Sunday, 17 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Marcelo Beraba

‘D.Luciano Mendes de Almeida, arcebispo de Mariana (MG) e colunista da Folha, criticou na quarta-feira a cobertura da imprensa no caso da crise política. Não reclamou de falta de equilíbrio ou de irresponsabilidade, as acusações mais freqüentes, mas sim do que considera um exagero: ‘A corrupção precisa ser combatida. Mas os jornais não podem ocupar a maior parte de seu espaço somente com isso. Há muita coisa no país que também precisa ser discutida, como saúde, reforma agrária e a situação dos idosos’.

Três observações:

1 – Os números da Folha confirmam a impressão de d. Luciano. O noticiário da crise é predominante. Mas acho que não poderia ser de outra forma, tal a gravidade da situação.

O jornal praticamente dobrou o espaço no caderno Brasil destinado à cobertura política por conta das acusações de corrupção. Para ter uma idéia, o jornal destinou o correspondente a três páginas e meia (3,64 páginas, para ser exato) ao noticiário político e nacional em janeiro. Em fevereiro, publicou quase cinco (4,84). A partir de maio esse espaço foi sendo ampliado até chegar, no mês de julho, ao equivalente a quase sete páginas por dia (6,74).

Outro indicador, este do Banco de Dados: no primeiro semestre deste ano, o assunto mais contemplado pelo jornal foi o governo Lula (média de 742 textos por mês), seguido de perto pelo futebol (725 por mês). Agora em julho, com a ampliação da crise, o governo Lula, incluído o ‘mensalão’, teve 1.397 textos; o futebol continuou em segundo, mas distante, com 740.

O ranking de personagens preferidos do jornal também mudou muito em julho. Ao longo do primeiro semestre, a relação dos dez nomes mais citados incluía os principais personagens da crise, mas ainda havia espaço para George W. Bush, João Paulo 2º e Bento 16. Agora, em julho, os dez primeiros são todos da política ou das CPIs. Pela ordem: Marcos Valério, Lula, Delúbio Soares, José Dirceu, Roberto Jefferson, José Serra, Geraldo Alckmin, Silvio Pereira, José Genoino e Renilda Fernandes.

2 – Alguns assuntos não têm espaço nos jornais com ou sem crise. É importante que d. Luciano chame a atenção para temas que considera mal tratados, mas eles, em geral, são sempre mal tratados. Em relação à Folha, dos três temas citados, um deles, a saúde, tem tido uma atenção especial do jornal e foi o sexto assunto mais bem coberto no primeiro semestre. Os outros, reforma agrária e idosos, realmente são ignorados.

A cobertura do campo está centrada nas invasões de terra. Idosos? O Banco de Dados localizou quatro textos em julho: três notinhas nos cadernos Equilíbrio e Cotidiano e uma reportagem sobre consumo, em Dinheiro. Imagino que d. Luciano não se referia a esse tipo de cobertura.

3 – O problema maior que vejo na cobertura da crise não é o ‘exagero’ do espaço, mas a forma como ele é utilizado. Em resumo, há muita notícia menor ocupando muito espaço, falta avaliação da importância dos fatos revelados e há poucas análises e bastidores que ajudem a entender o que está acontecendo.’

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‘A imprensa condenada’, copyright Folha de S. Paulo, 14/08/05.

‘A Folha foi condenada na quinta-feira, em segunda instância, a pagar R$ 750 mil de indenização ao casal proprietário da Escola Base e ao motorista que servia ao colégio.

Os três foram acusados, em 1994, pela polícia de São Paulo, de abuso sexual de crianças que estudavam na escola.

As acusações foram amplamente divulgadas pela imprensa. Os acusados foram ameaçados de morte e a escola foi depredada e faliu.

Depois se comprovou que as acusações eram infundadas e os três foram inocentados. Eles entraram com ações por danos morais contra o governo paulista (ganharam em todas as instâncias) e contra as principais empresas jornalísticas.

A Folha, o ‘Estado de S.Paulo’ (indenizações de R$ 250 mil para cada uma das três vítimas) e a ‘IstoÉ’ (R$ 200 mil) perderam em segunda instância. A TV Globo perdeu em primeira instância (1.500 salários mínimos para cada um). A rádio e a TV Bandeirantes e o SBT ganharam em primeira instância, mas as sentenças foram anuladas e haverá novos julgamentos. A Editora Abril aguarda julgamento. Em todos os casos ainda cabem recursos.

No caso da revista ‘IstoÉ’, um juiz considerou que não foi emitido juízo de valor, os fatos não foram exagerados e a culpa pelo chamado ‘linchamento moral’ foi da autoridade policial. Mas esse não foi o entendimento dos outros desembargadores, e a revista perdeu.

No caso da Folha, os desembargadores ignoraram o argumento de que a cobertura teve como base informações oficiais de um delegado e um laudo técnico. Segundo o ‘Consultor Jurídico’, a Justiça entendeu que ‘o direito de informação e a liberdade de imprensa se sustentam no cuidado com a honra e dignidade das pessoas’.

Esse é um caso tão emblemático que me pergunto por que as empresas condenadas ainda insistem nos recursos.’

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‘As agências de publicidade’, copyright Folha de S. Paulo, 14/08/05.

‘A propósito do artigo ‘A crise que se propaga’ (31/7), em que tratei do envolvimento de agências de publicidade no escândalo do ‘mensalão’, recebi correspondência do assessor de imprensa do Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária), Eduardo Correa:

‘Sobre seu artigo, temos a dizer que:

1 – não é nem nunca foi função do Conar julgar o comportamento empresarial de agências de publicidade e anunciantes. O Conar se ocupa unicamente do conteúdo das mensagens publicitárias frente ao Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária, no interesse do consumidor e do próprio mercado.

2 – Seu julgamento de que a ação do Conar parece insuficiente ‘para enfrentar o problema e prestar contas à sociedade’ é, na melhor das hipóteses, precipitado. Ativo há 25 anos, o Conar já julgou quase 6.000 representações éticas, abertas a partir de queixas de consumidores e autoridades ou a partir da ação da monitoria do Conar, sempre garantindo amplo direito de defesa às partes envolvidas e dando total transparência à divulgação dos resultados das demandas. Tudo sem qualquer traço de censura, contando exclusivamente com trabalho de voluntários, muitos deles jornalistas, e sem custar um centavo aos cofres públicos.

3 – Pior ainda foi o sentido geral do seu artigo, considerando ‘insuficiente’ a ação da auto-regulamentação publicitária. Não é assim que entendemos a questão, respaldados por centenas de manifestações de entidades da sociedade civil e de autoridades que reconhecem na auto-regulamentação uma das saídas para o Estado atulhado de leis ineficazes, como fez a própria Folha, que, em editorial publicado em 16/1, sugeriu o caminho da auto-regulamentação para a publicidade de produtos alimentícios.’

Sou a favor da auto-regulamentação. Mas da auto-regulamentação que funcione. Se o papel do Conar não é julgar o comportamento empresarial de agências, não estou distante da verdade quando digo que os instrumentos de que o setor dispõe talvez não sejam suficientes para agir no caso de Minas e de outras agências que mantenham comportamento semelhante.

No segundo depoimento que prestou à Procuradoria Geral da República, no dia 4, Marcos Valério assim se referiu a algumas agências: ‘A atuação na área de publicidade de um modo geral envolve a submissão a interesses políticos, sem o que as empresas não sobrevivem nesse mercado’. E citou oito grandes agências do Rio e de São Paulo.

Mas vamos aguardar. O Cenp (Conselho Executivo das Normas-Padrão) abriu processos contra as duas agências de Minas. A primeira sessão da Câmara de Ética que investigará ‘desvios de finalidade’ nas práticas da DNA e da SMPB ocorrerá na quinta.’