“Por que diabos você ia querer este emprego?”. A pergunta foi respondida dois anos atrás pelo ombudsman do New York Times, Arthur S. Brisbane, em sua coluna de estreia, pois muitos no jornal queriam saber a resposta. Agora, ao fim do seu período no cargo, quando ele passa o bastão para a próxima ombudsman, Margaret Sullivan, Brisbane escreve sua última coluna [25/8/12] com um outro olhar sobre a questão.
Há dois anos, ele via o NYTimes como uma organização de notícias com muitos recursos que havia sido desafiada a se recriar em um ambiente quase falido – o da mídia tradicional. “Eu me via como um médico legista chamado a fazer uma autópsia em artigos que receberam reclamações”, compara. “Mas me surpreendi com o que vi. Não tanto em relação a ‘cadáveres’ ocasionais em textos, mas a mudanças mais profundas remodelando o que eu hesito em chamar meramente de ‘jornal’”.
No período em que ocupou o cargo de ombudsman, a New York Times Company transformou-se e se desfez da maior parte dos bens que a tornaram um grupo diverso. Com a venda do portal de pesquisa sobre música About.com, a Times Company voltará ao básico: os jornais. Continuam no grupo o New York Times, seu carro-chefe; o International Herald Tribune, com sede em Paris; e dois jornais da região americana de New England, o Boston Globe e oTelegram & Gazette.
O grupo manteve um investimento incomparável em jornalismo, mesmo com a rentabilidade questionada (no último trimestre, foi registrado prejuízo de quase R$ 180 milhões). Isso leva o ombudsman a concluir que Arthur Sulzberger Jr., presidente da empresa e publisher do NYTimes, considera que um jornalismo forte é um bem do qual não se pode abrir mão.
Além do papel
O mantra de sobrevivência do grupo pede por expansão nas esferas internacional, de vídeo, social e móvel. O que é excepcional e surpreendente para Brisbane é como toda a redação do NYTimes parece ter sido levada a essa estratégia de ampliação. Sem dúvida, a ameaça mortal é clara o suficiente para ser motivadora. Mas, para jornalistas do NYTimes, a oportunidade de colocar seu conteúdo na web é atrativa. Encorajados a explorar as redes sociais, muitos jornalistas mostraram-se extraordinários no Twitter. Isso representa novas oportunidades para se construir uma audiência pessoal e, para a empresa, é uma maneira de seguir os leitores onde eles estão. Mas o resultado acabou sendo um NYTimes estranhamente desagregado em que jornalistas constroem suas próprias marcas.
Diante desta dinâmica, Brisbane enfatizou em diversas colunas que o jornalão deveria comunicar de maneira mais vigorosa os valores de sua marca – seu compromisso com a verdade, seus padrões, etc –, na medida em que acontece a transformação digital, publicando-os e comunicando-os diretamente aos leitores do site. Ao fazer isso, o jornal reforçaria os padrões para a equipe e daria aos leitores motivos de confiança.
Transparência, responsabilidade e humildade
Há dois anos, Brisbane sugeriu uma maior ênfase na “transparência, responsabilidade, humildade” e, hoje, ele acredita que o jornal poderia fazer isso melhor. Para ele, o NYTimes é pouco transparente. O leitor tem que procurar muito para encontrar as políticas online do jornal e ainda não há espaço para editores falarem sobre o tema. No que se refere aos erros, milhares deles são avaliados por ano na seção de correções, liderada por Greg Brock.
Quando assumiu o cargo, Brisbane acreditava que não havia nenhum tipo de “conspiração” guiando as escolhas editoriais e que o NYTimes era muito vasto e complexo para ter algum indivíduo ou grupo influenciando seu conteúdo. Hoje, ele mantém essa crença, mas acredita que a redação é moldada por uma cultura de mentes semelhantes.
Na cobertura da campanha presidencial, Brisbane descobriu que editores e repórteres são disciplinados a garantir precisão e equilíbrio – e geralmente são bem sucedidos. Mas, acredita ele, em todos os departamentos do jornal, muitos compartilham de um tipo de progressismo político e cultural que acaba sendo infiltrado no conteúdo. Assim, temas como casamento gay ou o movimento “Ocupe” são vistos mais como causas do que como notícias. Segundo uma pesquisa do Pew Research Center, o índice de credibilidade do jornal caiu drasticamente entre o público republicano, sendo uma imagem oposta quase perfeita à do canal de TV conservador Fox News. “Isso pode ser bom?”, indaga Brisbane.
Em relação à pergunta inicial, há dois anos, Brisbane responderia que aceitou o cargo por achar que seria interessante – hoje, ele conclui que realmente foi.