‘A reportagem de Andresa Boni que abriu o Balanço Social exibido em 24 de setembro, tratando de reciclagem de pneus e materiais usados na fabricação de bicicletas, não foi apenas uma demonstração de como é possível ter olhares novos e interessantes sobre assuntos que, num programa especializado como esse, são inevitavelmente repetitivos. Foi também uma pequena aula de como fazer uma boa reportagem de televisão sobre sustentabilidade. Ou sobre qualquer outro assunto.
Do campo de futebol da escolinha de futebol do Corinthians, feito de grama sintética e borracha reciclada, à velha carroça de um catador de sucata das ruas de São Paulo, passando pelo Instituto Via Viva, por vários departamentos da fábrica da Caloi, por uma sofisticada loja de bicicletas e também por uma típica bicicletaria – idêntica a milhares de outras espalhadas pelo país – a reportagem mostra, detalhadamente, em edição ágil de Alexandre Handfest e Eduardo Beraldo e cuidadosa captação de imagens de Peterson dos Santos, Reinaldo Delfino e Adilson de Paula, todo o processo necessário – e possível – para tornar qualquer bicicleta inteiramente reciclável.
Sem querer reinventar o telejornalismo, o Balanço Social, com essa reportagem, não apenas cumpriu seu objetivo de despertar o interesse do telespectador de TV aberta para um tema importante da sustentabilidade. Também deixou no ar um exemplo para outros programas da emissora, no que refere à preocupação com clareza, ritmo e adequação à linguagem da televisão. Um emblema dessa preocupação, aliás, foi a animação computadorizada produzida para ‘recortar’ uma bicicleta e mostrar o destino reciclável que pode ser dado a cada uma das peças e materiais usados em sua fabricação.
No mesmo programa, duas outras reportagens inspiraram algumas observações. Na que abordou o recondicionamento de computadores – assim como em outras matérias desse tipo já exibidas pelo programa – faltou fazer, de forma enfática, o que provavelmente multiplicaria a adesão de muitos telespectadores: um serviço com endereços ou telefones – de São Paulo e de outras capitais, pelo menos – que pudessem ser acessados pelas pessoas que têm computadores velhos em casa, não sabem o que fazer com eles e têm preguiça de sair procurando uma solução.
Na reportagem com dicas sobre como escolher um posto de gasolina, a boa intenção de aparelhar o telespectador ficou um pouco comprometida pelo exagero nos conselhos da técnica Jussara Vedovelli de Almeida, que propôs aos usuários checar se o estabelecimento tem licença de operação da Cetesb e verificar o funcionamento do equipamento que monitora os tanques e bombas de combustível. Propor esse tipo de comportamento sem que haja qualquer litígio ou flagrante irregularidade na hora do atendimento é como sugerir que as pessoas peçam a carteira do CRM de um médico ao entrar no consultório ou a habilitação do motorista, ao tomar um táxi.
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Luz amarela, 24 de setembro
Doze edições depois da estreia, os apresentadores do Programa Novo, como se viu na noite de 23 de setembro, continuam dando a impressão de estar à procura de espaço não apenas no cenário, mas na própria receita da nova atração juvenil da TV Cultura. A radical informalidade da apresentação e a elasticidade absoluta do script também continuam gerando lacunas de conteúdo, alguma delas acompanhadas de tal constrangimento com a falta do que dizer que nem a admirável capacidade de improvisação dos apresentadores consegue disfarçar.
As reportagens, que poderiam ser um bom contraponto para a falta de assunto e a pulverização de assuntos que tem predominado no cenário, têm sido tão ágeis que terminam rápidas e superficiais, como aconteceu com a matéria de Rodolfo sobre skate, na ida de Roberta a uma feira de games e nos bastidores da gravação do Ensaio com a cantora Pitty.
As enquetes temáticas que antecedem as entradas do link – no programa em questão, comandadas por Carlos Carlos, no Centro Cultural da Juventude – continuam curtas, sem o devido aprofundamento que tinham, por exemplo, no Pé na Rua. E o próprio link tem revelado que conseguir entrevistas interessantes ao vivo, é, ao contrário do que parece, um dos maiores desafios para quem faz televisão. Carlos Carlos, aliás, salvo de uma noite infeliz por Lulina, uma compositora muito engraçada, que o diga.
As mensagens que passam regularmente na tela durante o programa infelizmente não são comentadas na hora pelos apresentadores e bem que mereciam uma seleção mais rigorosa. Até porque quase todas, embora sejam declarações superlativas e estratosféricas de paixão irremediável on line pelo programa ou por algum dos apresentadores, nunca têm qualquer conteúdo adicional que possa ser comentado ou respondido. Algo como o que acontecida com os radioamadores do século passado, cujo objetivo era, acima de tudo, o de conseguir contato entre, por exemplo, Conceição do Rio Verde, em Minas Gerais, e Malmedy, no interior da Bélgica. Assunto, quase sempre, não havia. Nem poderia haver.
Apesar de receber e exibir incessantemente uma profusão de elogios derramados de jovens internautas, o Programa Novo foi criticado com veemência em todos os emails – densos, mas incomparavelmente poucos – que chegaram à caixa de entrada deste ombudsman. Essa óbvia condição de minoria dos críticos manifestos do programa, no entanto, não desautoriza nem pode impedir que todos os envolvidos na produção do Programa Novo façam uma profunda reflexão sobre as lições e atoleiros que surgiram no caminho nessas primeiras semanas.
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Diálogo animado, 23 de setembro
Transcrevo resposta de Quiá Rodrigues, diretor do Animania, sobre análise publicada aqui em 21 de setembro. Ele faz observações importantes sobre formatos anteriores do programa.
Formatos anteriores? Pois é. A resposta de Quiá mostra que a falta de uma boa apresentação a que me referi na análise sobre a estreia do programa na TV Cultura é maior ainda do que o telespectador da emissora poderia imaginar. E inclui a própria Assessoria de Comunicação da emissora, pelo menos no email distribuído hoje, 23 de setembro.
Animania é um programa da TV Brasil, definido no site da emissora como ‘um espaço para exibição, debate e reflexão do processo criativo da animação’, com ‘entrevistas, discussões sobre novas tecnologias, notícias e bastidores desse universo, além de curtas-metragens, vídeos experimentais, clipes musicais e comerciais’. O site acrescenta:
‘Tudo que é animação aparece no Animania! Também há dicas de sites, livros, DVDs e pequenos ‘truques’ das técnicas de animação’.
Agora que o programa está, enfim, devidamente apresentado ao telespectador da TV Cultura, vamos ao email de Quiá Rodrigues:
‘Caro Ernesto,
Acabo de ler sua resenha da estréia do Animania, programa que dirijo, faço a editoria e a manipulação do boneco apresentador Zeca 2D. Suas observações pertinentes me levam a avaliar o trabalho sob sua ótica e consigo ver os acertos a serem feitos por nós no programa… e concordo contigo em muitos pontos.
Depois de alguns programas gravados encontramos mais o caminho da atração. No antigo programa, Zeca se dirigia ao público e era quase um talk show sobre a carreira de animadores diversos. Com o novo conteúdo da TV Brasil, começamos a criar o novo Animania e a orientação que tivemos foi a de que Zeca e Seth não poderiam se dirigir aos telespectadores como apresentadores de um programa.
A ideia é que eles vivam uma nova ficção a cada programa que ilustre o tema do dia. No primeiro Animania, o tema foi o recorte digital e tudo no programa foi voltado a esse tema, dos filmes até a matéria ‘Oups’ de Márcio Ambrósio.
Como editor do Animania, prezo o conteúdo de cada episódio. Acho que nos dois blocos que temos, devemos ter pelo menos dois bons filmes de animação na íntegra, o processo criativo dos trabalhos, mostrando a diversidade da animação, mas sempre dentro de um tema, conforme orientações que recebi.
Nesse sentido não pretendemos ser uma revista de animação, e sim um programa que conta uma ficção sobre um animador e seu cobaia de animação, que vivem o dia-a-dia de uma produtora de animação mostrando filmes e conversando com quem entende do assunto.
Por mais que os apresentadores sejam bonecos e possam ser vistos como infantis, nada que eles falam tem essa conotação. A ideia é fazer um programa pra família e pra quem gosta de animação. E dar informações para quem um dia fará animação.
Estamos trabalhando pra acertar mais, e, nesse momento, uma observação como a sua é sempre bem vista. Adoraria que você avançasse mais em suas colocações sobre o programa. Peço que continue nos vendo e dialogando conosco. Queremos muito continuar ouvindo e aprendendo a fazer um Animania melhor!
Grande abraço!
Quiá Rodrigues.’
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Ensaio de campanha, 22 de setembro
Não poderia ser de outra maneira: o apetite com que os entrevistadores convidados se lançaram nas perguntas do tipo saia-justa, relacionadas a temas polêmicos e delicados, foi proporcional à facilidade e à naturalidade com que a senadora Marina Silva se apresentou – e se dispôs a ser tratada – como pré-candidata à Presidência da República. O resultado foi um programa que expôs não apenas o pensamento afiado e o serena combatividade da senadora como também os flancos polêmicos que seus possíveis e futuros adversários eleitorais deverão ou poderão explorar.
Heródoto Barbeiro, Eleonora de Lucena (Folha de S. Paulo), Denise Rothenburg (Correio Braziliense), Lourival Sant’Anna (Estadão) e Paulo Moreira Leite (Época) cumpriram com eficiência – e em alguns momentos de forma atropelada – a função de testar a nova personagem do cenário sucessório em temas como o ensino do criacionismo nas escolas, a descriminalização do aborto e da maconha, o pré-sal, as relações com tucanos e petistas, a construção de novas usinas nucleares, a permanência da lama no Senado, a possível entrada da Venezuela no Mercosul, o acordo militar com a França, as células-tronco e os desvios éticos do PT que a senadora abandonou.
De sua parte, Marina Silva mostrou que a experiência de três décadas de militância política fora e dentro do Senado e as lutas mais recentes como ministra profundamente identificada com o desenvolvimento sustentável lhe deram, além de um discurso denso e fortemente blindado, um bom jogo de cintura para enfrentar o que espera por ela no futuro próximo, se a candidatura decolar.
Para muitos telespectadores, o resultado foi um das edições mais envolventes da Roda Viva em 2009.
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Evolução, 21 de setembro
Depois de uma abertura ágil, bem-editada e que remete diretamente para a proposta do programa, o Almanaque Educação, logo na estreia de sua nova temporada, deixa claro que deu uma guinada considerável no formato do projeto, trocando as ruas da grande cidade por um cenário bem mais familiar ao cotidiano de milhões de estudantes brasileiros: um quarto bagunçado com um computador conectado à Internet e os vários ambientes de uma escola.
Mais do que uma troca de cenários, o programa reinventou os eficientes quadros da primeira fase, adaptando-os ao novo eixo narrativo formado por Cadu (Glauko Dias) e Mano (Fabio Baldacci), os amigos que resolvem fazer um programa caseiro de TV voltado para as situações e desafios que vivem diariamente.
O elenco original, se já não é mais a trupe circense que ancorava o programa, agora é um elemento decisivo na sustentação dos quadros, principalmente se considerarmos que Glauko e Fabio, por serem atores jovens e ainda em fase de aprendizado das técnicas de representação, nem sempre conseguem a química exigida pelos personagens Cadu e Mano.
Os quadros do programa agora ficaram inteiramente a serviço das necessidades, curiosidades e aflições de jovens estudantes como Cadu e Mano. O ‘Pílulas do Saber’, por exemplo, serviu tanto para um olhar mais sofisticado sobre um típico assunto curricular – no caso, a participação brasileira na Segunda Guerra Mundial – quanto para que Cadu – e, por tabela, os telespectadores – entendessem o que acontece com o nosso corpo em situações de stress, como a de ser chamado para uma conversa com a diretora da escola depois de uma travessura.
Na mesma linha estão o ‘Fala aí!’, uma janela para a participação dos telespectadores; o ‘Túnel do Tempo’, feito para mergulhos específicos de pesquisa audiovisual – no programa em questão, um paralelo entre a iminente punição disciplinar de Cadu e a repressão aos estudantes na Praça da Paz Celestial, em Pequim, 1989; e o ‘Ser ou não ser’, uma espécie de guia vocacional que, na estreia da nova temporada, mostrou um pouco da profissão de jornalista através de um encontro de uma estudante com Heródoto Barbeiro na redação da TV Cultura.
Vale destacar, no quadro ‘Grande Reportagem’, a divertida simulação com material de arquivo na qual Cadu ‘entrevistou’ ninguém menos que Ronaldo Fenômeno – um filão, aliás, praticamente inesgotável (e barato), se pensarmos na riqueza do acervo da emissora. E, no quadro realmente inédito chamado ‘TV do Cadu’, a bem-humorada entrevista com um Batman septuagenário e morrendo de ciúmes do Oscar conquistado pelo personagem Coringa.
Por tudo o que mostrou na retomada do projeto, o Almanaque Educação ganhou mais foco, pertinência, ritmo e eficiência como conteúdo de TV aberta voltado para o público infanto-juvenil. E tudo isso sem ter que abandonar as premissas educacionais que inspiraram o programa.’