Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Daniela Nogueira

Criar títulos para as matérias não é das tarefas mais fáceis do jornalismo. O serviço, incumbido geralmente ao editor, deve enfatizar a informação mais importante do texto e ser atraente o suficiente para fazer com que o leitor se interesse pela leitura. O título deve expressar a ideia transmitida na notícia, sem polemizar de modo desnecessário ou dar margem a interpretações múltiplas.

Na semana passada, um dos títulos da editoria de Brasil chamou a atenção dos leitores. “FAO. Brasil ainda tem 1,7% das pessoas com insegurança alimentar” era o título da página 12 da edição de quarta, 17/9. A matéria mostrava que o País havia superado o problema da fome, segundo a FAO, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, um braço da ONU. O texto apresentava que 3,4 milhões de brasileiros ainda não comem o suficiente por dia, o que corresponde a 1,7% da população.

“Lamentação”

Membro do Conselho de Leitores do O POVO, Ivan Rodrigues foi um dos que criticaram. “O texto segue uma linha de lamentação e crítica, ao invés de destacar o aspecto da conquista. A notícia que correu o mundo tem como base a apresentação de um relatório da ONU, respeitado até pelos meios mais contrários ao trabalho e programas sociais deste governo. As chamadas de outros jornais já falam por si. É preciso destacar as conquistas e os bons acertos, até para dar vontade em acreditar nas superações e contribuir com elas”, comentou.

De fato, como menciona Ivan, o rumo seguido por outros veículos foi diferente. No mesmo dia, o concorrente Diário do Nordeste publicou: “Brasil supera a fome, diz FAO”. Outros exemplos: “Brasil superou problema da fome, afirma relatório da FAO” (Folha de S.Paulo), “Brasil atinge metas de redução da fome no país, revela FAO” (O Globo), “Brasil reduz a pobreza extrema em 75%, aponta relatório da ONU” (Jornal do Commercio).

O texto publicado no O POVO foi recebido por agência de notícias. Era o mesmo veiculado em outras mídias, mas o título foi bem diferente. Em vez de dar destaque ao feito do País, com a redução da miséria e expor o desempenho brasileiro diante da luta que é global, O POVO optou por seguir o caminho inverso. A notícia considerada mais relevante na matéria não estava no título. Não está errado, não tem uma informação errada, mas não refletia a parte mais importante da notícia.

Questionados, os editores de Brasil, do Núcleo de Conjuntura do jornal, não responderam.

Mudanças gráficas e mais análises

O jornal britânico Financial Times anunciou, na segunda-feira passada, 15/9, uma série de reformulações gráficas em sua publicação impressa. O novo projeto é considerado por especialistas gráficos como o maior do jornal nos últimos sete anos. A ideia é tornar a edição mais analítica, com matérias mais desenvolvidas e coberturas aprofundadas. Quanto ao design, aumentou-se o tamanho das colunas, expandiu-se o espaço para as reportagens (com mais espaços brancos) e destacou-se o uso de elementos gráficos, como tabelas e quadros, para ajudar na explicação das informações.

O Financial Times é conhecido por ser impresso em um papel na cor salmão (meio rosa), e essa característica permanece. É um jornal de negócios, com renomada reputação (principalmente na Europa), e bem conhecido por profissionais do ramo empresarial. O que chama a atenção é a relevância que se impõe ao impresso em um mundo cada vez mais digital.

“Propriedade valiosa”

O editor-chefe do Financial Times, Lionel Barber, que está no cargo há nove anos, reforçou o investimento no jornal de papel. “O jornal ainda é uma propriedade muito valiosa. Pensamos muito sobre o futuro do impresso e chegamos a grandes conclusões. Primeiro de tudo, quem disser que o impresso está morto está errado. Ainda é uma valiosa proposta de publicidade”, comentou em entrevista.

Vale ressaltar que há nove anos o jornal vendia mais do que o dobro das 210 mil edições vendidas no mês passado. Nesse mesmo período, as assinaturas digitais saltaram de 75 mil para 455 mil, alcançando um público bem maior. (Os números foram publicados no site do The Guardian) Parece contraditório o desenvolvimento do impresso? Ou seria uma estratégia de sobrevivência? O impresso passa por constantes reinvenções e pode conviver com o digital – sem ser engolido por ele.

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Daniela Nogueira é ombudsman do jornalO Povo