Folha de S. Paulo, 24/4 Tiago Santiago Pesquisa fundamenta enredo de telenovela O crítico tem direito de não gostar, mas o jornalista tem compromisso com a verdade. O colunista Fernando de Barros e Silva errou ao avaliar a novela do SBT ‘Amor e Revolução’ (‘Aposta do SBT não vale como ficção nem como documento’, Ilustrada, 10/4/2011). Afirmou que ‘antes do golpe de 1964 (…) não havia guerrilha no Brasil’. Mas não é o que diz Elio Gaspari, em ‘A Ditadura Derrotada’, capítulo ‘Pelas Barbas de Fidel’: ‘No início de 1962, uma nova organização esquerdista recebera a bênção cubana. O Movimento Revolucionário Tiradentes planejava a montagem de um dispositivo militar espalhado por oito áreas de treinamento em sete Estados’. Também Jacob Gorender, em ‘O Combate nas Trevas’, diz que ‘a direção do MRT comprou algumas fazendas e instalou nelas campos de treinamento de guerrilha’. Em 4 de dezembro de 1962, ‘O Estado de S. Paulo’ noticiava que ‘os órgãos de segurança haviam descoberto um campo de treinamento (…) Ali foram presos vários militantes do MRT’. Depois que Fidel Castro tomou o poder em 1959, muita gente sonhava em fazer o mesmo no Brasil, antes do golpe militar. Fernando de Barros e Silva errou de novo ao afirmar que ‘a tortura … só seria adotada pelo regime de modo sistemático depois do AI-5, em 1968’. O colunista desconhece as reportagens sobre torturas de Marcio Moreira Alves, no ‘Correio da Manhã’, em 1964, e o livro ‘Torturas e Torturados’, do mesmo autor, publicado em 1966. Alves cita ‘torturas praticadas em larga escala por quase todo o Brasil’ e diz que ‘eram tantas as descrições, tão pavorosos os sofrimentos… que não conseguiam mais indignar’. Também Elio Gaspari, na cronologia de ‘A Ditadura Envergonhada’, afirma que há 203 casos de denúncias de torturas em 1964. Além de escritor, tenho mestrado em sociologia e estou há meses pesquisando para escrever ‘Amor e Revolução’, novela que tem a responsabilidade de contar bem essa história para milhões de brasileiros. A verossimilhança da novela é demonstrada por meio dos depoimentos reais ao final de cada capítulo. CONFUSÃO ‘Amor e Revolução’ conta com a realização magistral de Reynaldo Boury, um dos responsáveis pela novela brasileira ser hoje o que é, um nome que inspira respeito em quem realmente tem conhecimento sobre TV. O próprio crítico equivocado é forçado a reconhecer a aparência de superprodução, resultado do esmero na direção de arte e pesquisa. Quem ‘confunde dados históricos’ não é o enredo, e sim Fernando de Barros e Silva. Sua crítica, de tão errada, seria uma piada, se o assunto não fosse sério. Mudando de assunto: a tentativa de censura da novela é inconstitucional [uma associação de militares da reserva pediu neste mês ao Ministério Público Federal a retirada da novela do ar; o pedido foi negado]. E a novela não denigre as Forças Armadas, na medida em que mostra herói militar, democrata, e vários outros militares a favor da legalidade. TIAGO SANTIAGO é autor de ‘Amor e Revolução’ (SBT, seg. a sex., 22h15).