Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Joaquim Vieira

‘Duas reclamações sucessivas da assessora de imprensa de ‘Os Verdes’, Maria Luis Nunes, foram recebidas pelo provedor nos dias 14 e 15 de Outubro. O tema era comum a ambas: o PÚBLICO ignora as posições deste partido. Por outras palavras, ‘Os Verdes’ serão para este jornal um partido com assento parlamentar mas sem assunto para noticiar.

A primeira reclamação referia-se à notícia desse dia sobre uma série de audiências dos partidos parlamentares com o primeiro-ministro a propósito do então iminente Conselho Europeu para enfrentar a crise financeira mundial. Constatou Maria Luis Nunes que o jornal citou ‘as declarações feitas por todos eles (os da oposição), à excepção das de ‘Os Verdes’ (…), passando ao leitor do PÚBLICO a ideia de que apenas existem quatro partidos políticos da oposição com assento parlamentar’. A assessora indica a razão pela qual acha que as palavras dos seus dirigentes também deviam ser mencionadas: ‘No estatuto editorial do jornal pode ler-se que o ‘PÚBLICO é um jornal diário de grande informação, orientado por critérios de rigor e criatividade editorial, sem qualquer dependência de ordem ideológica, política e económica’’. E conclui: ‘‘Os Verdes’ esperam que aquele rigor seja aplicado de forma escrupulosa, de modo a evitar que ‘desinformações’ como a descrita acima voltem a ocorrer’.

O protesto seguinte foi motivado pela cobertura da entrega do Orçamento de Estado à Assembleia da República: ‘Dá-se destaque às reacções dos representantes dos partidos da oposição com assento parlamentar, mas, incompreensivelmente, as declarações da deputada Heloísa Apolónia, proferidas neste âmbito (…), foram omitidas’. Para Maria Luis Nunes, ‘mais uma vez, fica incompleta e imprecisa a informação que o PÚBLICO transmite aos seus leitores, deixando ainda transparecer a ideia de que ‘Os Verdes’ ou não reagiram a esta apresentação ou não fazem parte do grupo dos partidos da oposição com assento parlamentar’.

Este tipo de lamentações faz parte do universo e da circunstãncia da comunicação nas sociedades modernas. À esquerda e à direita, houve, há e haverá sempre gente a queixar-se de que o partido da sua preferência não foi tratado de forma equilibrada por este ou aquele órgão de informação.

Outra recente reclamação ao provedor veio do leitor Vasco Leitão em 30 de Setembro, desta vez por causa do (não) tratamento dado pelo PUBLICO.PT a (mais) uma tomada da posição do Partido Nacional Renovador (PNR, um grupo sem assento em S. Bento mas por vezes com muito assunto): ‘Segundo se pode ler no site do PNR, esse comunicado foi enviado para todas as redacções às 7h00 de hoje. Vários jornais divulgaram esse comunicado (…). Não está em questão, como é óbvio, se os editores/jornalistas concordam ou não com essa posição. Acontece que quem visitasse o site do PÚBLICO às 15h00 deparava com, na página inicial, três chamadas de atenção sobre posições do PCP (…). Dentro da secção de política, mais uma notícia principal do PCP e quatro chamadas de atenção sobre o PCP nos títulos abaixo (…). Ora, e novamente, não se trata de ser a favor ou contra determinadas posições, penso que o PCP tem tanto direito quanto os outros a ver as suas posições divulgadas. Nem sequer se respeitam as devidas diferenças de proporção de votos, visto que sobre o PNR nunca nada foi publicado e sobre o PCP é o que se vê, o que parece um critério não-pluralista e talvez tendencioso’.

Também o leitor Rafael Rodrigues enviou em 8 de Setembro o seguinte protesto (digamos, de sinal contrário): ‘Na edição de hoje, o espaço e destaque concedido pelo jornal à Universidade de Verão do PSD [discurso de Manuela Ferreira Leite – foto-legenda na pág. 1 e ‘destaque’ de duas páginas], à criação de uma fundação pelo PS [uma página] e à Festa do Avante! pelo PCP [discurso de encerramento de Jerónimo de Sousa – dois quintos de página] parecem-me completamente em desfavor deste último. Qualquer critério jornalístico de ordem de importância não é justificação’.

Importa saber quais as normas editoriais do PÚBLICO para o relevo a dar às posições dos partidos políticos. Foi sobre isso que o provedor questionou o director do jornal. Eis as explicações de José Manuel Fernandes:

1. ‘O primeiro critério é, como é óbvio, o do interesse jornalístico. Pode haver tomadas de posição do PNR com mais interesse do que comunicados do partido no poder, o PS. Depende do tema que abordam, como o abordam, da sua actualidade, oportunidade, novidade, potencial geração de controvérsia, número potencial de leitores a quem o tema pode interessar, etc.

2. Face a tomadas de posição ‘de agenda’, isto é, das que os partidos tomam porque é o dia de tomá-las (…), tende-se a privilegiar os partidos com mais impacto juntos dos eleitores, aqueles sobre os quais a maioria das pessoas quer estar informada. No caso português são cinco: PS, PSD, PCP. CDS e BE. Há mais partidos representados na AR – ‘Os Verdes’, que nunca concorreram em listas próprias mas formam um grupo parlamentar, julgo que ainda o PPM (um deputado eleito nas listas do PSD) e um grupo de independentes católicos na bancada do PS –, mas, por regra, noticiamos as suas tomadas de posição quando são substantivas, não por obrigação.

3. Fora dos períodos eleitorais, não temos nenhum critério ‘métrico’ para ‘equilibrar’ o noticiário vindo dos diferentes partidos, pois seguimos apenas critérios jornalísticos. Nos períodos eleitorais, em que é mais importante dar voz a todos, mesmo sem seguirmos critérios ‘métricos’, procuramos dar espaço (…) até aos mais pequenos. Mas mesmo nessas alturas é natural que os partidos parlamentares recebam mais cobertura, pois os leitores estão mais preocupados em conhecer as suas posições, até para escolherem. Isso não impede que, quando sentimos que há fenómenos políticos novos, os destaquemos. O BE foi exemplo disso mesmo quando ainda não tinha deputados. As recentes candidaturas independentes à Câmara de Lisboa também. Aqui é a nossa sensibilidade para captar o sentimento dos eleitores (ou as sondagens) que ajuda a tomar decisões’.

Sobre a edição de 8 de Setembro, José Manuel Fernandes acrescentou: ‘Fazendo parte do papel dos jornalistas escolher uma pequeníssima parte das notícias que nos chegam, as que merecem ser publicadas, tal como as que merecem mais desenvolvimento, isso significa que não praticamos uma ciência exacta. Por vezes enganamo-nos. Com os partidos e com outros temas. Não me parece ser o caso desta Festa do Avante!. Pelo menos a cobertura da Universidade de Verão do PSD, durante a qual se esperava de Manuela Ferreira Leite declarações relevantes, mereceria sempre mais atenção, à partida, do que mais uma Festa do Avante! que nem sequer era a primeira do actual secretário-geral do PCP. Já a criação da fundação do PS talvez tenha tido mais cobertura do que merecia por comparação com a festa do PCP. Foi assim este ano. Para o ano pode ser totalmente diferente. Dependerá do nosso julgamento sobre o que é mais importante nessa altura’.

No quadro constitucional de liberdade de expressão e informação em que se insere a nossa imprensa, é prerrogativa de um jornal relatar as posições políticas que entender, dentro dos princípios editoriais previamente definidos para a sua actividade (a invocação do estatuto editorial do PÚBLICO por Maria Luis Nunes não colhe neste caso, porque a omissão da posição do seu partido não denota falta rigor ou independência). Poderia ser diferente com um órgão estatal de serviço público, obrigado a certos constrangimentos nesta área (traduzidos caricatamente na absurda cronometragem pela Entidade Reguladora para a Comnunicação Social dos tempos ocupados pelos vários agentes políticos nas emissões da RTP), mas tal grelha não se aplica nem se pode aplicar a um meio de informação que é propriedade privada.

Além disso, sendo o espaço editorial de um periódico sempre limitado, será necessário que os seus jornalistas escolham o que julgam mais importante para publicação (princípio consagrado na célebre divisa de The New York Times: ‘Todas as notícias que merecem ser impressas’). E aqui entra em aplicação o tão falado critério jornalístico, que muita gente contesta (no seu legítimo direito) mas que não encontra substituto em nenhum outro.

Quanto ao grau de importância, nem sempre os jornais o conseguem reflectir, mas também isso é inerente à sua actividade e deve ser encarado como normal: podia a imprensa alemã, por exemplo, adivinhar o que viria a ser a carreira de Hitler quando ignorou os seus primeiros comícios?

O provedor nada tem por isso a objectar às respostas de José Manuel Fernandes, que esclarecem devidamente os casos expostos.’