Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Regina Lima

“Uma das queixas mais frequentes de leitores que chegam à Ouvidoria sobre notícias publicadas na Agência Brasil se refere à falta de imparcialidade e isenção na cobertura jornalística.

Vejamos algumas manifestações:

André de Souza Vieira, em manifestação enviada à Ouvidoria, fala da parcialidade da Agência Brasil na matéria publicada no dia 25 de janeiro de 2012, sobre a desocupação da área conhecida como Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), sob o título Kassab lamenta violência em manifestação contra operação na Cracolândia e no Pinheirinho. Ele pergunta: a Agência fará uma matéria intitulada: Ativistas lamentam violência policial e falta de democracia em São Paulo?

Também sobre a desocupação em Pinheirinho, Sonia Montenegro, manifestou-se no dia 23 de janeiro à Ouvidoria, questionando a notícia publicada pela Agência no dia 22 de janeiro com o título Prefeitura de São José dos Campos atende parte dos desalojados em reintegração de posse. A leitora comenta:“Que raio de notícia é essa? Estou sabendo por amigos, inclusive com fotos, que o que aconteceu foi uma invasão covarde de 1.800 homens armados, às 5 horas da manhã, com helicópteros e blindados, deixando uns tantos moradores feridos e contrariando uma decisão judicial. O que se espera de uma agência brasileira de notícias é a versão da população, não da elite.”

Por conta não só destas comunicações, mas de outras que chegam à Ouvidoria com o mesmo teor de reclamação, a coluna da Ouvidoria nesta semana dedica-se a refletir um pouco sobre a viabilidade ou não de um veículo de comunicação, independentemente se é público ou comercial, de transmitir informações isenta e imparcial, segundo os princípios que regem os manuais de redação dos grandes veículos de comunicação, em que a recomendação é de que a notícia seja dada com imparcialidade e isenção. Para isso, os manuais orientam que o repórter ouça todos os lados envolvidos no acontecimento.

Mas, entre o que está no papel e a prática vai uma longa distância. O dia a dia na redação de um veículo de comunicação tem revelado o quanto é difícil colocar em prática estes princípios, porque a interpretação da informação não está em quem a produz, o repórter, mas naquele que a recebe, o usuário dos meios de comunicação. A imparcialidade e a isenção são princípios que devem ser perseguidos pelo jornalista, mas nada garante que o leitor, o telespectador e o ouvinte vão interpretar a informação tal qual foi produzida pelo profissional do jornalismo.

Tomemos como exemplo as notícias que circulam em época de disputa eleitoral, em que a discussão sobre a imparcialidade fica mais evidente. No Brasil, diferentemente dos Estados Unidos em que os jornais se posicionam, a mídia ainda guarda a ilusão da imparcialidade. Por isso, os noticiários usam estratégias discursivas para camuflar sua participação no processo eleitoral. No Brasil, temos conhecimento apenas de dois casos em que os veículos de comunicação se posicionaram publicamente favoráveis a uma candidatura à presidência da República. Um foi o jornal O Estado de S. Paulo, em editorial intitulado O mal a evitar, publicado na edição de 25 de setembro de 2010. Nele, o veículo manifestou-se favorável à candidatura de José Serra, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), como podemos observar no trecho“(…) Com todo o peso da responsabilidade à qual nunca se subtraiu em 135 anos de lutas, o Estadoapoia a candidatura de José Serra à Presidência da República, e não apenas pelos méritos do candidato, por seu currículo exemplar de homem público e pelo que ele pode representar para a recondução do País ao desenvolvimento econômico e social pautado por valores éticos. O apoio deve-se também à convicção de que o candidato Serra é o que tem melhor possibilidade de evitar um grande mal para o País (…)”.

O outro foi o da revista Carta Capital em editorial Por que apoiamos Dilma, publicado na edição de 30 de setembro de 2010, em que o veículo declarou apoio à candidatura de Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT). Vejam o trecho "(…) De todo modo, não é apenas por causa deste destemido passado de Dilma Rousseff que Carta Capital declara aqui e agora apoio à sua candidatura. Vale acentuar que neste mesmo espaço previmos a escolha do presidente da República ainda antes da sua reeleição, quando José Dirceu saiu da chefia da Casa Civil e a então ministra de Minas e Energia o substituiu (…)”

Em entrevista publicada, no dia 20 de março de 2006, à revista do Instituto Humanista da Unisinos, a jornalista e professora do programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), Christa Berger, diz:“a cobertura da grande imprensa é escandalosamente tendenciosa – ela vem atuando como um partido que representa uma classe social – mas, com o poder de esconder esta condição ao afirmar-se neutra, imparcial e objetiva. Este é o poder perverso da imprensa: agir em uma direção e argumentar convicentemente que está na direção contrária”. Berger acrescenta que “o que se espera do jornalismo é a apresentação dos acontecimentos pela escuta de múltiplas fontes e da diferenciação do espaço da informação e da opinião. Mas o que geralmente há, é a distribuição desigual da informação”.

Jáo diretor de redação do jornal francês Le MondeI Diplomatique, doutor em Sociologia e professor de Teoria da Comunicação, Ignácio Ramonet, em entrevista publicada no Observatório de Imprensa no dia 31 de janeiro de 2012, defende que a mídia “deveria se posicionar claramente sobre a linha ideológica e política que segue”. Ele acredita que não existe a tão aclamada neutralidade da imprensa. “Um jornal que diz que é objetivo é um jornal alinhado à direita e que tenta esconder seu ponto de vista”. Ramonet entende que os veículos de comunicação deveriam deixar claras as posições políticas e ideológicas que defendem. “Não tenho nada contra um jornal de ser de direita, acho interessante que existam. Mas que fique claro que representa o ponto de vista dos empresários, da burguesia e da classe conservadora”, diz.

Se a compreensão e interpretação da notícia ficam a critério de quem recebe as informações, ao jornalista de um veículo público de Comunicação, como o é a Agência Brasil, cabe agir e informar com responsabilidade, procurando sempre tratar temas de interesse do cidadão, ouvindo as múltiplas fontes envolvidas no fato a ser publicizado, apurando e contextualizando a informação. Por isso, cada integrante deste Sistema Público de Comunicação tem que ter em mente a função do jornalismo como serviço público, pautado pela ética, principalmente com o compromisso com a verdade e com a pluralidade de fontes e opiniões.

Até a próxima semana.”