‘21/07/2006
Nenhum dos grandes jornais destacou a guerra no Líbano como manchete. Folha e ‘Estado’ publicam, no entanto, flagrantes do conflito como suas principais fotos e chamadas fortes: ‘Israel ameaça avançar no sul do Líbano’ (Folha) e ‘Israel fala em invasão ampla’ (‘Estado’).
As manchetes:
Folha – ‘VarigLog compra Varig e suspende vôos’.
‘Estado’ – ‘Presos tesoureiros e advogados do PCC’.
‘Globo’ – ‘Eleição custa 19 vezes mais sem financiamento público’.
Sanguessugas
A Folha continua a divulgar nomes de parlamentares supostamente envolvidos com o esquema de fraudes na compra de ambulâncias sem confirmação oficial da CPI ou do Ministério Público Federal (‘Empresário afirma ter pago propina a mais 3 governistas’, pág. A5).
Não há verbo mais perigoso, em se tratando de reportagem com acusações, do que o verbo ‘ligar’ _como está no título da página A4 de hoje, ‘Empresário liga governo do PT no Piauí a sanguessugas’.
Eleições 2006
Como o jornal pode afirmar que ‘Alckmin faz promessas vagas no Nordeste’ (pág. A8 da Edição SP) se o candidato não fez promessa alguma, apenas informou que anunciará, no dia 4 de agosto, um pacote de medidas para o Nordeste? O título está errado e é injusto com o candidato. Até a divulgação do pacote o jornal não tem como afirmar que as promessas que contém são vagas.
A obrigação de praticar um jornalismo crítico não pode ser confundida com distorção.
Qual o problema do filho do vice-presidente José Alencar, uma liderança empresarial, chamar José Serra de ‘governador’? O que isso tem de tão significativo e relevante a ponto de ser o principal destaque da campanha de Serra (‘Filho de José Alencar chama Serra de governador em evento em SP’, pág. A8)? Não é possível que as principais informações de um dia de campanha sejam o tratamento – absolutamente comum – dispensado ao candidato e uma gafe sem qualquer importância.
O jornal continua amarrado à agenda dos candidatos e preocupado com fatos menores que não sobreviverão ao dia seguinte.
Observei ontem, na Crítica Interna, que senti falta, no material que analisava o crescimento da candidata Heloísa Helena na última pesquisa Datafolha, da inclusão do ‘Jornal Nacional’ como um dos fatores que podem explicar o crescimento. A abertura do ‘Painel’ de quarta-feira já havia explorado este aspecto (‘É a TV, estúpido’).
‘Toda Mídia’
A legenda e o texto ‘Uma imagem explosiva’ não informam, na Edição Nacional, o país onde foi tomada a foto das bombas desenhadas por crianças. Nenhum leitor tem a obrigação de saber onde fica Kiryat.
Guerra no Oriente Médio
O jornal tem hoje repórteres nas duas frentes da guerra, em Israel e no Líbano. Ótima iniciativa.
O infográfico ‘Os confrontos de ontem’ da Edição Nacional (pág. A10) refere-se ao 10º dia de ofensiva, quando o texto principal (‘Piora conflito em terra; mortos vão a 363’) informa que ontem foi o nono dia. Na Edição SP também está 9º.
20/07/2006
As manchetes dos jornais em geral se dividem hoje entre o veto do presidente Lula ao FGTS para domésticos e a invasão do Líbano por parte de Israel.
A Folha preferiu, no entanto, como ontem, dar manchete para a pesquisa eleitoral Datafolha, mesmo sem novidade: ‘Serra mantém vitória no 1º turno em SP’. O título do ‘Estado’ informa que Serra teve uma pequena queda: ‘Serra cai, mas ainda venceria no 1º turno, diz Datafolha’.
Manchetes:
‘Estado’ – ‘Maior ataque de Israel ao Líbano mata 64’.
‘Globo’ – ‘Lula veta FGTS de doméstico para poupar a classe média’.
Na Primeira Página da Edição Nacional da Folha, a invasão do Líbano ficou como ‘incursões terrestres’. No título, o verbo escolhido foi ‘entrar’: ‘Israel entra no Líbano e ataca o Hizbollah no dia mais violento’.
A propósito do meu comentário de ontem de que o texto do escritor Amos Oz deveria ter sido editado junto com o extrato de análise com outro ponto de vista sobre o drama do Líbano, recebi da Secretaria de Redação a observação de que no domingo o jornal havia publicado, também na Primeira Página, um texto com outro ponto de vista e com mais destaque, ‘Acordo político seria solução’, de Ramig Khouri.
Sanguessugas
Não é mais prudente o jornal esperar a abertura de inquéritos para divulgar os nomes de novos deputados que podem estar envolvidos com o esquema de fraudes nas licitações de compra de ambulâncias? Se fosse esse o critério adotado – a abertura de inquérito – o jornal deveria ter esperado um pouco mais para incluir dois novos suspeitos, como faz hoje (‘Deputado do PT levou propina, diz acusado’, pág. A15).
Eleições 2006
Vai mal a cobertura jornalística quando a principal notícia que se extrai de um dia de campanha de um candidato a presidente da República é um ‘tenso bate-boca’ entre um candidato ao governo do Distrito Federal e um militante de outra candidatura (‘Alckmin inaugura comitê com bênção de padre e bate-boca’, pág. A7).
A Folha publicou hoje um bom material para tentar explicar o ‘fenômeno’ Heloísa Helena (várias reportagens e infográfico na pág. A8) revelado pela pesquisa Datafolha de ontem. Faltou explorar, no entanto, o fator ‘Jornal Nacional’, apontado pela coluna ‘Toda Mídia’ (‘O tratamento recebido’, pág. A14).
‘Mundo’
O jornal vai bem hoje no noticiário sobre a guerra no Líbano. Acho que faltou, no entanto, os textos analíticos e as entrevistas que vinha publicando e que ajudam a aprofundar o entendimento do que está acontecendo e facilitam a exposição dos vários pontos de vista distintos que estão em choque.
Julgamentos
Tenho dúvida se o jornal deveria dar tanto espaço, como vem fazendo, para a cobertura dos dois julgamentos dos últimos dias – casos von Richthofen e Embu-Guaçu. Embora sejam dois casos ‘policiais’ de grande interesse e visibilidade pelo apelo emocional que suscitam, fico com a impressão de que as coberturas estão sendo feitas em detrimento do acompanhamento da pior crise de São Paulo, a de segurança pública provocada pelos ataques do PCC. A crise e os ataques ainda continuam, mas já sem tanta exposição no jornal.
19/07/2006
Na Folha, como era de se esperar, a manchete é mais uma pesquisa eleitoral – ‘Lula mantém vantagem; cresce chance de 2º turno’. No ‘Estado’, a guerra no Líbano – ‘Ataques de Israel já deixam 500 mil refugiados no Líbano’. E no ‘Globo’, ‘Partidos do mensalão têm 2/3 dos 57 sanguessugas’ – com fotos dos treze parlamentares fluminenses que estão sendo investigados.
A Primeira Página da Folha não mostra, como fazem o ‘Estado’ e o ‘Globo’ com fotos, a dimensão da destruição de uma parte de Beirute por Israel. O noticiário da Folha enfoca a morte de mais um brasileiro e a retirada de brasileiros – ‘Ataque mata menino no Líbano’ –, mas dá pouca ênfase ao drama do país vitimado. Segundo o ‘Estado’, já são 500 mil refugiados. O texto do escritor Amos Oz deveria ter sido editado junto com o extrato de análise com outro ponto de vista sobre o drama do Líbano.
Guerra no Líbano
O que no ‘Estado’ é o principal destaque do caderno ‘Internacional’ – ‘Líbano já tem 500 mil refugiados – Situação é catastrófica, diz Unicef; número de fugitivos equivale a quase um sexto da população do país’ –, na Folha é apenas a última frase – ‘Estimativa da ONU indica que 400 mil pessoas deixaram suas casas no Líbano’ – de um texto de pé de pagina (‘Navios chegam a Beirute, e êxodo de milhares de estrangeiros se intensifica’, capa de ‘Mundo’).
Tem mais interesse e relevância a repercussão colhida pelo ‘Globo’ na imprensa britânica a respeito da gafe de Bush com Blair em São Petersburgo – ‘Ô, Bush, mais respeito com Blair! – Imprensa critica interjeição usada por presidente e subserviência do primeiro-ministro’ – do que o enfoque dado pela Folha – ‘Bush e Blair reagem com humor à gafe’ (nota na pág. A13).
Eleições 2006
A única análise da mais recente pesquisa Datafolha – ‘2006 repete 1998’ – está na página de ‘Opinião’, fora do espaço da cobertura jornalística da campanha eleitoral. O jornal tem repórteres, colunistas (inclusive blogueiros) e especialistas (no Datafolha) que poderiam enriquecer a leitura da pesquisa com análises do quadro eleitoral. O que o jornal faz é apenas descrever os números, com um ou outro parágrafo com um comentário ou uma referência que contextualiza o momento da pesquisa, mas sem explorá-la como deveria.
Segundo o ‘Estado’, o PT protocolou ontem no TSE notícia-crime contra o senador Jorge Bornhausen por causa da entrevista que deu para a Folha em que insinua a ligação do PT com o PCC. Não vi a notícia na Folha.
Também não vi a notícia de que a ex-ministra Zélia Cardoso de Melo foi absolvida no último processo que respondia, ainda pelo período Collor.
Guerra urbana
O texto da pesquisa Datafolha sobre o PCC (página C4 da Edição Nacional e C9 da Ed. SP) deveria ter dado mais ênfase do que deu aos números relativos a São Paulo. Era importante ter destacado mais o que pensam os paulistas sobre a responsabilidade dos poderes públicos e sobre os outros pontos levantados pela pesquisa. A pesquisa justificava, inclusive, a comparação, no infográfico, entre o que pensam os brasileiros e o que pensam os paulistas.
Está errado o gráfico que representa a evolução da responsabilidade de Geraldo Alckmin (infográfico ‘Como os brasileiros avaliam a crise’).
17/07/2006
As manchetes da Folha de ontem e de hoje são sobre a intensificação do conflito no Líbano: ‘Israel mata 16 civis em fuga no Líbano’ (domingo) e ‘Mísseis atingem Haifa e conflito piora’ (hoje). Para não fugir à preferência pelos textos declaratórios, a edição de ontem tem uma segunda manchete: ‘SP vive ‘guerra de Canudos’, diz Lembo’. O que isso quer dizer? Nem o jornal conseguiu explicar.
O ‘Estado’ deu manchete no domingo para a guerra em São Paulo – ‘Cresce a resistência de presos às ordens do PCC’ – e, hoje, para a guerra no Oriente: ‘Israel sofre o pior ataque e conflito cresce’.
O ‘Globo’ preferiu, nos dois dias, tratar da campanha de Lula à Presidência da República: ‘Gastos pré-eleitorais de Lula superam em 84% os de FH’ (domingo) e ‘PT propõe a Lula decálogo para esfriar a campanha’ (hoje).
‘Mundo’
Há um nítido esforço da editoria para apresentar, nas edições de ontem e de hoje, uma cobertura equilibrada e reflexiva sobre a nova escalada de violência nos territórios palestinos, em Israel e no sul do Líbano.
Eleições 2006/Estados
Não consegui entender por que o jornal considerou tão relevante a suposta influência da Igreja Universal nos conselhos tutelares (que defendem o Estatuto da Criança e do Adolescente) a ponto de reservar um alto de página para o assunto (‘Crivella usa conselheiros tutelares para atrair votos’, pág. A9).
Primeiro, a reportagem não explica – não apurou – como 14 conselheiros tutelares estão atraindo votos para a candidatura do senador Crivella ao governo do Rio. Não mostrou um caso sequer que comprove que os conselheiros estão em campanha para o senador.
Segundo, a própria reportagem informa que foram abertos procedimentos no Ministério Público para investigar a tal influência e o MP ‘não conseguiu comprovar a irregularidade’. Aliás, mesmo sem comprovação de irregularidade, a reportagem usa, no último parágrafo, uma das representações não comprovadas como um ‘exemplo’ da pressão e da influência da Universal em alguns conselheiros.
Terceiro, a reportagem diz que ouviu nove conselheiros (entre 50), um representante do CMDCA e três promotores. ‘Quase todos confirmaram saber da influência da Universal no órgão’, resume a reportagem. Quase todos? Quantos? Quantos negaram? Qual o perfil dos conselheiros ouvidos? Além disso, uma coisa é a Universal ter influência num órgão, outra estar usando conselheiros para fazer campanha eleitoral.
Não duvido que a Universal possa estar fazendo campanha eleitoral através dos conselheiros. Mas a reportagem está longe de provar. O que temos é uma pauta publicada sem que a apuração estivesse concluída.
Guerra urbana
Se está ‘praticamente’ descartada a participação do PCC no atentado ao prefeito de São Sebastião, como informa a reportagem ‘Prefeito de São Sebastião sofre atentado’ (capa de ‘Cotidiano’), por que usar o chapéu ‘Guerra urbana’ que tem identificado a cobertura dos atentados nos últimos dias?
O uso indiscrimado do chapéu não ajuda o leitor a entender que são fatos distintos e que exigem abordagens distintas.
Uma grande história
A reportagem ‘Não é lixo, caramba!’, publicada ontem no ‘Estado’ (caderno ‘Aliás’), mostra como um caso já exaustivamente noticiado por todos os meios ao longo da semana – a história de Violeta Martinez, que acumula tralhas e entulhos em casa – ainda pode ser transformado em uma grande história. Uma história bem apurada e bem contada, sem julgamento ou discriminação.
Legendas
Está errada a legenda da foto da página A6 da Edição Nacional que ilustra o relato sobre a visita de Lula a São Petersburgo. Ele e a primeira-dama não estão na igreja de Santo Isaac, mas diante da estátua de Pedro, o Grande.
A foto que ilustra a reportagem da página A10 de ‘Mundo’ (‘Câmara dos EUA mira Tríplice Fronteira’) não mostra pedestres na ponte da Amizade, como informa a legenda, mas numa rua.
Aviso
Farei amanhã uma palestra no Master em Jornalismo, em São Paulo. Por esta razão, não haverá a Crítica Interna.’