Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Regina Lima

Não é de hoje que a Agência Brasil vem publicando, mensalmente, o resultado das pesquisas realizadas pelas duas instituições que medem o índice de desemprego no país: a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com dados de seis regiões metropolitanas do país, e a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), baseada em sete regiões metropolitanas. De acordo com o nosso levantamento, nas matérias pesquisadas a partir de 2002 (402 sobre PME e 249 sobre PED), os resultados são apresentados em matérias distintas e, com uma exceção, não aparece nenhum tipo de comparação entre os índices diferentes levantados por essas instituições. Apenas uma matéria, publicada em 28 de fevereiro de 2007, se preocupou em mostrar a disparidade dessas informações. “Diferença de métodos faz desaparecer 200 mil desempregados na Grande São Paulo”.

Foi exatamente a disparidade dos índices levantados pelos dois institutos e apresentados pela Agência Brasil no mês de março, em matérias distintas, que provocou a manifestação do leitor Wolney Castilho Alves, dirigida à ouvidoria no dia 29 de março. Os números a que o leitor se refere aparecem nas seguintes matérias: Taxa de desemprego sobe 10,1% em fevereiro, aponta Dieese e Taxa de desemprego em fevereiro fica em 5,7% e é a menor para o mês desde 2003, publicada pela ABr no dia 22 de março. Veja o comentário do leitor:

“A informação sobre aumento nos índices de desemprego, segundo o Dieese, mostra números muito diferentes dos divulgados pelo IBGE seis dias atrás. O artigo informativo da EBC não faz nenhuma menção a essa disparidade. Perde, assim, a oportunidade de elevar a qualidade da comunicação social contextualizando minimamente a informação. A carência da formação de cenários bem informados e contextualizados pela sociedade se deve em grande parte à péssima qualidade da imprensa e dos demais meios de comunicação no Brasil. A EBC deve se diferenciar, se tornando órgão confiável [para] entendimento da situação vigente, no caso, a situação e evolução do desemprego, segundo fontes e critérios diferenciados”.

A Diretoria de Jornalismo da EBC respondeu ao senhor Wolney: “Agradecemos a sugestão do leitor. Vamos levar em consideração nas próximas matérias que faremos sobre índices de desempregos do IBGE e o Dieese”.

Ao compararmos as duas matérias, percebemos que são 4,4 pontos percentuais de diferença. Para dimensionar essa diferença, as próprias matérias fornecem os números: 1,4 milhão de pessoas desocupadas na pesquisa do IBGE e 2,248 milhões na pesquisa do Dieese, uma diferença de 848 mil, que seria mais de 1 milhão se o tamanho da população em idade ativa (de 10 a 64 anos) na área coberta pela pesquisa do Dieese não fosse 12% menor do que na pesquisa do IBGE (37,168 milhões contra 42,2 milhões).

Reunindo as informações dessas matérias com outras disponíveis nos portais oficiais do IBGE e do Dieese e em outros sites na web, identificamos que a classificação da relação das pessoas com o mercado de trabalho – ocupados, desempregados ou economicamente inativos – depende de uma combinação de critérios: atividade, disponibilidade e procura de trabalho. A diferença entre as duas pesquisas está na definição operacional desses critérios e nas combinações que determinam as classificações.

Nas matérias publicadas pela Agência Brasil nada disso aparece para ajudar o leitor a ter uma ideia mais clara a respeito do significado dos índices: apenas os totais de ocupados e desocupados (PME) e desempregados (PED), as taxas de desemprego e suas variações mensais em comparação ao mês anterior e ao mesmo mês do ano passado (ambas as pesquisas) e, no caso da PED, as variações regionais e setoriais.

Para quem se interessa em obter mais informações sobre a composição dos índices e a disparidade entre os resultados das duas pesquisas, é fácil encontrar respostas prontas na internet, inclusive, em sites populares como Yahoo! Respostas, indicando que o nosso leitor, o senhor Wolney, não está sozinho na sua dúvida. A explicação simples aponta que a PED, que adota um conceito mais amplo do desemprego, inclui entre os desempregados duas categorias de “desemprego oculto” excluídas na PME e que os trabalhadores em uma dessas categorias, desemprego oculto por trabalho precário (atividades na base de “bicos”) são considerados ocupados na PME. Essas diferenças aumentam o contingente de desempregados na PED por um lado e, de ocupados na PME, por outro.

Ainda assim, depois de uma análise da definição das categorias e dos dados disponíveis nos sites dos dois institutos de pesquisa, restam perguntas em relação ao tamanho das diferenças na PEA (população economicamente ativa, que corresponde a 60% da população em idade ativa na PED e 56,9% na PME) e no desemprego aberto (uma categoria comum às duas pesquisas, porém com um valor de 5,7% na PME e 7,7 % na PED), bem como em relação ao tamanho do contingente dos trabalhadores precários classificados como desempregados na PED e ocupados na PME. As diferenças entre as duas pesquisas nessas categorias parecem divergir substancialmente do que seria indicado pela explicação simples.

De posse dessas informações, gostaríamos de contribuir com algumas sugestões para futuras investigações a serem feitas pela Agência Brasil. Uma delas é não publicar esses resultados em matérias separadas. Outra é averiguar até que ponto a explicação simples dá conta das diferenças. As perguntas que foram levantadas poderiam integrar a pauta de uma reportagem que pretenda explicar a diferença entre os resultados das duas pesquisas de uma maneira que seja compreensível sem simplificar demais a explicação. Uma boa explicação também poderia citar exemplos, cuidadosamente escolhidos, para ilustrar as situações óbvias e as que não sejam tão óbvias em que a classificação da relação com o mercado de trabalho varia de uma pesquisa para outra. Finalmente, levando em conta que uma fonte é sempre consultada para tirar as dúvidas do repórter, observamos que não é o nome ou o cargo que mais determina a qualidade da fonte. Quanto melhores as dúvidas, melhor a fonte.

Até a próxima semana.