Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Joaquim Furtado

‘Confiança é, certamente, a palavra que deve definir a relação entre os leitores e o jornal. Procurar reforçar essa confiança é, certamente, o principal da tarefa do provedor do leitor, ao evidenciar a voz crítica daqueles a quem o jornal se destina.

A ideia está consignada numa passagem do ‘Estatuto do Provedor’ que é ponto central e princípio norteador desta coluna: ‘Nenhuma redacção dispõe da massa de conhecimentos e da capacidade crítica que os leitores de um jornal representam. Atender, analisar e encaminhar as dúvidas, queixas e sugestões dos leitores são competências do provedor que contribuem para aumentar a confiança dos leitores no seu jornal diário e para tornar mais transparentes os processos e decisões jornalísticos que intervêm na produção das notícias.’

É isso que se tem procurado, ao privilegiar a correspondência dos leitores como matéria de reflexão, embora partilhando esses temas com os que o provedor escolhe por sua iniciativa pessoal.

Preenchida com as questões mais universais ou representativas, por opção natural e por razões de espaço, a coluna do provedor não é, no entanto, a única expressão do ‘diálogo’ permanente entre o provedor e quem lê o Público. A participação dos leitores vai muito para além do conteúdo desta crónica semanal.

Alguns exemplos retirados da correspondência diária, não publicada, apenas para ilustrar essa outra ‘coluna paralela’, quando é decorrido meio ano sobre o início destas crónicas:

Pergunta Carlos Fernandes: ‘Não ficaria de bem com a minha consciência se não chamasse a atenção para o facto de o Público `permitir´por vezes algumas asserções que julgo impróprias num jornal com a responsabilidade como a que este detém. Cito o exemplo que motivou esta mensagem: (…) sob o título `Imprensa mundial invade Gelsenkirchen´, escreve-se que a final vai ser acompanhada por mais de 450 jornalistas `de imprensa escrita´. Este pleonasmo não merece reparo ?’

Resposta do provedor: ‘A expressão `deixou de ser´ um pleonasmo… isto é: antes da adopção e generalização das expressões `media´, ou meios de comunicação social, a palavra `imprensa´ tinha passado a significar todo o jornalismo, independentemente de ser escrito ou audiovisual. Sendo assim, a forma de especificar as referências aos jornais passou a ser o uso da expressão `imprensa escrita´. Autores tão consagrados como Daniel Cornu utilizam a expressão como, por exemplo, no excerto que cito: `Associar o público de uma forma ou de outra, a começar pela publicação regular de um correio dos leitores na imprensa escrita, é introduzir processos de verificação das normas da informação jornalística.’

Pergunta João Vaz: ‘As notícias referentes ao assassinato do cidadão sul-coreano no Iraque referem-se-lhe como `execução´, e isto de forma quase unânime. Desde quando um acto desta natureza merece a designação de `execução´? Por que razão as mortes de elementos do Hamas ou de outros grupos palestinianos (às mãos do Exército israelita) são qualificadas como `assassinatos´ou `execuções extrajudiciais´e, neste(s) caso(s) o registo muda? O cidadão sul-coreano e outros antes dele foram alvos de algum julgamento que lhes determinasse a pena a aplicar ?’

Resposta do provedor, transcrevendo as explicações da editora da secção Mundo, Margarida Santos Lopes, sobre os critérios usados no jornal : ‘A expressão `execução´ tem sido usada por todos os `media´ internacionais para caracterizar os `assassínios´que têm sido levados a cabo por raptores no Iraque. A execução tem sido, recentemente, na forma de decapitação e não creio que o uso do termo esteja errado. Quanto aos elementos do Hamas, como as mortes são atribuidas a, ou reivindicadas por, militares israelitas que fazem parte de um Estado de direito, usamos geralmente os termos `assassínio selectivo´ou `execução extrajudicial´. Não há nada de discriminação.’

Questiona a leitora Olivia Soares: ‘No Público de hoje aparece o termo `desfibrilhador´. Esta palavra não existe no dicionário. O vocábulo correcto é desfibrilador (…).

Após ouvir Rita Pimenta, coordenadora do sector ‘copydesk’ (e informando-a também que em dois de três dicionários consultados não aparece nenhuma das versões e que o Houaiss contempla apenas a forma `desfibrilador´) o provedor fez chegar à leitora a explicação que recebeu: ‘Após o acidente que vitimou o futebolista Féher, as primeiras declarações de médicos e de outros profissionais da saúde, referiam o termo `desfibrilhador´. Consultado o Dicionário Médico (da Climepsi Editores, de L. Manila, A Manila, P. Lewalle e M. Nicoulin ) a que se recorre nestas situações, verificou-se que regista as duas grafias: desfibrilhar e desfibrilar, bem como desfibrilhação e desfibrilação. Uma vez que a entrada era com `lh´optou-se pelo vocábulo `desfibrilhador´.’

Estranha a leitora Patrícia Jouin: ‘Estava eu a ler o artigo referente ao grande Robert Capa, da autoria de Raquel Ribeiro, a que sendo eu grande apreciadora de fotografia não pude deixar de prestar atenção acrescida, quando reparei num `pequeno´ lapso ao dizer que o nome verdadeiro de Robert Capa era Endre Friedman. Pois bem, presumo que talvez tenha sido lapso no momento da redacção do texto mas o seu nome era André e não Endre.’

Depois de pedir um esclarecimento a Raquel Ribeiro, o provedor respondeu à leitora, transcrevendo as explicações da autora do TEXTO ‘Entre inúmeras hipóteses de Andre (com e sem acento) e Endre, optei pela segunda porque me pareceu mais fidedigna segundo um dos livros que consultei, `Robert Capa: Fotographs´, da autoria do irmão de Capa (Cornell Capa) e do seu biógrafo, o americano Richard Whelan ( foi o único livro a que tive acesso que tinha sido `supervisionado´ pela família e os herdeiros do Robert Capa).’

São apenas alguns exemplos – que podem aproveitar a outros leitores, e até servir de estímulo à sua participação -seleccionados de entre inúmeros possíveis. Casos da esfera do provedor que não chegaram à coluna do jornal, mas não deixaram por isso de ser analisados.

Nas suas reclamações e protestos, os leitores nem sempre distinguem o âmbito de competências do provedor. Mas dirigem-se-lhe, à falta de outro destinatário que identifiquem, porque entendem que faz parte dos seus direitos exigir explicações. E faz. Para o provedor, a relação de confiança passa por tentar responder sempre. Mesmo que, frequentemente, a resposta seja apenas encaminhar o assunto para os serviços respectivos. Ou então convidar esses serviços para esta coluna. É o que acontecerá na próxima crónica que se ocupará de casos relacionados com as áreas do marketing e da publicidade do jornal.’