Na edição de 19/9 do Washington Post, a maneira diferenciada de como foi dada a notícia de dois assassinatos em Washington causou indignação em alguns leitores. No sábado (17/9), dois homens foram mortos em um intervalo de 45 minutos em duas regiões diferentes da cidade. Um deles era Greg Shipe, empresário de 34 anos, morto a tiros por um assaltante desconhecido enquanto passeava com seu cachorro em uma rua movimentada de Mount Pleasant. O fato foi contado na primeira página da seção Metro do jornal, com entrevistas de vizinhos, de um colega de faculdade e de um membro do Conselho Administrativo da região, Jim Graham, que afirmou que se tratava de ‘evento horrível’ e que teria sido o primeiro assassinato por arma de fogo em Mount Pleasant em quase dois anos. A outra vítima era Michael Lanham, de 32 anos, que levou pelo menos dois tiros em Barnaby Terrace, de acordo com a polícia. Ele foi declarado morto no hospital da universidade Howard e o fato foi relatado em uma nota de três frases na coluna Metro in Brief.
Em nenhuma das matérias foi mencionada a raça das vítimas, mas meia dúzia de pessoas mandaram e-mails ou telefonaram para o jornal a fim de expressar espanto e, em alguns casos, fúria, pelo contraste dos homicídios que os leitores assumiram ser de um homem branco em Mount Pleasant e o de um negro em Barnaby Terrace – o que foi confirmado depois, como conta o ombudsman do jornal, Michael Getler [25/9/05].
Um leitor mandou um e-mail para dizer que o jornal ‘comprovou, embora inadvertidamente, o racismo inerente na sociedade’. Um outro telefonou para expressar seu desgosto em relação ao caso. Os comentários são duros para qualquer jornal, e em especial para o Post, que é publicado em uma cidade predominantemente negra e que tem uma das redações mais diversificadas racialmente entre os maiores jornais dos EUA, principalmente na seção Metro.
Na redação, o editor da seção, Robert McCartney, e dois editores de notícias envolvidos nas duas matérias alegam que o caso de Mount Pleasant mereceu mais destaque por dois aspectos relevantes – foi o primeiro homicídio na região em dois anos e pareceu ser um assassinato aleatório de um transeunte. A comunidade ficou muito abalada com o crime e a raça não teve peso algum na decisão. ‘Os repórteres não sabiam inicialmente que a vítima era branca. No mês passado, uma senhora de 46 anos, que era negra, foi morta a tiros e a matéria foi capa da Metro’, afirmou McCartney. Sobre o outro caso, um editor defendeu-se dizendo que a polícia contou sobre o homicídio no sábado à noite, 20 horas depois do acontecido, e não havia muitas informações sobre o caso. Um outro editor afirmou que se a vítima fosse adolescente, eles teriam feito uma investigação mais profunda para ver se teria alguma relação com drogas – como é feito com homicídios de vítimas menores de 17 anos –, mas como a cidade teve 138 homicídios neste ano, não há como escrever uma matéria sobre cada um deles.
Getler fica do lado do jornal neste caso. Como leitor, ele acredita que com o que foi apurado pelo jornal no sábado à noite, o homicídio de Mount Pleasant foi uma decisão acertada para a capa do Metro. Além disso, o jornal já colocou várias outras matérias policiais envolvendo não-brancos na primeira página desta seção. Mas também é verdade que há um grande número de assassinatos em áreas predominantemente negras que acabam sendo tratados nas colunas de maneira resumida, que poderiam merecer uma maior cobertura – como aconteceu em um artigo de Kevin Merida, publicado em agosto.
Atualmente, não há muitos repórteres ou editores que morem em áreas predominantemente negras. Não são muitos os jornais, incluindo o Post, que têm fontes nestas comunidades que possam ser acessadas perto do horário do fechamento do jornal. Meia dúzia de reclamações não é um número grande. Em algumas ocasiões, o ombudsman afirma receber mais de mil e-mails em sua caixa de mensagens, mas Getler acredita que as reclamações de meia-dúzia de leitores devem ser vistas como um alerta de uma incoerência que merece a devida atenção.