Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Cibele Santos

‘A Câmara dos Deputados dos Estados Unidos aprovou, no dia 11 deste mês, por esmagadora maioria, o projeto de lei Broadcast Decency Enforcement Act of 2004, apresentado em janeiro pelo deputado republicano Fred Upton, com o objetivo de moralizar a programação das rádios e TVs abertas do país.

A ‘lei da indecência’ eleva de US$ 27,5 mil para US$ 500 mil a multa para emissoras que veicularem ‘material obsceno, indecente ou blasfemo’, sendo que a terceira reincidência pode levar à revogação das bilionárias licenças outorgadas pelo governo; outros itens incluem multa inédita de US$ 11 mil para os apresentadores dos programas e um prazo máximo de 180 dias para arbitragem das reclamações apresentadas à Federal Communications Commission (FCC).

Antes da aprovação pelo presidente George Bush, porém, os termos deverão ser conciliados com outro projeto apresentado em fevereiro pelo Senado, ainda mais draconiano, por instituir multas de US$ 275 mil na primeira transgressão, US$ 375 mil na segunda, US$ 500 mil na terceira e US$ 3 milhões por dia nas reincidências seguintes, além de cassação da licença; por bloquear, nos próximos 12 meses, o projeto de desregulamentação da mídia da FCC (aprovado em junho de 2003) que voltaria à estaca zero enquanto um comitê do Senado avalia os efeitos potenciais de novas aquisições da mídia sobre a programação das emissoras; e pela exigência de um amplo estudo, pela FCC, sobre a proteção das crianças contra a violência na TV.

Apesar do apoio manifestado do presidente Bush ao projeto da Câmara, a forma definitiva da lei ainda poderá levar vários meses. Quaisquer que sejam os detalhes finais, porém, o fato é que implicarão maior mudança dos padrões de ‘decência’ das emissoras abertas desde 1978, quando a Suprema Corte dos EUA sustentou o veto da FCC a um programa de rádio em que o comediante George Carlin comentava as ‘sete palavras sujas’ banidas pelas leis federais. A agência relaxou as normas no final da década seguinte, depois de concluir que o contexto de uma palavra ou ato deveria ser considerado.

Jogo de interesses

O atual ‘furor regulatório’ não pode ser atribuído apenas aos segundos de exposição do seio de Janet Jackson no intervalo do Super Bowl, veiculado pela CBS em fevereiro, apesar das 500 mil cartas de protesto enviadas por cidadãos indignados à FCC. Afinal, entre 2001 e 2003, a agência recebeu dezenas de milhares de queixas e emitiu apenas 17 advertências às emissoras.

A medida atual, dizem os analistas, deriva de vários fatores que incluem não só a óbvia proliferação de programas impróprios para menores no horário nobre, mas também sérios conflitos de interesses na questão do relaxamento da propriedade cruzada de mídia votada pela FCC e, mais importante, os interesses eleitoreiros dos políticos na disputa presidencial de novembro.

Para as emissoras abertas e os juristas especializados no setor, a aprovação da lei põe em xeque a liberdade de expressão garantida pela Constituição dos EUA e abre a possibilidade de uma reversão permanente aos arcaicos padrões vigentes em 1978, baseados na lei de comunicações de 1934 – uma época em que os raros aparelhos preto e branco de TV eram redondos, os programas jamais se referiam a sexo (os casais invariavelmente apareciam em camas separadas), e os intervalos de transmissões de esportes exibiam inocentes bandas de música e chefes de torcida recatadamente vestidas.

Além disso, questionam os críticos, por que as sanções se restringem às emissoras abertas, já que 90% dos americanos assistem canais a cabo ou por satélite? Um projeto de controle da TV paga, similar ao da Câmara dos Deputados, foi rejeitado há pouco tempo no Senado.

Medidas preventivas

Em meio aos debates, a FCC já aplicou duas multas milionárias – de US$ 775 mil e US$ 248 mil – à Clear Channel Communications, maior rede de rádio do país, por dois programas altamente polêmicos e de gosto duvidoso que exploram sexo, prostituição e outros temas controversos. Outras 20 emissoras poderão ser multadas nas próximas semanas, entre elas a Infinity Broadcasting (rede de rádio da Viacom) pela transmissão de um programa em fevereiro em que o DJ Howard Stern discutiu sexo e racismo no ar. A rede NBC está na lista por ter veiculado uma frase ‘obscena’ do roqueiro Bono ao receber um prêmio do Golden Globes (‘This is really, really fucking brilliant’), enquanto a Fox Broadcasting pode ser penalizada por um palavrão da cantora Nicole Richie no December Billboard Music Awards.

Com tanto a perder, as redes estão recorrendo à autocensura, à ‘intolerância zero’ e a importantes mudanças em suas normas de transmissão ao vivo, que incluem delays de até 20 minutos, edição de cenas antes de nudez parcial (como a ABC está fazendo com o NYPD Blue) e a ampliação dos departamentos de normatização (como no caso dos reality shows Big Brother e American Idol, da Fox).

Por via das dúvidas, algumas redes de TV a cabo estão fazendo o mesmo. A MTV, por exemplo, transmitirá o Video Music Awards deste ano com delay de vários minutos para evitar a repetição de episódios constrangedores como os beijos entre Madonna, Britney Spears e Christina Aguilera no evento de 2003. Até o programa U-Pick Live de seu canal infantil Nickelodeon está sendo vigiado.

E como prevenir é o melhor remédio, a maioria das emissoras está seguindo à risca o conselho dos advogados: na dúvida, simplesmente cortar qualquer episódio que possa despertar a ira dos censores.’



ITÁLIA
Jornal do Brasil

‘Berlusconi vence disputa por mídia’, copyright Jornal do Brasil, 25/03/04

‘Os deputados italianos aprovaram ontem a chamada ‘Lei Gasparri’, que reforma o sistema audiovisual da Itália e protege o ‘império’ de TV do primeiro-ministro e magnata das comunicações, Silvio Berlusconi.

O projeto de lei, preparado pelo governo de direita, havia sido vetado por inconstitucionalidade no ano passado, pelo presidente da República, Carlo Azeglio Ciampi. Agora, ele será submetido ao Senado, onde a coalizão governamental tem uma cômoda maioria.

A lei em vigor proibia que uma mesma pessoa fosse dona ao mesmo tempo de canais de televisão, diários e revistas. A oposição denuncia que o novo texto vai favorecer o monopólio, em particular de Berlusconi.

A nova lei acaba com o veto ao monopólio em 2010 e permite também a privatização parcial da poderosa televisão pública, a Rádio e Televisão Italiana (RAI).’



ESPANHA

Clóvis Rossi


"Aznar e ‘El País’ trocam acusações", copyright Folha de S. Paulo, 30/03/04


"O premiê espanhol, o conservador José María Aznar, e o principal diário do país, ‘El País’ (próximo dos socialistas), chamaram-se reciprocamente de mentirosos e manipuladores da informação.


O embate gira em torno do tratamento que o governo deu às informações sobre a autoria dos atentados de 11 de março em Madri, que mataram 191 pessoas.


Não é um caso que se limita à Espanha. Tem a ver com questões caras ao sistema democrático, como o direito do público a uma informação veraz.


O confronto ‘El País’/Aznar tomou a forma de uma carta enviada ao jornal e também à rádio SER, do grupo Prisa, que edita o jornal ‘El País’, acusando ambos de manipulação e de mentir sobre o comportamento do premiê.


O eixo da carta é o telefonema de Aznar a Jesús Ceberio, diretor de Redação do jornal, no dia dos atentados. Nele, Aznar teria expressado a convicção de que o grupo terrorista basco ETA fora o autor. Na carta, Aznar diz que a pista ETA era a ‘hipótese principal’. Mas acrescenta que fora Ceberio quem expressara certeza de que o grupo fora o responsável. Ceberio nega. Diz que, ‘de tão absurda, é uma mentira que se desfaz por si mesma’.


Aznar usa, como suposta prova da certeza de Ceberio, o fato de que o jornal mudou a manchete de sua edição extra. A primeira manchete era ‘Matança terrorista em Madri’; a segunda, ‘Matança do ETA em Madri’. Ceberio atribui ao telefonema de Aznar a troca de manchetes. Já o premiê alega que não daria tempo.


Mas a discussão é só um pretexto para o tema central, a suposta manipulação de informações sobre o atentado. A carta diz: ‘Não consentiremos que se continue a dizer que o premiê ocultou e manipulou informação’. O jornal ‘El País’ responde com dois duríssimos artigos, um de seu principal executivo, Juan Luis Cebrián, cujo título diz tudo: ‘A honra perdida de José María Aznar’.


Já Ceberio responde com um texto em que diz: ‘Ninguém acusou Aznar de ter mentido. (…) O que criticamos em Aznar é ter convertido em certeza (…) o que eram deduções (…). Para negar algo de que ninguém o acusou, desta vez, sim, recorreu à mentira’.


Cebrián, em seu texto, prefere ‘falta de rigor’ nas informações e diz: ‘Quem sabe se não foi precisamente isso o que lhes custou o poder’. É uma alusão à sensação, na Espanha, de que o tratamento do governo à informação sobre os atentados tenha feito o eleitorado dar a vitória à oposição socialista três dias depois.


Mais indiciamentos


Um juiz espanhol indiciou, no início da madrugada de hoje, mais duas pessoas suspeitas de terem ligação com os atentados de Madri, elevando para 14 o número total de indiciamentos do caso, de acordo com autoridades judiciais. Três suspeitos foram libertados após um interrogatório, segundo as mesmas fontes."



ARGENTINA
Carolina Vila-Nova

‘Mídia da Argentina favorece Kirchner’, copyright Folha de S. Paulo, 27/03/04

‘Nos primeiros 200 dias de seu governo, o presidente argentino, Néstor Kirchner, foi ‘amplamente favorecido’ pela cobertura da imprensa local. É o que aponta estudo do Centro de Opinião Pública da Universidade de Belgrano (Copub), em Buenos Aires, com base na análise de quatro dos principais jornais argentinos entre 26 de maio – um dia após a posse de Kirchner – e 11 de dezembro do ano passado.

Após analisar 744 edições dos jornais, os pesquisadores concluíram que 74% das mais de 10 mil matérias publicadas faziam referências positivas a Kirchner – contra 26% negativas.

A pesquisa mostra ainda que o governo Kirchner predominou nas manchetes de capa dos jornais nesse período, ainda que por uma vantagem pequena. Do total de manchetes, 51% mencionavam o presidente ou seu governo, contra 49% para outros temas.

Além disso, das manchetes que faziam referência a Kirchner, 35% eram positivas – quase o dobro das negativas (18%).

Os jornalistas argentinos também utilizaram uma variedade maior de adjetivos elogiosos (214) em relação a adjetivos depreciativos (114). Esses adjetivos, no entanto, enfatizavam os atributos de personalidade do presidente, praticamente desconsiderando sua gestão ou temas específicos de seu governo. Kirchner é apresentado como duro, forte, popular e firme, segundo os atributos positivos mais mencionados. Por outro lado, e com menos ênfase, o presidente é também caracterizado como hegemônico, demagógico, populista e autoritário.

Virginia Beaudoux, coordenadora do Copub, faz a conexão entre a imagem transmitida pela imprensa e as altas taxas de aprovação de Kirchner pela população, em torno dos 80%. ‘A alta cobertura positiva faz com que os cidadãos construam uma boa imagem do presidente e que também no exterior ele seja visto de maneira positiva, pela imagem que se dá da aprovação ou aceitação que tem o governo no país.’

Beaudoux, no entanto, evita caracterizar a cobertura da imprensa em relação a Kirchner como condescendente. ‘Temos de ver se é condescendência ou se efetivamente se considera que o governo está no curso de ação que se considera mais indicado’, disse.

Já o analista político Jorge Giacobbi discorda. ‘Há uma certa condescendência, e se está discutindo na Argentina se é observação ou manipulação. Há quem diga que o que os diários expressam em suas manchetes e matérias é o que eles pensam. E há quem diga que o sistema informativo está muito controlado.’

Mas ressalva: ‘Há razões objetivas para que o processo de entusiasmo com Kirchner dure tanto tempo. Se há alguma artificialidade, alguma manipulação, nem tudo é manipulação’.

Segundo Beaudoux, existe normalmente um período de ‘lua-de-mel’ entre a imprensa e os presidentes na Argentina, que dura cerca de cem dias. Foi o mesmo, por exemplo, com o ex-presidente Fernando de la Rúa (1999-2001) – que acabou renunciando ao mandato em meio a uma grave crise econômica e política.

‘No caso de Kirchner, a lua-de-mel já chegou aos 200 dias. Vamos ver quanto tempo isso se sustenta’, disse a pesquisadora.’