Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crítica diária

12/07/07

Tempo quente

A primeira página tem pelo menos quatro títulos com potencial de manchete: a própria manchete, boa opção, ‘Investigada no caso Petrobras foi a sexta maior doadora ao PT’; ‘Pressionado, Renan desiste de presidir sessão do Congresso’; ‘Polícia do Rio matou sem confronto, diz laudo da OAB’; e ‘Manobra tucana na Assembléia de SP ‘enterra’ CPIs’.

É fria

Chamada de primeira página para o caderno Turismo: ‘Câmbio favorável e vôos freqüentes atraem a Buenos Aires’.

Ao seu lado, o mundo real: ‘Crise de energia na Argentina se agrava com o frio’.

O cotejo de Turismo com Dinheiro dá a impressão de que a Folha vive em mundos diferentes.

Jornalismo de serviço não deve esconder os obstáculos, no caso, a viagens felizes.

Quando menos se espera…

Foram anos, meses, semanas e dias de espera para os Jogos Pan-Americanos do Rio em 2007.

Hoje, quando começa de fato a competição, inclusive com jogo da seleção brasileira feminina de futebol, a primeira página omite os eventos competitivos inaugurais.

O inominado

É boa a reportagem da pág. A4 que rendeu manchete, ‘Iesa, investigada por fraudes em estatal, deu R$ 1,6 mi a PT’.

Há uma omissão: quem é o presidente da Petrobras? A que partido ele pertence?

Os leitores têm o direito de saber. É informação importante no contexto da notícia.

Outro inominado

Na reportagem ‘Acusados faziam acerto de edital por e-mail’ (pág. A5), o vigor jornalístico fraqueja diante da maior empresa brasileira.

Trecho: ‘Especialistas ouvidos pela Folha dizem que, pelos valores dos contratos, de até R$ 88 milhões no caso da P-14, haveria a necessidade de aprovação ao menos do diretor da área para a realização do serviço e da licitação. Para valores mais altos, seria necessário até o aval de toda diretoria colegiada, que inclui o presidente da companhia [também aqui, o nome não é citado!]’.

Qual é a área? Qual o nome do diretor à época das licitações sob suspeita, inclusive a da plataforma P-14?

Por que, pelo segundo dia consecutivo, os dirigentes da Petrobras não têm seus nomes impressos no jornal?

Nessa quadra de furacão, onde está o presidente José Sérgio Gabrielli?

A reportagem começa assim: ‘Com o auxílio da auditoria da Petrobras, a Operação Águas Profundas da Polícia Federal e do Ministério Público Federal…’.

Mais à frente: ‘Uma auditoria realizada pela própria Petrobras percebeu que o edital exigia uma profundidade menor (8,23 metros) do que o estabelecido pelas regras da companhia. Foi apurado que isso teria sido feito para atender à Angraporto, cujo cais tem profundidade de 8,84 metros’.

Se a auditoria descobriu a jogada, que providência a Petrobras tomou? Com a precedência da informação sobre a auditoria, abrindo o texto, fica a impressão de que a Petrobras é a campeã das investigações, e não a polícia e a Procuradoria. Na verdade, o (aparente) esquema se desenvolveu dentro da empresa.

Uma coisa é a direção da estatal colaborar com PF e MPF. Outra é o jornal conferir à Petrobras a um lugar que ela, conforme se lê nas coberturas, não tem.

A função da Folha é a de fiscalizar, jornalisticamente, a Petrobras. Não a de promovê-la.

Foto perdida

O que faz a fotografia da plataforma P-50 em quadro da pág. A6? O jornal informa que a acusação de irregularidades se refere a quatro plataformas da Petrobras, nenhuma delas a P-50.

Bem na foto

Mais uma vez, a Folha publica foto de divulgação em cobertura de evento com a presença do governador José Serra (‘Manobra tucana ‘enterra’ CPIs em São Paulo’, pág. A7).

Ou seja: o jornal só recebeu fotografias em que Serra aparece bem.

A Folha deveria escalar fotógrafo próprio, pautado com critérios jornalísticos, e não promocionais, para cobrir as atividades do governador de São Paulo.

Farinhas

O jornal prestaria um grande serviço aos leitores se comparasse o que petistas e tucanos dizem e fazem em Brasília (no Congresso e no Planalto), e os tucanos dizem e fazem em São Paulo (na Assembléia e no governo estadual).

Além de informativo, poderia ficar –tragicomicamente– divertido.

Informações terceirizadas

Diz a reportagem ‘Iesa, investigada por fraudes em estatal, deu R$ 1,6 mi a PT’ (pág. A4): ‘Segundo a Iesa, antes de Lula o índice mínimo de participação de empresas nacionais exigido pela Petrobras era de 45% por obra’.

Segundo a Iesa? O jornal não poderia ter checado e, se fosse o caso, bancado a informação?

Trecho da reportagem ‘Manobra tucana ‘enterra’ CPIs em São Paulo’ (pág. A7): ‘Segundo Vaz de Lima, a resposta foi proferida na semana passada. O TJ teria reconhecido que a instalação de CPIs é de competência da Casa [a Assembléia]. O acórdão não foi publicado’.

Segundo Vaz de Lima? A Folha não poderia ter apurado no Tribunal de Justiça?

Lugar-comum

Volta hoje ao jornal a expressão ‘classe artística’ (‘Governo recua na classificação indicativa’, pág. A11).

Repito: os artistas podem até se definir assim, mas seria melhor a Folha evitar o clichê.

Sem vagas

É difícil entender um aspecto da reportagem ‘Kassab vai proibir estacionamento no centro’, capa de Cotidiano.

A abertura informa o que está no título. Em seguida o jornal afirma que o prefeito vetará projeto de vereador que proíbe estacionar no centro expandido de São Paulo.

O prefeito e o vereador parecem ter opinião igual sobre o problema e sobre como combatê-lo. Por que, então, Gilberto Kassab vai vetar o projeto de Ricardo Teixeira?

Um certo olhar

Títulos do caderno Pan 2007: ‘Promessas das piscinas regridem no cronômetro’; ‘Falhas marcam ensaio da abertura’; ‘Público a favor é desafio para boleiras’; ‘Jogo de cena’.

Energia

A reportagem da capa do caderno é interessante, ao mostrar o contraste entre esportes vitaminados por patrocínio de estatais e os que vivem à míngua (‘Sobra-Falta Energia’).

Há um problema: o tom no relato sobre as entidades ‘pobres’ é parcial, anti-governos. O jornal contrapõe as verbas públicas investidas no Pan à penúria das federações e confederações.

Ora, sempre que se descobrem (ou suspeitam da existência de) falcatruas em algumas entidades esportivas, seus dirigentes são os primeiros a brandir a condição de entidades privadas. Por que, então, cabe aos contribuintes, com seus impostos, bancar a luz dos prédios onde as federações funcionam?

A Folha deveria ser mais crítica em relação às entidades. O jornal diz que ‘empregados dessas confederações relataram que a falta de luz dificulta a prestação de contas desse dinheiro federal, o que tem prazo determinado. O expediente no local acaba às 15h, quando se torna reduzida a luz natural. Ao meio-dia, já há trechos de escuridão nos corredores e nas salas’.

Valeria investigar se também estão às escuras as carreiras ‘esportivas’ de parte da cartolagem brasileira, inclusive da que talvez atrase a prestação de contas sobre recursos oficiais, alegando falta de energia.

Por último, mas não menos importante: a reportagem informa que a conta de luz atrasada do prédio que está às escuras é de R$ 200 mil. Por que não revelou quanto as ‘mais de 20 organizações esportivas’ lá instaladas receberam de desembolsos públicos nos últimos anos?

A vida na Vila

É muito boa a reportagem do ‘Globo’ sobre os embalos na Vila Olímpica. Chamada na primeira página: ‘Vila animada: acaba o estoque de camisinhas’.

A Folha deveria ficar atenta ao que ocorre no local onde os atletas se hospedam. Podem sair de lá algumas das histórias mais saborosas do Pan.

11/07/07

Corruptos e corruptores

A manchete da Folha e o título do alto da sua pág. A4 expõem olhares diferentes sobre a corrupção (não custa registrar que os presos e denunciados ontem só podem ser considerados culpados depois de eventual condenação em última instância judicial).

A manchete, na primeira página: ‘Ação contra fraude prende 3 executivos da Petrobras’.

O título interno: ‘Investigação de fraude na Petrobras leva 13 à prisão’.

A manchete foca em (supostos) corruptos, ocultando (supostos) corruptores.

O título da pág. A4 dá conta do processo inteiro, ao abordar tanto (supostos) corruptos como (supostos) corruptores.

Além de traduzir uma interpretação mais abrangente da corrupção, a opção interna é mais fiel à ação da Polícia Federal e do Ministério Público, que miraram em quem é acusado de receber propina e em quem é acusado de pagar.

Para entender o caso

Há omissões na cobertura da Folha que suponho se deverem em parte a informações não fornecidas pela Polícia Federal e o Ministério Público Federal. Há outras que o jornal evitaria se não tivesse ficado tão dependente de fontes oficiais.

Não identifiquei uma só prova contra os acusados. Imagino que os investigadores as tenham, até porque o ‘Jornal da Globo’ veiculou interceptações telefônicas que mostram proximidade e promiscuidade entre funcionário da estatal e representante de empresa.

Talvez tenha sido falta de atenção minha, mas não vi informação sobre o fato que desencadeou as investigações. Por que a PF abriu o inquérito? Que dica, pista ou indício tinha?

Os funcionários da Petrobras presos e denunciados são funcionários de carreira concursados ou não?

A Folha não informa se as empresas envolvidas fizeram doações a candidatos. O ‘Estado’ publica reportagem sobre o assunto e Ancelmo Gois, no ‘Globo’, dá nota. Ambos informam sobre petistas beneficiados.

Há muitas questões a responder na edição de amanhã.

Para não entender o caso

‘Lupa’ da pág. A6, sob o título ‘Estatal afasta envolvidos e abre investigação’: ‘Empresa sabia da apuração da polícia, mas não tomou nenhuma medida para não impedir que a investigação chegasse a outros acusados’.

O texto, mais claro, explica o que se passou.

Leitura chata, mas útil

Assim como há jornalistas que mantêm o saudável (para alguns, excêntrico) hábito de ler os Diários Oficiais, seria salutar que se acompanhassem editais de obras importantes. Ou que, pelo menos, se pedisse análise a quem entende do assunto.

O jornal informa, no alto da pág. A6 (‘Estatal afasta envolvidos e abre investigação’): ‘Vencedora da licitação para reforma e modernização da P-14 com lance de R$ 89 milhões, a Iesa estranhou o fato do edital de licitação orientar a realização da obra na Angraporto, empresa prestadora de serviços de reparo e apoio a embarcações localizada no porto de Angra dos Reis, apurou a Folha’.

A Folha cumprirá com mais vigor sua função fiscalizadora caso se pergunte por que também não achou ‘estranha’ a orientação. O jornal não monitora os editais?

Mais: por que o comando da Petrobras não viu problemas no edital aparentemente dirigido?

Uma grave omissão

A Petrobras tem presidente?

Tem diretores a quem se subordinam os gerentes investigados?

Quem são os responsáveis, no alto da hierarquia, pela aprovação de editais como os que a PF e o MFP dizem ser ilicitamente dirigidos?

Quais são os nomes dos diretores?

Que a Petrobras solte uma nota, sem expor seus comandantes, é decisão dela.

Para o jornal, é obrigação procurá-los e lhes cobrar mais explicações. Ou a Folha se satisfez com a nota oficial?

Até o ex-governador Garotinho foi, acertadamente, ouvido.

O presidente da Petrobras não foi procurado? O jornal deveria informar. Das empresas, inclusive ou principalmente as públicas, se exige transparência.

É dever do jornal fiscalizar o poder, não se dobrar às suas conveniências, inclusive as dos dirigentes que submergem em hora incômoda.

Nos anúncios de recordes de produção da estatal, não me lembro de o jornal omitir o nome dos ‘donos’ da festa.

Sem invasão à privacidade

Não considero invasão de privacidade informar que um dos presos é pai de atriz famosa. É informação a dar em frase única, com discrição.

O jornal ‘O Dia’ afirma, em manchete, que o preso Ricardo Secco é pai da atriz Deborah Secco.

Igreja e pensamento único

A Folha deveria ouvir mais fontes na Igreja Católica brasileira e entre teólogos católicos ao repercutir documento elaborado pela Congregação para a Doutrina e a Fé, ratificado pela papa Bento 16 (‘Para Vaticano, protestantes não são igreja’, pág. A12).

O debate ficaria mais plural.

O jornal fez bem em ouvir representantes de outras religiões cristãs.

Currículos

A boa reportagem da capa de Cotidiano, ‘Aéreas pagaram só R$ 90 mil em multas’, talvez se enriquecesse se o jornal informasse o currículo dos dirigentes da Agência Nacional de Aviação Civil.

Quantos deles passaram pelas principais empresas do setor? Quais são suas relações com elas hoje? Como são indicados para a função?

Boa história

É muito boa a reportagem ‘Pai se recusa a pagar fiança para o filho’ (pág. C4).

É o tipo de história que merece lugar na primeira página, convida ao debate e provoca discussões, repercute, mexe com leitores dos mais diversos perfis, faz com que ‘um jornal a serviço do Brasil’ contribua para a reflexão nacional.

Pena que a primeira página a tenha ignorado.

Foi um Rio que passou em minha vida

A Folha já não tem hoje uma só nota sobre a matança de 19 pessoas no complexo do Alemão, há exatas duas semanas.

Paixão nacional

Na capa da primeira edição do caderno ‘Pan Rio 2007’, a nadadora Poliana Okimoto aparece, digamos, indo.

Na primeira página do jornal, também, embora seja possível ver um naco de sua face direita.

Teria sido interessante mostrar pelo menos um retratinho da atleta, vazando a foto do caderno, para os leitores conhecerem o seu rosto.

Um grave silêncio

A seleção brasileira se classificou para a final da Copa América na disputa em pênaltis contra o Uruguai.

O Brasil foi ajudado por erros escandalosos do árbitro na cobrança das penalidades.

O goleiro brasileiro, Doni, adiantou-se claramente, de modo proibido.

Na sua transmissão, a TV Globo, tantas vezes criticada pela Folha pelo tom mais de torcedor do que jornalístico, foi transparente: o goleiro avançou como não poderia, o árbitro ajudou o Brasil.

Os jornais descrevem o fato –o ‘Lance!’ publica duas fotografias.

A Folha não tocou no assunto. Mas não se esqueceu de comentar a reclamação de Dunga contra o árbitro Oscar Ruiz por causa de alguns lances controversos.

Há uma convicção histórica do jornal: mesmo que a informação não seja ‘boa’ ou ‘simpática’ à seleção, o jornal a publica. Seu compromisso é com os leitores.

Problema de espaço não houve, já que não faltaram dados estatísticos no texto. Nem haveria: o erro de arbitragem é informação de constar em lide e título.

A propósito, eis o título da pág. D4: ‘Lugano esbarra em Doni, e Brasil supera Uruguai’.

10/07/07

Frente fria

O jornal de hoje dá a impressão de frieza jornalística.

Creio que contribuiu para isso a escolha de uma manchete com informação sem relevância para tamanho destaque: ‘Conselho de Ética anula relatório do caso Renan’.

A notícia mais importante do dia foi a segunda na hierarquia da primeira página da Folha: ‘Ibama concede licença a usinas no rio Madeira’.

Mais uma derrota

A Folha fez bem em repercutir a liberação da construção das hidrelétricas. Linha-fina do alto da pág. A6: ‘Dois cientistas vêem vitória de Marina Silva, outro aponta riscos de desequilíbrios’.

O jornal deveria, contudo, tomar cuidado com análises que expressam muitas vezes interesses políticos. A aparência, na verdade, é de que a ministra do Meio Ambiente perdeu mais uma disputa no governo.

Havia (há) um confronto na administração federal. As expoentes eram as ministras Dilma e Marina. A liberação da construção atende, evidentemente, ao desejo de Dilma. Ela venceu. Logo, Marina perdeu.

Mínimos detalhes

É este, ‘Mínimos detalhes’, o título de nota na pág. A4. Ela informa que o PSOL ‘concluiu ontem 20 novos questionamentos’ à Polícia Federal no caso Renan Calheiros — ‘16 questões sobre compra e venda de gado’ e ‘sete perguntas mirando a questão fiscal’.

Mínimos detalhes: o resultado de 16 mais sete é 23.

Barack, com ck

Ainda a edição dominical.

Título da pág. A12: ‘Barak Obama avança na corrida do ouro’.

Mas a reportagem trata o pré-candidato democrata como ‘Barack Obama’.

A legenda da fotografia volta a grafar ‘Barak’.

No quadro, retorna a fórmula ‘Barack’.

Como se confirma no site do senador Obama, o correto é ‘Barack’.

A Folha lê a Folha?

O texto ‘Não há crise na Previdência, diz estudo’ (pág. B2) repete reportagem publicada em novembro do ano passado na própria Folha, com o mesmo estudo e a mesma estudiosa.

Rodízio e pensamento único

O tema prioritário de Cotidiano é o fim iminente da experiência com a suspensão do rodízio de veículos.

Impressiona que, em um tema tão importante para os leitores e a cidade, não seja consultada uma só voz dissonante da Prefeitura de São Paulo. Há especialistas em trânsito qualificados para opinar sobre o que quadro da pág. C3 chama de ‘Vaivém’ no rodízio.

Para formar juízo, os leitores precisam conhecer pontos de vista plurais.

Pode crer

Título do alto da pág. D2: ‘Dunga curte o acaso do futebol e impõe filosofia’.

9/07/07

Domingão

No meio do feriadão paulista, a Folha teve o seu melhor domingo das últimas semanas. Alguns destaques, em ordem aleatória: relato do piloto de navio abatido por ataque de submarino alemão em 1942; novos documentos do Departamento de Estado revelam que dom Paulo Evaristo Arns pediu em 1975, e logo mudou de idéia, embargo dos EUA contra o Brasil; distribuição de verbas do PAC em SP privilegia prefeituras sob comando do PT; investigação do Ministério Público aponta desvio de R$ 1,1 bilhão na CDHU nos governos do PSDB; a decadência da produção de álcool no Nordeste (ótima em texto e fotos); o crescimento das viagens de ministros em aviões da FAB; a conversa do repórter com atriz e da repórter com ator do filme ‘Cão Sem Dono’; perfil socioeconômico do Enade mostra que ‘formação de docente atrai aluno mais pobre’; relações da família Nuzman com empresas que faturam com atividades do Comitê Olímpico Brasileiro; e a melhor fotografia das primeiras páginas dos jornais sobre a goleada de 6 a 1 da seleção contra o Chile.

Esta crítica, no feriado de 9 de Julho, trata das edições da Folha de hoje, domingo e sábado.

O PAC e a política

É boa a reportagem que rendeu a manchete dominical sobre as verbas do PAC privilegiando administrações do PT em São Paulo. Os números que sustentam a reportagem mostram investimento por habitante de R$ 227 em prefeituras petistas e de R$ 164 nas tucanas.

Considero despropositada a linha-fina da primeira página (repetida, no conteúdo, na pág. A4): ‘Com 9% das cidades de SP, partido terá 35% dos recursos de saneamento’.

Ora, se uma só cidade tiver mais habitantes que um conjunto de dezenas, a distribuição equilibrada entregaria mais da metade das verbas do PAC para essa cidade. A comparação feita na linha-fina não tem importância.

Faltou a palavra do governo do Estado. Do PSDB, um deputado foi ouvido. De posse dos números, o jornal poderia indagar ao governador Serra se ele mantém o que disse há dias, conforme a reportagem: ‘Segundo disseram Lula e Serra na ocasião, as duas partes não levaram em conta critérios políticos, pois escolheram os municípios em conjunto’.

Primeira página e (falta de) equilíbrio

Considero um erro a inexistência de chamada na primeira página de domingo (edição São Paulo) para a reportagem da pág. A6 (que prossegue na A7) ‘Promotoria aponta desvio de R$ 1,1 bi na CDHU sob tucanos’.

O jornal manchetou a destinação de R$ 954 milhões a prefeituras do PT em SP.

No caso da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano, não se trata de critérios partidários se impondo aos de gestão pública, mas de suposta apropriação privada e ilegal de recursos públicos de grandeza maior, R$ 1,1 bilhão.

Esquema na CDHU

As edições do fim de semana não identificam os administradores da CDHU quando ocorreram os fatos agora investigados. Citam os governadores de então, mas não os presidentes da estatal. Por que a omissão?

Outro problema: a dependência de investigações do MP e da polícia é uma característica do jornalismo contemporâneo, não só no Brasil. A reportagem ‘Ministério Público estende apuração a outras construtoras’ (pág. A7) afirma: ‘Segundo o Ministério Público, a [empreiteira] Vesato tem entre seus sócios Vagner Pedro Stelato, filho do prefeito de Dracena, Elzio Stelato Junior (PSDB)’.

A Folha não poderia ter checado a informação, em vez de comodamente creditá-la à Promotoria?

Manual – CDHU

O mesmo texto referido acima diz que há ‘29 pessoas denunciadas sob suspeita de envolvimento com o esquema’.

É mais do que isso: se foram denunciadas, já não são apenas suspeitas (condição decorrente de indiciamento em inquérito policial): elas são acusadas pelo Ministério Público.

Mais detalhes no verbete ‘acusações criminais’, nas págs. 155 e 156 do ‘Manual da Redação’.

A guerra dos laboratórios

Não faz sentido o título ‘Laboratórios fogem da guerra contra remédios genéricos’ (pág. B9 do domingo).

O que a reportagem conta é que os ‘laboratórios que produzem remédios de marca mudaram a estratégia’ da ‘guerra’: não focam no preço, preferindo investir em propaganda.

A ‘guerra’ continua.

Além dos Jardins

A edição de domingo tem entrevista com o dono de restaurante Rogério Fasano propondo pôr abaixo o Jardim Europa.

A Revista da Folha apresentou ‘propostas delirantes’ de convidados ‘para ajudar a blindar a região mais chique de SP’.

O jornal continua a dever uma investigação sobre os assassinatos, nos Jardins, de um turista francês e de um garçom. Investigação jornalística não somente sobre os crimes, mas perfilando as turmas (punks?, skatistas?) de jovens suspeitos da autoria dos homicídios.

Direito à informação pública – Sugestão

A reportagem ‘Ministros driblam crise aérea em viagens nas aeronaves da FAB’ (pág. C7 do domingo) afirma em subretranca: ‘A FAB não divulgou os gastos com as viagens dos ministros’.

Sugiro que o jornal acione a Justiça em nome do direito à informação pública, a ser fornecida pela Força Aérea e o Ministério da Defesa. Não seria a primeira vez que a Folha lançaria mão de tal recurso. Deveria se tornar um hábito.

O jornal deveria se pronunciar em editorial sobre a restrição à informação e à declaração do ministro Tarso Genro, segundo o qual ‘é uma matéria muito primária saber se um ministro usa uma prerrogativa legal’.

(Hoje o colunista Fernando Rodrigues trata do tema.)

Pra frente, Brasil

A reportagem da capa de Esporte seria melhor se se restringisse aos convênios e suas conseqüências incontestes com que a Venezuela de Hugo Chávez transfere dinheiro ao comitê olímpico de Cuba.

Título ‘Chávez turbina Cuba e segura o Brasil’. ‘Lupa’: ‘No Rio, cubanos terão 90 esportistas a mais do que em 2003, a fim de manter brasileiros longe do 2º lugar no quadro de medalhas’.

Abertura do texto: ‘Se depender de Hugo Chávez, não será tão cedo que o Brasil vai subir de forma significativa no quadro geral de medalhas dos Jogos Pan-Americanos,ultrapassando Cuba e ficando atrás dos EUA’.

Com esse tom, o leitor se surpreende ao ver o abismo entre medalhas de ouro no último Pan, em 2003: 72 para Cuba e 29 para o Brasil.

Outro problema: parece que o Canadá não existe. O país não superou o Brasil nos últimos Pans?

Mais: não foi a Folha que noticiou o objetivo do Comitê Olímpico Brasileiro de ficar em terceiro?

Para usar expressão do título, parece que a reportagem, com informações interessantes, foi ‘turbinada’ com a ‘disputa’ do Brasil pelo segundo lugar.

Quem é o professor Pardal?

A cobertura do jogo Corinthians 1 x 1 Fluminense na edição de domingo merecia estar em espaço de opinião, não noticioso (‘Decadente, Corinthians festeja empate’, pág. D5).

É grave a transformação do que deveria ser reportagem em editorial impiedoso. Nesse tom, não costumo ler na Folha, inclusive em Esporte.

Afirmou o texto, implacável: ‘Ontem, Carpegiani usou o seu método mais conhecido para armar o time: as invenções. Conhecido como ‘Professor Pardal’ nos tempos em que treinou o São Paulo, ontem o treinador ‘inventou’ o volante Carlos Alberto na ala direita e, em alguns instantes, até o zagueiro Kadu arriscava jogadas de lateral no campo de ataque. Carpegiani também ‘ressuscitou’ o fraco lateral-esquerdo Everton, que estava no limbo até algumas rodadas atrás. O resultado da experiência, claro, não foi bom para o Corinthians. As jogadas pelas laterais praticamente não aconteceram’.

OK, acontece que o lateral Everton (de Barros Ribeiro) não jogou sábado contra o Fluminense (é o que informa o quadro com a escalação, entre outras fontes, inclusive leitores).

Quem jogou foi o atacante Everton Santos.

Há poucas semanas, a Folha colocou em condições de jogo três atletas que já haviam se afastado do Corinthians.

Não é assim, com opinião demais e informação de menos, que se deveria cobrir o clube mais popular do Estado.

Coincidências acontecem

O modelo que ocupa muitas páginas da revista sobre o Pan que circulou no sábado é o ator Rômulo Arantes Neto, que dias antes se envolveu em uma confusão com travestis e prostituta.

Cada cabeça uma sentença (Folha versus Folha)

A capa do Mais! destaca uma reportagem do Observer sobre Ozzy Osbourne.

Condenou ao pé a chamada para a excelente reportagem sobre o naufrágio do navio Araraquara.

Já a primeira página do jornal ignora o sobrevivente do Black Sabbath e destaca o navio torpedeado.

Concordo com a primeira página.

O caso Rondeau

Não há dúvida de que está longe de esclarecimento o possível envolvimento do ex-ministro Silas Rondeau com a empreiteira Gautama.

Isso é uma questão. Outra é que a Folha tinha a obrigação de informar em detalhes o que é o laudo da defesa do afilhado político de José Sarney. Isso não ocorreu. De acordo com o estudo, seria impossível que uma diretora da empreiteira levasse R$ 100 mil a Rondeau dentro de um envelope.

O jornal afirma hoje (‘PF não afasta suspeita sobre ex-ministro’, pág. A9): a Polícia Federal contou que o dinheiro foi carregado em uma bolsa, o que ‘desmonta a defesa do ex-ministro’. Por que desmonta? Se ele afirma que era impossível haver dinheiro no envelope, por que sua defesa foi desmontada? O jornal não é vara de Justiça.

Chama a atenção que a reportagem minimize a alardeada suspeita sobre dinheiro em envelope.

Eis, porém, o que a Folha publicou em 21 de maio na página noticiosa mais nobre de Brasil (‘PF suspeita de ministro e analisa fita de segurança’, pág. A4): ‘As imagens mostram uma funcionária da Gautama, Fátima Palmeira, entrando no Ministério pelo elevador privativo no dia 13 de março deste ano. Ela carrega um envelope de cor parda, no qual a PF acredita que estavam R$ 100 mil’.

O laudo mostra que a diretora não carregava envelope. Nem branco, nem pardo, nem azul. Nenhum.

Segue o texto de 21 de maio: ‘Meia hora depois, as imagens registram a saída de Fátima e de Ivo do gabinete. Aí, quem está de posse do envelope é o assessor do ministro. Ele volta ao gabinete. Depois, sai sem o envelope pardo’.

O laudo reproduz as imagens. O assessor carrega uma folha. Branca, não parda, conforme assisti na TV.

Segue o texto de maio: ‘Os agentes federais acreditam que dentro do envelope havia dinheiro porque monitoraram outros funcionários do empresário Zuleido Veras de Salvador até Brasília’.

De acordo com a edição de hoje, a investigação da PF concluiu que o dinheiro estava em bolsa, não em envelope.

Por que a Folha comprou o relato anterior da PF e hoje não apontou a contradição?

Por que descreveu um envelope que não aparece nas imagens?

Repito: é possível –tudo é possível– que tenha havido pagamento ilícito, suborno, propina. Mas a versão que o jornal divulgou em 21 de maio não se sustenta.

Erramos tardio

A edição do sábado traz um Erramos relativo a reportagem de 26 de maio.

Não basta corrigir, é preciso ser ágil. É um direito dos leitores a informação, também sobre erros, transparente e rápida.

Contribuição ao Erramos

A edição dominical não teve um só Erramos. A de hoje tem um. O jornal sem erros (ou quase) é uma utopia. Não existe jornalismo perfeito. A ausência de correções não é mérito de quem não teria o que corrigir. Sugere falta de vigor em se auto-avaliar.

Contribuição para o Erramos de amanhã:

1) O crédito da foto do alto da pág. A10 de domingo data a missa na catedral da Sé, dias após a morte de Vladimir Herzog, em 2005. O correto, claro, é 1975.

2) Ao contrário do que informou o texto ‘Dólar reduz preços de importados nos supermercados’ (pág. B3 de sábado), o vinho não é uma ‘bebida destilada’, mas fermentada.

3) A reportagem ‘Ministério Público estende apuração a outras construtoras’ (pág. A7 de domingo) afirma que um preso, desde maio, ‘é um dos 17 detidos na Operação Pomar, da PF’. Na edição de sábado, o quadro ‘Investigação na CDHU’ (pág. A4) diz que as 17 prisões de maio foram feitas pela Polícia Civil, não Federal. Aparentemente, uma das duas informações está errada.

4) O título ‘Israelenses escoltam cartola’ (pág. D2, de domingo) não se confirma no texto: o dirigente argentino é protegido por seguranças ‘treinados’ em Israel, não por israelenses.

5) O texto ‘Decadente, Corinthians festeja empate’ (pág. D5 do domingo) afirma que o lateral-esquerdo Everton enfrentou o Fluminense. Como informa o quadro com a escalação, Everton não jogou (quem atuou foi Everton Santos, atacante). O lateral-esquerdo foi Wellington.

Resposta ao ombudsman

A editora interina de Cotidiano, Denise Chiarato, enviou resposta à nota ‘A barriga da barriga’, da crítica diária da quinta-feira passada. Eis sua manifestação, pela qual agradeço:

‘Discordo da visão do ombudsman de que o texto sobre a menina James tenha tentado esconder algum erro. A informação de que ela não está grávida foi dada no alto da página, com chamada na Primeira. Também não acho que seja o caso de erramos, já que não é possível saber se ela nunca esteve grávida ou se esteve e sofreu um aborto espontâneo.

A reportagem, ao saber do caso de James, fez várias checagens, diferentemente do que diz o ombudsman. Confirmou e mostrou a certidão de nascimento dela com o registro de sexo masculino e procurou, com bastante antecedência, a Secretaria Municipal da Saúde sobre a alegação dela de que não conseguia fazer o exame por conta do documento. A informação só foi contestada após a publicação da reportagem. Também ouviu o Ministério da Saúde, que admitiu que o sistema não iria aceitar a realização de um exame de gravidez em um paciente do sexo masculino.

A reportagem não checou se James estava de fato grávida _o que só poderia ocorrer com a realização do exame. Confiamos no relato da menina, que, como mostra a foto, parece mesmo estar grávida. Mesmo se a reportagem não tivesse encampado a versão dela, se tivesse usado o recurso ‘ela diz’, isso não nos isenta do erro. Mas o texto de hoje [quinta-feira] expõe essa falha e mostra aos leitores, inclusive, que a Folha pagou o exame para esclarecer o caso.

Quanto à afirmação de que quem redigiu a legenda ou o fotógrafo ‘possam ter notado que poderia nem haver gravidez’, nem há o que comentar.’

Comentário do ombudsman

Observo:

1) A Folha informou que garota James, 16, estava grávida.

O fato: não estava, como demonstrou exame de sangue.

Não houve Erramos.

2) A Folha informou que James não havia sido atendida na rede municipal de saúde.

O fato: ela havia sido.

Não houve Erramos.

3) A Folha informou que James não havia feito exame de gravidez na rede pública.

O fato: havia feito, e o resultado teria sido negativo.

Não houve Erramos.

4) Há diferença abissal entre assumir versões ou deixar claro para o leitor que se trata de relato alheio. O jornal comprou a versão da jovem e publicou informações erradas.

5) Diz a editora que não é o caso de Erramos, ‘já que não é possível saber se ela nunca esteve grávida ou se esteve e sofreu um aborto espontâneo’. Ou seja: ‘aborto espontâneo’ entre o domingo em que a reportagem foi publicada e a quarta-feira, dia em que saiu o resultado do exame de sangue.

Agora, sim: não há o que comentar.’