Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crítica interna

13/04/07

A última edição do Manual da Redação (PubliFolha, 2006) reafirma uma orientação antiga do jornal. Diz à pág. 55, no verbete ‘briga’: ‘Não use como sinônimo de polêmica, discussão ou disputa no campo das idéias. A palavra implica agressão verbal ou física, luta, confronto’.

Esporte informa hoje sobre a polêmica, discussão e _até agora_ disputa no campo das idéias sobre o local da decisão do Campeonato Paulista de futebol.

Eis o título da principal matéria do dia (pág. D1): ‘Grandes brigam, e final caminha para o interior’.

Está errado. Não houve briga.

O Manual, como observou um leitor atento, é também um instrumento de defesa dos leitores.

Painel do Leitor

A carta do vereador Roberto Trípoli estaria mais bem situada na cobertura de Cotidiano sobre o pacote de benefícios que os vereadores de São Paulo aprovaram a favor deles mesmos.

A carta do leitor Orestes Woestehoff comenta informação que o jornal deveria ter registrado ontem: a proibição de certas vestimentas na Câmara. Peço perdão caso tenha sido publicado, mas eu não vi. Também não vi matéria hoje. A seção Tiroteio do Painel traz uma nota sobre o assunto.

Sem outro lado

No texto ‘delegado ataca arquivamento de inquérito sobre petista’ (pág. A9) o delegado da Polícia Federal Diógenes Curado Filho faz uma série de afirmações relativas ao inquérito no qual foi indiciado o senador Aloizio Mercadante.

O senador não tem a sua palavra contemplada.

É um direito dos leitores conhecer pontos de vista divergentes, a fim de reunir mais elementos para formar opinião.

Tragédia e jornalismo

No relato da morte do menino de um ano e quatro meses esquecido pelo pai dentro do carro, a Folha publica entrevista com a mãe do menino morto no ano passado em situação semelhante (pág. C3).

Sensível e sem romper o limite do respeito à dor materna, é uma bela peça jornalística.

Serviço

O jornal presta um valoroso serviço aos leitores ao publicar hoje como foi o comportamento de cada um (pelo menos dos que responderam) dos vereadores paulistanos na aprovação do pacote de auto-ajuda e divulgar na Folha Online informações complementares.

Disque M para matar

Os leitores da Folha ainda não foram informados sobre o teor das reportagens que o ‘Globo’ começou ontem a publicar sobre conversas telefônicas entre policiais do Rio.

No texto de maior impacto, o jornal revela hoje a sugestão da agora deputada federal Marina Magessi para dar ‘um monte de tiros’ em um delegado.

Trata-se de tema importante, com informações relevantes.

Magessi, inspetora da Polícia Civil do Rio, construiu sua carreira política ancorada na enorme simpatia que o jornalismo lhe concedeu.

PT na Justiça

O texto ‘Secretário nacional de Justiça é contra uso de Exército’ (pág. C9) contém declarações do ex-deputado petista Antonio Carlos Biscaia.

O Painel informou recentemente que o delegado Zaqueu Teixeira, veterano militante do PT, é assessor do ministro Tarso Genro.

Biscaia e Teixeira são do Rio. O petista Genro substituiu na Justiça um advogado sem militância partidária.

É possível dizer que, no segundo governo Lula, o PT assumiu o controle do Ministério da Justiça em todos os escalões?

Talvez valha reportagem.

Edmundo?

O texto ‘Após fiascos, Palmeiras quer nomes ‘de peso’’ (pág. D2) não cita o nome do atacante Edmundo.

A matéria trata de reforços para o Campeonato Brasileiro. Nesta semana, a Folha publicou reportagem centrada em Edmundo (anunciou um ‘retorno ao futebol’ inexistente, mas até hoje não houve Erramos). Dizia que o jogador falava de uma proposta de clube dos EUA, mas alguns dirigentes desconfiavam de plantação.

Como ficou? Edmundo vai seguir no Palmeiras? Vai para os EUA? A proposta de transferência existe ou não? O jogador vai abandonar o futebol?

O fato de uma nota do Painel FC tratar de Edmundo não resolve. O leitor, o palmeirense em particular, não pode ser obrigado a ler o jornal inteiro em busca de informações fragmentadas sobre o seu clube.

Palavra final

A seção sobre televisão apresenta um documentário em texto com o título ‘Canal relata drama de Vladimir Herzog’.

Não cabe ao representante dos leitores discutir ou se pronunciar sobre opinião estética.

Para reflexão, faço apenas um comentário sobre a afirmação de que o (bom) filme de João Batista de Andrade é o ‘registro definitivo de uma época’.

Se, em um texto noticioso de apresentação de filme, o jornal diz que há ‘registro definitivo’, o que vai afirmar quando aparecer um filme melhor ou com olhar diferente? Se o anterior era ‘definitivo’, nenhuma obra nova terá algo a acrescentar.

O melhor da semana

Em tempo: a reportagem de capa de ontem do caderno Equilíbrio, ‘Adoção incondicional’, tem um padrão jornalístico que deveria inspirar toda a Folha. Informativa, sóbria e emocionante, é dos melhores trabalhos produzidos pelo jornal nos últimos tempos. Entre outros méritos, elegeu um ótimo título interno: ‘A criança real’. Parabéns.

(Esclarecimento: a manutenção de sistema na virada das quartas para as quintas-feiras faz com que eu só receba no Rio a edição SP no fim da manhã. Por isso, às quintas, a tendência é a crítica diária circular um pouco mais tarde. Ontem, infelizmente, só consegui ler Equilíbrio depois do fechamento da crítica.)

12/04/07

É de grande interesse público a manchete-furo da Folha, ‘Anvisa vai limitar publicidade de cerveja’.

A cobertura em Cotidiano foi abrangente e plural, ajudando o leitor a tomar posição em um debate que apenas se inicia.

As regras propostas pela Anvisa, se entrarem em vigor, também atingirão os jornais, como se lê na capa de Cotidiano.

Ontem havia na primeira página do jornal um anúncio de cerveja.

Um leitor da cidade de São Paulo, sanitarista, telefonou para protestar. Ele disse que acompanha ‘a questão social dos alcoolistas e seus filhos’.

Infelizmente, não tive como encontrá-lo a tempo de obter autorização para citar seu nome nesta crítica.

Apagão aéreo

A primeira página da Folha ignora a audiência pública na Câmara com a presença do ministro da Defesa, do comandante da Aeronáutica, dos presidentes da Infraero e da Agência Nacional de Aviação Civil.

O evento rendeu a manchete do ‘Estado’ (‘FAB insiste em manter os militares no controle aéreo’) e do ‘Globo’ (‘FAB e Defesa expõem as divergências em público’).

A leitura das coberturas dos três diários dá a impressão de que a Folha errou.

O jornal menosprezou o conflito (os choques estão dispersos na reportagem, de baixíssima temperatura jornalística, ‘Na Câmara, Pires minimiza a crise aérea’, pág. C6).

As posições já estavam delineadas. Mas sua manifestação em público, com tamanhas divergências, tem impacto.

Deveria haver chamada na primeira.

Título cifrado

Diz título da primeira página: ‘FMI afirma que Brasil vai subir a grau de investimento’.

O que é ‘grau de investimento’?

Somente os leitores iniciados entendem. Os outros precisam ler o texto da chamada.

Títulos, especialmente os de primeira página, deveriam ser auto-explicativos.

Painel do Leitor?

Má notícia para os leitores da Folha: o Painel voltou a ser dominado, em mais da metade do espaço, por ‘leitores vips’.

A resposta do secretário estadual de Ensino Superior (SP) é a um artigo de docentes. Melhor seria o jornal convidar o secretário para escrever um artigo.

A carta do diretor de uma empresa de comunicação estaria mais bem editada acompanhando as reportagens sobre a instalação da CPI da Nossa Caixa.

A assessora de imprensa da Secretaria Municipal de Cultura poderia ter sua declaração registrada na Ilustrada.

O esclarecimento do assessor de imprensa de Paulo Maluf ficaria melhor em Brasil.

A apropriação do Painel do Leitor para personalidades e ‘outro lado’ de autoridades subtrai um direito dos leitores da Folha, o de ter um espaço seu para se manifestar.

Legenda versus imagem

Diz legenda na pág. A4: ‘Lula tropeça em escada e é amparado pelo senador Renan Calheiros (à esquerda do presidente), anfitrião de jantar com o PMDB’.

Está errada.

A fotografia deixa claro que Calheiros nem toca em Lula, embora estique os braços. Quem ampara o presidente é outra pessoa.

Mercadante

O jornal acertou em destacar na primeira página a decisão do STF de arquivar inquérito sobre o senador Mercadante.

Acertou também no relato ‘STF arquiva inquérito sobre Mercadante’ (pág. A6).

O ‘Globo’ informou que o senador foi ‘inocentado’ e que o STF o ‘absolveu’.

A corte não fez julgamento, não se pronunciou sobre mérito (logo, não absolveu). Julgaria se o Ministério Público Federal tivesse feito acusação. O que a Procuradoria Geral da República pediu, ao contrário, foi o arquivamento.

Nota cifrada

A nota ‘Neocons e o Brasil’ fala de certa revista ‘neocon’.

O leitor não é obrigado a saber o que é isso.

Sem terra, sem-teto

É excessivamente diminuta a cobertura da Folha hoje sobre o ‘abril vermelho’ do MST e outras organizações.

Talvez escape ao jornal a aparente conexão política entre a onda de mobilização de movimentos de sem-terra e sem-teto. As invasões no campo saem em Brasil. As urbanas, em Cotidiano.

O ‘Globo’ fez melhor, ao unir as coberturas.

A Folha poderia, ao menos, remeter o leitor para as reportagens no outro caderno.

Mireya, nome de mulher

A ex-presidente do Panamá Mireya Moscoso é mulher, não homem. O texto ‘Justiça dos EUA concede liberdade a Posada Carriles’ (pág. A21) a trata como ‘o então presidente’.

O mesmo texto diz que ‘pesa sob o ex-agente da CIA’ certa acusação. O correto é ‘sobre’, não ‘sob’.

Na edição Nacional há crase indevida em ‘à autoridades’. A crase foi retirada na edição SP.

Batalha de Argel

Título de Mundo diz: ‘Atentado traz terror de volta à Argélia’.

Como a Folha não é um jornal editado em Argel ou outra cidade argelina, o correto seria ‘leva’, e não ‘traz’.

Clareza jornalística

‘Spreads’, ‘Fed’, ‘core’, ‘subprime’.

O que é isso?

Está tudo muito bem explicado, na capa de Dinheiro, na cobertura das previsões do FMI sobre crescimento.

Quando expressões técnicas são indicadas (às vezes obrigatórias), não há problema em empregá-las. O imprescindível é explicá-las, como o jornal aqui fez com felicidade.

A banca

É muitíssimo interessante o texto sobre o estudo do Bradesco a respeito de inflação acumulada no país (‘Brasil é campeão de inflação em 45 anos’).

Ocorreu-me que seria igualmente interessante um estudo que calculasse os juros dos quais os bancos se beneficiaram no mesmo período. Não existe?

Expressão cifrada

O texto ‘BC dos EUA vê preocupação com inflação e abate Bolsas’ (pág. B10) fala em ‘financiamentos de segunda linha’ no mercado imobiliário americano.

O jornal ajudaria seus leitores se explicasse do que se trata.

Emprego

O texto ‘Petrobras deve atuar seguindo interesses do país, afirma Lula’ (pág. B12) não informa onde o presidente fez as declarações. Nem a legenda da foto. Pelo crédito da reportagem e a referência ao ‘Consórcio Rio Naval’, imagina-se que foi no Rio.

Não informa quantos postos de trabalho a construção de nove navios deve criar ou manter preenchidos.

Não esclarece se a construção se dará integralmente no Estado do Rio ou se trabalhadores de outros Estados podem ter expectativas.

E a lista?

A retranca ‘25 vereadores evitam declarar opinião sobre proposta; Câmara não divulga lista’ trata de questão importante: a posição de cada vereador na aprovação do pacote de benefícios na Câmara Municipal de São Paulo.

O jornal informa que ‘30 parlamentares assumiram sua posição’, mas não faz o principal: dizer quem são eles, o que pensam, o que defendem.

Esse tipo de serviço é útil ao leitor-cidadão.

A Folha não explica por que não publicou a lista nem chama para eventual divulgação na Folha Online.

Cidade aberta

Além de bem escrita, a reportagem de capa da Ilustrada tem o mérito de permitir a alguém que jamais viu um capítulo da série televisiva ‘Roma’ entender do que se trata. Mais que isso, se interessar em assistir ao programa.

Para isso, bastou contar com rigor jornalístico o que é a produção, sem bajulação.

Um problema pontual: fala-se em ‘cinco acres’. Isso é muito ou pouco? Dá quantos gramados do Morumbi ou praças Buenos Aires?

O leitor não é obrigado a saber.

Não é bem assim

A nota ‘Memória’ (pág. E2) informa que os arquivos de Samuel Wainer comprados pelo governo de São Paulo ‘podem finalmente vir a público’.

É possível que material inédito seja revelado, mas faz mais de uma década que é dado acesso público ao arquivo, pelo menos a uma parte dele.

No Arquivo do Estado, centenas ou milhares de pesquisadores já consultaram o arquivo de imagens da ‘Última Hora’. Livros foram editados com o melhor da coleção fotográfica, por tema.

Eventual ampliação ao acesso deve ser informada. Mas dando a real dimensão da novidade.

Palavra cifrada

O texto ‘Morumbi tem shows de ‘sobreviventes’’ (pág. E4) cita a palavra ‘freedom’, mas não a traduz.

Os leitores da Folha não são obrigados a entender inglês.

Notícia ou crítica?

O texto ‘Cerveny expõe ‘pequeno grande’ mundo’ (pág. E5) não é identificado como crítica. Portanto é notícia, a apresentação de uma exposição de artes plásticas.

Começa assim: ‘Em meio à onda do ‘vale qualquer coisa’ que perpassa a arte contemporânea, a reflexão de Alex Cerveny é um pequeno respiro’.

A seguir fala do mundo do artista, ‘sempre detalhista, interessante, cheio de meandros’.

A mostra mantém ‘a fina sensibilidade irônica que permeia a trajetória do artista’.

Lamenta: ‘uma pena que todo esse universo esteja confinado apenas no mezanino da galeria’.

Meu comentário: mesmo na notícia, haverá sempre alguma dose de subjetividade. Isso costuma ocorrer mais intensamente no jornalismo cultural, e talvez seja uma de suas particularidades enriquecedoras (ou talvez não).

Mas não é recomendável que a opinião contamine o noticiário. Imagino que, se a mostra merece análise estética, o jornal vá publicar uma crítica. O jorro opinativo na apresentação do evento foi indevido.

11/04/07

A dobradinha crítica de arte-reportagem, pelo mesmo autor, sobre os CDs e o show de João Donato me estimula a propor uma reflexão: não há, no limite, conflito jornalístico de interesses na dupla função?

Não se trata de análise do material publicado hoje, mas do expediente aceito pela Folha e, no geral, pela imprensa brasileira.

Suspeito que a condição de crítico influencie o trabalho do repórter e a condição de repórter interfira na produção do crítico.

Se um repórter é mal recebido por um artista entrevistado, é claro que pode escrever uma crítica isenta sobre a obra de arte do artista.

Se for recebido de braços abertos, também pode, em tese, assinar uma crítica intelectualmente honesta e pouco simpática.

Acontece que, por mais nobres que sejam os valores, é humano não se deixar levar apenas pelo cérebro, mas também, mesmo que involuntariamente, pelo coração.

É por isso que são raras, raríssimas, as dobradinhas em que a reportagem é mais dura com o personagem, e a crítica celebra sua obra. O contrário, também.

Na análise estética, o contato direto com o autor da obra, e a maneira como ele ajuda ou não a confecção da reportagem (por exemplo, recebendo ou não para uma entrevista), parece influenciar.

Se um repórter escrever a reportagem e um crítico compuser a crítica, a independência jornalística talvez seja exercida com mais vigor.

Aldeia universal

Fez muito bem a Folha em manchetar o pacote dos vereadores da capital (‘Vereadores se concedem pacote de benefícios em SP’).

Às vezes, o jornal deixa a impressão de que tem dois padrões de cobertura: um, melhor, para o Congresso; outro, menos atento e com menor ambição jornalística, para a Assembléia paulista e a Câmara Municipal de São Paulo.

A boa cobertura cita a abstenção em primeira votação e ausência na segunda da vereadora Soninha Francine (PT). O jornal mostra que não se constrange em cobrir a atuação de uma vereadora que é sua colunista. Mas faltou ouvi-la: por que se absteve, por que se ausentou?

É uma conta difícil, a esmagadora maioria dos vereadores não tem interesse em contribuir para que ela seja feita, mas a Folha deveria buscar uma projeção de aumento de gastos da Câmara. Ou dos cortes que serão feitos para bancar as novas despesas.

O jornal também deveria fazer uma lista com todos os vereadores que apoiaram, aberta ou veladamente, o pacote que aumenta recursos a vereadores e certos funcionários e diminui o controle sobre o emprego de dinheiro público.

Erramos

O Erramos sobre falta de crédito da foto de João Donato na capa de hoje da Ilustrada deveria informar que se refere a parte dos exemplares. A edição Nacional que eu recebi não tem crédito. Mas ele consta do exemplar da edição SP que li.

Pesquisa

O gráfico com o resultado da pesquisa CNT/Sensus (pág. A5) dificulta a vida do leitor ao não citar no pé margem de erro, data do campo e número de entrevistados.

O leitor que tem pressa poderia ler apenas o gráfico. Quem buscou nele aquelas informações, foi obrigado a recorrer à matéria.

Sem padrão

Se o jornal considera que é preciso explicar que o DEM é o antigo PFL, faz bem em identificar os parlamentares como ‘DEM, ex-PFL’.

Se está convencido de que a explicação é supérflua, faz bem em usar apenas ‘DEM’.

Hoje, contudo, a Folha segue a não padronizar.

E Alckmin?

A reportagem ‘Governo Serra não é contra a CPI’ (pág. A7) é mais um passo da Folha na até agora cobertura mais completa sobre o confronto para instalação da CPI da Nossa Caixa na Assembléia.

Faltou hoje uma informação: qual a atuação do ex-governador Alckmin? Ele articula contra a CPI?

A propósito, a última informação que li sobre o ex-governador e ex-candidato à Presidência dava conta de que ele passa uma temporada como aluno da Universidade Harvard. Há interesse público em saber o que Alckmin estuda, como vive, como se sustenta. Vale reportagem.

MST e Lula

O furo sobre a mudança de postura do MST em relação ao presidente da República é muito bom (‘MST decide fazer ataques diretos a Lula’, pág. A8).

A Folha não deu o maior espaço à mobilização do ‘abril vermelho’ pelo país, mas, bem informada, revelou a informação mais importante.

O jornal prestaria um serviço ao leitor se informasse quanto somam os repasses do governo federal a programas do MST.

Cidade histórica

A retranca ‘‘Abril vermelho’ lembra massacre de Carajás em 96’ (pág. A8) e a nota ‘Memória’ (pág. E2) se referem ao município onde houve o massacre de 1996 como ‘Eldorado dos Carajás’. Trata-se de erro costumeiro da imprensa.

O correto é ‘Eldorado do Carajás’.

TV sem imagem

O texto ‘França leva à TV campanha eleitoral austera’ é interessante, mas há um problema, de natureza que vai ser cada vez mais debatida no jornalismo diário, que caminha para uma era, pelo menos, de ‘jornais híbridos’ (impressos e online).

Trata-se de matéria, em boa parte, sobre imagem. Como no velho jornal, ela descreve.

Faltou algo importante: remeter aos links onde, na Internet, o leitor/espectador possa assistir aos vídeos citados.

E as TVs por assinatura, no Brasil, mostram a propaganda em algum canal francês?

O jornal não deveria se contentar em descrever, mas em indicar ao leitor o caminho para ele mesmo assistir ao material e tirar suas próprias conclusões.

Grande história

A Folha, que ontem não teve a história do dia, o resgate do bebê de dez meses no prédio invadido em São Paulo, traz hoje um caso saboroso (‘Calouro por acaso’, pág. C2): o professor que, desafiado pelos alunos, passou no vestibular da USP.

História desperdiçada

A nota ‘Ladrão cola lábio de vítima para evitar denúncia’ (pág. C3) é, na verdade, uma boa pauta. O leitor não é informado do que aconteceu. A boca ficou fechada? Não foi possível falar? Como descolou?

Terminologia jurídica

A matéria ‘Jovens são acusados de tramar morte via web’ (pág. C4) informa na primeira frase que quatro jovens são ‘acusados’ de planejar um assassinato.

O leitor tem o direito de perguntar: acusados por quem? A prerrogativa da acusação é do Ministério Público, que não é citado.

Os quatro jovens não foram nem indiciados pela polícia (se foram, o texto não informa).

Diz o texto que os jovens ‘aguardam o processo em liberdade’.

Que processo? Se a polícia não indiciou e o MP não denunciou, não há processo.

Pior: o advogado de três jovens afirma que não existe nem sequer inquérito. Como o jornal não diz que há, parece que o advogado tem razão.

Um caso de interesse jornalístico teve seu relato prejudicado pela impropriedade terminológica que confunde, em vez de esclarecer.

Apagão aéreo

A edição SP da Folha não tem a informação que rendeu a manchete do ‘Globo’, ‘Controladores militares agora ameaçam com baixa coletiva’, acompanhada da linha-fina ‘Duas semanas após motim aéreo, categoria se reaglutina e faz assembléia em Brasília’.

É uma pena.

Mesmo que a ameaça não se concretize, ela é notícia.

A Folha se mostra menos informada do que o concorrente sobre o movimento dos controladores militares. Informa no pé do box de um módulo que uma associação ‘fez uma assembléia informal ontem em Brasília, na qual entre 50 e 100 controladores teriam demonstrado a insatisfação com a situação’.

Em algum momento, a Folha soube do que ocorria. O mesmo box (‘A pedido dos controladores, OAB negociará’), na edição Nacional, afirma na última linha: ‘A categoria estuda pedir baixa coletiva’.

Poderia ou não ser manchete, essa é outra questão. Mas se trata de informação merecedora de destaque. O jornal a conhecia. Em uma edição, condenou-a ao pé de box. Em outra, suprimiu-a.

Pelo telefone

A reportagem de capa da Ilustrada, sobre o lançamento de CDs e o show de João Donato, foi feita por telefone, como esclarece, com transparência, o texto. O repórter fala da ‘calma que caracteriza sua música’.

A legenda da foto informa que o músico vive no bairro carioca da Urca.

Se a entrevista tivesse sido feita pessoalmente, talvez a observação da vida de João Donato no pacato e aprazível bairro ajudasse a compor um perfil mais rico.

É uma pena que a reportagem para a capa de um caderno seja feita por telefone, quando o personagem está a apenas 400 km de distância.

Velho lugar-comum, cujo conteúdo permanece válido: lugar de repórter é na rua.

Que emissora?

A nota ‘Rosa Choque’ (pág. E2) fala de ‘Walter Zagari, vice-presidente comercial da emissora’.

Que emissora? O leitor não é informado.

Pra frente, Brasil

O texto ‘Brasil busca um lugar em Cannes’ afirma que ‘faltou coragem’ ao diretor-geral do Festival de Cannes para selecionar o filme ‘Cidade de Deus’ na disputa principal em 2002.

Concordo.

Mas a afirmação é imprópria para texto noticioso. Não é partido que repórter deva tomar.

A mesma matéria fala de dois irmãos que se tornaram ‘lendários’. Imagino que eles não sejam lendas, mas legendas. O correto seria ‘legendários’.

A arte da mesma matéria diz que ‘Tropa de Elite’ ‘traz Wagner Moura em seu melhor papel’. É editorializar demais uma arte. O jornal tem espaços suficientes para opinião.

Serviço

O relato sobre o documentário ‘Santiago’, de João Moreira Salles, é bem feito e tem muitas informações interessantes.

Do ponto de vista do leitor, falta um dado elementar: os pobres mortais que não freqüentam festivais já podem assistir ao filme? Ele está em cartaz em que cidades? Se ainda não é possível, há data para estréia?

10/04/07

O Apagão Aéreo foi o principal assunto da Folha e do jornalismo brasileiro nos últimos dez dias.

Com inteira razão.

Os leitores do jornal, que em parcela expressiva são usuários da aviação, têm interesse em saber como foi o movimento ontem nos aeroportos do país, quais são as previsões para hoje, os próximos dias e semanas. O caos reforça nas pessoas a necessidade de se programar com esmero.

Também há interesse público e jornalístico em saber como a crise evolui; como ficou a desmilitarização da aviação civil; que passos foram dados (se é que foram) na Justiça Militar para julgar sargentos e, eventualmente, oficiais; o que o governo faz (se faz) para evitar um novo apagão; como os passageiros estão sendo tratados pelas empresas no esforço para fazer valer os seus direitos, inclusive o de ressarcimento do dinheiro pago por viagens que não foram realizadas; como os centros de controle estão operando; se há segurança para os vôos; quais são as ações do comando da Aeronáutica; como os sargentos se organizam (no caso de se organizarem) para os próximos passos em seu movimento; as conseqüências para os passageiros de toda a refrega política.

Os leitores da Folha não souberam nada disso hoje.

Com enorme surpresa _aqui, no mau sentido_, não encontraram (na edição SP) nem sequer um título para o Apagão Aéreo. A única notícia está escondida na segunda parte de uma pequena matéria no pé da pág. C3 a respeito de caso judicial sobre overbooking da TAM. No meio do texto, se lê declaração do presidente Lula, a porcentagem de atrasos no aeroporto de Curitiba e um parágrafo sobre como os controladores receberam as afirmações do presidente.

É frustrante para o leitor, que busca no seu jornal informações sobre temas que lhe afetam diretamente, encontrar pouco mais que nada.

A Folha não errou ao dar o destaque que deu à crise aérea. É por isso que surpreende o silêncio de hoje.

Infraero

A Folha deu chamada no pé da primeira página sobre o afastamento de quatro funcionários da Infraero. Reservou a manchete _acertadamente, na minha opinião_ para os números da economia (‘Risco-país e Bolsa batem recorde; dólar recua mais’).

O ‘Estado’ manchetou: ‘Governo demite na Infraero para esvaziar CPI do Apagão’.

As coberturas dos jornais têm uma diferença gritante: o ‘Estado’ identifica nos afastamentos na Infraero, decididos pelo conselho de administração, uma tentativa do governo de enfraquecer a articulação para a criação de CPI sobre a crise aérea.

A Folha não faz nenhuma associação entre a medida administrativa e o embate no parlamento.

Um fato, ao menos, faltou na cobertura da Folha. As declarações do senador Arthur Virgílio, citadas pelo ‘Estado’ (‘Estão querendo entregar quatro bois para deixar passar uma boiada’, disse o tucano).

Os pés de Edmundo

A primeira página publicou no alto foto dos pés de Edmundo, calçando chinelos. Posso estar enganado, mas não haveria relevância jornalística nem na imagem nem no fato de calçar chinelos.

Primeiro, porque a chamada dá a entender que havia treino do time (‘Edmundo vai de chinelos ao treino do Palmeiras para se recuperar’). Não havia. Os jogadores que atuaram no domingo, como Edmundo, não treinaram na segunda. Fizeram apenas exercícios.

Segundo, porque a expressão ‘para se recuperar’ induz o leitor a imaginar algum problema físico mais grave. Dentro, descobre-se que o atleta estava com uma unha encravada.

Em Esporte (pág. D1), o título é mais problemático (‘Calçando chinelos, Edmundo faz seu retorno ao futebol’).

Não é relevante Edmundo estar de chinelos. Jogadores de futebol também usam chinelos. E, se Edmundo estava com a unha encravada, não iria usar tênis ou sapatos.

O indecifrável é o ‘retorno ao futebol’. No domingo, Edmundo disse que pensava em parar. Mas não anunciou que deixava a carreira. Por isso, não ‘retornou’.

A linha-fina dá a entender que havia treino (‘Ídolo aparece no treino do Palmeiras, mas permanece no departamento médico, para tratamento de unha encravada’). O texto esclarece que quem jogou na véspera fez ‘trabalho de recuperação na academia’. O treino parece ter sido dos reservas, não dos titulares.

A matéria diz que, devido à perda recente de pênalti, Edmundo ‘abalou-se mais que o normal’. O que seria o abalo ‘normal’ ?

A Folha informa que dirigentes palmeirenses desconfiam que inexista a proposta para Edmundo jogar nos EUA. Além de publicar essa informação, o jornal faria um gol se descobrisse se a proposta existe de fato ou não.

Impressiona que a unha encravada de Edmundo tenha rendido o material de hoje.

Impressiona mais que a célebre matéria sobre uma unha de Ronaldo na Copa de 2006.

O jornalismo esportivo ganha quando, nos textos em que o recurso cabe, põe o pitoresco, molho, sabor, pimenta em sua produção. A Folha costuma fazer isso com talento.

Não é, infelizmente, o que ocorreu hoje na cobertura da crise profissional e existencial de Edmundo.

Painel do Leitor

Duas cartas de hoje no Painel do Leitor inspiram pautas interessantes: um balanço da Osesp, ajudando o conjunto dos leitores, e não apenas os melômanos, a entender o que está em jogo na manutenção ou não do maestro Neschling; o jornal ainda não fez, que eu tenha lido (posso estar enganado), uma contagem profunda e independente sobre quantos gols Romário marcou _seria um bom serviço aos leitores.

Nossa Caixa

A principal matéria de Brasil (pág. A4), sobre a CPI da Nossa Caixa, tem o mérito de mostrar como, na Assembléia de São Paulo, o PSDB atua como o PT no Congresso em Brasília, e vice-versa.

Há uma omissão: o leitor fica sem saber qual o movimento do governador Serra. Ele joga para preservar sua base e Alckmin ou prefere o desgaste do ex-governador?

A sub sobre a queda das ações da Nossa Caixa tem uma insuficiência: não explica por que isso ocorreu.

Ao jornal diário não basta noticiar. Tem que explicar.

Renascer

Há passagens incompreensíveis no texto sobre a acusação do Ministério Público Federal contra os fundadores da Igreja Renascer (pág. A7).

Diz que ‘a produtora omitiu declaração de depósitos bancários de origem não comprovada e reduziu o valor de tributos a pagar do Imposto de Renda, do PIS e das contribuições sociais’.

Que produtora? O texto não diz.

No pé, um advogado fala de uma empresa.

Que empresa?

O leitor também não é informado.

Padronização

Em textos de Brasil e Cotidiano, o jornal trata os antigos políticos pefelistas às vezes como pertencentes ao ‘DEM’, às vezes ao ‘DEM, ex-PFL’.

Seria bom padronizar.

Iraque

A abertura da retranca ‘Carismático, Al Sadr destaca-se entre xiitas’ (pág. A9) permite que o leitor imagine que o falecido ditador Saddam Hussein era xiita.

Ele era sunita. O jornal poderia informar.

Timor

Em vez de noticiar como foi ontem o pleito em Timor Leste, a Folha preferiu publicar uma entrevista (interessante) com uma professora da UNB. Entrevistas como essa enriquecem o jornal.

Mas o dia era para contar como estava a apuração, os resultados, como transcorreu a votação.

O leitor ficou sem saber.

As poucas informações ficaram perdidas na introdução da entrevista.

Argentina

O texto de alto de página ‘Morte de professor mobiliza milhares’, sobre manifestações na Argentina, não cita o presidente Kirchner.

O que ele diz sobre os protestos? Quais são suas atitudes? Se as centrais sindicais pedem reajustes salariais, como ele reage?

A Folha deixa o leitor sem saber.

‘O Globo’ e o ‘Estado’ trazem informações sobre o presidente.

Dono de restaurante

Em legenda de foto e no texto-legenda encorpado, um dono de restaurante é chamado de ‘restauranteur’ na pág. B2.

O correto é ‘restaurateur’.

Custo subestimado

A nota ‘Estádio poderá ter nome estrangeiro’ (pág. D1), sobre o estádio olímpico de Pequim-2008, diz que ‘mais de R$ 129 mi foram gastos em sua construção’.

Na verdade, o custo do estádio é de várias vezes aquele valor.

Mortes nas estradas

A matéria da capa de Cotidiano tem informações importantes.

O que ela dá a entender, porém, é que inexiste uma estatística nacional sobre mortes nas estradas, pelo menos durante a Semana Santa. Tal cálculo teria que incluir as rodovias federais e todas as estaduais.

É isso mesmo? O(s) governo(s) ignora(m) o número?

Nesse caso, além de informar o fato, a Folha poderia produzir uma estatística independente. Já fez isso com a dengue e a apreensão de drogas.

Dá trabalho, mas se presta um serviço ao leitor.

O drama do menino

A Folha não tem a história mais dramática do dia.

O jornal publica internamente a fotografia feita por Thiago Bernardes, do ‘Diário de São Paulo’, mostrando um menino sendo resgatado do edifício São Vito após repressão policial a invasores.

O menino João Vítor, de dez meses, estava desacordado, com dificuldades respiratórias devido ao emprego de bombas de gás.

Ao leitor, é bom que o seu jornal informe antes. Quando isso não é possível, para o leitor o fundamental é ser informado.

A Folha deveria recuperar a história do bebê e também ouvir a PM sobre os métodos que usou.

Exército nas ruas

Foi muito bem a Folha na cobertura sobre segurança pública no Rio. Faz bem o jornal em exercer o ceticismo ao abordar as propostas do governador Sérgio Cabral.

A retranca ‘Ação da Força Nacional no Rio inclui apreensão de passarinho e ‘fogo amigo’’ parece a mais esclarecedora já publicada sobre a equipe de policiais enviada ao Estado do Rio.

Seria interessante o jornal comparar as propostas bombásticas de Cabral com os fatos na área de segurança. Talvez descubra que a principal reação do governador aos crimes de repercussão seja justamente isso: declarações de repercussão.

Também caberia indagar ao governo federal por que o Exército pode invadir favelas no Haiti e não no Rio.

Erramos

O Erramos (publicado hoje) sobre a linha-fina da capa de Cotidiano do domingo passado, referente a relatório sobre controle aéreo, trata de sobretítulo. Ocorre que a linha-fina estava abaixo do título. Logo, não seria um sobretítulo.

Como explica acertadamente o Erramos, a linha-fina não poderia dizer que o relatório da Ifatca (Federação Internacional das Associações de Controladores de Tráfego Aéreo) ‘foi enviado a Lula’.

Diz o Erramos: ‘o que a entidade enviou ao presidente foi uma carta para oferecer assessoria e consultoria’.

O que escapa ao representante dos leitores é por que não houve Erramos da manchete dominical (‘Entidade alertou lula de falhas no controle aéreo’).

Se o relatório não foi enviado a Lula, o presidente não foi alertado pela Ifatca, que mandou apenas uma carta com a proposta de consultoria.

09/04/07

Esta crítica aborda três edições da Folha: as de hoje, ontem e anteontem.

Sábado, 7 de abril de 2007

Clima

O noticiário da Folha sobre o relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática) reuniu uma série de acertos: o envio de repórter a Bruxelas, o que deu temperatura jornalística e densidade à cobertura; os quatro altos de página plenamente justificáveis pela relevância do tema; o emprego amplo de artes informativas; um cardápio com a conta paga pelos mais pobres, o confronto entre políticos e cientistas, a crítica de um climatologista argentino sobre biocombustíveis, o pingue com o vice-chefe do IPCC.

A Folha superou a concorrência e ofereceu uma cobertura muito boa sobre o assunto de sua manchete.

Não foi melhor por dificultar a leitura com terminologia cifrada, para iniciados:

a) A arte da primeira página fala em ‘recarga dos aqüíferos’. O leitor não é obrigado a saber o que é isso.

b) O texto ‘Pressão de políticos ‘suaviza’ relatório’ (pág. A17) relata a declaração: ‘Esse sumário não é mais para os ‘policymakers’, é dos ‘policymakers’’. O que é ‘policymaker’?

c) Arte na pág. A19 diz que ‘até 40% das espécies endêmicas nos hotspots de biodiversidade se extinguem até 2100 com um aumento de 3,5% na temperatura’. O que são espécies endêmicas? E hotspots de biodiversidade?

d) Outra arte na pág. A19 reproduz um jargão que se espalha por várias editorias: ‘matriz energética’. Isso significa fontes de energia? Em caso positivo, é melhor preterir o código de especialistas. Se for imprescindível empregá-lo, é preciso explicar do que se trata.

e) O quadro ‘Perguntas e respostas’ (pág. A18) indaga: ‘O que é aquecimento global?’. Não responde, porém.

Octogenários ao volante

A boa reportagem da capa de Cotidiano sobre o aumento do número de motoristas octogenários deixa de prestar uma informação importante aos leitores: que tratamento as seguradoras dão aos motoristas idosos? Elas fazem seguro? Cobram mais ou menos do que de condutores de outras faixas de idade? Há cláusulas prejudiciais aos motoristas? A carteira de seguros de motoristas de 80 anos para cima cresceu?

Novo colunista

Aparentemente, faltou dizer, na apresentação (pág. E3) do novo colunista da Ilustrada, Antônio Cícero, que ele também é professor de filosofia. Sublinhando sua condição de poeta e letrista, o texto informa que o autor é ‘habituado à produção de ensaios’. É mais que isso: dá (ou deu) aulas de filosofia em cursos universitários. O fato é importante, ainda mais para entender a formação do autor que na coluna de estréia (pág. E12) passeia pelo campo ao qual se dedica (ou se dedicou) na academia.

Acabamento

Talvez seja um detalhe, mas a contradição se refere a dois espaços que exigem capricho redobrado: a primeira página do jornal e a capa da Folhinha. Na primeira, o sobrenome do menino que junta dinheiro se escreve de um modo (‘Janequine’). No caderno infantil, de outro (‘Janequini’).

A cor do dinheiro

A retranca ‘É importante, mas não é tudo’ (pág. 4 da Folhinha) se refere a dinheiro como ‘a verdinha’. É o modo como se costuma falar do dólar, não do real.

Domingo, 8 de abril de 2007

Manchete versus reportagem

A manchete ‘Entidade alertou Lula de falhas no controle aéreo’ soa mal aos ouvidos (‘alertou… de’, em vez de ‘sobre’), mas esse não é o seu maior problema jornalístico.

Combinada com a linha-fina, ela dá a entender que o relatório feito a partir de vistoria no Cindacta-1 foi encaminhado ao presidente da República. Não é o que diz a (ótima) reportagem.

Como descreve a chamada da primeira página, a Ifatca [Federação Internacional das Associações dos Controladores de Tráfego Aéreo] enviou a Lula uma proposta de consultoria _não o relatório sobre as falhas no controle aéreo.

Na capa de Cotidiano, a reportagem informa que o relatório foi enviado a duas entidades, de aviação civil e pilotos. O relatório expõe o caos no controle aéreo do Brasil.

No entanto ele não foi enviado a Lula, e sim uma carta ‘para oferecer consultoria’. O trecho da carta (remetida a Lula pela Ifatca) publicado pela Folha não fala do conteúdo do relatório. Ou seja: Lula não teria sido ‘alertado’.

A combinação de título e linha-fina de Cotidiano também dá a entender que o relatório foi enviado a Lula (‘Relatório já apontava controle aéreo inseguro’ e ‘Documento da federação internacional dos controladores, feito após acidente com o Boeing da Gol, foi enviado a Lula’).

É possível que o relatório tenha sido em algum momento mandado para o Planalto. Mas essa informação não consta da reportagem.

Brilhantes

Angeli no domingo e Jean no sábado assinam trabalhos dignos de figurar em antologia mundial de cartuns sobre pobreza e desigualdade.

Painel

A nota ‘Trinca’ afirma que Zaqueu Teixeira, assessor do ministro Tarso Genro, é delegado de Polícia Federal.

Teixeira é delegado de Polícia Civil no Rio de Janeiro.

Datafolha e reportagem

Os números do Datafolha sobre pena de morte, eutanásia, aborto e união homossexual (em Brasil) foram transmitidos sem que o jornal agregasse algo de jornalisticamente significativo a eles.

No caso da pena de morte, poderia contar como as opiniões se formam. Gente que defende e não defende a pena. Quem mudou de posição. Contar histórias. Lembrar erros judiciais recentes, e o que eles poderiam significar em um país com pena de morte.

O jornal não deveria se limitar a divulgar os números do Datafolha, e sim, a partir deles, produzir reportagens.

Datafolha e pluralismo

O texto com a pesquisa Datafolha sobre pena de morte (pág. A4) só tem comentários de quem é abertamente ou sabidamente contra a medida.

O texto com os números sobre aborto (pág. A8) publica comentário só de quem, aparentemente, é a favor da mudança da lei.

O que trata de união homossexual (pág. A8) só tem a palavra de deputado favorável à mudança na legislação.

A Folha registrou o ‘pensamento único’.

É direito do leitor e dever do jornal assegurar pluralismo em suas páginas, como recomenda o projeto editorial.

Curiosamente, os eleitos para falar estão na contramão da maioria das pessoas consultadas pelo Datafolha.

Maior brasileiro, menor espaço

Quando 200 personalidades se pronunciaram sobre o ‘Maior Brasileiro de Todos os Tempos’, no domingo anterior, o jornal concedeu duas páginas inteiras ao assunto. Para anunciar o resultado da eleição com 66.303 eleitores na Folha Online, limitou-se a um texto curto em um módulo de pé de página.

Não publicou nenhum comentário sobre a queda de Getúlio Vargas do primeiro lugar com as personalidades para o quarto na sondagem online.

Jornalismo acrítico

Parece contraditório com o jornalismo crítico preconizado pela Folha o texto ‘Fiocca anuncia números recordes no dia de sua despedida do BNDES’ (pág. B2).

Com tom mais promocional que jornalístico, a nota diz que Demian Fiocca deverá ‘fechar seu período’ à frente do BNDES com ‘chave de ouro’. Que os números ‘impressionam’. Os valores ‘espantam’. ‘Todos os indicadores são extremamente favoráveis.’ ‘Números recordes.’ Fiocca ‘vai deixar claro que parte desses recordes se deve também à gestão do banco’. ‘O sucessor de Fiocca irá ter uma vida bem facilitada.’ ‘Trata-se do melhor momento da história do banco.’

É possível que o trabalho de Demian Fiocca tenha sido mesmo excelente.

Mas a Folha, em nome da independência editorial, deveria ser mais sóbria ao tratar do desempenho de gestores públicos.

Sem outro lado

A boa entrevista com o cavaleiro Luiz Felipe Azevedo (pág. D5) foi prejudicada pela ausência do outro lado.

Azevedo atacou o cavaleiro Rodrigo Pessoa e a Confederação Brasileira de Hipismo.

Nem Pessoa nem a CBH tiveram o direito de responder.

O leitor poderia tirar suas conclusões com mais segurança se fosse assegurado o pluralismo na discussão sobre a seleção da equipe de hipismo para o Pan.

Quanto vale?

A interessante reportagem ‘Michelangelo de Aparecida’, da capa da Ilustrada, deixa de informar ao leitor alguns dados relevantes.

O artista sacro Cláudio Pastro diz que na Basílica de Aparecida ‘só o ouro é alemão; e o azulejo das cúpulas, que é porcelana vinda do Japão’.

O artista conta que mandou derrubar uma estátua de cimento porque ‘cimento é um material chulé’.

O leitor ficou sem saber quanto custou até agora e quanto custará a a obra artística em curso.

Quanto a Igreja pagará? Com ajuda do Estado e da iniciativa privada?

Quem paga o trabalho do artista?

Não se trata de questão privada. Até porque é preciso esclarecer se há uso de verba pública.

A comparação entre as basílicas de Aparecida e São Pedro (pág. E3) poderia, se possível, informar quantos quilos de ouro há em cada local.

Revista da Folha

O texto ‘‘Hillzilla’ versus ‘Obambi’’ (coluna América, pág. 6 da Revista da Folha) é um exemplo de como se pode escrever de modo informativo, saboroso e claro (ou didático).

As expressões em inglês foram traduzidas e contextualizadas, sem desrespeitar a inteligência do leitor.

Segunda, 9 de abril de 2007

Fotografia

O nome correto do fotógrafo da France Presse, autor da foto do tenista Saretta na primeira página, seria Antonio Scorza, e não Scoiza, como aparece no crédito. O nome da agência está escrito ‘France Press’, e não ‘Presse’.

Padronização

A primeira página e a introdução da entrevista do ministro José Gomes Temporão sobre aborto (pág. A14) empregam ‘descriminalização’.

Antes da declaração do cardeal Scheid (pág. A14) aparece ‘descriminação’.

É um problema recorrente na discussão sobre drogas: o jornal tem preferido ‘descriminalização’, embora norma de anos atrás recomende ‘descriminação’ .

Seria bom que houvesse um padrão definido.

Progressismo

A retranca ‘Setores mais progressistas vêem avanço’ (pág. C3), da reportagem sobre mudança na Lei de Crimes Hediondos, se refere a ‘setores jurídicos mais progressistas’.

O que é ‘mais progressista’?

É querer o progresso?

Nesse caso, o progresso é identificado com uma determinada opinião, e não com outra, o que implica editorialização da notícia.

Quanto mais juízo de valor faz, mais a reportagem perde.

Lado único

A matéria ‘Mesmo alteradas, fachadas infringem a lei’ (pág. C4) só traz a palavra dos técnicos da Prefeitura de São Paulo.

O que têm a dizer os lojistas cujos estabelecimentos foram fotografados?

O leitor ficou sem saber.

Homem-peixe

Embora bem escrita, a reportagem ‘Homem-peixe encerra desafio’ (pág. D5) poderia ser melhor caso a repórter estivesse em Belém, e não na Redação.

A matéria informa que o nadador foi levado para o hospital, ‘seguiu direto’.

Mas publica declarações dele. Quando elas foram dadas?

A arte parece identificar como rio Amazonas trecho que, no Brasil, é conhecido como rio Solimões.’