Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Paulo Machado

‘A publicação da matéria ‘Nos últimos dez anos, bancos arrecadaram R$ 2,6 bilhões só com tarifas cobradas de clientes’, às 6h13 da manhã de quinta-feira, 27 de setembro, levou o senhor José Altair, presidente da Federação dos Bancários do Paraná, a ligar para a Ouvidoria contestando o valor de R$ 2,6 bilhões arrecadado pelos bancos. Segundo o cidadão, os balanços de Bradesco e Itaú mostram que os dois bancos, sozinhos, arrecadaram com tarifas um valor maior do que o anunciado na reportagem para todos os bancos. Por essa razão, ele pergunta qual é o relatório do Banco Central que contém a informação divulgada pela Agência Brasil e reclama da imprecisão da abertura da matéria que não disse que relatório é esse.

Às 11h11, do mesmo dia, foi a vez de o leitor Ademar Henrique Bellini enviar uma mensagem pedindo que fossem confirmados os números da mesma matéria por considerar que eles haviam sido subestimados, pois, segundo ele,’a maioria dos bancos pagam a folha de pessoal só com as tarifas que cobram’.

A Ouvidoria repassou imediatamente ambas as mensagens dos leitores para a redação da Agência Brasil que se apressou em apurar as informações.

Às 13h, a Agência respondeu à Ouvidoria: ‘Entramos em contato com a redação da TV Nacional, para encontrar a origem da apuração das informações feitas por ela. A TV Nacional e a Agência Brasil fazem parte do sistema Radiobrás, que trabalha de forma compartilhada. Após fazer as devidas verificações, a TV admitiu o erro e explicou que não existe relatório do Banco Central. Além disso, informou que o valor de R$ 2,6 bilhões corresponde somente à arrecadação de um mês de tarifas pelos bancos. A Agência então procurou a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) e recebeu um estudo mostrando que os bancos arrecadaram R$ 52,6 bilhões com tarifas cobradas de clientes em 2006. De posse dessa informação, corrigiu a reportagem e publicou uma errata às 12h38 de hoje [27/9]. O título e o texto foram alterados.’

A informação permaneceu errada por seis horas e 25 minutos no ar.

Era a errata de número 104 deste ano, corrigindo informações das matérias publicadas na página da Agência Brasil.

Isso é muito ou é pouco?, poderia perguntar o leitor. Se considerarmos o número total de matérias publicadas em 2007, até o dia de hoje, algo em torno de 17 mil, esse número poderia ser considerado estatisticamente irrelevante. Principalmente se considerarmos que os erros não se referem à matéria como um todo, que contém muitas informações, mas sim a alguma informação específica, como é o caso do montante e do período de arrecadação das tarifas bancárias.

O problema quando se trata de informação é a importância do erro, qualitativamente falando, nem tanto sua quantidade. A questão a salientar é a dimensão do erro no que tange à sua importância para a vida das pessoas. Temos ainda que analisar a dimensão do erro do ponto de vista do número de leitores que potencialmente possam ter tido acesso à informação incorreta. Isso tudo sem se falar em erros ortográficos e gramaticais presentes em muitas matérias e que nem sequer são percebidos pelos editores e, talvez, tampouco pelos leitores.

A Ouvidoria considera que mais importante ainda do que a simples constatação dos erros na construção da credibilidade do jornalismo é sanar os motivos que levam a eles e que, geralmente, estão associados a problemas estruturais do processo de produção jornalística de uma empresa de comunicação. Assim, não importa tanto quem cometeu o erro, mas sim a constatação de que o jornalismo, como processo coletivo de produção de informação, tem problemas.

Nesse ponto, o jornalismo, como qualquer outro processo de produção, seja ele de sabonetes ou de notícias, precisa de mecanismos de controle de qualidade.

Na gestão passada, a direção da Radiobrás implantou o Comitê de Qualidade Editorial, responsável pelo programa que foi ancorado em três pontos: qualidade da produção jornalística, qualidade dos profissionais envolvidos e qualidade das posturas éticas. Esse programa estimulou a formulação de planos editoriais dos veículos da empresa, nos quais foram pactuados com os profissionais os objetivos, as diretrizes, as metas e o funcionamento do processo de produção jornalística, entre outras medidas.

Para acompanhamento da execução dos planos, a assessoria técnica do Comitê realizou mais de 140 leituras críticas de matérias que foram ao ar por todos os veículos da Radiobrás, durante três anos. Este ouvidor foi responsável por elas, ao lado de outros profissionais que foram se somando à equipe.

Periodicamente, o Comitê de Qualidade Editorial reunia-se com as chefias dos veículos para analisar os problemas e debater soluções. Desse processo decorreram muitas das mudanças estruturais e funcionais verificadas nos últimos anos. Dele também decorreu a produção do Manual de Jornalismo da Radiobrás, depois de mais de 30 anos de funcionamento da empresa sem um instrumento que orientasse a sua produção jornalística.

Com base em todo esse arcabouço teórico e na experiência acumulada, o controle de qualidade atualmente é exercido da maneira mais democrática e participativa possível – é o público que faz a leitura crítica e aponta os erros, via Ouvidoria.

A princípio, esse tipo de controle causou certo espanto nas redações. Os jornalistas passaram a se sentir vigiados, não pela Ouvidoria, mas pelo cidadão, que ganhou voz, que passou de receptor a emissor de informação sobre a qualidade do jornalismo. Com o tempo, os profissionais viram que o objetivo da atuação da Ouvidoria não era expor ou crucificar ninguém, e sim corrigir os rumos dos processos e ajudar a aperfeiçoar o fazer jornalístico com base na opinião e das necessidades de quem recebe a informação.

O objetivo desse controle continua sendo melhorar a qualidade da informação. Para isso, a Ouvidoria tem agido no sentido de ajudar os gestores dos veículos a detectar problemas e encontrar soluções, talvez não na velocidade e na intensidade que o público espera e a que tem direito.

Mudanças são processos dolorosos, atingem interesses e podem gerar reações imprevisíveis. Mas de modo geral a colaboração e a disposição para que elas ocorram têm sido a marca das redações da Radiobrás, estimuladas pela direção da empresa.

No caso da Agência Brasil, a velocidade com que ela tem respondido às demandas do leitor, quando ele tem razão, mostra disposição em buscar o aprimoramento da qualidade da informação. Os 104’erramos’, publicados assim que foram constatados os erros devem ser considerados um sinal de honestidade e respeito para com o público leitor.

Porém, corrigir as causas desses erros é uma atitude que demanda muito mais que boa vontade, disposição e honestidade. Às vezes, requer medidas corretivas profundas, revisão de posturas e mudança de cultura.

A vigilância de leitores como José Altair e Ademar Henrique Bellini ajudam a fazer o controle de qualidade editorial da Agência Brasil. Vontade de acertar todos tem. Já condições para não errar ou não publicar matérias com erros depende de muitos fatores que vão além da vontade dos profissionais. Esses fatores continuam sendo perseguidos. Deles depende a credibilidade da informação de uma empresa pública de comunicação.

Até a próxima semana.’