Sunday, 17 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Osvaldo Martins

‘Passados quatro meses e meio de lançamentos, já é possível fazer um balanço dos acertos e dos equívocos da TV Cultura em sua nova grade de programação. Minha opinião a respeito da qualidade e da adequação dos novos programas coincide com a média das opiniões que recebo dos acionistas, o que remete a uma situação previsível e inevitável: muitos me escreverão para contestar a análise a seguir. Nem poderia ser diferente. Minha opinião é pessoal e a média das opiniões alheias supõe variações para cima e para baixo – ou seja, dos elogios entusiasmados às críticas severas. Média é média.

Primeira constatação: há mais novidades positivas que negativas no ar. Ainda que não se consiga identificar um nexo, ou um eixo, na concepção da nova grade, o fato é que os resultados, caso a caso, mostram mais acertos do que erros. Isso fica evidente quando se observa que programas bons ou ruins não estão todos nas mesmas categorias – idéias novas ou antigas, produções caras ou baratas, tentativas ousadas ou conservadoras. Há de tudo um pouco em todos os gêneros.

Comecemos pelos resultados positivos. A Cultura acertou em cheio ao lançar os novos programas de música clássica. Por Dentro da Orquestra, Resumo da Ópera e Fortíssimo são três programas simples e de produção barata, bem concebidos e bem realizados. Atendem perfeitamente a vários requisitos do que se espera de uma TV pública em sua missão, didática, de difusão do conhecimento. Oferecem alternativas de qualidade justamente em um dia da semana – o domingo – que as TVs abertas parecem ter consagrado à mediocridade, para dizer o mínimo.

Outro achado é o Entrelinhas. A Cultura conseguiu fazer um programa sobre literatura com uma linguagem leve, original e atraente. O tema é difícil de ser abordado em versão televisiva, mas a ousadia deu certo. Nota-se que há inteligência na pauta, competência na realização e capricho na edição e acabamento. Simples, barato e eficiente.

Outros dois programas (nada ousados, mas bem sucedidos) na linha do bom e barato são o Sr. Brasil e o Qual é, Bicho?, ancorados respectivamente nos talentos de Rolando Boldrin e Renato Consorte. Um e outro já fizeram coisa parecida antes, mas souberam manter a forma. Não trazem nenhuma grande novidade, muito ao contrário, mas são adequados. Boldrin devolve à TV algo que estava em falta no vídeo: um passeio pela alma do povo brasileiro, em toda a sua singeleza. E Consorte, com sua turma, oferece às crianças informações do reino animal extremamente importantes para a sua formação fora da escola.

Completam o bloco das boas novidades o Mar Sem Fim e o De Fininho, dois programas bem realizados, cada qual no seu gênero, cada um com seu público, mas ambos pertinentes, do ponto de vista da adequação à grade de uma TV como a Cultura. Com uma ressalva: o De Fininho inédito, que vai ao ar às 20 horas de terça-feira, ficaria melhor no sábado à tarde, com reprise no domingo.

Fórmulas antigas podem dar certo, como nos casos de Boldrin e Consorte, mas podem dar errado, como o Senta Que Lá Vem Comédia. O gênero teleteatro tem origem nos primórdios da televisão, quando o novo meio eletrônico de transmissão de imagens à distância era, em si, revolucionário. No Brasil dos anos 1950/60, antes do advento do vídeo-tape, a televisão ao vivo não tinha ainda criado seus próprios conteúdos e, por isso, era um meio ‘a serviço de’ – do teatro, da dança, do futebol. Meio século depois, com o êxito mundial da estética da teledramaturgia brasileira, o teleteatro tornou-se anacrônico. No caso do Senta… o problema é agravado pelo repertório, tão antigo quanto a fórmula. Para piorar trata-se, até onde sei, de um projeto desequilibrado na relação custo-benefício. O resultado artístico não compensa o investimento.

Outra aposta de alto risco no passado é a tentativa de ressuscitar os velhos festivais de música popular. Seu custo, tal como o do teleteatro, não é baixo. E sua qualidade depende em grande medida da qualidade da ‘nova música do Brasil’, um risco adicional. O que se ouve, nos últimos anos, só aumenta a saudade da música brasileira do século passado. Mas, como o Festival Cultura vai até setembro, é esperar para conferir.

Fechando este bloco incluo o Silvia Poppovic. Pouco tenho a acrescentar a tudo o que já escrevi a respeito nas semanas seguintes à estréia. Trata-se de uma revista de variedades que deveria estar na programação vespertina, e não no horário nobre – e mesmo assim, com muitas modificações de conteúdo. A Silvia é uma profissional séria, exigente e experiente, mas foi exposta desnecessariamente a um desgaste que não merece. Conheço-a há muitos anos, o suficiente para supor que ela própria não deve estar feliz com o programa que faz.

Restam para análise, mas em próximos comentários, os programas antigos que foram repaginados – como o Roda Viva, o Vitrine, o Metrópolis e o Cartão Verde. E ficam de fora, por falta de novidades, os telejornais – o que pode parecer, e é, um paradoxo.’