Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Folha de S. Paulo

IMPRENSA
‘Valor Econômico’ completa dez anos com novos projetos

‘O jornal ‘Valor Econômico’, investimento conjunto do Grupo Folha e das Organizações Globo, completa hoje dez anos como uma referência no jornalismo econômico no país.

Em sua primeira década de existência, ganhou mais de 80 prêmios, incluindo dois Esso, o mais tradicional do jornalismo.

Também fez história com furos de reportagem de grande repercussão, como a entrevista, no ano passado, do então diretor de política monetária do Banco Central Mário Torós, que revelou os bastidores da atuação do BC durante a crise econômica.

O presidente do Grupo Folha, Luiz Frias, declarou: ‘No lançamento do jornal, muitos duvidaram da possibilidade de uma joint-venture entre Folha e Globo dar certo. Nada como o tempo para provar o contrário. Construiu-se o melhor e mais qualificado conteúdo de jornalismo econômico do país. Daqui para a frente, o desafio será usufruir desse conteúdo de excelência em outras plataformas, como a digital.’

Para o presidente das Organizações Globo, Roberto Irineu Marinho, ‘em um prazo muito curto, o jornal ganhou o respeito do público, com um jornalismo ágil, analítico, independente e pluralista. Hoje é líder absoluto do setor, tendo se tornado fonte de informação de qualidade, um instrumento importante para os agentes econômicos na tomada de decisões’.

‘Sempre acreditamos que essas metas seriam alcançadas, mas o tempo recorde com que se chegou a esse patamar é a prova do acerto do projeto e do talento dos profissionais que tornaram o jornal uma realidade. Nós, das Organizações Globo, temos muito orgulho desses resultados e acredito que o Grupo Folha compartilhe o mesmo sentimento’, diz Marinho.

Com uma tiragem diária de 55 mil exemplares, o ‘Valor’ surgiu a partir da expectativa de que a expansão da Bolsa de Valores impulsionaria o noticiário econômico. E foi o que aconteceu. O valor de mercado das empresas listadas na Bovespa saltou de R$ 441 bilhões em 2000, ano em que o jornal chegou às bancas, para R$ 2,3 trilhões no ano passado.

‘O ‘Valor’ testemunhou uma época muito importante para a economia brasileira’, afirmou a diretora de Redação, Vera Brandimarte. ‘Quando o jornal nasceu, havia um concorrente fortíssimo, que era a ‘Gazeta Mercantil’. E logo em seguida vieram a crise energética e a turbulência do período eleitoral. Foram anos difíceis. Mas depois veio um período de forte crescimento. O jornal centrou o foco no mercado acionário, ampliando a cobertura de investimentos e de empresas.’

Hoje a equipe de Redação é formada por 145 profissionais, entre jornalistas, fotógrafos e diagramadores, e mudou muito pouco desde que foi montada pelo jornalista e então colunista da Folha Celso Pinto. ‘O Celso foi o catalisador no início do projeto, e suas diretrizes continuam vivas até hoje’, afirma Brandimarte.

Fruto de um investimento inicial de R$ 50 milhões, dividido em partes iguais pelos grupos Folha e Globo, a Valor Econômico S.A, empresa que edita o jornal ‘Valor’, exibiu um faturamento de R$ 166 milhões no ano passado, crescimento de 12% sobre o ano anterior, apesar da crise econômica mundial. O lucro líquido foi de R$ 16,5 milhões.

A companhia não tem dívidas e encerrou 2009 com um caixa de R$ 42,7 milhões, crescimento de 64% em relação ao ano anterior (R$ 26 milhões).

Com o jornal ‘Valor’ de carro-chefe, a empresa já gerou vários ‘filhotes’. Por ano, são publicadas mais de 60 revistas, como a ‘ValorInveste’, de tiragem mensal, além de anuários e outras publicações setoriais. Há ainda uma área de eventos, que organiza seminários nacionais e internacionais.

Em comemoração dos dez anos da publicação, o ‘Valor’ apresenta aos seus leitores mudanças gráficas a partir da edição de amanhã.’

 

Marcio Aith

Celso Pinto é ‘pilar’ do sucesso do jornal

‘O jornalista Celso Pinto foi o dínamo que determinou o sucesso do ‘Valor Econômico’, joint-venture entre o Grupo Folha e as Organizações Globo que completa dez anos.

Então colunista da Folha, foi ele quem definiu, em 2000, a equipe inicial de 160 jornalistas e as diretrizes a partir das quais construiu-se o melhor e mais qualificado conteúdo de jornalismo econômico do país.

Quando o ‘Valor’ foi lançado, Celso já era o jornalista econômico mais influente de sua geração. Alguns de seus pares sabiam apurar. Outros, analisar. Um terceiro grupo, opinar. Celso conquistou seu espaço com um estilo que conciliava grande vigor da apuração, enorme capacidade de análise e fobia à opinião pessoal.

Suas colunas eram acompanhadas por banqueiros, acadêmicos, industriais, autoridades e integrantes de organizações internacionais, que o conheciam pessoalmente.

Frequentou as reuniões do FMI e do Banco Mundial por 30 anos, período no qual angariou o respeito pessoal dos diretores e do corpo técnico de ambas as instituições.

Em outubro de 1998, Stanley Fischer, segundo homem forte do Fundo, procurou Celso para conversar sobre a situação cambial brasileira, prestes a explodir. À ocasião, o FMI, pressionado pelo Tesouro americano, gestava um pacote de ajuda ao país, que fracassaria.

Quem testemunhasse a conversa veria que Fischer, a pretexto de informar Celso, tentava mesmo era tirar do jornalista o máximo de dados. Celso pouco falou e ainda saiu do encontro com a sensação de que estavam todos desorientados, de que a desvalorização do real era iminente.

Celso, 57 anos, conhece a fundo os dilemas clássicos envolvendo juros, câmbio, dívida e inflação. Ao longo dos anos 90, apontou o risco do uso da apreciação cambial para conter a inflação. Também fez alertas relevantes no sentido inverso – sobre formas artificiais de depreciar o câmbio.

‘Celso Pinto é um gigante do jornalismo. Competente, sério, inteligente, fez escola e nos deixou, como legado, o ‘Valor Econômico’, disse à Folha o economista Armínio Fraga.

‘Celso Pinto é um dos raros casos em que competência, conhecimento, talento e seriedade se reúnem. O jornal Valor Econômico espelha esta lista de qualidades.’ afirmou Henrique Meirelles, presidente do Banco Central.

‘Além de sua dimensão empresarial, a clareza de seus textos é um marco do jornalismo brasileiro’, disse o economista e banqueiro Pérsio Arida.

O lançamento do ‘Valor’ foi a coroação de uma carreira de sucesso iniciada na própria Folha, em 1974, e solidificada na ‘Gazeta Mercantil’, onde trabalhou em São Paulo e Brasília e como correspondente em Londres. Em 1996, voltou à Folha como colunista e, em 2000, lançou o ‘Valor Econômico’, do qual foi diretor de redação.

Em maio de 2003, a carreira de Celso foi interrompida por uma parada cardiorrespiratória da qual ele convalesce.’

 

CAMPANHA
Leitor aprova cobertura eleitoral da Folha

‘O grau de interesse dos leitores da Folha a respeito das eleições deste ano deu um salto nos últimos seis meses. Hoje, 75% dizem acompanhar regularmente reportagens ou artigos sobre o assunto. Em outubro de 2009, eram 61% os que diziam fazer isso.

Segundo pesquisa Datafolha realizada junto ao leitorado do jornal nos dias 19 e 20 de abril passados, a grande maioria (74%) não considera que a Folha favoreça alguma das pré-candidaturas à Presidência.

Entre os que veem algum favorecimento, 13% apontam o tucano José Serra como beneficiado pela cobertura. Os que veem tendência a favor da pré-candidata petista Dilma Rousseff são 6%.

A pesquisa foi realizada entre leitores que moram na Grande São Paulo e que leem a Folha ao menos uma vez por semana. A margem de erro máxima do levantamento é de cinco pontos percentuais, para mais ou para menos.

Espaço e teor

Conduzida entre 350 leitores assinantes e secundários (que leem o exemplar do assinante), a pesquisa procurou averiguar também a satisfação deles com as coberturas eleitoral e do governo Lula e as intenções de votos nos candidatos.

O levantamento mostrou que a grande maioria dos leitores está satisfeita tanto em relação ao espaço dedicado pela Folha ao assunto como com o teor da cobertura.

Avaliam como ótima ou boa a cobertura jornalística 88% dos leitores. Um percentual semelhante (85%) também considera o espaço dedicado ao tema ‘na medida certa’.

Segundo o levantamento, há uma correlação direta entre idade, renda e o acompanhamento do noticiário político. Quanto maior a renda ou a idade, maior o índice dos que acompanham as notícias.

Os homens se mostram mais interessados do que as mulheres nas eleições deste ano (82% contra 70%).

Os leitores da Folha também se dizem satisfeitos com o jornal em relação à cobertura do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Avaliam a Folha como ‘crítica na medida certa’ a maioria deles (67%), enquanto outros 21% consideram o jornal ‘menos crítico do que o necessário’. Apenas 9% consideram o jornal ‘mais crítico do que o necessário’ quando o assunto abordado é a gestão de Lula.

Intenções de voto

O levantamento mostra que 40% dos leitores da Folha disseram espontaneamente que devem votar em Serra para presidente (um salto de 20 pontos percentuais sobre o resultado de outubro de 2009). A ex-ministra Dilma tem 10% das preferências dos leitores (ela tinha 3% há seis meses).

A senadora licenciada Marina Silva, pré-candidata do PV à Presidência da República, manteve os mesmos 6% das intenções de voto espontâneas dos leitores registradas em outubro do ano passado.

Quando os leitores são estimulados pelos pesquisadores do Datafolha a escolher em quem votar a partir de uma lista de candidatos, a preferência a favor de Serra é ainda maior. Atinge 54%; ante os 18% de Marina e 15% de Dilma.

Na última pesquisa Datafolha, realizada nos dias 15 e 16 deste mês e divulgada no último dia 17, Serra obteve 42% das intenções de voto, Dilma 30% e Marina 12%.

Na análise por segmentos, o ex-governador de São Paulo destaca-se entre os leitores de 70 anos ou mais (70%), entre os que possuem ensino fundamental e médio (61%) e entre os que ganham entre 10 e 20 salários mínimos (62%).

Já Marina tem seu melhor desempenho entre os mais jovens, de 16 a 29 anos, e entre os que ganham até dez salários mínimos (23%).

Acima da média da população, a petista Dilma tem a preferência dos leitores homens (20%) e dos que ganham mais de 20 salários mínimos (23%).’

 

CHINA
Nova regra para internet é alvo de críticas de ONGs

‘Organizações de direitos humanos e pela liberdade de expressão condenaram a nova lei chinesa que obriga empresas da internet e de telecomunicações a fornecerem ao governo informações de usuários quando autoridades julgarem necessário.

‘A lei é um grave retrocesso e um claro ataque à liberdade na internet’, afirmou Fan Yafeng, militante da ONG Direitos Humanos na China.

A ONG Repórteres Sem Fronteiras disse que a nova lei, que entrará em vigor em outubro, serve para amparar legalmente as constantes censuras e ataques a dissidentes no país.

Pelas regras -aprovadas quinta-feira-, as empresas terão que acatar os mais variados pedidos do governo, desde interromper a transmissão de dados ou do sinal, até fornecer histórico de navegação de usuários e de ligações.

O ministro para o Conselho de Informação sobre o Estado, Wang Chen, disse que a nova regulamentação é necessária diante do aumento do número de internautas no país, que já são cerca de 400 milhões.’

 

MERCADO EDITORIAL
Mariana Barbosa

Faro para best-sellers

‘O sonho de consumo da nova classe média brasileira não se resume a computadores e celulares. Ela também quer cultura. As editoras Sextante e Intrínseca foram as primeiras a entender o apetite da nova classe de consumidores pelos livros e estão revolucionando a área editorial com preço de capa até 30% abaixo do que costuma ser praticado pelo mercado.

Com um faro apurado para best-sellers, as duas editoras cariocas, que têm sócios em comum e perfis editoriais distintos, estão por trás de sucessos como ‘A Cabana’ (William P. Young) e ‘O Código Da Vinci’ (Dan Brown), ambos da Sextante, e os livros da série ‘Crepúsculo’ (Stephenie Meyer), da Intrínseca.

‘O brasileiro adora ler. Basta chegar às suas mãos bons títulos a preços baixos’, diz Tomás Pereira, 41, que, junto com o irmão Marcos, é dono da Sextante. ‘Uma característica interessante da nova classe C é o desejo de progredir, e a leitura, que educa, traz cultura e entretém, é um caminho natural.’

Netos do célebre editor José Olympio, que lançou nomes como Guimarães Rosa e Graciliano Ramos, Tomás e Marcos fundaram a Sextante em 1998, com o pai Geraldo, já falecido. Começaram com livros de autoajuda e espiritualidade, que ainda são o forte da editora, mas deram uma grande tacada na área de ficção ao adquirir, em 2004, os direitos de ‘Código da Vinci’ por US$ 12 mil.

‘Existe no mercado uma mentalidade elitista de que as pessoas que gostam de ler podem pagar mais. Isso fez com que se investisse em acabamentos especiais que agregam muito mais preço do que valor aos livros, deixando à margem um público leitor ávido por comprá-los’, afirma Tomás. Há 12 anos, o preço de capa dos títulos de autoajuda da Sextante custam R$ 19,90. Os de ficção custam R$ 39,90.

‘É difícil, antes de você ler um livro, saber quanto ele vale. Se o preço é mais baixo, você diminui o risco e a resistência do leitor’, diz Tomás.

Há três anos, ele e o irmão se associaram a Jorge Oakim, que fundara anos antes a Intrínseca, mas ainda não tinha adquirido os direitos da série dos vampiros que virou febre junto ao público infantojuvenil. A Sextante detém 50% da Intrínseca e é responsável pela área operacional da editora.

Ambas compartilham o mesmo modelo de negócios: estrutura enxuta, poucos títulos de grande apelo comercial e preço de capa mais em conta. Também trabalham com esquemas de distribuição alternativo, como as revendedoras da Avon. Suas tiragens não começam em menos de 10 mil exemplares, enquanto a média das demais editoras é de 3.000.

‘Você só consegue fazer um preço menor quando a tiragem é alta’, diz Tomás. ‘É uma aposta. Nem sempre dá certo. Felizmente tivemos mais acertos do que erros.’

Considerando apenas o segmento em que atuam (tirando livros didáticos, venda a governo, serviços gráficos e outros), as duas editoras, juntas, venderam mais em volume e receita do que qualquer outra editora no país no ano passado.

Com um catálogo que deve chegar a 600 títulos, a Sextante vendeu 7,7 milhões de exemplares em 2009. A Intrínseca, que tem 76 livros em catálogo, vendeu 3,8 milhões. Empresas de capital fechado, elas não revelam números. Segundo fontes, o faturamento de cada uma foi da ordem R$ 60 milhões.’

 

Nem todo livro que é sucesso lá fora ‘decola’ no Brasil

‘É preciso faro e sorte para identificar livros que vão se tornar grandes fenômenos mundiais. O sucesso em um mercado como o americano não é garantia de sucesso no Brasil, e vice-versa. Maior sucesso da história da Sextante, o livro de autoajuda ‘O Monge e o Executivo’ vendeu 2,4 milhões no Brasil. Adquirido com um adiantamento de US$ 3.000, nunca decolou nos EUA: em 12 anos, vendeu 200 mil exemplares.

A Sextante conta com cinco pessoas dedicadas a farejar novos títulos. ‘O instinto, que é uma síntese de informações e experiências, cheio de falhas e distorções, ainda é o elemento principal’, diz Tomás Pereira, da Sextante. ‘Não tentamos adivinhar o que os leitores vão gostar. Gostamos do livro e imaginamos que as outras pessoas vão gostar.’

Do catálogo da Sextante, sete títulos venderam mais de 1 milhão de exemplares e 90 venderam mais de 100 mil. ‘Um livro se torna um best-seller fundamentalmente por sua força própria, que gera o boca-a-boca. Mas ajuda muito ter um preço acessível, uma boa distribuição’, avalia Tomás.

Jorge Oakim, da Intrínseca, conta que conseguiu seu primeiro best-seller, ‘A Menina que Roubava Livros’ (1,3 milhão de exemplares vendidos), pela força de uma carta para o autor Markus Zusak.

‘Tinha uma editora muito maior na disputa, e o agente me pediu para escrever uma ‘love letter’ [carta de amor, na tradução literal] dizendo por que aquele livro era importante para mim.’ O primeiro lugar onde o livro estourou no mundo foi no Brasil.

Além da qualidade do título e do preço, Oakim acrescenta o marketing como ingrediente fundamental para o sucesso de um livro. ‘A gente nunca deixa o livro sozinho. Temos poucos títulos, e todos os livros que decidimos publicar merecem a nossa atenção’, diz Oakim, 40. Sem tradição familiar no ramo editorial, ele largou um emprego no mercado financeiro para montar a editora.

Oakim não revela quanto, mas diz que a Intrínseca investe bastante em marketing. Divulga livros com anúncios em jornal e adesivos nos ônibus do Rio de Janeiro. Com a maior parte dos títulos voltada para o público infantojuvenil, a Intrínseca também tem um marketing bastante agressivo na internet e nas redes sociais.’

 

Fabio Victor e Jean Canuto

Novatas já estão entre as grandes do país

‘Embora nem entidades de classe nem empresas do setor divulguem dados oficiais sobre faturamento e número de livros vendidos por editora, não há dúvida no mundo livreiro de que, por um ou outro critério, a Sextante e a Intrínseca estão entre as maiores do país.

Integram também a lista os grupos Record, Ediouro e Objetiva (conglomerados de editoras ou selos) e a Companhia das Letras. A estimativa se refere à categoria ‘obras gerais’ -excluindo publicações didáticas, técnicas e religiosas.

Na ausência de estatística oficial, as listas de livros mais vendidos são um termômetro possível para medir a força de cada empresa. A reportagem tabulou as editoras que mais apareceram no ranking publicado aos sábados no caderno Ilustrada, da Folha, nos últimos nove meses.

A Sextante lidera, com 199 títulos na lista durante o período. Em seguida vêm Intrínseca (165), Ediouro (105), Objetiva (92), Planeta (89) e Record (79). A lista da Ilustrada é feita com base na soma do número de exemplares (de ficção, não ficção, autoajuda e negócios) vendidos a cada semana nas principais livrarias do país.

Editores e livreiros avaliam que os principais grupos faturem de R$ 70 milhões a R$ 100 milhões por ano. Ainda que não alcancem essa cifra, é possível que Sextante e Intrínseca sejam mais rentáveis e eficientes, pois têm catálogos e estruturas bem menores.

Tome-se o caso dos grupos mais tradicionais: o Record, 68 anos, reúne 12 editoras e tem 7.000 títulos em catálogo; o Ediouro, 71 anos, tem sete selos e cerca de 7.000 títulos.

Das entidades do setor, a ANL (Associação Nacional de Livrarias) foi a única que se dispôs a apontar quais editoras mais vendem, mas sem dar cifras e as listando por ordem alfabética: Companhia das Letras, Objetiva, Planeta, Record, Sextante e Martins Fontes.

Os números gerais mais recentes do mercado, referentes a 2008 e divulgados no ano passado, são de uma pesquisa da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), segundo a qual foram vendidos 211,5 milhões de livros no Brasil (em todos os segmentos), com faturamento de R$ 2,43 bilhões.’

 

TELEVISÃO
Andréa Michael

Pessoas e personas

‘Rio e São Paulo se juntam na versão 2010 do ‘Bastidores’, que estreia nesta sexta no Multishow sob o comando da carioca Erika Mader, 24, e da paulista Luisa Micheletti, 26. Estarão em eventos esportivos, culturais e baladas. Mas começam o programa na rua 25 de Março (SP), em busca de um presente de R$ 50 para os 50 anos do cantor irlandês Bono. ‘Todo mundo quer mostrar a persona, nós vamos mostrar a pessoa’, dizem.

Sangue frio dá mais tempo na TV

Em ano de eleição, agenda bem organizada, treinamento de mídia e sangue frio são armas capazes de conquistar um bem disputadíssimo -o tempo deTV. Não nohorário eleitoral, do qual o telespectador foge, mas na programação, aquela que o eleitor senta para assistir.

As ruas são um campo minado. Cassetas (Globo), loiras e morenas do ‘Gugu’ (Record), homens de preto do ‘CQC’ (Band) e Sabrina Sato do ‘Pânico na TV’ (Rede TV!) vivem atrás de um político que lhes renda um vexame.

O candidato também pode ‘morrer’ pela própria boca. Quem não se lembra da entrevista em que a então ministra Dilma Rousseff chamou uma repórter de ‘minha filha’?

E quando o ainda governador de SP José Serra se irritou com a pergunta de uma jornalista da TV Brasil e sugeriu que a emissora atuava de maneira parcial?

‘A gente passa a nossa experiência, mas vai depender muito do sangue frio do candidato’, afirma o presidente do PT, José Eduardo Dutra.

‘Os fatos negativos têm mais consequências porque as notícias ruins dão mais manchetes do que as boas.’

‘Quando fazemos a agenda, queremos que o candidato tenha contato com a população, mas também temos que protegê- lo’, diz a senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), responsável pela agenda de Serra.

O pacote de preparação de Dilma para disputar a Presidência inclui consultoria da jornalista Olga Curado, acompanhamento da equipe do publicitário João Santana e puxões de orelha do midiático presidente Lula.

Os presidenciáveis Serra e Marina Silva (PV) não fazem treinamento de mídia.

Marina saiu-se bem na última segunda no ‘CQC’. Em respostas gravadas sem edição, falou sem gaguejar, entre outros assuntos, sobre o que faria se tivesse um filho gay.

‘Foi para mudar o tom, porque, como ela diz, nesta eleição só tem carrancudo’, afirma Nilson de Oliveira, assessor da pré-campanha de Marina Silva.

COVER NA PRAÇA

Tá fazendo sucesso? É um sério candidato a se tornar a 157ª celebridade imitada por Alexandre Porpetone, ao lado de Pedro Bilau (Pedro Bial, da Globo), Cabrito Teves (‘Carlito’ Teves) e Ronalducho (Ronaldo). Estrela de ‘A Praça É Nossa’ (SBT), ele testa piadas: ‘Uma balada aí foi fechada. Tava tocando DJ Marlboro’.

REVELAÇÕES

O contrato que Ratinho acabou de renovar com o SBT por mais um semestre tem como base a divisão do que o apresentador fatura mensalmente com anunciantes (R$ 3 milhões).

Logo estreia o quadro ‘Sai Dessa’, dirigido pela ex-Faustão Lucimara Parisi, em que o telespectador decide o desfecho.

SEXO AMADOR

Em sessão batizada de ‘Cine Amateur’, o canal pay-per-view Venus exibe neste mês obras feitas por não profissionais e aspirantes a estrelas de filmes adultos que registram suas estripulias na cama. A escolha da empresa Playboy do Brasil resulta de pesquisa e estará acessível sempre às 0h05 dos sábados.’

 

Nina Lemos

Preta Gil expõe vida sexual de famosos

‘O que não falta na televisão é sexo. E principalmente gente falando sobre o assunto. Há um pouco de tudo. Velhinhas dando conselhos, especialistas tentando salvar a vida sexual de casais e por aí vai. O que faltava? Celebridades confessando seus segredos de alcova. Esse ‘nicho de mercado’ é preenchido pelo programa ‘Vai e Vem’ (sex. 23h30; classificação não informada), que a cantora Preta Gil apresenta no canal GNT.

As principais atrações do programa, que tem também reportagens e curiosidades sobre o sexo, são as entrevistas com famosos. Quem não quer saber da vida sexual das celebridades? Bem, se hoje se vende o que elas vestem e como criam os filhos, descobrir seus segredos de cama é o que faltava. E Preta Gil consegue realizar a missão espinhosa com sucesso. Durante as entrevistas, ela se coloca como igual, transformando o papo com o convidado em uma conversa entre amigos.

E assim consegue proezas, como fazer o jogador Vagner Love falar quanto mede o seu pênis. Ou o ator André Marques confessar sua predileção por sexo oral.

Tudo isso poderia ser grosseiro. Mas acaba ficando engraçado graças ao jogo de cintura de Preta. Frases como ‘Ah, então você cai de boca’ poderiam soar pesadas. Mas não soam (pelo menos não muito).

A apresentadora consegue ter a mesma naturalidade quando vai para a rua. E se mete, por exemplo, em uma conversa de homens no intervalo de uma pelada. Ou faz uma visita à famosa feira de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, em busca de comidas afrodisíacas.

O programa é baseado em temas como sexo e gastronomia, sexo virtual etc. Mas o que interessa mesmo são as entrevistas de Preta. Curiosidades sobre o sexo a gente encontra em qualquer lugar. É só acionar o controle remoto.

Outra parte desnecessária fica por conta de algumas regrinhas colocadas no programa.

Para começar, ‘Vai e Vem’ é gravado em um ‘elevador’. O entrevistado entra no tal elevador com Preta, que aperta os botões dos andares. As perguntas vão ficando, teoricamente, mais picantes de acordo com a subida. Esses ‘adereços’ não só não acrescentam, como também fazem com que a entrevista perca o ritmo.

A apresentadora não precisa disso. Ela se vira no humor. E ainda tem a vantagem de fugir dos estereótipos das outras apresentadoras de TV, em geral magras e loiras. Preta tem o diferencial da espontaneidade, o que a faz fugir dos padrões (não só os estéticos) e transformar um assunto tão banalizado em algo, pelo menos, divertido.’

 

Mônica Bergamo

Sexo dos anjos

‘‘Quando cheguei aqui, tinha medo de comer uma folha de alface, engasgava com um grão de arroz’, relata Regininha Poltergeist, ex-dançarina, ex-atriz pornô e ex-coelhinha da ‘Playboy’, à repórter Adriana Kuchler. ‘Tinha doença em todo o corpo. Por dentro e por fora. Cheguei na igreja mal. E Deus foi me ressuscitando. Tipo assim, nasci de novo.’

– Vamos bater palmas pra Grazi!, diz Roberta Foster.

– Êeeeeee!

– Pra Grazi?, estranha Regininha. ‘Pensei que era pra mim.’

Grazi, funcionária da igreja evangélica Bola de Neve Church, do Rio, é quem traz os canapés e bombons para a reunião de pauta do programa ‘Boladas’, que atrizes e artistas da comunidade religiosa [de fieis jovens e geralmente ligados ao esporte] começam a produzir. No elenco estão Poltergeist e a policial Marinara Costa, que trabalharam com Fausto Fawcett, Roberta Foster, a Eva do ‘Zorra Total’, Georgiana Guinle, filha do playboy Jorginho Guinle, Luciana Bessa, ex-’Malhação’, e Giselle Policarpo, atriz da Record. Várias delas já posaram nuas para revistas masculinas e admitem que tiveram vidas ‘desregradas’.

Mas hoje, sob o comando da pastora Priscila Mastrorosa, o grupo planeja um programa no estilo ‘Saia Justa’, do GNT, para ‘levar uma visão de Deus para assuntos polêmicos’. Nos três primeiros pilotos, os temas foram sexo, drogas e Haiti (ou ‘onde está Deus quando a terra treme?’). Pretendem veicular o produto na Record, na Rede TV! ou na CNT – e buscam patrocínio. As reuniões de trabalho são na sede da igreja (que tem lemas como ‘In Jesus We Trust’ e ‘Ser Cristão É Muito Louco’) no Rio, de frente para o mar da Barra da Tijuca.

A primeira missão das moças é assistir aos testes do programa em um computador. A pastora Priscila mostra uma enquete feita nas ruas: ‘É legal fazer sexo no primeiro encontro?’ Várias mulheres dizem que sim. Regininha, 39, se assusta. Mas uma entrevistada surge na tela dizendo não achar certo o sexo casual. ‘Aleluia!’, respira a convertida, aliviada.

Um dos principais preceitos da Bola de Neve é ‘sexo só no casamento’. Regra seguida hoje por todas as Boladas. ‘Se antes elas não esperavam nada, hoje elas ficam quietas na igreja’, diz a pastora. Solteira, Regininha, ex-louraça belzebu da música ‘Kátia Flavia’ e que já fez filmes pornô da série Brasileirinhas, diz que está há mais de um ano ‘em santidade’, como classificam o período sem casamento (e sem sexo). ‘Criada pra casar virgem’, diz que, depois de pegar atalhos na vida, retornou, na igreja, para ‘a essência pura do útero da minha mãe’: ‘A Poltergeist voltou pro inferno. Agora, sou Regininha Pentecostes’. Enquanto não encontra marido, ‘ora e espera, espera e ora’. E quando o sexo faz falta? ‘Vai malhar, toma banho frio. Chora, ajoelha, ora.’ Após três casamentos, Roberta Foster, 39, diz que come ‘uma caixa de bombom inteira’.

‘É o tobleromem’, segundo Georgiana Guinle, 40. Ela, que escrevia contos eróticos, se dizia uma ‘Bussunda em versão loira e curvilínea’ e ‘vivia nesse universo sexual por causa do meu pai’, diz que Guinle ‘ficou deprê quando eu disse que ia ficar em abstinência’.

Casada com um membro da igreja, Luciana Bessa, 31, diz que sexo para ela era ‘um momento de me satisfazer e beijinho, beijinho, tchau, tchau’. Agora, explica às amigas a importância de esperar o casamento. ‘Você pode até se perguntar: ‘E se eu não gostar [do sexo com o marido]?’ Mas, quando é de Deus, cara, ele manda o seu número. Na lua de mel, você diz: ‘Caraca! Parecia que eu era virgem.’

Quando indagadas sobre quantos namorados já tiveram, as boladas reagem. ‘Isso é pergunta que se faça?’, diz Marinara, 42, por telefone, há cinco anos em santidade. ‘Já usei o sexo como arma para segurar homem. Antes, eu queria um bofão. Agora, estou tranquila até conhecer o meu varão.’ A pastora classifica Marinara como a ‘primeira ovelha difícil’: ‘16 anos de Carnaval, 20 na macumba’. Chegou ao Bola pelas mãos de Monique Evans [que deixou a igreja].

A policial conta que sofreu violência doméstica, teve depressão, passou nove dias sem tomar banho e três meses sem sair de casa. ‘Fui uma das mulheres mais chifradas do Rio.’ Na igreja, recuperou até a amizade com Regininha. As duas brigaram por causa do apresentador Fernando Vanucci, que se casou com a primeira e depois namorou a segunda. Conta Regininha: ‘Um belo dia, no show da Madonna [em 1993], ela me viu com ele e partiu pra cima. Me deu uns mata-leão, uns socos, um chute… Claro que eu fiquei magoada, né? Porque a ideia…’ ‘A ideia é não ser enforcada’, ajuda a pastora. ‘Eu fiquei cega. Apaguei ela’, conta Marinara. ‘Estava deslumbrada com o mundo artístico. Depois, fui chorando pedir perdão.’ Sua capa de ‘Playboy’, em 1992, vendeu ‘mais que a da Juma’ [personagem de Cristiana Oliveira na novela ‘Pantanal’], lhe contaram na época. Foram seis ensaios entre ‘Playboy’ e ‘Sexy’. ‘Imagina quantos homens traíram suas mulheres vendo essas revistas?’

Regininha também fez vários: ‘Trip, Sexy, Sexy Premium, Sexy com CD, Playboy’. Hoje, todas se arrependem e nenhuma repetiria a dose. ‘A gente não deleta o passado, mas quero mostrar, com o meu testemunho, que uma atriz não precisa ficar nua pra comprar um apartamento’, diz Roberta.

Todas as convertidas usam calça justa, salto alto e cabelão solto e tingido. Giselle, 28, é a única que não tem o cabelo tão loiro. ‘Vai ter que amarelar!’, gritam juntas. ‘Vamos mostrar que crente não usa mais coque, vestidão, que se depila’, diz Roberta. E bota silicone, um denominador comum entre várias boladas. ‘A Bíblia diz que a mulher tem que se embelezar’, argumenta Giselle. ‘O amadurecimento tem que ser espiritual. Mas, aí, se você fica lá, embagulhada, [só dizendo] Jesus, Jesus, o cara vaza’, diz Roberta.

Além da igreja, de várias terem feito silicone e algumas terem posado peladas, o que une esse grupo? Para Luciana, a dificuldade de lidar com a fama [ou com a falta dela] pesou para todas. ‘Esse mundo mexe muito com o ego. Se você não passava num teste, ficava desesperada. Hoje, se não passa, é o senhor fazendo a sua vontade.’

Regininha conta que começou a enxergar coisas antes invisíveis a seus olhos. ‘Esses dias, eu tava olhando uma árvore e reparei: ‘Como essas folhas estão verdes! Olha essa flor!’ Já Georgiana diz ter visto anjos três ou quatro vezes. ‘Eles são altos e brilham feito nácar.’

É tarde e as meninas decidem as pautas do próximo programa: aborto, música e submissão da mulher. Algumas partem e outras ficam para um grupo de estudos sobre ‘Obras da Carne’. Na púlpito -que tem uma prancha de surfe e cenário pintado com areia, sol e mar-, uma líder da igreja critica as leis ‘a favor de liberar o homossexualismo’, diz que não se pode fazer sexo oral ou anal porque são as ‘duas extremidades do canal digestivo’ e ensina que a masturbação ‘não agrada a Deus’: ‘Quando você se masturba, não pensa em cachoeira. Pensa em pornografia’.

Na hora de partir, Regininha chama o filho, Lucas, 5, que a acompanhou à igreja. De repente, ele começa a rebolar. Com quem aprendeu isso? O menino aponta para a mãe. ‘Eu?’, se espanta Regininha. ‘Ta me botando no fogo? Faz anos que eu não rebolo! Crente não dança assim…’’

 

BIOGRAFIA
Bill Keller

Cidadão Luce

‘De todas as discussões em curso, hoje em dia, no ruidoso ponto de inflexão que o setor de notícias ocupa, nenhuma é tão básica quanto o debate sobre a credibilidade jornalística -quem a detém e que valor ela deve ter.

De um lado, simplificando a questão, existe a visão de que o poder de democratização da internet tornou obsoletos as formas e os valores tradicionais do jornalismo e, com eles, não incidentalmente, a ideia de que as pessoas deveriam pagar pelo acesso à notícia. Entre os partidários mais utópicos da ideia de que a sabedoria está nos números, depender de jornalistas profissionais é visto como elitista e sufocante. Do outro lado, existe a convicção de que uma população significativa de pessoas sérias sinta a necessidade de que alguém dotado de treinamento, experiência e padrões -repórteres e editores- ajude na tarefa de localizar e selecionar as notícias, identificar o que elas têm de importante e descobrir o que significam.

Isso de maneira nenhuma exclui a participação da audiência, em forma de comentário, contribuição ou colaboração (uma prova é a esplêndida combinação entre jornalismo profissional e amador que manteve ativo o noticiário recente sobre o Irã).

Mas, nos termos dessa visão -da qual compartilho-, a credibilidade dos jornalistas profissionais é tanto uma valiosa conveniência para os leitores que não têm tempo ou disposição para administrar sozinhos o tsunami de informações recebidas quanto um bem cívico, já que uma democracia precisa de uma base compartilhada de informações confiáveis sobre a qual realizar seus julgamentos.

Henry Luce [1898-1967], por bem ou por mal, pode ser considerado um dos pais fundadores da escola do jornalismo como autoridade. Luce, o criador das revistas ‘Time’, ‘Life’, ‘Fortune’ e, posteriormente, ‘Sports Illustrated’, foi um magnata da mídia em uma era na qual a liberdade de imprensa pertencia aos proprietários das editoras (e não, como agora, a qualquer pessoa dotada de acesso à internet).

Luce empregava seu poderoso megafone para promover líderes que admirava, pintar um retrato, em geral positivo, da classe média americana e fomentar a causa da intervenção dos Estados Unidos no mundo, o que inclui sua paixão incansável pela desventura do Vietnã. O que ele definia como ‘jornalismo de informação com propósito’ era ocasionalmente difícil de distinguir de propaganda, e lhe valeu o escárnio dos intelectuais de inclinações esquerdistas.

Figura complicada

Alan Brinkley, estudioso do New Deal [plano econômico e social contra a Grande Depressão nos EUA] e colaborador frequente do ‘New York Times’, tem talento especial para restaurar as proporções corretas de figuras vistas como caricaturais. Em ‘The Publisher -Henry Luce and His American Century’ [O Publisher – Henry Luce e Seu Século Americano], o Luce que ele retrata é uma figura complicada, mais trágica que maligna.

O livro faz completa justiça à insegurança que Luce sentia como figura vinda de fora da elite, a sua afinidade cega pelos detentores do poder e a seus defeitos como homem de família. Mas o retrato o humaniza e destaca o papel que suas revistas, especialmente ‘Time’ e ‘Life’, desempenharam em um país que tentava desconfortavelmente se acomodar à função de força geopolítica dominante no planeta.

Para aqueles que, como eu, baseavam sua imagem anterior de Luce em ‘The Powers That Be’ [Os Detentores do Poder], livro de David Halberstam, a biografia de Brinkley não é especialmente reveladora, mas mostra maior sutileza e, por fim, maior simpatia pelo homem que lhe serve de tema.

O homem que, em seu mais famoso ensaio para a revista ‘Life’, proclamaria o século 20 como ‘o século americano’ nasceu e cresceu a mais de 10 mil quilômetros dos EUA. Seu pai era um missionário presbiteriano na China, educado na Universidade Yale, que via sua tarefa como não só converter os chineses a sua fé, mas elevá-los a padrões ocidentais de educação e prosperidade, de modo a que gravitassem naturalmente na direção do cristianismo.

Como estudante em Hotchkiss e Yale, Luce apresentou desempenho acadêmico notável, mas sempre teve dolorosa consciência de que sua família não tinha dinheiro; a inveja ressentida que dedicava aos privilegiados natos influenciou o ideal de uma classe média satisfeita e inclusiva que norteava o empresário e suas publicações.

Empreitada jornalística

Em Hotchkiss, uma escola de ensino médio, ele também conheceu uma das duas pessoas que desempenhariam os mais importantes papéis em sua vida adulta -ambas, a um só tempo, rivais e parceiras.

Britton Hadden era tão iconoclasta quanto Luce era sério, tão incontido quanto Luce era disciplinado e tão carismático quanto Luce era socialmente inepto. Repletos de autoconfiança juvenil, eles conceberam a ideia de uma revista semanal de notícias e análises, que tomaria por base o material de outras publicações.

A revista se chamaria ‘Facts’ (mas o nome foi mudado para ‘Time’ antes do lançamento, em 1923) e prometia vasculhar quase 90 periódicos e amalgamar notícias provenientes de todas as esferas.

A nova revista tinha as qualidades que hoje associamos aos blogs. Era concisa e informal, com preferências políticas claras e expressas em uma prosa que inspirou inúmeras sátiras.

O autodestrutivo Hadden terminou morrendo aos 31 anos em razão de uma vida de excessos, mas a ‘Time’, àquela altura, já se havia transformado em grande sucesso, e uma revista de negócios, ‘Fortune’, estava a ponto de ser lançada. Poucos anos mais tarde, Luce começou a planejar uma ‘revista de fotos’ que se tornaria a imensamente popular ‘Life’.

Editor-chefe

‘Time’, ‘Fortune’ e ‘Life’ se tornaram veículos para trabalhos originais de alguns dos melhores jornalistas e fotógrafos do planeta. Alguns deles -James Agee, Theodore White, Archibald MacLeish, Margaret Bourke-White- têm papéis memoráveis no livro.

Mas o mais importante dos personagens coadjuvantes na história, excetuado Hadden, é Clare Booth Luce, a segunda mulher do magnata da mídia, dramaturga, deputada federal, embaixadora na Itália e maluca de carteirinha. Suas escapadas teriam valido cobertura abundante na revista popular que a Time Inc. criou depois da morte de Luce, ‘People’.

Desde o começo, as revistas de Luce não hesitavam em opinar, e ele se esforçou, nem sempre com sucesso, para que as opiniões veiculadas fossem as dele. Luce nunca se definiu como publisher, ao contrário do que o título de Brinkley indica, e sempre preferiu o título de ‘editor-chefe’, refletindo a influência direta que exercia sobre o conteúdo.

A curiosidade e o senso de admiração quase infantil que Luce sempre exibiu representam o aspecto redentor e mais genial de suas publicações. Mas elas também eram caracterizadas pelo encanto para com o poder. Luce instava suas revistas a promover os políticos que ele amava.

A ‘Fortune’ também tinha uma agenda específica; Brinkley a descreve como ‘legitimar o modernismo, recompensar aqueles que contribuem para a racionalização da indústria e do comércio e celebrar a nova e elegante estética que acompanha esse processo’. E o papel da ‘Life’ era promover o ideal de um país harmonioso e dominado pela classe média.

O século americano

A causa mais duradoura de Luce, forjada pela Segunda Guerra Mundial [1939-45] e alimentada por seu desdém pelo comunismo, tinha por foco sua visão ativista e paternalista do papel americano no mundo, e seu desprezo por aqueles a quem via como isolacionistas ou adeptos do apaziguamento.

Essa visão foi articulada no ensaio ‘The American Century’ [O Século Americano] e dominava todas as suas publicações. Houve momento em que chegou a contemplar a possibilidade de fazer de ‘Fortune’, em lugar de uma revista de negócios, uma revista sobre ‘os EUA como potência mundial’.

Halberstam definiu Luce como ‘o mais influente dos empresários editoriais conservadores dos EUA e, ao menos nos anos 1950, dotado de influência comparável à do secretário de Estado’.

Brinkley ressalta um pouco mais que outros biógrafos as limitações do poder de Luce -ele não só se provou incapaz de levar presidentes a fazer o que não desejavam como enfrentava problemas para convencer seus editores e redatores a seguir a linha que impunha. O ódio que sentia por Franklin Roosevelt não abalou seriamente a popularidade do presidente, ou distorceu suas políticas. A ideia de que os EUA tinham a obrigação de libertar a China [dos comunistas] não conquistou espaço.

E Luce nem era tão conservador. Apoiou a expansão do poderio do governo, o que inclui o Estado de bem-estar social. Defendeu os direitos civis das minorias e era menos chauvinista que seus pares quanto à liberdade feminina. Defendia os sindicatos.

O legado de Luce

Não importa o que mais achemos de Luce, ele jamais apelou. Sempre que suas publicações enfrentavam dificuldades, ele insistia em que a maneira de revigorá-las era torná-las melhores, e não mais burras, populistas, sensacionalistas ou cínicas. Na opinião de Brinkley, o legado de Luce não está em qualquer grande influência sobre a política ou as decisões estratégicas americanas, mas sim na criação de novas formas de mídia que ‘ajudaram a transformar a maneira como muita gente experimentava as notícias e a cultura’.

O que isso significa? As revistas de Luce, e posteriormente os reconfortantes telejornais da era do tio Walter Cronkite [âncora do principal telejornal da rede CBS de 1962 a 1981], ofereciam aos norte-americanos um conhecimento compartilhado, um senso unificado sobre o mundo.

Quando Luce morreu, em 1967, esse consenso já havia sido dilacerado, e hoje não existe veículo, ou voz, dotado do coeso poder que caracterizou as revistas de Luce em seu auge.

Seria um erro sentimentalizar a versão de credibilidade jornalística que dominou o século passado. Mas é provavelmente justo afirmar que a cacofonia da mídia atual -na qual boatos e invectivas, com frequência, sobrepujam a verdade factual, na qual a gritaria muitas vezes sufoca a reflexão sóbria, na qual as pessoas podem se sentir plenamente informadas mesmo que jamais encontrem opiniões que contrariem seus preconceitos- tem certa influência na polarização de nossa política, na disfunção do nosso sistema político e no crescente cinismo do eleitorado americano.

BILL KELLER é editor-executivo do ‘New York Times’, jornal em que foi publicada a íntegra deste texto.

Tradução de Paulo Migliacci

THE PUBLISHER

Autor: Alan Brinkley

Editora: Alfred A. Knopf (EUA)

Quanto: US$ 35, R$ 61 (560 págs.)

ONDE ENCOMENDAR – Livros em inglês podem ser encomendados pelo site www.amazon.com’

 

 

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