‘Para realmente valerem por mil palavras, certas imagens precisam de mais algumas’, escreve o editor-público do New York Times, Byron Calame, em sua coluna de 3/7/05. Esta semana, o novo ombudsman deixa de lado o texto do jornal e concentra sua crítica às fotografias. Ou melhor, aos créditos das fotos estampadas no Times.
Avanços tecnológicos simplificaram o ato de intervir em imagens e complicaram a forma de compreensão delas. Câmeras digitais e programas de computador permitem que fotógrafos e designers alterem seu trabalho original com facilidade. Mas quando as fotografias são destinadas às páginas de um jornal, são produtos jornalísticos e, por esta razão, os leitores merecem explicações precisas sobre sua origem, defende Calame.
O editor-público entende que as diversas seções do Times – e de qualquer outro jornal – têm pesos e medidas diferentes. Páginas de notícias devem ser imparciais, e diferem das de opinião, assim como as reportagens da revista distribuída semanalmente. Foi justamente a dominical New York Times Magazine que chamou a atenção de Calame para esta questão. Em matéria de capa da edição de 12/6, a revista discutia o uso de tortura para tirar informações de presos sob custódia militar. Para ilustrar o atual e polêmico assunto, foram expostas fotografias de supostos prisioneiros sendo torturados. Apenas detalhes: as costas de um pessoa algemada com um fio de sangue seguindo do pulso aos dedos; uma pessoa encapuzada; outra sendo torturada com água.
Calame afirma que as fotos poderiam – como aconteceu com ele – provocar dúvidas sobre sua veracidade entre os leitores. No crédito, as imagens eram identificadas apenas como de autoria de Andres Serrano, sem nenhuma referência a terem sido posadas – o que de fato eram. A editora de fotografia do Times, Kathleen Ryan, diz que tortura é um tema perturbador, e ela decidiu chamar Serrano para o trabalho por ser ele um fotógrafo provocativo. A idéia inicial era fotografar apenas os acessórios usados para tortura, mas a mensagem das imagens, conta Kathleen, talvez não ficasse tão clara para os leitores. Por isso foi produzido o ensaio que ilustrou a reportagem.
O editor da New York Times Magazine, Gerald Marzorati, defende a escolha dizendo que a linguagem da revista é diferente da do jornal. ‘Basicamente’, afirma ele, ‘é como comparar poemas com furos jornalísticos’. Além disso, o editor acredita que a grande maioria dos leitores compreendeu que as imagens não se tratavam de torturas reais.
Calame discorda, e cita uma carta que recebeu do curador de fotografia do Instituto de Arte de Chicago. Diz ele: ‘Porque fotografias por si próprias não conseguem separar claramente realidade de aparência, é bom saber o máximo possível sobre como, onde, quando e por que foram feitas. Isto é especialmente necessário para temas que sejam parte de um debate nacional sobre as práticas e direções de um país em guerra. As fotos de Andres Serrano seriam melhor descritas pelo simples crédito: ‘Ilustrações fotográficas por Andres Serrano’’.
O Guia de Integridade do Times, que se refere a todas as partes do jornal, enfatiza a questão do uso de imagens e seu objetivo – ou não – de retratar a realidade. ‘Imagens em nossas páginas que tem como objetivo mostrar a realidade devem ser genuínas’, explica a seção do Guia sobre fotografia. Basicamente, qualquer imagem que não retrate genuinamente a realidade deve ser explicada, ‘se a menor dúvida for possível’. A partir deste direcionamento, Calame pede que o Times considere estabelecer créditos a serem usados para explicar as diversas categorias de imagens, dependendo delas terem sido produzidas ou manipuladas. ‘O ideal: leitores confiantes de que, em qualquer seção do jornal, poderão saber se as imagens são reais ou modificadas – tudo com a ajuda de apenas mais algumas poucas palavras’, conclui.