Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Keila Jimenez

‘A guerra está no ar e é explícita. Após várias reportagens em jornais impressos da Igreja Universal, a Record resolveu atacar na TV o empréstimo do BNDES para saldar as dívidas das Organizações Globo. Nas chamadas para o Repórter Record de hoje, às 21h45, o texto omite o nome ‘Globo’, mas se refere a ‘uma das maiores empresas’ de comunicação do País enquanto a imagem mostra o logotipo do plim-plim. No programa, a Record mostra detalhes de bastidores dessa negociação e se ‘solidariza’ com os pequenos empresários que, em vão, lutam anos por ajuda financeira do governo. A atração é a nova bomba no fogo cruzado que a Record abriu contra a Globo. A rede de Edir Macedo resolveu atropelar até outros interesses, como a parceria com a concorrente na transmissão de campeonatos de futebol e a meta de obter imagens da Olimpíada de Atenas, cujos direitos, até aqui, são exclusivos da Globo e da Band no Brasil.’



Daniele Madureira e André Silveira

‘Bom – mas não é de graça’, copyright Meio & Mensagem, 29/03/04

‘O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deu, na semana passada, o primeiro sinal indicativo de que irá atender as empresas de comunicação com a liberação de crédito exclusivo para o setor. Na quarta-feira, 24, o vice-presidente do BNDES, Darc Costa, afirmou que o programa contará com recursos da ordem de R$ 4 bilhões – valor 20% inferior aos R$ 5 bilhões pleiteados na primeira proposta discutida com o banco, em novembro. Na ocasião, as principais associações de mídia no Brasil – Abert (rádio e TV), ANJ (jornais) e Aner (revistas) – levaram ao BNDES, juntamente com a consultoria MS&CR2, um levantamento completo do setor, informando que os veículos de comunicação estavam endividados em cerca de R$ 10 bilhões. Depois de quatro meses de estudo e discussão com os técnicos do banco, a mídia vê a possibilidade de ser contemplada com as três linhas que pediu: uma para investimento; outra para financiamento de papel imprensa e a terceira para reestruturação de dívidas. Mas as condições não são as que as empresas acalentavam.

Darc Costa afirmou que a linha de financiamento para a reestruturação de dívidas terá um custo mais alto que as outras duas. Esse é o ponto nevrálgico da discussão, principalmente no meio TV: as emissoras Record, SBT e Rede TV! não concordam com a liberação de crédito para pagamento de dívidas, pois acreditam que isso iria beneficiar a maior concorrente das três, a Globo. Só a holding das Organizações Globo, a Globopar, apresenta um rombo superior a R$ 5 bilhões, segundo balanço de 2002. O vice-presidente do BNDES deixou claro, no entanto, que o banco conta com um corpo técnico capacitado a elaborar uma proposta para o programa. ‘O BNDES não recebe prato feito’, afirmou Costa, durante audiência na Comissão de Educação do Senado, da qual participaram alguns dos principais executivos do meio TV – Dennis Munhoz, presidente da Record, Marcelo de Carvalho Fragali, presidente da Rede TV!, Luiz Sandoval, presidente do Grupo Silvio Santos, controlador do SBT, João Carlos Saad, presidente da Bandeirantes, e Evandro Guimarães, vice-presidente de relações institucionais das Organizações Globo.

Condições e desdobramentos

As condições do financiamento ainda estão sendo discutidas no BNDES, e deverão passar pela Comissão de Educação do Senado. Antes disso, assegurou Costa, as opiniões de todos os representantes do setor que procuraram o banco serão consolidadas em um projeto final. Mas algumas ressalvas o BNDES já fez à proposta original apresentada pelas associações: não haverá financiamento direto do banco estatal para o setor de comunicação; há a necessidade de apresentar garantias reais para obtenção do crédito; o BNDES vai pedir contrapartidas das empresas de mídia em termos de governança corporativa. Esse último ponto é considerado fundamental para especialistas do setor.

‘Para ter acesso a um funding de longo prazo, as empresas do setor precisam se tornar mais transparentes e reorganizar seus processos internos’, diz o consultor de mídia Fernando Portella, ex-presidente do grupo O Dia. ‘É preciso fazer a lição de casa, como qualquer outro setor da economia faz para sobreviver, mas na mídia as discussões em torno do possível financiamento por parte do BNDES têm ganhado contornos emocionais’, diz o consultor, referindo-se ao racha no meio TV e também às especulações de que a mídia correria o risco de perder sua independência editorial se recorresse ao banco estatal.

Procurando se resguardar de possíveis ataques da própria imprensa, o BNDES faz questão de debater as condições e desdobramentos do financiamento. Darc Costa afirmou que, a não ser que o Congresso se manifeste de maneira diferente, os financiamentos serão repassados por meio de instituições intermediárias, para que haja uma relação de transparência e independência entre as empresas de mídia e o banco. A única possibilidade de financiamento direto é através de debêntures não conversíveis, com prêmio de resgate com base no desempenho das receitas líquidas.

Já o gerente de telecomunicações do BNDES, Alan Fischler, afirmou que o banco não vai exigir contrapartidas sociais, muito menos pretende interferir no conteúdo, como determinar cotas de produção regional, por exemplo. ‘Existem outros fóruns mais apropriados para que esses pontos sejam debatidos, e essa discussão não cabe ao BNDES’, disse Fischler.

Reações

Na opinião do diretor geral da editora Três, Carlos Alzugaray, a necessidade de apresentar garantias reais e de ter um agente financeiro intermediando a liberação de crédito tornam um possível financiamento do BNDES menos atraente, uma vez que o aproxima das opções já disponíveis no mercado financeiro. ‘De qualquer forma, é positivo para o setor ter uma linha de crédito só para o setor’, ressalta Alzugaray, que também é presidente da Aner. No que se refere à Três, o empresário diz que a linha para reestruturação de dívidas não interessa. ‘A dívida que o grupo tinha era fiscal e já foi financiada pelo Refis’, diz Alzugaray, que pretende analisar, no entanto, a proposta de financiamento do BNDES para compra de papel imprensa e para investimentos no setor.

Já o grupo Abril, dono da maior editora da América Latina, tem interesse nas três linhas de financiamento, segundo o presidente da organização, Roberto Civita. Para ele, não faz sentido que a única instituição financeira que apresenta taxas de juros menos atrozes exclua a mídia. ‘Por que todos os setores do País têm tido acesso ao financiamento do BNDES e a mídia fica de fora?’, questiona. O presidente da Abril lembra que cada empresa irá discutir com o banco as suas necessidades.

Na tão atacada Organizações Globo, o vice-presidente João Roberto Marinho, sinaliza que o grupo pode usar o financiamento do banco para investir em TV digital – cuja implantação, no Brasil, ainda está em discussão. ‘Já em relação à reestruturação da dívida, ainda é preciso saber detalhes das condições de financiamento’, afirma.

Em Brasília, durante a audiência na Comissão de Educação do Senado, Luiz Sandoval, do SBT, afirmou que as concorrentes da Globo são obrigadas a sobreviver com 20% da verba publicitária do meio TV, já que 80% estão com a emissora carioca. ‘O ano passado foi péssimo para o setor, mas a Globo diz ter tido lucro de R$ 600 milhões na TV’, afirmou Sandoval. ‘Quem tem esse lucro não precisa de financiamento’.’



Pedro Soares

‘BNDES vai exigir contrapartida nacional’, copyright Folha de S. Paulo, 2/4/04

‘O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) vai exigir conteúdo nacional mínimo de 60% ou a certificação de que os produtos sejam feitos no Brasil para financiar projetos nas áreas de software, medicamentos e bens de capital.

Ontem, o banco anunciou detalhes das novas linhas de financiamento para esses setores, dentro da proposta da política industrial do governo Lula, divulgada anteontem e que prevê financiamentos de R$ 14,5 bilhões neste ano por parte de agentes federais, incluindo o BNDES.

Só para os três segmentos o banco estatal terá disponível ao menos R$ 1,1 bilhão em 04. O banco considera essas áreas estratégicas por seu conteúdo tecnológico, encadeamentos com outros setores e impacto no balanço de pagamentos.

No caso dos medicamentos e bens de capital, foram criadas linhas para financiar o aumento da produção, com a exigência de que ao menos 60% das encomendas sejam feitas à indústria nacional. Segundo a interpretação do BNDES, a regra não fere normas internacionais de comércio. No passado, o Brasil assinou compromisso com a OMC (Organização Mundial do Comércio) que o impedia de exigir que empresas do setor privado comprassem bens de fabricantes nacionais.

Para o ramo de software, o BNDES informou que espera desembolsar R$ 100 milhões neste ano. No caso de bens de capital (apenas os sob encomenda para compor uma nova linha de produção, como um alto-forno siderúrgico, por exemplo) e dos medicamentos e fármacos (princípio ativo), a previsão é emprestar R$ 500 milhões para cada setor.

O governo já havia anunciado uma linha de crédito com juros prefixados -a Modermaq– para máquinas prontas, cujo previsão de financiamentos neste ano é de R$ 2,5 bilhão.

Para os softwares, haverá uma linha destinada a financiar os compradores com juros prefixados -TJLP (Taxa de Juro de Longo Prazo), que está em 9,75% ao ano, acrescida de 5% ao ano (1% para o BNDES e 4% para o banco que repassar os recursos). Será exigida dos softwares a certificação de produção no país.

Desembolsos maiores

De acordo com o diretor da área industrial do BNDES, Fábio Erber, se a demanda de projetos para esses setores for maior do que o previsto, o banco tem recursos para ampliar os desembolsos.

‘São apenas valores estimados. Esses setores são motores do progresso tecnológico, que terão o apoio do banco’, disse.

O BNDES também terá outras duas linhas -uma na áreas de fármacos e outra na de software– que apoiarão fusões e aquisições entre empresas de capital 100% nacional.

Nesse caso, o banco poderá financiar o negócio ou se tornar sócio das empresas, injetando capital por meio da BNDESpar, braço de participações do banco estatal.

Para os bens de capital, haverá ainda uma linha para financiar as empresas responsáveis pelo leasing dos equipamentos.

Ciro Mortella, presidente-executivo da Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica, disse que o setor ainda não analisou as condições das linhas do banco nem se elas são positivas para o setor.

Ele disse, porém, que ‘mais importante do que ter os recursos são as condições impostas, que, às vezes, dificultam o acesso ao financiamento’.’



Cidade Biz

‘Guerra do bispo Macedo contra UTI da mídia ganha vulto no Senado’, copyright Cidade Biz (www.cidadebiz.com.br), 1/04/04

‘Ao que tudo indica não será só a fúria do bispo Macedo, da Igreja Universal, que o governo vai ter de driblar para prestar socorro ao setor de comunicação, que carrega uma dívida de cerca de R$ 10 bilhões. O dono da Record lança mão nesta quinta-feira de um dos programas da emissora, o Repórter Record, para declarar guerra contra a TV Globo e ao BNDES. De outro lado, um grupo de senadores, liderado pelo presidente da Comissão de Educação, Osmar Dias (PDT-PR), também deve abrir fogo contra a abertura do pronto-socorro de Lula à mídia brasileira.

A Comissão de Educação espera receber no início da próxima semana cópia da proposta em estudo pelo BNDES para abertura de financiamentos às empresas de comunicação social. Basicamente, segundo antecipou o vice-presidente do banco, Darc Costa, na audiência pública da CE que debateu o tema na semana passada, o foco central será a criação de três linhas diferenciadas – investimento, compra de papel e refinanciamento de dívidas.

Para Osmar Dias, a chegada do documento é imprescindível para que os senadores possam formar opinião sobre se a linha de crédito vai atender aos interesses do país. ‘Tenho muitas dúvidas em relação aos critérios, pois é importante que sejam usados os mesmos em relação a outros setores da economia’, disse em notícia da Agência Senado. ‘Reconheço a importância da mídia e sua função estratégica para o país, mas não cabe assegurar privilégios para ninguém.’

Darc Costa antecipou aos senadores que os planos do banco são de criar um programa de incentivo no valor de R$ 4 bilhões para as empresas de rádio, TV e mídia impressa. ‘O programa que imaginamos envolve investimentos, capitais de giro e reestruturação de dívidas’, confirmou Costa, na audiência pública do dia 24.

O senador Osmar Dias, porém, é contrário ao uso do dinheiro para este fim. ‘Na ocasião, trouxemos as partes envolvidas para apresentar seus pontos de vista e tornar públicas as condições em que os empréstimos poderão ser oferecidos’, disse. ‘Se não fosse realizada, talvez o dinheiro já tivesse sido repassado de uma forma não usual, já que o BNDES não tem, como se sabe, linha de crédito para capital de giro ou pagamento de dívidas.’

O senador Defende que os empréstimos sejam usados para investimentos, uma mudança de rumo importante para que o dinheiro público seja mais bem aplicado. Para vice-presidente da CE, o senador Hélio Costa (PMDB-MG), os critérios de concessão devem ser decididos pelo corpo técnico do BNDES, obedecendo às regras usualmente empregadas pelo banco.

Na sua avaliação, o programa de socorro deve ser amplo, abrangendo jornais, revistas, TVs e rádios abertas. Deve atender às mídias de todos os tamanhos, pois a crise no setor é geral. ‘O Estado brasileiro pode mostrar, com esse programa, que considera estratégico o segmento de meios de comunicação’, afirmou. ‘Já temos uma enorme participação estrangeira em setores como telecomunicações, telefonia, TVs a cabo e por satélite, por isso defendo que a imprensa brasileira seja protegida dessa invasão, que seja mantida em mãos nacionais.’

Depois de lembrar que ‘o BNDES é, sobretudo, um banco social’, Hélio Costa alegou que estão em jogo os 500 mil empregos oferecidos pelos meios de comunicação no país. ‘Hoje, o mercado publicitário encolheu e, além do mais, é disputado por um número muito maior de veículos, inclusive dezenas de canais de TV por cabo com sede no exterior.’’