Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O jornal, o presidente e a crise financeira

O New York Times vem publicando desde o mês de setembro uma série de artigos intitulada ‘The Reckoning’ (que poderia ser traduzido por ‘avaliação’, ou ‘ajuste de contas’). Cada artigo, às vezes com mais de uma página de jornal, examinou um aspecto específico da crise financeira que levou ao colapso dos preços de imóveis, congelou o crédito, abalou Wall Street e forçou o governo a buscar uma sucessão de alternativas dramáticas.

No domingo (21/12), o Times analisou o papel do presidente George W. Bush na ajuda à inflação da bolha imobiliária, ao estimular a expansão da casa própria com um mínimo de regulamentação – o que, segundo o jornal, teria incentivado padrões de empréstimos negligentes. A reação da Casa Branca e de alguns leitores foi de fúria, conta o ombudsman Clark Hoyt.

As raízes das crises

A Casa Branca divulgou uma declaração dizendo que o Times ignorou um discurso no qual Bush ‘examinou detalhadamente as causas das crises imobiliária e financeira’. Quais são essas causas? ‘Dinheiro barato’ inundando os EUA e o erro das instituições financeiras ao não operar com a adequada diligência na criação, compra e venda de produtos de investimentos baseados em hipotecas. Segundo a Casa Branca, o Times deixou de levar em conta a política monetária, a natureza regional dos mercados imobiliários e os esforços do governo para superar as deficiências do sistema regulatório. ‘Mas uma análise dessas questões’, diz a declaração oficial, ‘teria complicado a visão míope do repórter, de que somente as políticas do governo Bush poderiam ser responsáveis pelas crises imobiliária e financeira.’

‘Se não tivessem sido previamente publicados 15 artigos examinando as raízes dessas crises, eu acharia que a Casa Branca estava certa’, diz Hoyt. ‘Mas qualquer pessoa que tenha lido a série de artigos sabe que estes não adotam a visão de que foram somente as políticas do governo Bush que nos levaram ao caos financeiro em que nos encontramos’.

Declaração sem procedimento

Apenas dois dias antes da publicação do citado artigo, um outro da mesma série, com chamada de primeira página, avaliava o papel que um corte de impostos promovido pelo presidente Bill Clinton teve, provocando inflação no mercado imobiliário. Os outros artigos examinavam os casos de Fannie Mae e Freddie Mac e seus defensores; do senador democrata Charles Schumer, que propôs uma agenda de desregulamentação para Wall Street e apoiou medidas que, supostamente, teriam contribuído para a crise; das agências que não levaram em conta os riscos das dívidas; e de Henry Cisneros, ex-secretário do governo Clinton, que incentivou o relaxamento na exigência de pedidos de empréstimo para compradores de casa própria que não tivessem como enfrentar os empréstimos convencionais. Entre outros assuntos, diz o ombudsman do Times, a série abordou republicanos, democratas, agências reguladoras, financistas de Wall Street e a influência do ex-presidente do Federal Reserve (Banco Central), Alan Greenspan.

A série de artigos não sugere que a culpa seja toda do governo Bush, embora o artigo de domingo tenha claramente documentado sua contribuição – baseado em considerável quantidade de reportagens –, como, por exemplo, o esforço empreendido pela Casa Branca para demitir uma agência reguladora que tentava prevenir sobre um possível colapso envolvendo Fannie e Freddie, devido a suas carteiras de risco.

‘Não vejo, portanto, fundamento na declaração da Casa Branca’, finaliza Clark Hoyt. ‘O que ela diz que faltou, consta de outros artigos da série’. A íntegra dos artigos está aqui.