Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Como lidar com conflitos de interesses

Em sua coluna de domingo [20/1/08], o ombudsman do New York Times, Clark Hoyt, falou sobre os conflitos de interesses que podem atrapalhar o trabalho dos jornalistas. Ele apresenta como exemplo a repórter do NYTimes Linda Greenhouse, que cobre a Suprema Corte há mais de 30 anos e já ganhou um prêmio Pulitzer. A jornalista lida com diversas autoridades legais para suas matérias e o fato de ser casada com uma delas pode não ser conveniente.

No início de 2006, Linda escreveu um artigo sobre ordens judiciais em apoio à apelação de um prisioneiro da Baía de Guantánamo, em Cuba, que foi segurança e motorista de Osama bin Laden. Uma das ordens – não mencionada no artigo – foi aberta por Eugene Fidell, em nome do Instituto Nacional de Justiça Militar e da Ordem dos Advogados do Distrito de Colúmbia. Fidell, um dos maiores especialistas em leis militares dos EUA, é o presidente do instituto e um conhecido crítico das políticas da administração Bush. É também marido de Linda.

No mês passado, a repórter cobriu outro caso envolvendo prisioneiros de Guantánamo. O Instituto Nacional de Justiça Militar abriu, mais uma vez, uma ordem contrária à posição do governo Bush no caso. Desta vez, porém, o marido de Linda não a assinou porque o caso estava na corte judicial que ela estava cobrindo.

O blogueiro conservador M. Edward Whelan III, geralmente crítico a Linda, escreveu sobre o envolvimento de Fidell no caso e alegou tratar-se de um conflito de interesses. A repórter e seus editores discordaram. Dean Baquet, chefe de redação da sucursal de Washington, classificou o conflito de ‘abstrato’ e afirmou que Fidell e seu instituto eram personagens menores no caso. Linda disse que seu marido não representa nenhum prisioneiro e, para ela, ‘há uma diferença significativa entre representar um lado em um caso e assumir uma posição em um assunto levantado por um caso’. Whelan é ex-funcionário do Departamento de Justiça na administração Bush e secretário do juiz Antonin Scalia. Além disso, é presidente do conservador Centro de Políticas Públicas e Ética. Hoyt leu os diversos artigos escritos por Linda sobre os dois casos e não notou nenhum conflito de interesses, nem tampouco uma cobertura tendenciosa ao ponto de vista do marido da repórter.

Novas normas

Ainda assim, Whelan levantou uma questão importante que incomoda jornalistas, na medida em que eles fazem amizades, apaixonam-se e têm uma vida fora das redações. O NYTimes tem normas para possíveis conflitos de interesses e o caso de Linda indica que elas devem ser revistas. Segundo as regras atuais, os repórteres devem ser sensíveis a potenciais conflitos de interesses e discuti-los com seus supervisores. Em alguns casos, é suficiente apenas avisar aos editores. Em outros, o repórter deve se abster de cobrir o tema ou mudar de editoria. Hoyt sente falta das regras não abordarem a necessidade de revelação de parentesco ou envolvimento pessoal ao público.

Linda diz que, antes de cobrir o primeiro caso, conversou com Philip Taubman, chefe de redação na época, que concordou que ela não deveria escrever sobre o assunto se seu marido representasse o partido na Suprema Corte. Caso ele não representasse, ela não teria problemas em fazer a cobertura. Segundo Jill Abramson, editora de notícias, o fato foi discutido com outros editores, que chegaram à conclusão de que a experiência de Linda sobre o assunto seria extremamente importante para a cobertura do caso. ‘O profissionalismo de Linda ao longo destes anos é inquestionável. […] Como muitos jornalistas, ela consegue se afastar do ponto de vista de amigos e de seu marido para escrever’, opina Jill.

Já Lee Wilkins, professor de jornalismo da Universidade do Missouri, vê a situação por outro ângulo. Para ele, Linda está escrevendo sobre algo no qual seu marido está envolvido, e o NYTimes não está contando isto aos leitores. Hoyt diz que, se fosse editor da repórter, não a tiraria da cobertura, mas acompanharia atentamente o envolvimento de Fidell no caso, podendo rever, no futuro, sua decisão. O ombudsman afirma ainda que revelaria ao público a relação existente entre os dois.