Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Paulo Machado

Na opinião do leitor Ivonio Barros a cobertura dedicada pela Agência Brasil à 14º Conferência Nacional de Saúde, realizada em Brasília, entre os dias 1o. e 4 de dezembro foi muito superficial. Segundo ele: ‘achei muito superficial a cobertura da Conferência Nacional de Saúde. Hoje começa a Conferência Nacional de Assistência Social e na próxima semana será realizada a Conferência Nacional de Política para a Mulheres, seria muito importante que a EBC fizesse uma cobertura mais profunda e contextualizada.’

Se observarmos o espaço que a Agência Brasil deu ao evento entenderemos melhor no quê se baseia tal opinião, da qual a Agência discordou: ‘Repasso abaixo os links com galerias de fotos e matérias que fizemos sobre a Conferência Nacional da Saúde. As matérias e as fotos tiveram um bom destaque nas páginas da Agência Brasil. Sempre é necessário avançar na cobertura de temas como da saúde. Não creio que o trabalho feito pelos nossos repórteres pode ser considerado como ‘superficial’, como sugere o leitor na mensagem enviada à ouvidoria.’

Participaram do evento 3.212 delegados, representantes do governo federal, dos estados e municípios, de organizações não governamentais, de centrais sindicais e de organizações da sociedade civil.

De todas essas pessoas, a Agência Brasil ouviu apenas sete. Dentre elas, quatro, repetidas vezes:

Ministro da Saúde – 3 vezes; secretario geral da Conferência – 2 vezes; coordenadora do evento – 3 vezes; conselheiro do Conselho Nacional de Saúde – 2 vezes.

Dentre os temas apresentados em mais de 300 propostas consolidadas e sintetizadas em 15 diretrizes, apenas sete aparecem nas oito matérias relativas ao evento, publicadas no período entre 30/11 e 04/12. Do que tratavam essas 300 propostas? Quais foram essas diretrizes? No quê constavam os 17 eixos temáticos? Os leitores da Agência Brasil desconhecem, . O mote da Conferência e sua justificativa: Todos usam o SUS! SUS na Seguridade Social – Política Pública, Patrimônio do Povo Brasileiro, foram citados em apenas uma matéria.

As matérias da ABr abordam questões relativas ao sistema de gestão do SUS, a seu financiamento,

e ao lançamento de dois programas pelo Ministro da Saúde. No entanto, se fizermos uma visita ao site do Ministério (*) encontraremos cerca de 26 matérias tratando de todos os 17 diálogos temáticos com importantes depoimentos dos debatedores, além de matérias sobre os diversos eventos paralelos como a Oficina ‘Diálogos – Mídia e Saúde’ que contou com a participação de assessores de comunicação de Secretarias e Conselhos, jornalistas da grande imprensa e blogueiros discutindo a melhor forma de fazer com que a informação circule entre as instituições, entidades e veículos de mídia, procurando alcançar o objetivo primordial de como chegar à população.

Ficamos sabendo também que a mesa central da Conferência ‘Acesso e acolhimento com qualidade: um desafio para o SUS’ contou com a palestra da usuária, representante do Movimento Popular de Saúde de São Paulo, Luzinete Freitas Alves. Para Luzinete, que tem um longo histórico de militância no município de São Paulo, o Sistema Único de Saúde é, ainda, muito jovem. Ao compará-lo com um adolescente, ela destacou que o Sistema precisa de atenção, ‘e carinho’. Para ela, o Sistema ainda não foi implementado em sua plenitude. Apesar de destacar o Sistema como ‘o melhor plano de saúde do povo brasileiro’, Luzinete chama atenção para a falta de profissionais e problemas como falta de acessibilidade aos deficientes físicos, UTIs lotadas, dentre outros. A usuária defendeu, ainda, mais financiamento para o SUS, ‘precisamos garantir o recurso que é destinado ao SUS e não ficar de pires na mão’.

Outro momento importante da Conferência foi a entrega do ‘Prêmio Sérgio Arouca de ações de gestão participativa’. A premiação, que desde 2005 homenageia o sanitarista e um dos grandes líderes da Reforma Sanitária do país, teve como objetivo promover o reconhecimento e a divulgação de experiências exitosas de gestão participativa em saúde nos serviços, organizações e movimentos sociais. Mais de 120 trabalhos foram inscritos nesta edição. O prêmio contemplou três categorias: experiências implementadas em municípios com menos de 50 mil habitantes; municípios com mais de 50 mil habitantes; e no âmbito dos estados. Experiências importantes que dariam ótimas pautas para a agência pública, mas que os leitores desconhecem porque não foram informados.

Por fim encontramos na página do Ministério o relatório final da Conferência com as deliberações a que chegaram os mais de 3 mil delegados e a Carta à sociedade (**) na qual os participantes prestam contas à sociedade sobre as politicas públicas e suas perspectivas. A Carta também não foi divulgada pela ABr.

Porque cobrir as Conferências Nacionais

Para o jornalismo cumprir com sua função social de fiscalizar e informar sobre a execução de politicas públicas em atendimento aos direitos da cidadania relacionando-os às obrigações do Estado, geralmente, a reportagem tem de percorrer os locais onde essas politicas se realizam na prática, ouvindo os usuários alem de ouvir os responsáveis por sua execução e repercutir os resultados junto à especialistas que os analisem e os expliquem para os cidadãos.

Politicas de abrangência nacional, como por exemplo, o Sistema Único de Saúde – SUS, acontece simultaneamente em todos os municípios brasileiros levando a cabo ações sob responsabilidade das três esferas de governo. A complexidade de se montar uma cobertura jornalística que consiga trazer informações sobre o que acontece em todo o território nacional, durante todo o tempo, é um desafio quase impossível.

Quase, porque as conferências nacionais constituem uma forma avançada, adequada e econômica para o jornalismo proceder tal cobertura sem maiores esforços, a não ser um bom e detalhado planejamento. Elas geralmente reúnem, em um só evento e em um só lugar, tantas e tão qualificadas fontes sobre um assunto que de outra maneira talvez fossem necessárias centenas de viagens para a reportagem ouvir a cada uma delas isoladamente.

Os profissionais que a elas acorrem, vindos das mais remotas regiões deste país, trazem na bagagem uma fantástica diversidade de experiências vividas no cotidiano de suas comunidades, organismos e instituições. Soma-se a isso o conhecimento de cada um, adquirido ao longo de anos de trabalho na execução local, regional ou nacional de políticas públicas, constituindo um verdadeiro arcabouço de informações para o jornalismo produzir um balanço completo e pormenorizado de qualquer programa.

Para o jornalismo da empresa pública, que tem a missão de formar e informar cidadãos críticos, cientes de seus direitos e obrigações e, geralmente, com escassez de recursos para reportagens aprofundadas, as conferências nacionais proporcionam pautas extremamente qualificadas pois nelas são discutidos o passado, o presente e o futuro das politicas públicas e como elas impactam a vida dos cidadãos.

Se compararmos o conteúdo do quê os leitores da Agência Brasil foram informados com o quê eles não foram informados veremos que o leitor Ivonio Barros tem razão em afirmar que a cobertura foi ‘muito superficial’ e recomendar ‘seria muito importante que a EBC fizesse uma cobertura mais profunda e contextualizada.’

Até a próxima semana.

(*) – Mais informações sobre a 14a. Conferência Nacional de Saúde no site do Ministério : (http://www.conselho.saude.gov.br/14cns/index.html)

(**) – disponível em: http://conselho.saude.gov.br/14cns/docs/04_dez_carta_final.pdf