’29/08/2005
A economia tomou o lugar da crise do ‘mensalão’ na manchete da Folha desta segunda-feira: ‘Sob Lula, empresa lucra mais que banco’. ‘Estado’ (‘Planalto usa estatais para premiar companheiros’) e ‘Globo’ (‘Sob críticas, CPI acelera relatório até sexta-feira’) mantiveram a crise como destaque, mas sem novidades. As manchetes de Domingo dos jornais e revistas trouxeram poucas informações relevantes, apesar do tom:
Folha – ‘Buratti diz que é fácil provar propina’.
‘Estado’ – ‘Irritados, Lula e Dirceu estão à beira de colisão’.
‘Globo’ – ‘Auditorias acham 525 tipos de irregularidades na ECT’.
‘Veja’ – ‘Político artificial’ e ‘Grampos do MP: lobistas cercam Palocci’.
‘Época’ – ‘A rota do PTdólar. Fundos de pensão investigados por lavagem de dinheiro’.
‘IstoÉ’ – ‘Como o Citibank ganhou um presente bilionário dos fundos de pensão’.
‘Carta Capital’ – ‘PT – o partido agüenta o tranco?’.
Escândalo do ‘mensalão’
No âmbito das cassações de mandatos dos deputados, o ponto mais relevante agora é a discussão sobre a existência do mensalão. O relator do processo que estuda a cassação do deputado Roberto Jefferson adiantou que não encontrou prova de que tenha existido o mensalão, e esse ponto será um dos argumentos que usará para pedir a cassação do presidente do PTB.
1 – Houve ou não houve o ‘mensalão’? Se não houve, isso muda alguma coisa?
O jornal ignora este ponto na edição de domingo (nenhuma das questões do infográfico ‘50 perguntas ainda sem respostas’, publicado na página A12, leva em conta a hipótese de não se provar o mensalão) e não o aprofunda na edição de hoje. A reportagem ‘Para presidente do Conselho de Ética, ‘tese do mensalão’ cairá’ deveria ter deixado claro o que existe de evidência ou prova a favor da tese do ‘mensalão’ e o que existe de evidência ou prova a favor da tese de que não houve o ‘mensalão’.
2 – Usada para cassar o mandato de Roberto Jefferson, a tese de que não houve ‘mensalão’ beneficiará, como o jornal deixa claro, as defesas dos outros deputados ameaçados. Mas vários deputados ouvidos na reportagem de hoje dizem que mesmo que não fique provada a existência do ‘mensalão’, está comprovada a transferência de dinheiro do PT para aliados – o que justificaria as cassações de deputados. Por que? Como o jornal continua sem tipificar os crimes que supostamente teriam ocorrido (no caso, que crime foi cometido se houve o mensalão? E qual teria ocorrido se houve apenas a transferência de dinheiro?), o assunto fica no terreno da imprecisão das aspas. Embora a decisão vá ocorrer no âmbito da Comissão de Ética, teria sido importante ter ouvido também especialistas fora do Congresso.
Um bom infográfico poderia ter esclarecido melhor estes dois pontos da discussão.
Em relação ao infográfico de domingo (‘50 perguntas ainda sem respostas’), acho que ele deveria ter sido complementado por um outro que informasse o que já se tem comprovado até agora e que mostrasse o que falta comprovar.
O formato de perguntas transfere para o leitor a busca de informações que o jornal deveria estar fornecendo. Mais do que as perguntas não respondidas, o que dá a todos esta sensação de que as CPIs não andam é a falta de resultados concretos em relação às acusações. Mas alguma coisa foi apurada, muitas irregularidades e crimes foram comprovados. Acho que o jornal continua devendo uma consolidação do que dispõe até agora (e do que ainda falta investigar) em relação a cada acusação feita ao longo destes três meses. Só assim será possível saber se as CPIs e o trabalho dos MPs e da PF estão avançando ou não, e o que de relevante falta ser provado.
Detalhe:
– O infográfico ‘Os números do orçamento’ informa que entre as ‘principais obras do PPI em 2006’ está a BR-101 (Belo Horizonte-Porto Alegre). Se não me engano, a BR-101 vem pelo litoral. É bom verificar se estão certas as outras BRs apontadas.
– Segundo o texto ‘Teste nuclear no Pará tinha data marcada’ (pág. A10 da Edição SP), ‘o artefato nuclear desenvolvido em segredo na Serra do Cachimbo (PA) até 1990 já teria data prevista para detonação’. O Brasil não desenvolvia seu artefato nuclear na Serra do Cachimbo. Lá era o local do poço onde ocorreria o teste de explosão. O artefato estava sendo desenvolvido em outros lugares.
Cotidiano
Boa a reportagem de capa de Cotidiano (‘Médicos denunciam favores de laboratórios’) e é impressionante o depoimento do médico que defende a aceitação de favores dos laboratórios farmacêuticos, ‘Não acho antiético aceitar viagens’. É um bom debate na hora em que o país discute a ética na política.
A Velhinha de Taubaté
O jornal publica hoje uma carta de leitor (‘Profissão de fé’, no ‘Painel do Leitor’) que faz menção à morte da Velhinha de Taubaté, personagem criada por Luís Fernando Veríssimo, colunista do ‘Estado’ e ‘Globo’.
Eliane Cantanhêde e Elio Gaspari também fizeram referências ontem, nas suas colunas, à personagem. Imagino que muitos leitores da Folha não tenham entendido do que se trata por que o jornal não noticiou a decisão de Veríssimo de anunciar o fim da velhinha. Como a figura era conhecidíssima e sua ‘morte’ está ligada à desilusão do autor com os acontecimentos políticos atuais, o jornal deveria ter feito algum registro na semana passada. As citações do leitor e dos dois colunistas provam a repercussão que teve. Era notícia.
Edição Nacional
Está muito claro (branco), o que impede a sua compreensão, o mapa ‘Deslocamento do Katrina’ que ilustra a reportagem ‘Nova Orleans é esvaziada à espera de Katrina’ (capa de Mundo) na edição que recebi no Rio.
Aviso
Por conta de compromisso na Folha, em São Paulo, amanhã não será feita a Crítica Interna.
26/08/2005
Quase todos os jornais tiraram suas manchetes do discurso do presidente Lula. Os três grandes apenas relataram o trecho principal: ‘Lula diz que não imitará Getúlio, Jânio nem Jango’ (Folha), ‘Lula diz que não vai repetir Getúlio, nem Jânio, nem Jango’ (‘Estado’) e ‘Não farei como Getúlio, Jânio e Jango’, diz Lula’ (‘Globo’). Mas alguns diários preferiram interpretar as referências feitas pelo presidente: ‘JB’ – ‘Síndrome de agosto ataca Lula’. ‘Correio Braziliense’ – ‘Os fantasmas que assombram o presidente’. ‘O Dia’ – ‘Não me mato nem renuncio’.
Dos três jornais que competem, apenas a Folha mencionou na primeira página o equívoco do presidente na referência à renúncia de João Goulart. ‘Globo’ e ‘Estado’ não fazem menção, o que confirma de uma certa forma que o presidente está sendo tratado como ‘café-com-leite’, para usar a expressão que Clóvis Rossi ressuscitou na sua coluna de ontem. Internamente, o ‘Estado’ foi explícito ao apontar os erros (‘Nas citações históricas de Lula, vários equívocos’) e a Folha, mais sutil (‘Presidente se mira na ‘paciência de JK’, na Ed. SP, e ‘Presidente me o destino de líderes populistas’, na Ed. Nacional).
Escândalo do ‘mensalão’
Há um problema sério na reportagem ‘Advogado se queixa da imprensa’ (pág. A6) que relata as reclamações de Rogério Buratti em relação ao comportamento da Folha e tem as explicações do jornal. Os esclarecimentos do jornal me pareceram consistentes. Se tudo ocorreu realmente como o jornal descreve, o repórter agiu com correção, e o próprio testemunho da ex-mulher de Buratti confirma que procedeu corretamente. Por isso, não dá para entender por que um outro repórter da Folha procurou anteontem o advogado e ‘pediu desculpas formalmente em nome do jornal’. Se o jornal não errou, por que as desculpas? Ou a história não é bem aquela contada pelo jornal? Há algo estranho nesta história. Ao mencionar o pedido de desculpas revelado por Buratti, o jornal tinha obrigação de informar por que o fez. E se errou, a ponto de pedir desculpas formais, deveria ter deixado claro para os seus leitores que erros cometeu.
Não vi na Folha a declaração feita ontem por José Dirceu no plenário da Câmara a respeito da guerra interna do PT: ‘Dirceu: melhor dar tiro na cabeça que deixar chapa’ (título do ‘Globo’).
Dinheiro
A reportagem ‘Sem recurso, Anatel desliga central telefônica’ (pág. B8 de Dinheiro) dá os números do orçamento da agência (R$ 377 milhões) e do valor já liberado (R$ 130 milhões), mas não informa o valor do serviço de atendimento que agora está suspenso. Era um número necessário para o leitor, e o próprio jornal, avaliar se o corte realmente se justificava ou é apenas uma forma de pressão da agência. Sempre sobra para o consumidor.
Cotidiano
E se a menina de 12 anos que teria sofrido abuso sexual tivesse alguma ligação com o tráfico, em que esse fato atenuaria o crime de quem cometeu o abuso? Por isso, me parece incorreto o título da página C9 da Edição SP da Folha, ‘Acusado nega abuso e diz que menina tem ligação com o tráfico’. O que está em foco é saber se o universitário acusado cometeu ou não o crime. Se for para falar em drogas, o mais correto seria ressaltar que o próprio acusado admitiu que é usuário eventual. A menina até agora é a vítima, e não deve ser tratada como acusada.
Esporte
É um escândalo sem tamanho o erro cometido pelos organizadores dos Jogos Pan-Americanos do Rio (‘Erro em projeto faz Rio-07 gastar R$ 21,6 mi a mais’, capa de Esporte). O problema é que não ficam claras as responsabilidades. O jornal deveria ouvir o Ministério Público, o TCM ou o organismo responsável pela fiscalização das obras. Não é possível que não haja responsabilidade num caso como este que envolve dinheiro público. Acho que é um grande caso que o jornal deveria continuar acompanhando de perto. Não interessa apenas ao Rio. É um assunto nacional.
Painel dos Assessores
Mais um dia de pouco espaço para as manifestações e observações dos leitores no ‘Painel do Leitor’.
25/08/2005
Os jornais tinham ontem duas informações relevantes a respeito das investigações das CPIs: a quebra do sigilo dos fundos de pensão e a revelação de que Rogério Buratti ligou várias vezes para a casa de Palocci e para os seus assessores diretos. Folha e ‘Estado’ optaram pela primeira notícia – ‘CPI quebra sigilo de fundos de pensão’, na Folha, e ‘CPI quebra o sigilo de três fundos de pensão’, no ‘Estado’. O ‘Globo’ optou pela segunda, mas sem ressaltar o que parece ser o mais importante, as ligações diretas para Palocci: ‘Buratti falava com assessores de Palocci ao celular e na Fazenda’. O jornal ‘Valor’ resume a importância dos telefonemas: ‘Dados da CPI contradizem Palocci’. A Folha deu uma chamada na primeira página da Edição SP (‘Buratti ligou ao menos 6 vezes para casa de Palocci’), mas jogou o assunto para o final da edição, para a página A14. Outro assunto importante que o jornal vinha insistindo também acabou relegado, ‘TCU aprova auditoria de uso de cartões da Presidência’.
A melhor história nos jornais é a da senhora de 80 anos que filmou, durante dois anos, o movimento do tráfico de drogas em Copacabana, no Rio. Foi furo do jornal ‘Extra’ de ontem.
Escândalo do ‘mensalão’
Nem a reportagem ‘CPI quebra sigilo de fundos de pensão e convoca doleiro’ (pág. A4) nem o infográfico ‘Suspeitas sobre os fundos de pensão’ informam que crimes estarão configurados caso sejam comprovadas as suspeitas das CPIs dos Correios e do Mensalão. Que crime cometeram os fundos, por exemplo, caso seja confirmada a suspeita de que investiram nos bancos Rural e BMG a fundo perdido e a operação tenha sido a fonte de recursos repassados a Marcos Valério como ‘empréstimos’ e, depois, ao PT? Neste caso, que crimes foram cometidos e quem responde por eles? Isso vale para as suspeitas de que a Petros favoreceu a Globalprev e de que a Previ, as Teles? São estes esclarecimentos que permitem ao leitor avaliar a importância dos fatos.
Um leitor escreve, e acho que tem razão, que deveríamos informar que Rogério Buratti foi mais do que um simples assessor de Antonio Palocci na Prefeitura de Ribeirão Preto. Ele foi o secretário de Governo do então ministro, ou seja, o cargo de maior confiança de uma administração. Para usar a comparação do leitor, Buratti foi o José Dirceu do prefeito Palocci. O que não significa necessariamente que tudo que esteja delatando seja verdadeiro. A informação não está na Edição Nacional, mas é encontrada na Edição SP (‘Buratti ligou 6 vezes para Palocci em 2003’, pág. A14).
Não vi na Folha as críticas feitas ao PT por Frei Betto em Passo Fundo: ‘cúpula do PT desmoralizou esquerda’ (‘Globo’) e ‘direção atolou pé na lama’ (‘Estado’).
Também não li nada sobre a exoneração de Itamar Franco da embaixada em Roma.
Haiti
A participação brasileira na missão da ONU no Haiti tem sido alvo de vários questionamentos e críticas. A Folha perdeu a oportunidade de fazer estes questionamentos ao novo comandante da missão (‘Pleito preocupa general que assume no Haiti’, pág. A19 de Mundo).’