Friday, 29 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Ernesto Rodrigues

Jornal da Cultura, 29 de janeiro

A aferição diária oficial do Ibope na TV aberta vem indicando que o novo Jornal da Cultura tem alavancado a audiência da emissora de forma regular e em índices expressivos, considerando-se o desempenho médio da emissora. Ao mesmo tempo, algumas manifestações de telespectadores indicam que uma parte do público, minoritária, preferiria o modelo anterior, analítico, pouco conectado com os fatos do dia e quase irreconhecível como telejornal clássico.

Um dos argumentos dos críticos diz respeito à falta de ‘debate’ e de ‘aprofundamento’ dos temas. Impossível discordar, já que nenhum telejornal do planeta – incluindo alternativas como o antigo Jornal da Cultura ‘analítico’ – consegue debater os assuntos com a mesma profundidade de formatos como, por exemplo, no caso da TV Cultura, o Roda Viva, o Opinião Nacional, os documentários e programas especializados como Nossa Língua, Letra Viva, Café Filosófico, Cartão Verde, Entrelinhas, Ensaio e outros.

Outra crítica refere-se à suposta omissão, no JC, de fatos e temas importantes em troca de ‘amenidades’ e notícias sem importância. Nesse caso, o simples cotejo de edições do Jornal da Cultura como a de 29 de janeiro, por exemplo, indica que esse julgamento não se justifica. Na edição citada, dos dezenove assuntos abordados, doze (74%) eram notícias do dia, quatro ( 21%) eram matérias inspiradas em fatos do dia ou da semana e três (16%) podem ser consideradas como features (matérias interessantes e atemporais) ou amenidades.

Estavam lá o registro e a contextualização possível (em telejornal) da maioria dos fatos mais importantes e interessantes do dia, como o aprofundamento geométrico da crise econômica nos Estados Unidos e na Europa, a histórica legislação igualitária de Barack Obama para trabalhadores e trabalhadoras, o dia no Fórum Social Mundial, as definições sobre as cidades brasileiras que poderão sediar jogos da Copa de 2014, a chuva no Rio Grande do Sul, a morte de Hélio Gracie e as últimas de Ronaldo Fenômeno.

Estavam lá, também, matérias inegavelmente dispensáveis, mas também importantes, na minha opinião e na da maioria dos formatadores de telejornal, por cumprirem o papel de seduzir o telespectador de forma agradável ou instigante, até para que ele permaneça sintonizado e acompanhe o noticiário mais importante. Caso das reportagens sobre o turismo em estádios de futebol, a pesquisa científica a respeito do sentimento da vergonha, a feira de artigos e serviços para casamento, o costume de atrair dinheiro comendo inhoque no dia 29 de janeiro, o primeiro assalto a banco na pequenina cidade de Borá, a participação de Sean Penn num filme humanitário contra os gastos militares e o hilariante festival de gritos no dia da pessoa amada no Japão.

É claro que o dia-a-dia da hierarquização do importante e do interessante para o telespectador de TV aberta é cheio de armadilhas e cascas de banana. No caso da edição de 29 de janeiro, por exemplo, poderiam ser enquadrados, nessa categoria, a paginação que concentrou demais os assuntos leves no início do programa, o excesso de citações cinematográficas – Jerry Lewis na matéria sobre vergonha, várias cenas de casamentos na reportagem sobre a feira e cenas de ‘Nos tempos da brilhantina’ – e a discutível relevância, no Brasil, da notícia do ressurgimento do marido supostamente falecido (e possivelmente pilantra) da cantora Olivia Newton-John.

O exagero na dose aqui ou ali, no entanto, não elimina a conclusão, referendada pelo índice de audiência, de que o Jornal da Cultura está no caminho certo. Até porque telejornal, como relógio de pulso, bicicleta, jornal impresso, pudim de leite e tantas outras criações geniais, não se reinventa. Ou se produz com competência, criatividade e liberdade, ou não.

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Visibilidade

Caixa de mensagens, 28 de janeiro

A propósito da coluna publicada ontem, 27 de janeiro, (‘Ombuds quem?’), recebi e transcrevo, na íntegra, a seguinte mensagem do Secretário-Executivo da Presidência da Fundação Padre Anchieta, Júlio Moreno:

Sr. Ombudsman:

Seus comentários sobre o número inexpressivo de emails que o ombudsman recebe em comparação com os enviados diretamente aos programas merecem algumas considerações.

É provável que isto ocorra porque as mensagens enviadas aos programas têm os mais diferentes conteúdos, tais como sugestões de pautas, solicitações de informações sobre atrações, pedidos de reprise, elogios, etc.. Nesse etecetera, é claro, estão incluídas também as críticas. É só nesse item, nos parece, que se poderia estabelecer um ‘comparativo’ justo com os emails enviados ao ombudsman, pois ele é um canal neutro ao qual o telespectador tem condições de recorrer ao invés (ou mesmo em paralelo) do contato com a produção dos programas.

Hoje existem ativados na Fundação Padre Anchieta cerca de 100 endereços de emails de programas das TVs e Rádios que a instituição mantem. Não há uma estatística segura sobre o total de mensagens recebidas. O gerenciamento desses emails fica por conta de cada produção. Sem prejuízo da manutenção da relação direta público/programa, a Fundação está estruturando uma Central de Relacionamento, que deve entrar em funcionamento nos próximos meses. A Central contará com uma equipe especializada e um sistema próprio que possibilitarão uma visão integrada das manifestações do público (inclusive aquelas encaminhadas por intermédio do ombudsman) assim como um gerenciamento dos retornos dados aos telespectadores e ouvintes.

Assim, a Central não será apenas um canal receptivo, mas se constituirá num canal de diálogo e aproximação entre as TVs e Rádios e seu público. Ela terá uma atuação complementar ao ombudsman. Se, de um lado, cabe ao ombudsman manifestar-se a respeito de nossa atividade, com a postura independente de compromissos (a partir ou não de manifestações do público), de outro lado, cabe à Fundação oferecer a este público um canal direto que nos dê outra medida da satisfação e alcance das atividades aqui exercidas.

Nesse contexto, a criação da Central deverá incrementar a interação do público com as emissoras e, certamente, com o próprio ombudsman, dando-lhe maior ‘visibilidade’. Em paralelo, estão sendo analisadas outras ações como as sugeridas pelo ombudsman com tal objetivo. Uma delas, a inclusão do endereço de seu email nos créditos finais dos programas já está em implementação pela Diretoria de Programação.

Atenciosamente,

Júlio Moreno

Secretário-Executivo da Presidência da Fundação Padre Anchieta

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Ombuds quem?

Caixa de mensagens, 27 de janeiro

Um exemplo concreto da falta de visibilidade da coluna deste ombudsman, acessível apenas aos telespectadores que navegam pelo site da TV Cultura e que resolvem clicar no link específico, é o número praticamente inexpressivo de emails relacionados ao programa Pé na Rua, ao logo dos primeiros meses de análise da programação por parte deste ouvidor: dois emails. Surpreso com a estatística, o diretor do Núcleo de Arte e Cultura, Helio Goldsztejn, informa que a média de emails que chegam à equipe do Pé na Rua é de 40. Por dia!

Boa parte desses telespectadores faz contato certamente porque vê, nos créditos finais de cada edição do programa, o link pelo qual pode entrar em contato com o Pé na Rua. A idéia de fazer o mesmo com o endereço de email do ombudsman, exibindo-o nos créditos finais de todos os programas da grade, chegou a ser acertada informalmente com a direção da emissora, mas até hoje, passados quase seis meses desde da entrada no ar desta coluna, infelizmente não foi implantada. Também não avançaram os entendimentos práticos para viabilizar a exibição regular de um programa do ombudsman na grade da emissora.

Sem essas duas providências, o alcance e a relevância do trabalho do ombudsman ficam consideravelmente limitados e quase que restritos aos profissionais da TV Cultura que recebem a análise interna da programação.

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Pergunta também é informação

Móbile, 25 de janeiro (reprise)

Permanece, no Móbile, uma característica que, não parecendo ser fundamental para a integridade do programa, às vezes compromete seu ritmo e sua compreensão: a ausência do áudio do entrevistador. Essa característica não representou um problema no caso de Tatiana Cobbett e do ator Renato Consorte, articulados e capazes para, respectivamente, apresentar o próprio trabalho e contar uma história engraçada. No caso de Elifas Andreato, no entanto, houve algumas frases que só poderiam ser compreendidas se o telespectador ouvisse as perguntas.

Aliás, Elifas chamou o entrevistado fraternalmente de ‘Baixinho’ e, no final de uma de suas participações, disse que o amava. O telespectador, confuso, infelizmente não fica sabendo que o entrevistador – e alvo da emocionada gratidão de Elifas – é Fernando Faro, um dos profissionais mais brilhantes da televisão brasileira. Por que não saber?

Faltou também um crédito sobre a autoria do belo texto que abriu o ensaio sobre Alicia Alonso e que nos deu pérolas como a seguinte: ‘Havana deixa a gente assim com o coração desguarnecido’. E uma captação mais trabalhada das imagens das grandes capas de disco cujas histórias Elifas contou, para que o telespectador menos informado que nunca as viu pudesse saborear todo o seu valor artístico.

Esta edição do programa, no entanto, foi mais generosa com outra causa que defendi na análise interna: a de tornar esse ‘mundo Móbile’ menos estranho aos olhos do telespectador não iniciado. Desta vez, as legendas que intercalaram os diferentes conteúdos foram mais informativas e a própria distribuição desses conteúdos contemplou cenários mais diversificados, além do estúdio onde foram feitas as entrevistas. Como Havana, vista em boas imagens de arquivo, a casa da crítica Helena Kaz, o atelier de Maria Bonomi e, inteirinha, a antológica sequência em que Tarzan e Jane romperam a barreira da comunicação.

(Este comentário também é uma reprise, no caso da coluna do ombudsman de 4 de agosto passado)’