Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Manuel Pinto

‘Nos últimos meses e, em particular, a partir do início deste ano, o universo mediático português entrou em ebulição com a perspectiva e a iminência de a PT vender a Lusomundo Media que detém, entre os seus principais activos, precisamente o Jornal de Notícias.

Mais recentemente, tornou-se raro o dia em que não surgem notícias sobre as movimentações no âmbito desse processo.

O provedor entende que deve dizer uma palavra sobre este assunto melindroso e complexo. Os leitores de um jornal como o JN constituem um vastíssimo grupo de pessoas seguramente muito heterogéneo. Muitos deles não se contentam em ler as notícias ou em consultar os anúncios interessam-se pela vida do jornal, pela sua orientação, pelas decisões e opções da empresa que lhe dá suporte.

Desta perspectiva, não pode deixar de ser visto como intrigante sucederem-se as informações sobre a venda do seu jornal sem que lhes seja prestado um esclarecimento. De resto, não é invulgar que para se saber da vida de um órgão de comunicação tenhamos de frequentar os órgãos de informação vizinhos e concorrentes. Ora os leitores do JN são, em certa medida, parte (decisiva, diria) do universo do jornal e, seja como leitores seja como cidadãos interessados na coisa pública, é-lhes devida informação específica e avalizada sobre o que se está a passar. Aquela que o provedor do leitor possa dar constitui uma achega, mas não a bastante, até porque é uma voz independente do jornal e da empresa.

Mas, então, que é que se está a passar? Os sinais de que o sector de media do grupo PT poderia ser objecto de transacção já vinham de trás, mas só começaram a tornar-se notícia na sequência da polémica que se seguiu à saída de Marcelo Rebelo de Sousa da TVI. Recorde-se que, na altura, se aludiu a um conjunto de factos que trouxeram para a ordem do dia a independência dos media face ao poder político, nomeadamente no caso da Lusomundo Media. Na verdade, a ‘golden share’ ou quota privilegiada que continua a permitir ao Estado influir nos rumos da PT constitui, como vários analistas observaram, uma porta entreaberta para o melhor, mas também para o pior. O que parece certo é que a polémica terá levado, aparentemente, a acelerar a decisão da PT de se abrir à venda dos seus activos no campo dos media. E o ‘bolo’ não é pequeno Diário de Notícias, TSF, 24 Horas, Tal & Qual, Grande Reportagem, Notícias Magazine e, naturalmente, Jornal de Notícias, entre outros.

No passado dia 14 terminou o prazo para a entrega de ofertas de compra, naquilo que foi como uma ‘auscultação ao mercado’. E, ao que se soube, cinco grupos, dois deles espanhóis e três portugueses, manifestaram interesse na aquisição, estando agora o processo dependente de uma decisão da PT. Oficialmente, porém, tudo parece ainda bastante indefinido quando, com quem e em que termos se verificará o negócio. Por razões políticas o assunto não deve retroceder, uma vez que não parece haver grande oposição dos principais partidos. Em todo o caso, há uma pergunta que é legítimo formular: há riscos para este jornal que decorram da sua eventual venda? Coloquei-a ao director do JN, José Leite Pereira, o qual, sobre o assunto, considera ‘deixar claro que o clima criado por esta situação não afecta o normal funcionamento do jornal nem a sua independência’. ‘Nem afectará – acrescenta ainda – desde que quem quer que compre assegure o estatuto editorial e a independência do jornal face a todos os poderes, como tem acontecido até aqui. Isso, para nós, jornalistas, é o essencial’.

Acerca desta matéria, perguntei igualmente ao director se não entendia que um assunto que envolve directamente o JN mereceria um tratamento noticioso mais aprofundado nas páginas do jornal. Leite Pereira reconhece que as notícias dadas têm sido ‘realmente escassas’. Atribui isso, no entanto, ao facto de não haver ‘informações seguras’, para além das que o JN tem adiantado, nomeadamente ‘quem fez ofertas, quem se mantém na corrida’. ‘Penso também que, quando se chegar a uma solução, há que esperar ainda algum tempo para se saber se a solução é definitiva, pois há que contar com o parecer da Autoridade da Concorrência e da Alta Autoridade para a Comunicação Social’, salienta o director deste jornal.

Em resumo, pode dizer-se que há um processo de possível alienação de um dos principais grupos de media do nosso país que está em curso e cujo desfecho não se conhece ainda; que esse processo envolve este jornal mas que não tem necessariamente implicações na sua orientação editorial; que, para além da dimensão de negócio, haverá lugar à intervenção e verificação de autoridades reguladoras, quer a do sector quer a geral, para indagar sobre se o pluralismo e as regras de concorrência correm ou não riscos com esta mudança. Este é um assunto que muitos acompanham com interesse e com preocupação.

Leitores querem acompanhar decisões sobre o futuro do seu jornal’