Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Suzana Singer

“Os repórteres de política passaram a última semana vivendo do que pinga da caixa de Pandora do caso Cachoeira. A parte da investigação da Polícia Federal que não foi divulgada é alvo da cobiça de toda a imprensa, que disputa cada grampo e cada nova suspeita.

Nessa corrida, a Folha conseguiu bons ‘furos’ que revelaram um provável esquema de envio de dinheiro da construtora Delta, a sexta maior do país, para campanhas políticas por meio de empresas de fachada criadas pelo bicheiro Carlos Cachoeira, que o jornal insiste em chamar de ‘empresário’.

Os males que jorram do escândalo são tantos que uma certa dose de cautela está sendo deixada pelo caminho. Na sexta-feira passada, a Folha apontava um possível envolvimento do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e do bicheiro com base em apenas uma conversa na qual um assessor de Cachoeira diz que o ministro autorizou o desenvolvimento de um projeto, depois de uma reunião em Brasília.

Novas evidências podem surgir, mas, por enquanto, projeta-se uma sombra de dúvida sobre o ministro sem que haja nada de concreto. Qualquer contato com alguém ligado ao bicheiro de Goiás vira sintoma de doença fatal.

A mesma afobação aparece na divulgação de outro grampo, no qual Cachoeira comenta que o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), possui um avião particular em sociedade com dois empresários. O jornal transcreveu a gravação e registrou Perillo negando ter aeronave. Antes de publicar a reportagem, não daria para investigar um pouco mais sobre o tal Cessna?

A Folha tem a vantagem de (quase) sempre dar com destaque o chamado ‘outro lado’. Na última quinta-feira, entrevistou com exclusividade o empresário Fernando Cavendish, dono da empreiteira Delta, que teme falir depois do escândalo.

Só que isso não basta. É preciso frear o açodamento. Não adianta publicar acusações mal embasadas e dar a negativa embaixo, deixando ao leitor a tarefa de tirar uma conclusão. Transmutar migalhas de investigação policial em destaques do noticiário político traz o risco de cometer injustiças tremendas.

A Comissão de Ética Pública da Presidência da República arquivou o processo sobre desvio ético do ex-vice-presidente do Banco do Brasil Allan Toledo. A conclusão foi que ele conseguiu comprovar a origem do R$ 1 milhão movimentado. A notícia deveria estar na Primeira Página, já que as acusações contra ele foram manchete em fevereiro.

Com a faca no pescoço

A foto da ‘Primeira Página’ de anteontem, de Dilma na cerimônia de comemoração do Dia do Exército, em Brasília, provocou indignação em internautas governistas que acusaram a Folha de fazer uma ameaça velada à presidente. Pura paranoia. O inspirado flagrante, feito por Sérgio Lima, lembra a foto surpreendente de Wilton Junior, publicada no ‘Estado de S. Paulo’ em agosto do ano passado e premiada no exterior.”