Folha de S. Paulo, 10/2 Ana Paula Sousa Festival de Berlim começa hoje com os irmãos Coen Quando, na noite de hoje, sob previstos 4C de temperatura, a Berlinale for oficialmente aberta, o tapete vermelho receberá pisadas hollywoodianas. O filme escolhido para a sessão de gala, ‘Bravura Indômita’ -que estreia amanhã no Brasil (leia à pág. E4)- traz à capital alemã não só a Hollywood de hoje, simbolizada pelo que tem de melhor -os irmãos Joel e Ethan Coen-, mas também a velha Hollywood, aquela que John Wayne atravessava a cavalo. O Festival de Berlim, que vai até o próximo dia 21, parece cumprir assim a política de boa vizinhança com os grandes estúdios para, a partir de amanhã, dedicar-se à sua vocação ao longo dos anos: o cinema que ainda se crê arte, mesmo quando se propõe a entreter. Não por acaso, o festival exibirá experimentos em 3D, o novo eldorado da indústria, feitos por grifes do cinema de autor. Werner Herzog traz o documentário ‘Caverna dos Sonhos Esquecidos’, projetado em Toronto, no ano passado, e Wim Wenders apresenta ‘Pina’, um tributo à lenda da dança moderna, Pina Bausch (1940-2009). Para a competição foi selecionado o animador francês Michel Ocelot, de ‘Príncipes e Princesas’, que tranpôs para a terceira dimensão o universo do conto de fadas em ‘Fábulas da Noite’. URSO DE OURO A mostra competitiva, a principal da Berlinale, trará 22 títulos, 16 dos quais concorrerão ao Urso de Ouro a ser outorgado pelo júri presidido pela atriz Isabella Rossellini. Entre os títulos em competição, metade tem a Alemanha como produtora ou coprodutora, caso de ‘O Cavalo de Turim’, dirigido pelo húngaro Béla Tarr, e do filme do russo Alexander Mindadze. ‘Coriolanus’, o único britânico no páreo, é também um dos mais estrelados. Versão moderna da tragédia de William Shakespeare (1564-1616), o filme marca a estreia do ator Ralph Fiennes na direção. No elenco, além de Fiennes, estão Gerard Butler e Vanessa Redgrave. Outra produção que também tem o elenco como chamariz é ‘Margin Call’ (o chamado de Margin). Estrelado por Kevin Spacey, Demi Moore e Jeremy Irons, o longa-metragem de estreia de JC Chandor é um thriller passado num banco durante os primeiros dias da crise financeira mundial que teve início em fins de 2008. A América Latina tem dois únicos representantes: a mexicana Paula Markovitch, com ‘O Prêmio’, e o argentino Rodrigo Moreno, com ‘Um Mundo Misterioso’. Ao Brasil couberam apenas as mostras paralelas. ‘Tropa de Elite 2’, de José Padilha, será exibido na Panorama, ‘Os Residentes’, de Tiago Mata Machado, na mostra Forum, dedicada a filmes experimentais, e ‘Ensolarado’, de Ricardo Targino, na mostra Geração. LEMBRANÇAS Dois eventos que prometem marcar a programação desta 61ª edição são as retrospectivas do sueco Ingmar Bergman (1918-2007) e do iraniano Jafar Panahi, condenado à prisão em seu país. O festival promoverá um debate, na semana que vem, sobre cinema e censura. Folha de S. Paulo, 10/2 Ricardo Calil Fotos de Wim Wenders registram ausência No passado, o olhar de Wim Wenders podia ser traduzido por um ou outro ‘frame’ tirado de seus filmes. Nastassja Kinski refletida no espelho de uma cabine de ‘peep-show’ em ‘Paris, Texas’ (1984); o anjo Cassiel observando Berlim aboletado em uma estátua em ‘Asas do Desejo’ (1987). Hoje a visão do cineasta alemão parece melhor refletida na fotografia de um drive-in vazio em Coober Pedy, Austrália: em meio à paisagem inóspita, uma velha tela resiste ao tempo. É uma imagem tipicamente wendersiana. Silêncio, aridez, solidão, cinema. Nos filmes, ele buscava essas palavras no rosto de seus atores. Nas fotos, Wenders as encontra nos cenários. O velho drive-in de Coober Pedy é uma das fotografias que compõem o livro de ‘Lugares, Estranhos e Quietos’. A publicação reúne as imagens mostradas ao público pela primeira vez em exposição em cartaz no Masp. São fotos tomadas por Wenders em viagens pessoais ou na busca por locações para seus filmes, em lugares como Austrália, Israel, Estados Unidos, Itália, Alemanha, Japão e Brasil. VÁCUO O primeiro elemento que chama a atenção nas imagens é justamente a ausência de pessoas. A foto que ilustra a capa do livro, de uma esquina em Butte, Montana (EUA), remete aos quadros do pintor americano Edward Hopper. Mas, em vez dos clientes solitários de um bar, vemos um manequim e quinquilharias na vitrine de uma loja. Mais do que registrar lugares estranhos e quietos, Wenders tenta retratar o vazio humano, o vácuo deixado por quem não mais está. Outro elemento é uma certa indefinição geográfica. Apesar de um ou outro dado cultural, a sensação é de que os cenários registrados são intercambiáveis. Cineasta de vocação internacional, Wenders parece nos dizer que o essencial ao humano independe de fronteiras: a paisagem pode ser específica, mas o vazio é universal. LUGARES, ESTRANHOS E QUIETOS – LIVRO AUTOR Wim Wenders EDITORA Imprensa Oficial do Estado de São Paulo e Mostra Internacional de Cinema QUANTO R$ 60 (64 págs.) AVALIAÇÃO bom LANÇAMENTO hoje, às 19h30, no Masp (av. Paulista, 1.578, tel. 0/xx/11/3251-5644) LUGARES, ESTRANHOS E QUIETOS – EXPOSIÇÃO QUANDO das 11h às 18h; até domingo ONDE Masp QUANTO R$15 CLASSIFICAÇÃO livre