Aldo Manuzio nasceu em 1449, em Bassiano, um pequeno povoado na região do Lácio, na Itália. Após estudar em Ferrara e em Roma, transfere-se para Veneza, onde passará grande parte de sua vida e onde irá instalar e desenvolver a Imprensa Aldina, tendo morrido nesta mesma cidade em 1515. Talvez Manuzio seja a grande figura da história da editoração em todos os tempos. A forma de se fazer o livro mudou para sempre após seu trabalho, tendo ele introduzido diversas inovações que permanecem utilizadas ainda hoje.
Homem de vasta cultura humanística, Manuzio encarnava em seu grau máximo o intelectual da Renascença, tendo aglutinado, em torno de si, através de sua Academia Aldina, homens de talento, como Erasmo de Roterdã e Pietro Bembo, além de estudiosos fugidos de Bizâncio que encontravam refúgio em Veneza. O próprio Manuzio era um helenista e um latinista de primeira qualidade, o que se refletiria em sua produção editorial.
Seu trabalho como editor e tipógrafo durou cerca de vinte anos, tendo sua Imprensa Aldina, que logo se tornou célebre por toda a Europa, publicado 134 obras em grego, latim e italiano. Seu primeiro objetivo como editor foi difundir a língua, a literatura e a filosofia gregas da Antiguidade. Para atingi-lo, Manuzio colocava em segundo plano inclusive o aspecto econômico, editando obras extremamente sofisticadas, numa forma de reverência ao valor dos clássicos. Por essa época, seu público era uma faixa restrita de homens cultos e ricos, pois suas primeiras produções tinham um preço bastante elevado.
Tiragens mais altas
Num segundo momento, a partir de 1500, ele passa a lançar livros em formato in-8° que contribuíram para ampliar bastante o acesso a uma cultura até então bastante restrita, pois o preço dessas obras era muito mais baixo que o daquelas editados na primeira fase de sua produção. Tais obras são precursoras dos livros de bolso atuais, tanto por seu custo como por suas características físicas.
Manuzio definiu os padrões técnicos e estéticos dos novos livros, tendo feito várias experimentações com tipos gregos e latinos, a maioria criados em sua própria oficina ou decorrentes do trabalho de Nicolas Jenson, que atuou independentemente em Veneza entre 1467 e 1480. A tipografia de Aldo Manuzio se destacou por sua qualidade e por suas inovações. Seu mais importante colaborador nesta área foi Francesco Griffo, que aperfeiçoou e modernizou as fontes de Jenson.
Os tipos da família romana foram primeiramente empregados por Manuzio nas edições de livros latinos. Com a criação do tipo itálico, uma versão da família romana que era bastante legível e se ajustava bem às páginas compactas, seus livros in-8° encontraram uma tipografia que se ajustava ao novo e mais revolucionário projeto do grande editor, que ampliou muito o público da alta cultura naquele momento. Com essa inovação, num tempo em que as tiragens médias dos livros eram de apenas duzentos exemplares, era comum que as suas fossem de mil exemplares.
‘Apressa-te devagar’
Um dos pontos fortes da produção de Manuzio está justamente em seu trabalho tipográfico, cuja elegância proporcionou uma identidade tão marcante a suas edições que elas logo passaram a ser conhecidas por toda a Europa pelo adjetivo ‘aldinas’, tendo sido inclusive utilizadas nas contrafações feitas pelos livreiros de Lyon, famoso centro de falsificação de livros na época. Outro índice de seu êxito é o fato de o tipo itálico criado em suas oficinas ter sido adotado para uso nos documentos oficiais do governo da então cidade-Estado de Veneza.
As fontes criadas ou aperfeiçoadas na oficina de Manuzio tiveram grande influência no desenvolvimento da tipografia dos últimos cinco séculos, sendo algumas delas utilizadas ainda hoje com pequenas modificações. Em grande parte, ele foi o responsável pela predominância das fontes latinas sobre as góticas no Ocidente, a partir do Renascimento.
O que mais impressiona no legado de Aldo Manuzio, no entanto, é a qualidade e a quantidade das inovações que ele trouxe para o livro, que permanecem até a atualidade. Sua casa editorial foi uma das precursoras no uso de uma marca tipográfica. A sua, com uma âncora sobre a qual se enrosca um delfim, tendo logo abaixo a inscrição latina festina lente (‘apressa-te devagar’), tornou-se célebre, realizando-se como a marca mais imediatamente reconhecível da identidade de suas obras.
Influência na cultura moderna
A Imprensa Aldina foi a primeira a publicar um catálogo de suas edições e uma das pioneiras no lançamento de livros ilustrados no período posterior à grande invenção de Gutenberg. Manuzio foi pioneiro também no lançamento de coleções temáticas, e suas edições costumavam ter a curadoria de um estudioso eminente, sendo ele um precursor do estabelecimento dos conselhos editoriais. As primeiras experiências com obras multilíngues, utilizando-se de várias fontes, também foram feitas em sua tipografia.
Manuzio definiu um sistema de pontuação para seus livros, com o ponto final como fechamento de um período, com a vírgula, o ponto-e-vírgula, o apóstrofo e os acentos empregados pela primeira vez em sua forma moderna. O primeiro livro com páginas numeradas na frente e no verso também é uma criação sua, bem como a página dupla considerada como unidade formal na arquitetura do livro. Do lado de fora, ele estabeleceu o padrão dos livros com lombada quadrada e capa de couro sobre papelão, sobre as quais brilhavam gravações em ouro laminado aquecido.
O trabalho de Aldo Manuzio teve enorme influência na cultura letrada moderna. A ele devem muito áreas e instituições como a universidade, a indústria e o comércio livreiro, o jornalismo, a publicidade. Hoje, a transição digital tem comprovado a perenidade de muitas de suas criações ao transportá-las para os meios eletrônicos. Qualquer e-book deixa isso evidente.
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Professor, tradutor e revisor, São Paulo, SP