Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

O plágio na era Google

O que caracteriza roubo intelectual na era da internet?, questiona o ombudsman do Washington Post, Patrick B. Pexton, em sua coluna [9/9/11]. A questão surgiu, conta ele, porque um professor da Universidade do Texas alegou recentemente que seu trabalho foi roubado e usado em um ensaio publicado no Post em 26 de agosto.

O artigo de Anna Lewis no jornal tratava em parte da relação das mulheres com as ciências da computação nas décadas de 60 e 70. Ao contrário de outros mercados de trabalho, este era um que, nos EUA, aceitava cada vez mais mulheres, e elas estavam ganhando rapidamente responsabilidade e espaço. O ensaio de Anna analisava um artigo de 1967 da revista Cosmopolitan que citava a então nova ciência como uma carreira em ascenção para as mulheres. E terminava descrevendo as dificuldades que a autora, que até pouco tempo trabalhava para uma empresa de software como diretora de recursos humanos, tinha para contratar jovens mulheres nesta área.

O professor Nathan Ensmenger, especialista em história da tecnologia, alega que a primeira metade do artigo de Anna é baseada, em grande parte, em suas pesquisas sobre o papel das mulheres na indústria.

Anna reconhece que encontrou o artigo da Cosmopolitan no site do professor a partir de uma pesquisa no Google. Ela não cita Ensmenger em seu ensaio, mas cita o livro de ensaios Gender Codes: Why Women Are Leaving Computing, organizado por Thomas J. Misa, e onde está publicado um artigo do professor do Texas sobre o assunto.

Ensmenger afirmou que, se o artigo de Anna chegasse a ele como um trabalho acadêmico, ele a reprovaria pela falta de identificação de fontes e ainda levaria seu nome ao conselho disciplinar da universidade. Anna e Rachel Dry, sua editora no Post, vêem a situação de forma diferente. Para elas, a citação ao livro de ensaios – que de fato continha o ensaio do professor – era o suficiente.

“Eu não roubei nada, não cometi plágio”, afirmou Anna ao ombudsman. A editora concorda. A seção em que o artigo foi publicado, Outlook, costuma pegar resumos de pesquisas, às vezes acadêmicas, e torná-los acessíveis a um público mais amplo.

Sem links

O ensaio de Anna foi adaptado de um post que ela havia publicado no site da Fog Creek Software, empresa onde trabalhava. Rachel viu o post e pediu que ela o transformasse em um artigo para o jornal. Para Pexton, os pontos de vista de Rachel e Anna refletem a era do Google e do jornalismo de blogs, em que hyperlinks são como notas de rodapé e o compartilhamento de informações é visto mais como uma honra do que como um roubo.

No artigo original para o blog, Anna colocou diversos links para suas fontes, incluindo um para o site de Ensmenger. “Na minha cabeça, linkar é algo muito mais poderoso do que colocar uma nota de rodapé ou citação”, afirma ela. O ombudsman nota, entretanto, a dificuldade de se reproduzir links no texto impresso. E, neste caso específico, os links também não entraram na versão online para o site do Post. Então, de fato, havia pouca citação.

Pexton atenta para a falta de experiência de Anna. “Este foi seu primeiro artigo para um grande veículo de mídia. Jornalistas veteranos, se passassem pelo livro e site de Ensmenger, teriam tentado entrevistá-lo e provavelmente o citariam. Ele é claramente um especialista na área”.

Anna disse que não passou pela sua cabeça ligar para o professor. Muito da sua pesquisa para o ensaio foi feita em livros (para as partes históricas) e sites (para as estatísticas); ela não falou diretamente com ninguém. Para Pexton, este foi um erro, “e um erro muito comum na era da internet”. Para o ombdusman, portanto, não houve plágio ou roubo, e sim falta de cuidado na hora de identificar as fontes do trabalho.

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Nota do OI: em texto em seu site após a publicação da coluna de Pexton no Post, o professor Nathan Ensmenger afirma que “independente do que os advogados do Washington Post argumentem, este é claramente um caso de plágio. Sem dúvidas, sem ambiguidade”. Ele completa: “a grande ironia é que, se a autora e o Washington Post tivessem simplesmente me pedido desculpas e corrigido a versão online do artigo colocando um link, o problema provavelmente teria acabado ali”.