Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

José Queirós

‘O aumento do preço do jornal pode ser compreendido pelos leitores, ainda que lhes desagrade. Já uma explicação coxa para esse aumento tenderá, provavelmente, a irritá-los. Foi o que aconteceu quando, no início deste mês, se anunciou na última página que o PÚBLICO iria passar a custar mais dez cêntimos aos fins-de-semana, ‘por causa do aumento do IVA’.

O leitor José Alberto Tomé, de Lisboa, não gostou da explicação. E vá de fazer contas: ‘O PÚBLICO (…) no dia 1 de Julho avisa-nos que o preço ao fim de semana será de 1,6 euros às sextas, sábados e domingos ‘por causa do aumento do IVA’! Ora esta informação não corresponde à realidade (quanto muito podem dizer que o aumento do IVA é um dos factores que leva ao anunciado aumento). De facto, 30 cêntimos por semana correspondem a um aumento do preço semanal actual de 3,5%, muito para além do aumento do IVA. Mas a base a considerar para saber qual o ‘IVA’ que o PÚBLICO vai cobrar deveria ser o actual preço sem IVA, que actualmente é de 7,08 euros. Teríamos assim, para justificar o novo preço, um ‘IVA’ de 24,3% (8,8/7,08 igual a 1,243)’.

‘Ironicamente’, comenta o leitor, ‘este anúncio é feito no mesmo dia em que noticiam o facto de o retalho querer pôr os fornecedores a pagar a factura! Então e o PÚBLICO? Porque aumenta a factura? Não merecemos uma explicação mais séria?’.

Claro que sim. Redigido como foi, o anúncio do aumento do preço parecia-se mais com alguma publicidade enganadora que por aí anda do que com uma explicação honesta e verdadeira aos leitores. Saibam os responsáveis pelo jornal manter sempre o respeito pela inteligência de quem os lê e não terão, penso eu, de recear que um aumento de 30 cêntimos por semana possa afastar quem hoje compra este diário.

O director adjunto Manuel Carvalho reconhece que ‘as contas do leitor são claras e inequívocas’. E justifica: ‘O que se pretendia dizer aos leitores é que no actual contexto do mercado da imprensa não nos seria possível acolher o impacto do agravamento da taxa do IVA. Ou, como sugere a carta do leitor, ‘o aumento do IVA é um dos factores que leva ao anunciado aumento’ (…). O PÚBLICO não aumentava o seu preço desde 2008. Entretanto, não só se agravaram os custos de matérias-primas como o papel, como as receitas publicitárias recuaram por força da actual crise. O aumento do IVA foi, por isso, mais um custo a ser considerado na decisão da empresa de aumentar o preço nas edições de fim-de-semana’.

Era o que, no mínimo, deveria ter sido dito desde o início. Manuel Carvalho considera pertinente, no caso, o conselho do leitor: ‘O PÚBLICO deveria ter mais cuidado com as informações que nos transmite!’. Eu subscrevo e só acrescento que não deveria ser necessária a intervenção dos leitores atentos para que a direcção editorial corrigisse falhas que são nocivas para a exigível relação de transparência com os compradores do jornal.

Mais cuidado e atenção deveriam os responsáveis editoriais dedicar também à leitura do que publicam nas suas páginas. Evitariam, assim, reclamações justificadas, como a que me chegou de Maria do Rosário Gama, directora da escola secundária Infanta D. Maria, de Coimbra.

Passo a transcrever: ‘Na contracapa do jornal PÚBLICO de hoje [16/7], na secção ‘Sobe e Desce’, vem uma notícia falsa sob o título ‘Rosário Gama’. É aí referido que eu fui eleita sucessora do dr. Álvaro Santos na presidência do Conselho das Escolas, quando este órgão só agora vai ser constituído. O escrutínio para a constituição do Conselho das Escolas foi feito ontem [15/7] e só depois da primeira reunião dos elementos eleitos se procederá à eleição do presidente. A jornalista sabia isto porque eu expliquei, em contacto telefónico, como se processava a eleição, por isso é muito desagradável para mim e para os outros conselheiros eleitos uma notícia deste teor, em contradição com o conteúdo sobre o mesmo tema incluído na página 7’.

Acrescenta a directora da escola de Coimbra: ‘Devo informar que não sou candidata ao cargo de presidente do Conselho das Escolas e por esse facto mais gravosa é a notícia. Agradeço pois um desmentido em nome do jornalismo de verdade’.

A correcção, acompanhada das devidas desculpas, foi já feita na edição de ontem, na secção ‘O PÚBLICO Errou’. Mas o que aconteceu ilustra bem o que o director adjunto Manuel Carvalho chama ‘um daqueles erros indesculpáveis que por norma acontecem na hora de fecho’. Explicação: a nota da última página ‘resulta de uma leitura apressada do texto que lhe está na base (…). O facto de Rosário Gama ter sido eleita para o Conselho das Escolas justificou sem dúvida o destaque que lhe foi concedido no corpo da notícia, e esse destaque pode ter influenciado a ideia de que a professora foi eleita não apenas para o Conselho, mas também para a presidência desse órgão’. Para concluir: ‘Uma leitura mais atenta do que se escreveu na página 7 seria suficiente para afastar esta percepção. O que, de facto, não aconteceu’.

Traduzir numa chamada de primeira página ou utilizar numa nota valorativa, como são as do ‘Sobe e Desce’, o que outro jornalista escreveu envolve, para os directores ou editores de fecho, uma responsabilidade dupla. Para com os leitores, no que toca à selecção dos temas, e à síntese e interpretação adequadas da notícia. E para com os próprios jornalistas autores das peças, às vezes envolvidos em erros pelos quais não são responsáveis. Esses jornalistas, ou os seus editores, podem e devem, aliás, ser consultados quando surjam dúvidas ‘na hora de fecho’.

No caso vertente, a jornalista Clara Viana, que assinou a notícia propriamente dita, transmitiu a informação correcta sobre o processo de eleição do Conselho das Escolas, destacando, com toda a lógica jornalística, o facto de um dos futuros membros deste órgão consultivo do Ministério da Educação ser alguém que fora, nas suas palavras, ‘uma das caras da contestação’ à política da anterior ministra. No topo da hierarquia redactorial, o responsável de fecho tresleu, e o resultado foi uma ‘notícia falsa’.

Compreensível? Sim, a pressão do fecho de um diário pode facilitar o desacerto. Aceitável? Não, os leitores têm direito a esperar que existam a organização e o rigor profissional que evitem lapsos deste tipo. Remédios? Reler, perguntar, pensar duas vezes. No caso específico das notas de uma secção como o ‘Sobe e Desce’, dialogar com aqueles por quem passou a notícia que lhes deu origem.

Os leitores também têm direito a não ser prejudicados por outros sinais de desorganização, como os que se revelam em falhas de coordenação interna e deficiências de revisão. Não me refiro, hoje, aos erros frequentes no uso da língua portuguesa, tema de queixas recorrentes e justificadas de vários leitores, a que não tive ainda oportunidade de dar a atenção sistemática que merecem.

Falo, desta vez, da área da chamada ‘informação utilitária’ (farmácias de serviço, grelhas televisivas, roteiros de espectáculos), cuja exactidão é essencial, e em que a negligência pode provocar contratempos aos leitores que nela confiam. Veja-se o caso do leitor Gonçalo Rosa, que já tivera a experiência de esbarrar na porta fechada de uma farmácia que o jornal lhe indicara estar aberta, e que no passado dia 26 de Junho viu frustrado o convite que fizera a amigos americanos para assistirem ao jogo de futebol entre as selecções dos EUA e do Gana, que o PÚBLICO anunciara, erradamente, ir ser difundido num canal televisivo de sinal aberto.

Referindo-se às edições de 26 e 27 de Junho, diz o leitor: ‘A informação televisiva referente aos jogos do Mundial desse fim-de-semana e publicada numa tabela de suporte aos textos estava toda errada: o Uruguai-Coreia foi difundido na SIC e não num exclusivo da Sport TV, o Gana-EUA e o Alemanha-Inglaterra não foram difundidos na RTP, como anunciado, mas sim apenas no canal pago’.

Consultei essas edições e concluí que a reclamação do leitor só pecava por defeito. Na verdade, na edição de 26/6 anunciava-se, na tabela referida, que o jogo Uruguai-Coreia do Sul seria difundido pela Sport TV, mas na mesma página, num quadro referente à partida, dizia-se que passaria também na SIC, enquanto na página da informação televisiva se voltava a referir apenas o canal pago. Quanto ao EUA-Gana, era anunciado, em lugares diferentes da mesma página, como passando só na RTP ou só na Sport TV, que por sua vez tinha o exclusivo da transmissão na página das grelhas televisivas. Na edição seguinte, referia-se na página 26 que o Alemanha-Inglaterra passaria na Sport TV, para na página seguinte se garantir que seria na RTP, e na informação televisiva que seria em ambas. Mesmo sabendo-se que os erros em matéria de programação são por vezes da responsabilidade das próprias estações televisivas, uma trapalhada como a que descrevi, com informações contraditórias na mesma página, só pode ser explicada por descoordenação e uma revisão desatenta ou inexistente.

Os responsáveis editoriais olham para estes erros, muitas vezes, como falhas menores, desvalorizando a desconfiança que provocam, que pode levar um leitor como o que citei a interrogar-se: ‘Se o PÚBLICO erra o básico, o que não fará com a informação mais complexa?’. Este é um problema de organização e profissionalismo. Sabe-se como as rotinas mais monótonas levam ao abrandar da vigilância. Uma monitorização regular da fiabilidade destas páginas poderia ajudar.’