‘Durante 27 dias o leitor de O Povo, como, de resto, o consumidor de notícias em geral viu-se bombardeado por um noticiário que dava idéia de uma greve de bancários que parecia prestes a paralisar a economia nacional. A média das matérias publicadas entre 17 de setembro e 14 de outubro, ou, pelo menos, a maneira como foram editadas, levava à falsa impressão de que todo o sistema bancário se encontrava envolvido no movimento de pressão contra banqueiros, privados e públicos, pela concessão de aumento salarial e outras conquistas para categoria. O leitor Vicente de Paula Pessoa reclama que se orientando pelo que a imprensa informava, o que inclui O Povo, ‘a gente pensava que estava tudo paralisado. No entanto, o sistema de compensação nunca deixou de funcionar um dia sequer, ou seja, quem pensou que podia esperar a greve acabar para cobrir um cheque, por exemplo, quebrou a cara’. Para ele, o problema é que as notícias não conseguiram dimensionar o tamanho real do movimento dos bancários, sugerindo uma espécie de ‘corporativismo’.
A notícia estava com o gerente
A advogada e professora universitária Ana Virginia precisou contactar o gerente da agência do BEC onde mantém conta para saber que a compensação funcionava normalmente e que teria de correr ao banco para cobrir um cheque de sua mãe em determinado dia. Como muita gente, ela, até então, imaginava que a greve tinha conseqüência sobre o processo de pagamento dos cheques. O resultado, o leitor pôde conferir em matéria editada na página 21 do O Povo da última terça-feira, dia 12, onde a advogada precisou usar de seus direitos de cidadã para conseguir entrar em agência bancária e ser atendida no caixa, fazendo o depósito que garantiria a cobertura. Durante contato com o Ombudsman, ela, mesmo sem se queixar especificamente da cobertura do jornal, admitiu que as notícias faziam supor que a greve era mais ampla do que, de fato, a realidade demonstrava. Não fosse o contato pessoal com o gerente ela diz que teria ficado sem saber que a compensação nunca parou de funcionar todo o tempo em que a greve se estendeu. O movimento, aliás, foi suspenso temporariamente em alguns bancos e de maneira definitiva em outros, do setor público, pois na área privada quase não se fez sentir.
Do lado de cá, uma outra percepção
A percepção dos jornalistas do núcleo de Negócios do O Povo é diferente. A editora-executiva Regina Ribeiro demonstrou-se surpresa, até, com o questionamento apresentado sobre a cobertura da greve. ‘Acompanhamos tudo de perto, notícias foram publicadas todos os dias, praticamente, e acreditamos ter deixado claro que os bancos, do ponto de vista dos seus recursos tecnológicos, se mantinham funcionando’, diz ela, lembrando que ao longo dos 27 dias da greve várias matérias abordaram a questão da perspectiva dos clientes, dos cidadãos, de lojistas. Ou seja, continham a preocupação com os efeitos práticos para aqueles que apresentam mais dificuldade de resolver suas pendências bancárias através da internet ou outros meios eletrônicos, para quem precisava ser atendido na ‘boca do caixa’, segundo avaliação da editora. Para Regina, porém, as queixas chegadas ‘parecem demonstrar que havia espaço para sermos mais claros do que fomos na nossa cobertura. Mesmo assim, a impressão que temos no núcleo, é de que as matérias demonstraram que havia diferenças, que havia bancos funcionando normalmente e que apenas parte das operações estava atingida’.
O advogado e anunciante pede mais espaço
O leitor, anunciante e advogado João Quevêdo Ferreira Lopes encaminha direito de resposta, no qual faz algumas ponderações quanto ao conteúdo da coluna de domingo passado, dia 10. Primeiro, pede para esclarecer que seu pai, João Jacques Ferreira Lopes, era ‘sócio’ e não apenas funcionário do O Povo. De fato, João Jacques, que entrou na empresa como redator, foi integrado posteriormente como um dos seus acionistas, em ato de reconhecimento pelo seu trabalho, lealdade e outras qualidades demonstradas ao longo de uma extensa e profícua relação profissional. Em outro ponto de seu documento, o advogado diz que os motivos que levaram o jornal à decisão de suspender suas matérias pagas não foram a ele apresentados, insistindo, por outro lado, na sua versão de que a razão verdadeira seria uma pressão de Procuradores da República contra o comando da empresa. Segundo Quevêdo, os representantes do Ministério Público, para conseguirem suspender suas matérias, teriam ‘chantageado’ o jornal, ameaçando dar andamento a execuções fiscais por uma dívida da empresa com a União. A direção do O Povo mantém sua versão de que decidiu não mais publicar os textos depois de uma longa discussão, levada às mais diversas instâncias internas, pelo entendimento de que estava caracterizada uma campanha devido à quantidade de matérias pagas, o tema comum, o tom de ataques contra agentes públicos da Justiça e Ministério Público, além do peso que se deu ao fato de o autor das denúncias ser um advogado da ativa. Ou seja, havia o evidente risco de ele, por sua atividade profissional, criar algum tipo de constrangimento para magistrados que logo adiante estariam julgando uma causa por ele patrocinada.
Quem sabe a redação não ‘compra’?
No documento endereçado quarta-feira passada, dia 13, João Quevêdo faz uma espécie de desabafo. Diz ser um advogado conhecido pela ‘combatividade’ e afirma que denuncia ‘as irregularidades que ocorrem, sobretudo no âmbito do Judiciário, sempre esteado em provas. Nada me intimida, nem me faz calar’. Para ele, o comportamento do O Povo no caso aumenta uma alegada descrença dos cidadãos com a imprensa, que diz vir aumentando e propõe, por isso, que ‘se faça um trabalho de recuperação da imprensa falada e escrita do nosso Estado perante a sociedade, o que só será possível com a atuação serena e firme de pessoas independentes, comprometidas unicamente com o bem da sociedade e do estado de direito’. O advogado está no seu direito ao manifestar toda sua decepção com a decisão tomada pelo jornal e, vale ressaltar, tem a solidariedade do leitor Máriton Maia, que ligou para dizer que também acha que a liberdade de expressão está sendo tolhida no caso. Sugiro ao advogado João Quevêdo, mais uma vez, que opte por outro caminho para fazer suas denúncias ganharem eco na sociedade, oferecendo-as à Redação do O Povo, com todas as provas e documentos que diz ter, para as necessárias apurações. Digo, de novo, que enfrentando resistências editoriais para dar conseqüência a fatos graves que queira levar ao público, aí sim, encontrará no Ombudsman um aliado que, lamentavelmente, não pude ser quanto à sua queixa pela legítima decisão empresarial de não mais aceitar textos pagos a partir de quando viu caracterizado neles uma campanha.’