‘Mais um seqüestro no Ceará, o 19º caso este ano, segundo informação publicada na edição de quarta-feira, quando se anunciou o crime contra o pai de um jogador de futebol, cearense, atuando na Europa. De acordo com o procedimento que vem adotando, O Povo não divulgou o nome do seqüestrado e nem de seu filho famoso, ao contrário dos outros dois jornais da cidade e dos noticiosos televisivos locais e nacionais. Obviamente, O Povo não é obrigado a seguir o critério dos outros meios de comunicação, mas continuo achando equivocado o jornal omitir o nome das pessoas ao divulgar o seqüestro.
Desta vez havia uma explicação na notícia informando que a vítima não fora identificada ‘a pedido da família’, mas a norma é seguida pelo jornal independentemente de qualquer solicitação. Como explica a editora do Núcleo de Cotidiano, Tânia Alves, em resposta ao questionamento do ombudsman, o ‘procedimento foi implantado este ano’, sendo válido em todas as situações equivalentes. Ela acrescenta que, no caso específico, ‘como foi uma notícia nacional, a família do jogador foi consultada; caso eles tivessem autorizado, a editoria teria publicado (o nome o seqüestrado)’. A rigor, se o jornal tem uma norma, deve segui-la, independentemente da atitude da imprensa ‘nacional’. Uma regra deve levar em conta o princípio, não a circunstância, mas essa já seria outra discussão.
Nos comentários internos à Redação, venho perguntando qual o sentido em se omitir o nome da vítima, pois isso não aumenta o perigo para ela, quando os criminosos têm conhecimento de quem estão levando. Para piorar a situação, neste caso, o jornal não deu o nome do seqüestrado, mas anotou tratar-se do pai de um jogador que já atuara no Flamengo e hoje joga na Europa. Alertei que, caso os seqüestradores não soubesse quem haviam apreendido, o jornal acabara por dar-lhes a pista, o que tornava ainda mais incompreensível a supressão do nome.
Dilema
Diferente de divulgar o nome do seqüestrado ao se noticiar o crime, no ato de seu acontecimento – até onde eu sei prática adotada apenas pelo O Povo –, existe outro dilema: os meios de comunicação devem ou não noticiar o andamento de um seqüestro? Existem duas posições bem definidas na mídia: os jornais que deixam de publicar as informações obtidas, a pedido da família, e aqueles que mantêm o assunto no noticiário. Para tomar uma ou outra posição o argumento é idêntico: a defesa da vida da vítima. Os primeiros acham que omitir informações ajuda a preservar a integridade do seqüestrado e facilita as investigações da polícia; os segundos dizem que a publicidade inibe maior violência contra a vítima e pode ajudar a encontrá-la. Confesso não ter idéia formada sobre o assunto; portanto, se me coubesse resolver, no calor da hora, atenderia ao pedido da família.
É difícil estabelecer normas abrangentes para os problemas com os quais o jornalista depara no dia-a-dia. Em 2000, por exemplo, o empresário Luiz André Matarazzo foi seqüestrado com seu filho, ao acaso, em uma rodovia paulista. Temendo que descobrissem o sobrenome Matarazzo, ele deu um jeito de orientar o menino a não revelá-lo aos seqüestradores. O pai foi solto sob a condição de conseguir R$ 100 mil pela liberação do filho. O Jornal Hoje, da TV Globo, divulgou o seqüestro anunciando que Luiz André era ‘primo do senador Eduardo Suplicy e do (então) secretário de Comunicação do Governo, Andrea Matarazzo’. Temendo repercussão maior – dificuldades adicionais para resgatá-lo, além do aumento do risco à vida do filho, caso os seqüestradores soubessem de quem se tratava –, Luiz André pediu que o assunto não fosse levado ao ar no Jornal Nacional, de maior audiência, mas não teve o seu apelo atendido. A criança terminou por ser libertada. Mesmo assim, Luiz André Matarazzo abriu processo contra a Rede Globo, sustentado que a emissora pusera em risco a vida de seu filho.
Lembrei o caso para mostrar que não existem respostas fáceis para os dilemas éticos do jornalismo. O jornalista pode omitir informações de interesse público? Em que circunstâncias isso seria aceitável? É difícil ter resposta inequívoca: a meu ver, cada caso tem de ser analisado individualmente, de modo a se buscar a melhor saída em cada situação.
Os nomes
A propósito, desde que escrevi a coluna ‘O nome do shopping’ (http://www.opovo.com.br/opovo/colunas/ombudsman/610788.html), e a nota ‘O nome, de novo’, em coluna de agosto deste ano (http://www.opovo.com.br/opovo/colunas/ombudsman/610788.html), uma comissão de jornalistas vem debatendo os critérios que devem orientar a divulgação de nomes de pessoas e instituições nas notícias, sem resultado conclusivo até o presente momento.
O anúncio
A rigor, não está entre as tarefas do ombudsman a análise dos anúncios publicados no jornal. Mas não é incomum leitores se incomodarem com uma ou outra propaganda veiculada. Quando se trata de anúncios do Grupo de Comunicação O Povo, a exigência aumenta, pois os leitores os comparam com os princípios regentes no jornal. Foi nesse sentido a crítica de um leitor a uma publicidade (edição de segunda-feira, pág. 12), assinada pela rádio O Povo/CBN, sobre uma atividade esportiva ocorrida em Fortaleza, da qual participaram pessoas ligadas ao futebol. O texto dizia o seguinte: ‘Para os amantes de futebol tem o Felipão e o Luxemburgo. Para os amantes de pelada, a Ana Paula Oliveira’. O leitor disse que os técnicos eram destacados como especialistas no esporte, ao passo que o atributo da bandeirinha Ana Paula seria apenas o de ‘ficar pelada’. Ele considerou ‘uma falta de respeito tremenda’ para com ela e as mulheres em geral.
Depois de ter reproduzido a queixa do leitor em comentário interno, recebi e-mail de uma repórter, dizendo que o anúncio também induz a pensar que Ana Paula ‘somente seria capaz de exercer sua função em uma ‘pelada’, ou seja, não está apta para participar de jogos ‘sérios’. É a reprodução de um discurso preconceituoso que diz que a mulher só pode fazer parte do futebol como produto do desejo masculino ou, no máximo, como alguém menos capaz de exercer o trabalho dentro de campo’.’