‘Na opinião do leitor Álvaro Labuto Filho, ‘a imagem do Senado e do Congresso Nacional, como um todo, já está manchada, independente do resultado do julgamento do senador e essa desmoralização vem crescendo há muito tempo, pela atuação da própria imprensa, que mistura deliberadamente a parte com o todo, quando denuncia e julga parlamentares, sem marcar nitidamente a defesa da instituição. Isto é uma burrice, pois destruir a representação do povo é contra a muito usada ‘liberdade de imprensa’.
Na Agência Brasil o ‘caso Renan Calheiros’ foi objeto de 517 matérias entre 25 de maio, repercutindo as primeiras denúncias da imprensa, até 11 de outubro, quando o senador decidiu se afastar da Presidência do Senado.
Pelas questões levantadas, o leitor afirma que a desmoralização do Congresso Nacional deve ser atribuída à imprensa, que deliberadamente mistura denúncias contra parlamentares com a instituição em que eles trabalham. A Ouvidoria analisou as matérias da Agência sob esse ponto de vista para verificar se, no caso citado, a afirmação do leitor se confirma. Ou seja, se a Agência confunde ‘a parte pelo todo’ e, nesse caso, estaria ajudando a ‘destruir a representação do povo’.
O caso Renan, como ficou conhecido, tem uma seqüência de episódios retratados na cobertura que revelam o funcionamento da instituição e o comportamento de seus membros. Em cada um deles, há diversos interesses envolvidos, mas há que salientar que a própria imprensa sempre representou um dos lados na questão, não só por ser protagonista de denúncias, como também pelo caso envolver a suposta aquisição de veículos de comunicação pelo acusado. A matéria Corregedor diz que vai reexaminar concessões de rádio aprovadas no Senado, publicada em 9 de agosto, relata as investigações do corregedor do Senado sobre a suspeita de que seu presidente tenha se beneficiado de concessões.
Outro objeto de disputa entre o acusado e grupos privados de mídia, que ainda está sob investigação, é reportado em diversas matérias, como Grupo Abril rebate denúncias de Renan Calheiros sobre venda da TVA , publicada em 9 de agosto, em que o grupo privado contesta as denúncias do senador registradas na matéria Renan Calheiros acusa Grupo Abril de negociar operação ‘ilegal’ e ‘imoral’. Nesse episódio, acusado e acusador freqüentemente invertem os papéis. As matérias ouvem os dois lados.
As matérias também mostram que a instituição – o Senado Federal –, quando desafiada pelos acontecimentos, teve problemas para dar uma resposta e julgar um de seus pares. Quando as denúncias caíram no Conselho de Ética, vieram à tona diversos tipos de conflitos de interesse. As reportagens mostraram que o presidente renunciou, Sibá Machado renuncia à presidência do Conselho de Ética no Senado e diz que trabalha ‘com fatos’, após senadores se esquivarem da relatoria do caso: Jucá admite dificuldade para substituição de Cafeteira no Conselho de Ética do Senado, publicadas em 19 de junho, e Sem votação de parecer sobre Renan, novo relator renuncia, publicada em 20 de junho. Outros se licenciaram da casa. A questão da falta de transparência no sistema de votação, os procedimentos para obtenção e verificação de provas e falhas no regimento interno, comentadas pelos parlamentares, tudo isso retratado nas matérias, possibilitaram aos leitores tirar as próprias conclusões sobre o funcionamento do Conselho.
A paralisação dos trabalhos legislativos ou sua suspensão momentânea têm ocorrido com certa freqüência como, por exemplo, os reportados nas matérias Líderes partidários alertam para continuidade dos trabalhos no Senado, publicada em 12 de setembro, e Renan decide adiar reunião de Mesa Diretora e causa novo tumulto no Senado, de 12 de julho. As notícias salientaram importantes temas que deixaram de ser votados no decorrer da crise.
A cobertura sobre o caso Renan também serviu para mostrar ao cidadão situações em que a instituição, por meio de seus membros, recorre a outros poderes da República ou a personalidades de destaque para tentar fazer valer interesses pessoais ou corporativos de senadores. Esse é o caso, por exemplo, da matéria Lula é meu amigo e não vai cobrar nada do Senado, diz Renan Calheiros, publicada em 8 de agosto, na qual o senador busca o respaldo político do presidente da República para se manter no cargo. Também se verificou o apelo a outros poderes por ocasião do recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF) por parte de deputados que queriam assistir ao julgamento pelo plenário da Casa do primeiro dos quatro processos contra seu presidente, retratado na matéria STF permite acesso de 13 deputados à sessão que analisa cassação de Renan, publicada em 12 de setembro. O próprio acusado aventou a possibilidade de recorrer ao STF para que a sessão do Conselho de Ética que decidiria seu futuro político fosse feita com voto secreto, conforme consta na matéria Renan estuda possibilidade de recorrer ao Supremo, segundo Jobim, publicada em 2 de setembro.
O voto secreto é um dos instrumentos regimentais objeto de discórdia entre os membros da casa e que também já foi motivo de apelação à Suprema Corte. A matéria STF nega pedido de votações secretas sobre Renan Calheiros no Conselho de Ética, publicada em 25 de setembro, informa que o STF decidiu sobre o fim do voto secreto no Conselho de Ética e que é aguardada a votação, em plenário, da proposta aprovada por unanimidade na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para acabar com ele em qualquer situação no Congresso Nacional. Por trás dessa discussão está o direito do eleitor saber como vota seu representante e que interesses defende em nome dos representados.
Ao retratar os fatos protagonizados no Senado Federal, na pessoa de alguns de seus membros, sem emitir juízo de valor, as matérias informaram ao cidadão os problemas que vive a instituição. Os próprios senadores, talvez sob pressão da opinião pública, admitiram esses problemas e estão fazendo propostas para aperfeiçoar as regras. Nesse sentido, aspectos do regimento interno estão sendo questionados por alguns parlamentares, conforme consta na matéria Senador diz que objetivo da proposta de mudança no Regimento Interno é ter transparência, publicada em 11 de setembro.
A Ouvidoria entende que agindo dessa maneira a Agência Brasil contribuiu e vem contribuindo, não para desmoralizar o Congresso, mas sim para seu aperfeiçoamento, informando ao cidadão correta e objetivamente sobre o que acontece ali para que você, cidadão, de posse dessas informações, exerça efetivamente seu poder de pressão sobre seus representantes, exija as mudanças que achar necessárias, e faça seu próprio julgamento. Se a ‘opinião pública está contaminada’, como disse o leitor, talvez seja porque está tendo a oportunidade de conhecer melhor o Senado Federal.
A liberdade de imprensa, citada pelo leitor, também serve para mostrar aos cidadãos a realidade do funcionamento das instituições. Somos nós que pagamos para que elas cumpram seu papel a contento. Afinal, transparência e eficiência são condições imprescindíveis para legitimar instituições democráticas.
Até a próxima semana.’