O Estado de S. Paulo, 5/4 Patrícia Villalba Caminho para o altar No camarim do Teatro Poeira, em Botafogo, Andrea Beltrão tem o vislumbre de que o charmoso casarão colonial, que ela e a amiga Marieta Severo transformaram em teatro em 2005, carrega o mesmo simbolismo do traje mais desejado pela maioria das mulheres. ‘É um sonho romântico, um vestido de noiva – até branco ele é’, filosofa ela, que estreia hoje como a Sueli do seriado Tapas & Beijos, às 22h15, na Globo. Ao lado de Fátima (Fernanda Torres) como vendedora da Djalma Noivas, Sueli está cercada de romantismo e dos anseios alheios. Mas a graça da comédia romântica escrita por Cláudio Paiva e dirigida por Maurício Farias é, justamente, os desencontros amorosos das duas. ‘Isso me agrada no programa: o ideal para a mulher é um belo vestido, e não ser famosa ou capa de não sei onde’, diz Andrea, de novo em cartaz no Rio com a peça As Centenárias (Teatro João Caetano) e que volta à TV depois deixar A Grande Família, em que interpretou por sete anos a cabeleireira Marilda. ‘Tive saudade física dela, foi bem esquisito.’ A Sueli me parece mais romântica do que a Marilda. É isso? Elas se parecem por serem fortes, interessantes e independentes, e querem o amor romântico. A Marilda era a amiga desestruturada da Nenê (Marieta Severo), que é a mãe perfeita e a esposa apaixonada. Ela às vezes queria um homem, mas quando ele aparecia e dormia na casa dela, ela se irritava logo. Acho que a Sueli tem um pouco isso, só que ela é apaixonada pelo Jurandir (Érico Brás), que é um folgado. O cenário é perfeito, porque casar vestida de noiva está em alta de novo. É mesmo? Estou por fora desse assunto… O que será que aconteceu, gente? Pois é, eu ia perguntar sua opinião. Tem gente até recasando. São casamentos em clima de superprodução, têm até grua. Meu Deus, que aflição! (risos) Grua, aquela coisa que a gente tem a maior dificuldade para alugar pra fazer um filme? Preciso falar sobre isso com o Cláudio Paiva… Esse universo romântico da loja de noivas é muito divertido. No seriado, usamos a alegoria da noiva, mas as duas personagens que vivem dentro desse universo não têm a menor ilusão. Elas são vividas, querem um homem bacana, somente isso. E eu, Andrea, me aproximo mais da ideia de casamento da Sueli do que dessa moça de que você falou, do recasamento com grua. Você acha que essa noção sobre os relacionamentos tem a ver com a desilusão ou com a fase da vida? Acho que com fase da vida. Mas o que eu percebo, hoje, é que as pessoas têm uma necessidade enorme de mostrar suas coisas e expor a felicidade. O que eu estranho é isso. Não estranho a pessoa querer casar na igreja, mas o que move isso. É o amor ou é necessidade de aparecer, porque o que não está estampado na internet não existe? É como se você não fosse ninguém se não estivesse no Twitter ou no Facebook. Parece que tudo hoje em dia tem a ver com as redes sociais, uma verdadeira obsessão. É, que coisa chata! Todo mundo fica se expressando sem parar, um saco. Detesto isso, e acho importante preservar a quietude. Eu estava pensando hoje no vestido de noiva, que é um clássico, uma roupa bem tapada, elegante, não é um fio dental. Isso me agrada no programa: o ideal é um belo vestido e não ser famosa ou a capa de não sei onde. Ser atriz e proprietária de teatro é algo que remete a outros tempos do teatro e divas como Cacilda Becker. É tão romântico quanto parece? É um sonho romântico, um vestido de noiva – até branco o Poeira é (risos). Mas é maravilhoso. Para a Marieta e para mim, acho que ter construído isso aqui sozinhas e com dinheiro próprio é um ápice pontual. Temos o patrocínio da Petrobrás para programação e oficinas, mas o prédio em si é por nossa conta. Quando a gente está em cartaz aqui, ele se paga. Mas lucro a gente não tem. E acho que não vamos ter… Você fazia parte de um projeto do Cláudio Paiva que tocaria no caso do mensalão, mas que acabou não sendo aprovado pela Globo. Por que ainda é tão difícil falar sobre certos temas na TV? Olha, a raiz dessa questão é que a emissora em que a gente trabalha tem dono. E esse dono tem seus gostos e suas preferências. Não sei se a decisão teve a ver com o PT, vejo mais como a empresa não querer falar disso agora. Mas não me sinto impedida ou atacada como artista. Talvez ainda recaia sobre a televisão a responsabilidade de ser um veículo de transformação, como foi nos anos 80. É, acho que essa fase de que você está falando foi muito mais rica do que a que gente vive agora. Tinha TV Pirata, Armação Ilimitada, Malu Mulher, Ciranda Cirandinha, uma penca de coisas maravilhosas. Agora deu uma encaretada. Daí, o sucesso do Canal Viva? Ah, muito legal. Tenho fé que o Viva ainda vai dar uma sacudida no terreiro. Acho que o público vai querer ver a mesma qualidade daquele tempo. Por que estão correndo para o Viva? Porque tem Vale Tudo, TV Pirata… Tem coisas que você vê e pensa ‘gente, isso não pode fazer mais’. Será que Heleninha Roitman seria feita daquele jeito? Imagina, não se pode nem fumar mais na televisão. O que podemos dizer para a audiência: você aposentou a Marilda de vez ou está mesmo num período sabático? O que é um período sabático? É aquela coisa que a pessoa fica em casa dizendo ‘ommmm’? Nunca estive nisso, Deus me livre. É que os ‘seres expressantes’ ficam falando coisas, então alguém inventou que eu estava num ano sabático, mas não é nada disso. É que acabou pra mim, queria mesmo sair e fazer outra coisa. Foram sete anos. Foi difícil pra caramba sair, porque é difícil sair do paraíso para dar uma volta no inferno. E eu amava fazer a Marilda. Tive saudade física dela, foi bem esquisito. De vez em quando, eu falava alguma coisa em casa no tom dela e pensava ‘nossa, nunca mais vou fazer a Marilda, que estranho’. Sei lá… Mas foi ótimo.