“Terça-feira, 20. Benfica e FC Porto disputam uma das meias-finais da Taça da Liga. O PÚBLICO dedica duas páginas à antecipação do encontro. Plantéis prováveis, estatísticas, declarações dos treinadores, a alimentar o interesse dos que não dispensam o espaço que o jornal dedica ao futebol.
Quarta-feira, 21. Ganhou o Benfica. Os leitores que gostam de futebol já o sabem, mas querem conhecer o olhar dos jornalistas sobre as incidências do jogo, ver ou rever as declarações dos protagonistas, ponderar a análise crítica dos especialistas. Duas páginas inteiras e a fotografia principal da capa.
Quinta-feira, 22. Falta saber quem será o outro finalista da competição. A resposta será dada em Barcelos, onde o Gil Vicente recebe o Sporting de Braga na segunda meia-final. Nem uma linha no jornal. Quem não souber que nessa data se conhecerá o adversário do Benfica na final não o ficará a saber pelas páginas de Desporto do PÚBLICO.
Sexta-feira, 23. Ganharam os de Barcelos. Será a primeira final do Gil Vicente numa competição nacional. Feito inédito, portanto. O jogo não foi banal, teve reviravolta nos últimos minutos e foi decidido com recurso a grandes penalidades. Quem não o viu encontrou no jornal um curto relato — nada de reacções, nada de análise crítica — paginado a duas colunas na segunda página do Desporto (a primeira era dedicada a um jogador do Benfica). Na capa, nem uma referência.
A desigualdade de tratamento entre as duas meias-finais disputadas esta semana foi gritante. A diferença de peso — em currículo, recursos, adeptos — entre os clubes envolvidos em cada um dos jogos não pode justificá-la. Tratava-se de embates com idêntica importância para o apuramento dos finalistas de uma competição nacional.
O leitor Miguel Ângelo de Almeida criticou, com razão, o critério editorial seguido. Especialmente no jornal de quinta-feira. Declara o seu “espanto” por não ter encontrado, “nem na versão em papel nem online’, qualquer ‘referência’, ‘nos moldes que o Público tem por hábito fazer’, à disputa, nesse dia, ‘da meia-final da Taça da Liga entre o Gil Vicente e o Sporting de Braga’.
Alarga a crítica e situa-a no âmbito da recente mudança gráfica do PÚBLICO, queixando-se de que o jornal ‘deixou de referir certos jogos de futebol que se realizam quer à sexta-feira quer à segunda-feira’, quando entre as equipas que os disputam “não estão o Porto, Benfica e Sporting’. Fala de ‘sonegação de informação’ e questiona se o PÚBLICO considera aceitável essa discriminação positiva “dos chamados três grandes’. Pede que seja clarificada a orientação do jornal nesta matéria.
A essa questão responde Jorge Miguel Matias, editor do Desporto, informando que, “de facto, a alteração gráfica do jornal obriga os diferentes editores a apostar em determinados temas em detrimento de outros’, com a intenção de que ‘o jornal desenvolva com mais profundidade dois ou três temas por dia, em vez de oferecer uma multiplicidade de assuntos tratados muitas vezes de forma ligeira, em notícias com uma dimensão média ou reduzida’. Trata-se pois de uma alteração de fundo, a que valerá pena voltar em outra ocasião, já que os critérios de selecção temática resultantes do novo figurino editorial e gráfico têm levado alguns leitores a colocar dúvidas ou objecções que merecem ser analisadas.
Ficando hoje pelo Desporto, devo salientar que o editor não inscreve no âmbito dessa alteração o caso da omissão noticiosa do jogo de Barcelos, acerca do qual reconhece que ‘a não publicação de nenhuma informação (no papel e no online) foi um erro de edição’, pelo qual apresenta desculpas aos leitores. ‘A secção de Desporto’, escreve, ‘deveria ter publicado alguma informação, mesmo que pequena’, pois ‘tratava-se de uma meia-final de uma competição oficial e, portanto, a relevância era inequívoca’.
Afirmando que se mantém ‘a política de não limitar o acompanhamento noticioso aos chamados três grandes’, Jorge Miguel Matias alega que ‘prova disso mesmo é o facto de, precisamente pelo facto de o Sp. Braga estar na luta pelo título de campeão nacional, termos passado a publicar um texto de antecipação dos seus jogos’.
É compreensível que motivos de relevância e audiência levem o PÚBLICO, como aliás toda a imprensa, a privilegiar o espaço concedido aos jogos e às notícias dos maiores clubes. Mas não é aceitável — qualquer que seja o modelo gráfico ou o espaço disponível — que essa diferença ultrapasse os limites exigidos pela isenção no acompanhamento de competições nas quais todos os participantes estão, à partida, em situação de igualdade formal. E muito menos que o desequilíbrio possa chegar a assumir a forma de omissão. Sendo isto válido para qualquer das edições do jornal, é de esperar que o esforço por uma abordagem mais equilibrada seja maior no Público Online, em que não existem os constrangimentos de espaço próprios da edição impressa.
O PÚBLICO não deve esquecer que têm leitores em todo o país e que se contam entre eles adeptos de clubes como o Sporting de Braga ou o Gil Vicente. Que existem ainda os que se interessam por futebol à margem das paixões clubísticas. E que os últimos anos têm mostrado que a tríade dos ‘grandes’ não está fixada para a eternidade.
Protestos diplomáticos
Nos últimos meses foram publicadas neste jornal várias notícias sobre o caso de um ex-vice-cônsul de Portugal em Porto Alegre, que é procurado pelas autoridades brasileiras no âmbito de uma acusação de burla, e que entretanto perdeu, por despedimento, o estatuto de funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE).
Quando, a 30 de Janeiro passado, a notícia do seu afastamento foi publicada na edição on line sob o título ‘Ex-diplomata português no Brasil despedido com justa causa’, o leitor Bernardo Ribeiro da Cunha, identificando-se como diplomata, enviou-me um pedido de rectificação (que transmiti à direcção do jornal), alegando que esse título ‘revela um profundo erro’, já que a pessoa a que diz respeito ‘não integra a categoria dos diplomatas portuguesas’. Na mesma data, mas na edição impressa, a qualificação em causa não figurava no título, mas aparecia na abertura da peça, que referia o ‘diplomata envolvido no desaparecimento de mais de um milhão de euros’ que lhe teriam sido confiados pela arquidiocese de Porto Alegre.
A 2 de Fevereiro, a Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses (ASDP) deu-me conta de um comunicado enviado à directora do PÚBLICO, em que se lia: ‘Urge clarificar que a pessoa referida nesta notícia não integra o Serviço Diplomático, ao qual apenas poderão aceder os cidadãos que obtenham aprovação em concurso público específico e que é regido por estatuto profissional próprio’. Acrescentava a propósito a associação sindical que as funções de vice-cônsul, para as quais ‘o elemento referido na notícia’ fora nomeado são reguladas por um diploma sobre o qual emitira um parecer negativo, ‘designadamente pelo grau de discricionariedade e ausência de transparência no processo de seleção dos vice-cônsules’.
Uma semana depois, nova notícia sobre o caso de Porto Alegre insistia no qualificativo ‘ex-diplomata’ para referir o ex-funcionário do MNE, dando origem a nova reclamação da ASDP, em que se referia que ‘a repetição do erro é da autoria da mesma jornalista’. Não é assim. Essa jornalista, Mariana Oliveira, que tem continuado a acompanhar o caso (ver nomeadamente as notícias de 7 e 14 deste mês) informou-me no passado dia 12 de que pedira aos editores do jornal que não colocassem a palavra ‘diplomata’ nos títulos e aberturas das suas notícias sobre a alegada burla, o que ela própria deixara de fazer após a primeira reclamação. Terá sido ouvida, porque, e pela primeira vez, o termo desapareceu na notícia publicada dois dias depois.
Haverá quem, defendendo o uso do termo diplomata num vago sentido lato, possa ver algum laivo de corporativismo nos protestos recebidos, mas são protestos justificados. O ex-funcionário do MNE nunca pertenceu de facto ao Serviço Diplomático, e é natural que os que o integram não gostem de ver a diplomacia portuguesa associada a acusações criminais.
Ao longo de várias semanas, perguntei à direcção do jornal se concordava com o teor das reclamações e se iria ser feita uma correcção. Não tendo recebido resposta, nem tendo sido publicada qualquer rectificação, não estou em condições de assegurar que o erro não se repetirá.”