Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Ernesto Rodrigues

Roda Viva. Logo na primeira resposta, dada à pergunta de abertura feita por Lillian Witte Fibe, o delegado Protógenes Queiroz deu a senha do que não estava muito disposto a discutir ou detalhar, com fatos e nomes, o relatório e as ações polêmicas da operação policial que lhe deram notoriedade nacional e que provocaram crises e controvérsias em torno de sua conduta à frente das diligências que resultaram na prisão do banqueiro Daniel Dantas.

Protógenes disse que não mudaria nada no relatório e que, se pudesse fazer algo de diferente, só tentaria dobrar a ‘proteção operacional’ para sua equipe. O que se viu então, a partir deste momento, foi uma tentativa às vezes tumultuada dos quatro entrevistadores convidados – Ricardo Noblat, Fernando Rodrigues, Fausto Macedo e Renato Lombardi – de obter, sem sucesso, na maioria das vezes, respostas mais objetivas do delegado sobre o cenário de poderosas conspirações, ameaças e armadilhas internas, tráfico de influência nos três poderes da República e manipulação midiática que ele diz ter enfrentado – ou estar ainda enfrentando – por ter mandado o banqueiro Daniel Dantas para a cadeia.

Na maioria das respostas, o delegado manteve o tom que, em certo momento do programa, o levou a dizer, profeticamente, que foi o criador de ‘um grande debate’: o do Brasil de antes e o do Brasil de depois da Operação Satiagraha. Para prejuízo dos telespectadores que esperavam detalhes sobre as forças poderosas que diz ter enfrentado, Protógenes não revelou novas evidências e nem justificou, com indícios mais claros, a menção, no relatório, de alguns políticos e jornalistas. O argumento do delegado, quase sempre, foi o de que não poderia violar o sigilo das investigações e, desse modo, cometer o erro que seus ‘adversários’, segundo ele, querem que ele cometa.

Ricardo Noblat insistiu nas críticas – as dele próprio e as e outros jornalistas – à falta de clareza e de contextualização do relatório do delegado para fazer boa parte das perguntas que permanecem sem resposta, no que se refere aos fatos e à crise que cercaram o afastamento do delegado: a citação de José Dirceu e do deputado Luís Eduardo Greenhalg no relatório, a sugestão de Protógenes de que é perseguido pela cúpula da Polícia Federal, a supostas vantagens que jornalistas e empresas de comunicação receberam de Daniel Dantas e o grampo telefônico do qual o presidente do STF, Gilmar Mendes, diz ter sido vítima.

Fernando Rodrigues, como Fausto Macedo e Renato Lombardi, acompanharam Noblat na ênfase à falta de clareza e às generalizações do relatório, mas também tocou em pontos específicos, conseguindo, nesses momentos, deixar Protógenes sem respostas convincentes. Primeiro, mostrou que a acusação do delegado de que a repórter Andrea Michael, colega de Fernando na Folha S. Paulo, ‘oferece seus serviços organização criminosa’ foi baseada num diálogo transcrito erradamente. Depois, mostrou que Protógenes decidiu, efetivamente, em uma reunião gravada na Polícia Federal, deixar o comando da Operação Satiagraha, o que levou o delegado a dizer que ‘editou-se criminosamente a fita do afastamento’.

Na maior parte das respostas, no entanto, Protógenes, dizendo que não podia se manifestar sobre o mérito ou de violar o sigilo da investigação, não se sentiu obrigado a dar explicações e insistiu na afirmação de que contrariou ‘interesses poderosos da República’. Em determinado momento, justificou-se com a convicção de que ‘o tempo é o senhor da razão’. E fez questão de se referir a Daniel Dantas como ‘banqueiro bandido’ e de dizer que tem o desejo de ser o seu ‘carcereiro’. O delegado negou que tenha planos de se candidatar a cargo eletivo, mas defendeu, quase discursando, referindo-se à divulgação de imagens de acusados presos, que ‘bandido deve ser exposto’ e que ‘o que mais choca é a miséria do povo’.

Nem o delegado Protógenes nem seus entrevistadores, infelizmente, se deram mais tempo para abordar, até para efeito de comparação, nos erros ou acertos, outras operações policiais de grande repercussão que ele comandou nos últimos anos, como as que levaram Paulo Maluf e o contrabandista LawKin Chong à prisão, a do Caso Banestado, a que desmantelou a organização criminosa liderada pelo ex-deputado Hildebrando Paschoal, a que levou à prisão da cúpula do Banco BNP Paribas no Brasil e a do Caso Corínthians-MSI.

Quase sempre, tudo, de um lado, empacava em perguntas legítimas mas infrutíferas sobre os pontos polêmicos da Operação Satiagraha e, de outro, na clara disposição do delegado, igualmente legítima mas repetitiva, de fazer, de seu atual protagonismo, plataforma para um discurso auto-referente de moralização da vida nacional.

Altos e baixos da TV Cultura nos últimos oito meses, 22/12

‘Veja na coluna Altos e Baixos uma seleção feita pelo ombudsman dos altos e baixos da TV Cultura nos últimos oito meses.’