Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Marcelo Beraba

‘Escrevi, na coluna de domingo passado, a propósito da cobertura que a Folha fez dos assassinatos no centro de São Paulo, que o jornal não soubera aproveitar o momento para abrir e aprofundar a discussão sobre a população que vive nas ruas.

São mais de 10 mil pessoas sem perspectivas de vida. Nem todos são mendigos. Muitos trabalham recolhendo papel e latas. É um problema seriíssimo, como ficou demonstrado na seqüência de chacinas iniciadas dia 19. Na quinta-feira passada, mais uma pessoa foi assassinada, e agora já são sete mortes.

O jornal começou mal a sua cobertura. Mas, com o correr dos dias, passou a acompanhar bem as investigações policiais e acabou revelando, em reportagens esparsas, um pouco da vida dessas pessoas abandonadas. Foi bem ao manifestar sua opinião e exigir providências por meio de três editoriais. E teve momentos de brilho com as charges do Angeli, do Glauco e do Jean, publicadas no caderno Opinião (página A2).

Fórum de debates

Falhou, no entanto, ao não abrir espaço para o debate. Jornais informam, prestam serviços e são, por tradição, fóruns de discussão e de confronto de idéias e políticas. Nem sempre fazem bem. Às vezes, deixam os assuntos fugirem, às vezes, os tratam sem aprofundamento.

Não é um problema só da Folha. Acho improvável que algum leitor tenha conseguido consolidar uma opinião sobre assuntos polêmicos, como o sistema de cotas nas universidades, por exemplo, ou os riscos dos transgênicos, lendo apenas os jornais.

É um desafio abrir espaço para os novos assuntos, fugir das discussões ralas, conseguir contribuir de fato para o entendimento dos problema e para a busca de soluções. Mas esse é um papel que cabe aos jornais mais do que a qualquer outro meio noticioso.

No caso da Folha, estranhei seu posicionamento desde o início. O jornal, que não costuma perder os grandes temas, ignorou completamente o drama dos moradores de rua. A seção ‘Tendências/Debates’, espaço privilegiado para a discussão, não havia publicado, 15 dias depois das tragédias, um só artigo.

Aos sábados, a seção tem um formato diferente. Propõe uma pergunta, que deve ser respondida com um ‘não’ e com um ‘sim’. No sábado, 28, quando o assunto ainda estava quente e poderia ter inspirado uma boa pergunta a ser respondida por especialistas, o jornal preferiu um tema relativo à Olimpíada, que terminava: ‘Os esportes de alto rendimento são sobrevalorizados no Brasil?’. Ontem, optou por discutir o projeto das Parcerias Público-Privadas.

Para não dizer que inexistiu discussão, na sexta-feira, duas semanas depois da primeira chacina, o caderno Cotidiano publicou um resumo das principais propostas dos candidatos à Prefeitura de São Paulo e brevíssimos comentários de especialistas. Nada mais.

Incômodo

Em relação à ausência de artigos, ouvi o jornalista Fábio Chiossi, da Coordenação de Artigos e Eventos: ‘Não acho que o assunto seja o mais adequado para a pergunta de sábado, que prevê uma resposta com sim e outra com não. Concordo que o assunto deveria figurar em ‘Tendências/Debates’ em dias normais, e estou tentando abrir um espaço para publicar artigos a respeito. Além disso, convidamos o padre Júlio Lancellotti (da Pastoral do Povo da Rua da Arquidiocese de São Paulo) para participar de um debate sobre violência na cidade’.

Chego à conclusão que o assunto é mais incômodo do que eu imaginava, e não tem o glamour das grandes polêmicas. É mais fácil discutir os distantes problemas nacionais ou as loucuras do terrorismo internacional.

O baixo número de mensagens dos leitores ao longo da semana que passou (15 cartas até sexta) revela, de uma certa forma, que o assunto não atrai tanto. Talvez seja difícil encará-lo.

Mas ele está aí, querendo ou não, e ainda sem solução. Estamos às vésperas de uma eleição para o cargo Executivo que tem como responsabilidade cuidar da cidade e de sua gente. Não há como fugir do problema.’

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‘Debates com os leitores’, copyright Folha de S. Paulo, 5/9/04

Para quem gosta de debates, a Folha realiza nesta semana dois eventos que contam com a participação de seus leitores. São oportunidades, raras, para que possam discutir problemas da cidade, como o da população de rua e o da violência, e para que estejam mais próximos da notícia e da produção jornalística.

Quarta-feira, dia 8, encerra o ciclo ‘Trocando Idéias – de olho na cidade’, organizado pelo Folhateen e o Unicef. O tema será a violência em São Paulo. Participarão das discussões a coronel Laudinéa de Oliveira, diretora de Assuntos Municipais e Comunitários da Polícia Militar do Estado de São Paulo, o padre Júlio Lancellotti, diretor da ONG Casa Vida, e os adolescentes José Ranto, do Projeto Amar (Associação das Mães dos Adolescentes em Risco), e Isis Mozetic. O jornalista Gilberto Dimenstein fará a mediação.

Na sexta, dia 10, terá início o ciclo ‘Candidatos na Folha’, uma série de sabatinas com os principais candidatos à prefeitura da cidade. Eles serão entrevistados por jornalistas e responderão a perguntas da platéia.

A ordem das sabatinas: dia 10, Luiza Erundina (PSB); dia 13, Paulo Maluf (PP); dia 14, José Serra (PSDB); e dia 15, Marta Suplicy (PT). Serão entrevistados por Clóvis Rossi, Gilberto Dimenstein, Renata Lo Prete, Nilson Camargo e Contardo Calligaris.

Espero que os formatos que a Folha concebeu para os dois eventos permitam a participação de um grande número de leitores, e que eles tenham tempo bastante para encaminhar perguntas e questionar os entrevistados.

Para quem quer participar:

‘Trocando Idéias – de olho na cidade’ – Auditório do Mube (Av. Europa, 218, Jardins, São Paulo), com início às 14h. A entrada é franca e os interessados em assistir devem fazer reservas pelo telefone 0/ xx/11/ 3224-3473, de segunda a sexta-feira, das 14h às 18h.
‘Candidatos na Folha’ -Teatro Folha, no shopping Pátio Higienópolis (av. Higienópolis, 618, piso 2, São Paulo), às 15h. Serão gratuitos e abertos aos assinantes do jornal. Os interessados em participar podem se inscrever pelo telefone 0/xx/11/3224-3473, de segunda a sexta-feira, das 10h às 17h, ou pelo e-mail candidatosnafolha@folha.com.br.