Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Joaquim Furtado

‘Há, no correio do provedor, bastante correspondência sobre textos de opinião. Leitores que pretendem ver impresso o seu ponto de vista e presumem que cabe ao provedor promover esse objectivo ou leitores que, tendo reagido a comentários, editoriais ou crónicas de colaboradores ou jornalistas, recorrem ao provedor reclamando por não terem visto publicadas as suas opiniões.

O tema já foi analisado nesta coluna. Sendo matéria da competência da direcção do jornal, o director expôs aqui as regras a que obedece a participação dos leitores e explicou os critérios de selecção usados. Por sua vez, o provedor fez as recomendações que julgou adequadas para reduzir as razões de queixa de leitores e que continua a considerar válidas.

Há, entretanto, regularmente, quem pretenda do provedor uma outra resposta que também lhe não cabe dar: que se pronuncie sobre opiniões sustentadas no jornal pelos seus colunistas. Não é uma tendência portuguesa. Provedores de outros países são também solicitados nesse sentido. E a posição é comum: poderá haver casos excepcionais, mas não cabe a esta coluna contrariar ou confirmar pontos de vista em divergência, arbitrando a favor da opinião do comentador e contra a do leitor ou vice-versa. Mas já é da sua competência, uma outra matéria, oportunamente referida neste espaço: tal como se exige em relação à informação noticiosa, também os factos que suportam artigos de opinião devem ser rigorosos. E quando não forem, os erros devem se rectificados como se faz com as notícias. Mesmo que, para assegurar eficácia, seja criada a figura do editor para textos de opinião.

Não prevê, de resto, o livro de estilo, nenhum compromisso, nesse plano, para quem – ‘colaboradores regulares e/ou ocasionais’ – escreve nos espaços de opinião.’Apenas’ se exige ‘respeito pela linguagem não insultuosa e não panfletária a que se obriga o Público’.

O assunto merece atenção, até por ser muito importante a parcela do jornal constituída pelo género opinião.

Durante muito tempo e antes do advento do jornalismo moderno, prevaleceu o jornalismo de opinião. Hoje é parte do conjunto da informação oferecida pelos jornais, assinada por nomes conceituados da comunidade intelectual, sejam escritores, políticos, sociólogos ou jornalistas. Na maioria colaboradores permanentes, os seus textos são publicados com regularidade fixa e em lugar estabelecido. São para o jornal um valor acrescentado, proporcional à sua notoriedade e prestígio. As suas crónicas, seguindo a actualidade, fazem deles líderes de opinião disputados como trunfos capazes de ajudar na afirmação ou na consolidação das publicações, junto dos leitores. Embora numa variante televisiva e rodeado de contornos próprios, o recente ‘episódio’ protagonizado por Marcelo Rebelo de Sousa ilustra a importância que podem ter e que a opinião pode ter, no quadro dos órgãos de informação. Recentemente, no âmbito de uma campanha desenvolvida nas suas páginas para anunciar a integração de Vasco Pulido Valente no seu corpo de colunistas, o Público – numa ‘bela metáfora de integridade’ – associou a ideia da coluna de opinião à imagem da coluna vertebral humana: ‘para ser livre e independente, para andar de cabeça erguida, é preciso ter coluna. O Público tem coluna’.

Por si só, a campanha ilustra a importância que o jornal confere à opinião, no conjunto do serviço que presta aos seus leitores. Uma importância não só reconhecida por ele. Precisamente num texto de opinião publicado no Diário de Notícias – onde, antes de se transferir, escrevia Vasco Pulido Valente – o jornalista Armando Rafael comentou que o Público ‘não só manteve e reforçou um leque de colunistas invejável, como ainda se deu ao luxo de enfraquecer a concorrência’. Tal como outros comentários, entretanto surgidos sobre o tema, também este analisa aspectos ligados ao papel dos espaços de opinião, considerando a sua diversidade e a orientação do jornal. Questões de conteúdo, relacionadas com os próprios estatutos editoriais de cada publicação, que haverá ocasião de analisar.

Por agora, uma vez que vai nesse sentido a solicitação de um leitor, fiquemos pelos aspectos da forma. A.J.Quadros Flores, do Porto, escreve a propósito da crónica assinada por Frei Bento Domingues no dia 14 de Novembro. Embora discordando da substância do texto, o leitor dirige-se ao provedor para ‘protestar pela forma de apresentação’ dele e para contestar o ‘destaque dado, em caixa, a uma simples citação feita pelo autor (…) destaque esse que, em regra, se toma como opinião do autor (…).

O leitor reconhece que o destaque ‘não se afasta muito da orientação geral’ do artigo e que numa ‘leitura em diagonal, bem poderá passar pelo seu sumário’ mas, mesmo assim, pergunta se ‘o destaque (caixa) abusivo’ é da responsabilidade do jornal ou do colunista. E considera a questão como ‘de ética jornalística’.

Cada jornal adopta a linguagem visual que entende como a que melhor serve a sua mensagem informativa. Por um lado, procura garantir uma identidade coesa de forma e conteúdo e, por outro, procura captar o interesse do leitor e facilitar-lhe a leitura. Diz Jean-Luc Martin-Lagardette que ‘não é por o leitor ter aderido à sua causa que [o jornal] pode dispensar o cuidado com o aspecto visual e com o estilo’.

Dentro deste espírito, um documento aprovado pelo Público alterando alguns conceitos que estabelecera no Livro de Estilo, visa um objectivo : ‘permitir os vários tempos e os vários níveis de leitura. Permitir que quem só lê os títulos entenda o essencial, fique a saber o que é mesmo importante ficar a saber ao mesmo tempo que quem ?entra? nos artigos o faz com facilidade e (…) com profundidade e rigor’.

Títulos, entradas, legendas e caixas obedecem a regras e linhas de orientação. Foram elas observadas no exemplo apontado pelo leitor?

As normas para as entradas e para os destaques nos textos de opinião, estão definidas como explica Luciano Alvarez, o chefe de redacção do jornal: ‘procura-se um excerto do texto que encerre uma ideia forte e que, se possível, acompanhe de alguma forma o sentido geral do artigo, ou de um dos seus temas, já que os colunistas nem sempre abordam um único assunto em cada crónica’.

A escolha do excerto que, em alguns casos, é sugerida pelo autor e pode sofrer uma ou outra adaptação formal, exigida pelos limites do espaço disponível.

Neste caso, o destaque resulta da transcrição ‘ipsis verbis’, de um excerto do texto (1), que chama a atenção do leitor, observando ao mesmo tempo o sentido do artigo. Claro que na margem de subjectividade envolvida pode caber sempre a sensibilidade de um leitor que diverge.

(1) – ‘Os discípulos roubaram o corpo de Jesus, inventaram a ideia da sua ressurreição e do seu retorno iminente. E tiveram êxito. Construiram o Cristo narrado pelos Evangelhos e pregado pela Igreja’.’