Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crítica interna


’19/05/2005


Juros, a crise política que se aprofundou depois das denúncias de corrupção nos Correios e o desmatamento da Amazônia são os principais assuntos dos três grandes jornais.


Folha: ‘Planalto e PT ainda tentam evitar CPI’ (manchete), ‘Copom aumenta juros pelo 9º mês consecutivo’ e ‘Amazônia tem segundo maior desmatamento da história’.


‘Estado’: ‘BC sobe juro pelo 9º mês seguido, para 19,75%’ (manchete), ‘Lula tenta evitar, mas oposição protocola CPI’, ‘PMDB fala em reabrir caso Waldomiro’, ‘Desmatamento é maior que o esperado’.


‘Globo’: ‘Aliados de Lula dão metade das assinaturas para a CPI’ (manchete), ‘Juros têm 9ª alta seguida e vão a 19,75%’, ‘Desmatamento cresce 6% na Amazônia’.


A Folha ainda destaca mais uma rebelião na Febem de São Paulo (‘Febem iguala total de motins registrados no ano passado’) e a rejeição do ex-presidente da entidade, Alexandre de Moraes, para cargo no Conselho Nacional de Justiça (‘No Senado, PT barra nome da oposição para novo conselho’). O ‘Estado’ também registra a derrota de Moraes e destaca as negociações do governo com o MST (‘Lula promete ao MST facilitar desapropriação’).


Outras manchetes:


‘JB’ – ‘Lula deflagra operação Deus nos acuda’.


‘Correio Braziliense’ – ‘Novas denúncias agravam crise e fortalecem CPI’.


‘Zero Hora’ – ‘Fracassa esforço de Lula para evitar CPI da Corrupção’.


‘Valor’ – ‘BC mantém rota e eleva o juro em mais 0,25 ponto’.


‘Gazeta Mercantil’ – ‘São Paulo dá a largada para operações de PPP’.


Governo sob pressão


A Folha fez uma página ontem sobre o envolvimento da empresa Novadata num ‘acerto’ de reajuste de contrato com os Correios. O nome da empresa apareceu na fita em que o funcionário Maurício Marinho é flagrado recebendo dinheiro e o jornal resolveu dar visibilidade ao caso. Hoje, no entanto, o caso sumiu do jornal. A atenção agora está voltada para a suspensão de uma licitação para a compra de remédios (‘Correios suspendem a licitação suspeita’, pág. A8).


Um dos problemas de coberturas feitas sob pressão, como é este caso agora, é a falta de continuidade dos assuntos. Afinal, a Novadata fez ‘acerto’ com os Correios ou não fez? Ela se beneficiou ou não do fato de seu dono ser amigo do presidente Lula? O jornal levantou o caso e é necessário dar seqüência.


Em relação à Novadata, mostrei ontem que o chamado ‘outro lado’, ou seja, o direito de defesa e de explicação, não tinha tido a visibilidade que o caso exige. Na minha opinião o problema não foi sanado na edição de hoje. Segundo o ‘Estado’, que hoje entrou na história, a empresa divulgou ontem uma nota oficial. Não vi na Folha.


O ‘Estado’ explorou melhor a desconfiança do PMDB em relação ao governo no caso da CPI da Corrupção. Segundo o jornal, os peemedebistas temem que o PT jogue a culpa do escândalo nas costas do partido: ‘PMDB ameaça governo com caso Waldomiro’.


Ralo municipal


O ‘Estado’ traz hoje um novo e curioso caso de corrupção: um empresário que pagou propina de R$ 30 mil para um prefeito do Estado de São Paulo em troca de isenção fiscal está pedindo o dinheiro de volta. Como a promessa não foi cumprida, o empresário quer recuperar a grana.


Diplomacia


O texto ‘Rice se opõe a acesso da Alemanha ao Conselho de Segurança da ONU’ (pág. A18 de Mundo) informa que a posição ‘prejudica de modo indireto o Brasil’ mas não ouve o Itamaraty. Segundo o ‘Estado’, que ouviu o ministro Celso Amorim, o Brasil aceitaria integrar o Conselho de Segurança sem poder de veto. Segundo o ministro, ‘a influência do Brasil vai aumentar se tiver assento permanente’, mesmo sem direito de veto. A entrevista foi colhida em Brasília.


Está errada a forma como o jornal vem tratando a crise do Haiti (foto-legenda ‘Apoio’, na pág. A18).


O país só tem espaço quando o enfoque são as tropas brasileiras, suas manobras preparatórias ou a importância presumida do Brasil na mediação da crise. Mas o país continua afundado, as denúncias de problemas e irregularidades são constantes, a oposição cresce, o papel do Brasil está sendo questionado, sua situação é vulnerável, e pouco disso sai no jornal.


Ambiente


A Folha (Ciência) tem um ótimo aproveitamento do relatório sobre desmatamento da Amazônia divulgado ontem pelo Ministério do Meio Ambiente (‘Desmatamento é o 2º mais alto da história’, ‘Grilagem muda geografia da devastação’ e ‘Derrubada ilegal, gado e soja campeiam na BR-163’). As fotos da primeira página e da pág. A20 impressionam.


Acabamento


A falta de um ‘não’ tornou incompreensível a última nota da seção ‘Erramos’ da Edição Nacional: ‘… o jurista Goffredo da Silva Telles Junior nasceu em 1915, e em 1916’.


Também faltou verbo na nota ‘Judiciário’ da Edição São Paulo (pág. A14): ‘João Carlos da Rocha Mattos sai da carceragem da PF em Florianópolis e para o quartel da PM no Regimento de Cavalaria Montada ‘Nove de Julho’ (SP)’.


Aviso


Viajo amanhã para participar da reunião anual da ONO (organização mundial de ombudsmans de meios de comunicação), que este ano será realizada em Londres. Por esta razão, não haverá a Crítica Interna nos próximos dias.


18/05/2005


Folha e ‘Estado’ têm a mesma manchete (‘Oposição diz já ter nomes para abrir CPI dos Correios’ e ‘Oposição já tem as assinaturas para criar CPI dos Correios’), a mesma foto (confronto entre PMs e sem-terra em Brasília) e sete chamadas iguais: MST em Brasília, Bolívia, depredação da assembléia de Rondônia, estudo sobre a população de SP, os dois novos secretários municipais da cidade, estréia do último episódio da série ‘Star Wars’ e o jogo da Libertadores.


Diferenças: a Folha destaca o aumento de seqüestros em São Paulo (‘Aumento de seqüestros faz polícia tentar força-tarefa’) e o ‘Estado’, a entrevista coletiva do ministro da Fazenda (‘Palocci: ‘BC não pode agradar a todos’).


A manchete do ‘Globo’ também é sobre a CPI dos Correios, mas com outra formulação: ‘Lula defende Jefferson mas já há assinaturas para CPI’. O jornal do Rio faz um grande quadro na capa onde junta, sob o selo ‘Escândalos em série’, o caso dos Correios, de Rondônia, de Alagoas (onde vários prefeitos foram presos ontem) e Campos (RJ).


Crise dos Correios


A Folha arrumou melhor a sua Edição SP. O lidão na página A4, inexistente na Edição Nacional, resume os principais fatos de ontem e ajuda a entender a edição.


A cobertura tem outro ponto positivo: a degravação da fita de vídeo e o foco em outra licitação, de computadores, ganha pela Novadata.


Há um problema sério, no entanto, com este material, que é a falta de visibilidade para as explicações da empresa citada. Não se pode considerar como ‘Outro lado’ um texto que tem como título ‘Reajuste de contrato com Correios rendeu a empresa R$ 5,5 milhões’ (A8). Esta informação já estava inclusive na reportagem principal. O título teria de ser as explicações da empresa: ela informa que não negociou a liberação de dinheiro com Maurício Marinho.


O título abaixo, ‘Novadata faturou R$ 273 mi desde início do mandato do presidente’, não está errado, mas omite duas informações relevantes do perfil da empresa: ela já liderava a venda de computadores ao governo federal desde o mandato de FHC e faturou mais no último ano do governo tucano do que no ano passado com o governo Lula. A empresa, portanto, aparentemente não se beneficiou do fato de seu dono ser amigo de Lula para ganhar licitações. Já ganhava antes. O que não significa que não possa estar envolvida com alguma irregularidade ou corrupção nos Correios.


Painel do Leitor


O que pensam os leitores da Folha a respeito dos escândalos de corrupção nos Correios e em Rondônia, destaques de toda a imprensa nos últimos três dias? A se fiar nas mensagens publicadas hoje, nada. Não há nenhuma carta de leitor comentando estes casos.


A seção de cartas do ‘Globo’ publicou oito mensagens sobre os escândalos de corrupção, fora outro tanto comentando o caso Garotinho em Campos; no ‘Estado’, foram publicadas cinco cartas.


Acho difícil que nenhum leitor da Folha tenha se manifestado sobre estes assuntos.


Gestão petista


O texto ‘TCE considera irregulares contas de Palocci’ (A11 da Ed. SP) não informa que conseqüências têm a conclusão do Tribunal. Alguém foi responsabilizado? Será punido? Que tipo de punição?


Investigação


As legendas das fotos devem identificar os personagens fotografados. Isso não acontece na legenda da foto da pág. A10 da Ed. Nacional que flagra um prefeito de Alagoas preso pela Polícia Federal. Se foi uma atitude de cautela do jornal, não deveria ter dado a foto do político nem identificá-lo na Ed. SP.


Corrupção


Não consigo entender por que o escândalo de corrupção nos Correios leva o chapéu ‘Crise dos Correios’ enquanto na Assembléia Legislativa de Rondônia o chapéu é ‘Brasil profundo’. Nem existe crise nos Correios (a crise é do governo Lula) nem a corrupção está restrita ao Brasil profundo.


2006 em risco


O jornal deu ontem destaque para as acusações feitas por Jocinaldo da Silva contra o ex-governador Anthony Garotinho (‘Ex-candidato do PL diz ter prova de compra de votos em Campos’, pág. A7 da Ed. Nacional). Ontem à noite o político voltou atrás e retirou as acusações. O jornal deveria ter dado hoje o mesmo destaque, com título para a retratação, e não escondido a informação , na Ed. SP, no pé do texto ‘Garotinho diz que não ofendeu juíza’ (pág. A11).


O ‘Estado’ foi explícito: ‘Testemunha que acusava Garotinho diz que mentiu’.


Em relação à retratação, o ‘Globo’ informa que ela foi divulgada pela assessoria de Garotinho.


Religião


O papa Bento 16 ainda não era cardeal em 1969, como dá a entender o primeiro parágrafo do texto ‘Boff espera que o papa volte a ser ‘liberal’ (pág. A18).


Legenda


A legenda da foto ‘Putinóquio’ (pág. A17 de Mundo), em que aparece o presidente russo com o nariz do Pinóquio, não informa por que os poloneses o consideram mentiroso. A referência a ‘versão estalinista da história’ não informa do que se trata.


Ciência


É válido o esforço do jornal de facilitar a leitura de assuntos difíceis da ciência. Tenho dúvidas, no entanto, se esse objetivo é alcançado quando utiliza, como hoje, no texto ‘Impactos revelam ‘lua azarada’ de Marte’, termos e expressões como: ‘calhou’, ‘o que pode não ter acontecido de cara’, ‘até aí, tudo bem; cada enxadada, uma minhoca’ e outras tantas parecidas.


Terror dos paulistas


O governador Geraldo Alckmin deve ser muito insensível, a se acreditar no título da capa de Cotidiano, ‘Seqüestros crescem e assustam Alckmin’. Pois o fenômeno dos seqüestros em São Paulo vem desde pelo menos 2002, como mostra um dos gráficos da Folha. Os números são assustadores mesmo quando houve tendência de baixa.


A reportagem registrou a nova alta do crime, mas não questionou o governo do Estado no ponto mais importante: por que a sua política de combate aos seqüestros não dá certo? De que adianta a formação de uma força-tarefa? A experiência mostra que elas são criadas apenas para efeito de propaganda e para dar satisfação à imprensa. Quantas medidas o governo já prometeu e quantas iniciativas já anunciou desde 2002 para combater o seqüestro? Por que não deram certo? O jornal preferiu destacar a mudança de discurso do governo (antes dizia que a tendência de aumento do crime não preocupava e agora se diz assustado) do que questionar a política de segurança e a responsabilidade do governador e de seus secretários nas medidas ineficazes adotadas até agora.


População


Na reportagem sobre o estudo populacional divulgado ontem pela Fundação Seade (‘Cidade violenta cresce mais que a média de SP’, pág. C7 da Ed. SP e C4 da Ed. Nac.) ficou faltando uma arte que ilustrasse a relação entre crescimento populacional das cidades e taxas de homicídio. Este foi o enfoque escolhido pela editoria para editar o estudo e, portanto, deveria ter tido um tratamento gráfico que permitisse ao leitor verificar se está correto.


A reportagem sobre seqüestros deveria ter remetido para a reportagem que associa crescimento populacional a homicídio.’