Foi declarada aberta a Olimpíada do Rio. Abertura que ficará na história olímpica. Com vaias, como se esperava. Nas capas dos jornais de sábado (6) fotos e palavras de deslumbre. Sóbria, a Folha reuniu na manchete a grandiosidade da festa e a rápida manifestação contra o presidente interino Michel Temer.
Desde os Jogos Pan-Americanos de 2007, quando o Rio já fazia campanha para receber a Olimpíada de 2016, a Folha teve repórteres dedicados a acompanhar de perto a candidatura e a preparação da cidade.
De lá para cá, publicou dezenas de reportagens que revelaram aumento de gastos nas obras, promessas não cumpridas e falta de transparência. As que mostraram o surgimento de futuros recordistas ou a preparação de equipes olímpicas foram em número bem menor.
Não por acaso. Faz parte da tradição da cobertura esportiva da Folha o viés crítico, a visão politizada e o caráter investigativo e, é justo dizer, o interesse restrito ou certo mau humor em relação à parte propriamente esportiva. A acertada preocupação em evitar aderir ao oba-oba ufanista às vezes gera insensibilidade para pautas mais leves e narrativas mais agradáveis.
Na última sexta (5), Primeira Página com caráter histórico deu o tom do que o leitor deve esperar da cobertura da Folha. “Brasil dá início à maior Olimpíada mergulhado no pior da recessão”, dizia a manchete. Visão política, cobrança sobre o bom funcionamento da cidade e a condição das arenas e sobriedade nos relatos esportivos.
O relativo pessimismo da Folha contrastou com a proclamação da manchete de “O Globo”, que estampava: “Festa exaltará tolerância entre os povos”. As coberturas dos dois maiores jornais do país em circulação nacional estão em polos opostos.
Em 5 de julho, por exemplo, a Folha resumia entrevista do prefeito do Rio, Eduardo Paes, à CNN na seguinte manchete: “Segurança no Rio é horrível, diz Paes a um mês dos Jogos”. Enquanto isso, o jornal carioca optou por declaração otimista: “Paes afirma que segurança não será problema na Olimpíada”.
A manchete da Folha se mostrou mais adequada, como provaram vários fatos em julho: agentes da Força Nacional foram intimidados por milicianos; uma dona de casa morreu, abraçada à filha de sete anos, após ser esfaqueada; um jovem de 16 anos foi baleado na cabeça.
Nos últimos dois meses, a Folha elevou o tema olímpico por oito vezes à manchete, sempre em tom crítico, quase negativo. Informou que os Jogos não vão cumprir sua meta ambiental, divulgou em que metade dos brasileiros se dizia contra os Jogos, mostrou que metade da Vila Olímpica não estava pronta a dez dias da competição e abordou a possibilidade da fuga do patrocínio para atletas, entre outros problemas.
É fundamental equilibrar um acompanhamento crítico do evento, tanto do ponto de vista do funcionamento da cidade como em relação às arenas esportivas, com a oferta de reportagens que revelem bastidores das competições e histórias de atletas. Nesse último ponto, o jornal não tem se destacado.
Além das competições propriamente ditas, são os personagens, atletas ou não, as grandes atrações dos Jogos. Exemplo de boa reportagem a partir de um olhar criativo foi o texto da Folha que mostrou a exigência de salva-vidas na competição de natação, criando um espectador privilegiado das competições, porque dificilmente terá de salvar algum nadador olímpico do afogamento.
Para quem gosta de esportes, acompanhar uma Olimpíada é quase desesperador. Diferentemente de uma Copa do Mundo de futebol, várias competições são realizadas simultaneamente e são transmitidas ao vivo.
É na busca de minorar a aflição de espectadores-leitores diante de uma oferta monumental de atrações que reside a verdadeira pauta dos jornais. Eles precisam ajudar na seleção do tempo que vamos investir nos esportes, além de recuperar a narrativa daqueles que não tivemos tempo de acompanhar.
Já é possível afirmar que, com edições mais enxutas que as dos concorrentes, as colunas especiais do caderno Rio-2016 prometem estar entre os destaques da Folha. Exemplos disso foram a de geopolítica, assinada por Diogo Bercito, e a de moda, por Pedro Diniz, além da crônica de Antonio Prata.
Em nenhum outro momento a versão digital, nas diferentes plataformas, se fará tão necessária e rica para melhorar a experiência do leitor.
A Folha não pode abrir mão do seu padrão de jornalismo. O DNA do jornal foi moldado para a visão crítica, o que é uma qualidade. Precisa evoluir em reportagens de força narrativa. Conseguir levar o leitor para a beira das pistas de competição, um lugar virtual único.
A maior olimpíada da história, a primeira na América do Sul, com recorde de atletas e de modalidades e extenuante transmissão ao vivo, é desafio esportivo que a Folha jamais enfrentou. Os concorrentes são fortes. A disputa será dura. Daqui a duas semanas, veremos se o jornal terá chegado ao pódio e quais medalhas terá conquistado.