‘Em 1930, nasceram no Maranhão, a 333 km e cinco meses de distância, dois meninos que receberam o nome Ribamar, mais tarde abandonado por ambos.
Os dois gostavam de livros e de política e se destacaram como talvez os maranhenses mais famosos do século 20. Um foi da UDN, o partido conservador do Brasil dos anos 1950, e presidiu a Arena, que dava apoio aos militares na ditadura. O outro foi do PCB e presidiu o Centro Popular de Cultura, núcleo de intelectuais de esquerda nos anos 1960.
Quiseram o destino e os desatinos da política brasileira que, aos 79 anos, José Sarney e Ferreira Gullar se tornassem dois dos colunistas mais atacados por leitores deste jornal. Curiosamente, muitos que se consideram esquerdistas criticam Gullar e poupam Sarney.
Há quem cobre do ombudsman que se posicione em relação a colunistas controversos. Como já expliquei aqui, o ombudsman não pode emitir juízo de valor sobre o conteúdo opinativo publicado pelo jornal.
Se o fizer, estará se alienando dos que não concordarem com sua opinião. O dever do ocupante deste cargo é tentar cumprir a missão impossível de representar quase 1 milhão de pessoas, que têm entre si as mais diversas visões de mundo.
O ombudsman se esforça para satisfazer a alguns desejos específicos de todos os leitores, não a todos os desejos de alguns leitores específicos. Em princípio, todos querem um jornal com menos erros, mais bem escrito, mais imparcial, mais claro, mais atraente, mais útil. Esses são os objetivos de seu trabalho.
Mas ele não precisa se omitir em relação às colunas. Quando elas cometem erros factuais, por exemplo, é necessário apontá-los. Tenho a impressão de que Gullar cometeu um no domingo passado.
Ele disse que ter filhos se tornou um modo fácil de aumentar a renda familiar graças ao programa Bolsa Família e citou exemplo de pessoa que passou de 3 para 7 filhos (mais 1 na barriga) para elevar seus benefícios. Pode ser, mas só por meio de burla da lei porque segundo a regulamentação do programa há um limite de benefícios por filho, que é de três (mais dois adolescentes de 16 a 17 anos que estiverem na escola).
Outra questão sobre colunistas para a qual o ombudsman precisa estar vigilante é se o jornal garante pluralismo de ideologias e partidos na composição de sua equipe.
Às vezes, como no atual momento político, com o vasto arco da aliança que apoia o presidente da República, é complicado.
Há muitas acusações de que a Folha tem um time de colunistas que pende para a direita. A dificuldade para definir o que seja esquerda ou direita atualmente é clara.
Mas há que reconhecer que nomes como Cesar Benjamin, Marina Silva, Paulo Nogueira Batista Jr., Luiz Gonzaga Belluzzo, Fernando Gabeira, Ferreira Gullar, entre outros, não podem ser classificados como ‘de direita’, ainda que eventualmente critiquem o governo, tido como de esquerda.
E nomes como Delfim Netto e Sarney, muitas vezes vistos como ‘de direita’, não podem ser listados entre os opositores do presidente, considerado de esquerda, porque eles indiscutivelmente o apoiam.
Muitos pedem que a Folha tire a coluna de Sarney. O ombudsman transmite à direção esses pedidos. Mas não opina sobre eles.’
***
‘Da natureza oblíqua da credibilidade’, copyright Folha de S. Paulo, 12/7/09.
‘Está disponível na internet apenas em inglês (ver indicação abaixo) mais uma boa pesquisa sobre o estado do jornalismo, do Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo, na Universidade de Oxford, Inglaterra. ‘A Confiança Pública nas Notícias’ se define como ‘um estudo construtivista da vida social das notícias’. Os autores concluem que a confiança nos meios de comunicação vai além da óbvia e fundamental questão da veracidade dos fatos por eles relatados.
O crédito do público diminui na medida em que o consumidor percebe que ele e o veículo não compartilham as mesmas expectativas. O descrédito também decorre de razões oblíquas, não apenas da simples credibilidade. Isso talvez ajude a explicar por que alguns meios de comunicação, como a revista ‘The New Republic’ (cuja história é descrita no filme recomendado abaixo) ou o jornal ‘The New York Times’ não perderam o respeito nem a leitura da maioria absoluta de seus leitores após constrangedores episódios de falsificações de matérias. Claro que ser veraz é vital. Mas dividir com a audiência visões de mundo semelhantes também pode ser.
PARA LER
‘Challenges Public Trust in the News’, de Stephen Coleman, Scott Anthony e David E. Morrison, Reuters Institute for the Study of Journalism (http://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/fileadmin/documents/ Publications/Public_Trust_in_the_News.pdf)
PARA VER
‘O Preço de uma Verdade’, de Billy Ray, 2003 (a partir de R$ 19,90)’
***
‘Onde a Folha foi bem…’, copyright Folha de S. Paulo, 12/7/09.
‘CHINA
Com agilidade, jornal desloca correspondente em Pequim para Urumqui, de onde tem enviado bons relatos sobre os conflitos étnicos
MÚSICA
Ótimo material sobre música em vários pontos do jornal no domingo
…E ONDE FOI MAL
FATO CONSUMADO
Mais dois assuntos importantes (regulamentação de mototáxi e reforma eleitoral) são decididos no Congresso e apresentados ao leitor como fato consumado sem preparação e debate anteriores
SATIAGRAHA
Como há um ano, quando o caso estourou, apresentação da denúncia contra acusados no caso Satiagraha ganha grande destaque, mas as questões fundamentais ficam sem resposta’