Friday, 27 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Mara Gama

‘Além da tragédia humana irreparável e dos desdobramentos sobre a atuação da polícia em dois momentos chaves do episódio ainda não esclarecidos, o violento final do seqüestro das duas adolescentes em Santo André expôs também mazelas da velocidade da informação.

Lindemberg Fernandes Alves, de 22 anos, manteve como refém a ex-namorada, Eloá Cristina, de 15 anos, e a amiga dela, Nayara, também de 15 anos, no apartamento de Eloá, em um conjunto residencial de Santo André, na Grande São Paulo,

O seqüestro começou na segunda-feira, 13 de outubro, por volta de 13h30.

Por volta das 18h10 da sexta-feira, 17, a polícia invadiu o apartamento.

As duas meninas foram retiradas do apartamento baleadas e levadas a um hospital. Eloá em estado gravíssimo, tendo sido atingida por duas balas. Nayara com ferimentos, tendo sido baleada no rosto. Lindemberg Alves foi conduzido a uma delegacia e posteriormente para a penitenciária.

As circunstâncias e a seqüência de fatos nos minutos imediatamente anteriores à invasão não estavam claros até a madrugada deste sábado, 18.

Em entrevista na sexta, o coronel Eduardo Félix de Oliveira, do Batalhão de Choque da PM, afirma que a invasão do apartamento ocorreu após e devido a um primeiro disparo. O Comando da Polícia afirma que usou apenas armas não-letais na operação.

A reportagem da Folha de S. Paulo, em contato com o governador José Serra no início da noite, informou, as 19h10, que a adolescente Eloá tinha morrido.

O texto foi publicado na Folha Online.

Segundo a reportagem, Serra fora informado da morte pela Secretaria de Segurança Pública. A notícia foi amplificada pelo UOL, que deu manchete em sua home page.

TVs a cabo e alguns sites passaram a divulgar a notícia da morte, afirmando que a informação fora confirmada pelo assessor de imprensa do Palácio dos Bandeirantes.

A informação da morte, porém, não foi confirmada pelo hospital, onde estavam internadas as duas meninas.

Na seqüência, a assessoria de imprensa do Palácio passou a negar a morte de Eloá.

Em novo texto, as 19h43, a Folha Online dava transparência ao desencontro das informações:

‘Embora o governador José Serra (PSDB) tenha sido informado pelo secretário da Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, da morte da adolescente mantida refém pelo ex-namorado, a assessoria de imprensa do Palácio dos Bandeirantes –sede do governo do Estado– nega que ela tenha morrido. De acordo com a assessoria do governo, a garota está em estado gravíssimo e em coma induzido.’

Mais tarde, a assessoria de imprensa do governo do Estado divulgou nota sobre o ocorrido, se desculpando:

‘A assessoria de imprensa do governo do Estado esclarece que chegou a receber a informação, da área da Segurança Pública, sobre o falecimento da jovem Eloá. No entanto, em seguida, nova informação deu conta de que, felizmente, ela foi reanimada na sala de cirurgia e, neste momento, encontra-se em coma induzido e processo cirúrgico. Pedimos desculpas à família de Eloá e, junto a ela, oramos a Deus por sua recuperação.

Segundo a equipe médica do hospital, às 23h de sexta-feira, o estado de Eloá continuava gravíssimo.

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Política da home page do UOL (17/10/08)

Na noite de quinta, 16, o UOL publicou reportagem que registrava a ‘cena’ do bairro de Santo André onde houve o seqüestro. O texto explorava a história real como se fosse um reality show.

O seqüestro virou ‘uma história de chamego mal resolvida’, na reportagem ‘Roubos, tráfico interrompido e rivalidade esportiva entram no seqüestro de Santo André’.

A home page do portal manteve um tom mais apropriado desde a primeira chamada para o caso, no dia 14:

‘Violência – Jovem mantém duas adolescentes reféns em Santo André’.

No mesmo dia, mais tarde, ‘Santo André- Rapaz que mantém jovens reféns suspende negociações com PM’.

No dia 15, ‘Seqüestrador libera uma das duas reféns em Santo André’. No dia 16, ‘Santo André – Jovem mantém refém pela 3ª manhã seguida’.

As palavras seqüestrador e seqüestro foram usadas comedidamente até o desfecho final, quando as garotas foram baleadas, o apartamento foi invadido e Lindemberg Fernandes Alves, preso.

Entendo que a atitude editorial se insere nas diretrizes da recém-divulgada política editorial da home page do portal, divulgada no dia 15, junto com o novo layout:

‘Os sistemas de medição de audiência em tempo real podem e devem ser usados pela equipe da home page, de modo a balizar o tempo e a forma de exposição de cada assunto. Mas o interesse da audiência por temas escabrosos e sensacionalistas ou o desinteresse do público por temas difíceis não devem obstruir a capacidade de discernimento jornalístico da equipe e a responsabilidade pública do portal’.

No momento da libertação das reféns, a home page do UOL passou a dar link para reportagem o sinal ao vivo da BandNews.

Também ali, a home page deu temperatura à cobertura, cumprindo o dever de fornecer informações atualizadas, sem, contudo, aderir ao tom do noticiário da BandNews. Ponto positivo.’