Uma crítica em um grande jornal como o Washington Post pode influenciar o sucesso ou fracasso de um livro, constata o ombudsman Andrew Alexander, em sua coluna de domingo [15/11/09]. Por isso, ao pautar uma crítica, editores procuram por pessoas que não tenham nenhuma relação com o objeto resenhado. A imparcialidade é tão importante que o contrato firmado com críticos literários requer que eles revelem a ‘possibilidade’ de ‘qualquer possível aparência de conflito de interesses’.
Recentemente, no entanto, esta cláusula foi violada, levando o escritor Jon Krakauer a se queixar de uma crítica negativa de seu livro Where Men Win Glory: The Odyssey of Pat Tillman (Onde os homens alcançam a glória: a odisseia de Pat Tillman, tradução livre), que conta a história de um jogador de futebol americano que colocou sua carreira de lado depois dos ataques do 11/09 para se juntar ao Exército e acabou morrendo no Afeganistão. Krakauer focou seu trabalho em uma informação secreta do Exército que revelava que Tillman foi morto por fogo amigo e sugeria que o general Stanley A. McChrystal, hoje comandante superior dos EUA e da Otan no Afeganistão, teria feito parte dos esforços para não revelar a causa da morte do soldado.
Para escrever a crítica do livro, o Post escolheu Andrew M. Exum, membro do Centro para uma Nova Segurança Americana. Exum serviu, pelo Exército, duas vezes no Afeganistão. Sua crítica foi publicada no dia 13/9, um mês após ter recebido a incumbência de escrevê-la. O artigo não foi positivo. Sem abordar o papel de McChrystal, Exum concluiu que ‘outros comandantes competentes’ fizeram uma ‘série de decisões desastrosas e incompreensivelmente estúpidas’ ao falhar em revelar prontamente a verdadeira causa da morte de Tillman.
O que não foi revelado é que Exum tem uma forte relação com McChrystal, a quem descreveu em seu blog como um ‘dos melhores homens que conheci’. Em junho e julho, ele trabalhou como conselheiro civil não remunerado de McChrystal no Afeganistão. A crítica informava que Exum havia estado no Afeganistão como ‘conselheiro civil’ este ano, sem dizer, no entanto, para quem ele havia trabalhado.
Krakauer ficou furioso com o fato de Exum ter escrito uma crítica que claramente protege o general. A questão foi levantada pelo autor com a editora da seção de livros do Post, Rachel Hartigan Shea, que investigou a denúncia. Na semana passada, ela enviou um e-mail a Krakauer informando que Exum confirmou ter servido ‘como conselheiro civil voluntário de McChrystal este ano’ e que isto deveria ter sido informado ao jornal. Em uma correção publicada posteriormente, o Post disse que a crítica deveria ter mencionado a relação de ambos.
Exum defendeu-se e alegou que, para ele, sua relação com McChrystal era tão óbvia que não imaginava que os editores do Post não estivessem cientes dela. Ele citou um artigo de capa publicado no jornal, em julho, que o identificava como membro de uma equipe que faz recomendações estratégicas a McChrystal. Nas semanas seguintes após o convite para escrever a crítica, sua função foi citada em diversas matérias na imprensa americana. Na realidade, ele chegou a pensar que a grande exposição na mídia teria sido o motivo do Post ter lhe convidado para escrever a crítica. ‘Estava em todos os lugares a informação de que eu havia ido ao Afeganistão aconselhando McChrystal’, disse.
Rachel mostrou-se satisfeita com a explicação de Exum, mas ressaltou que editores de livros do Post pautam diversos assuntos e por isso é complicado monitorar os detalhes de cada campo. A equipe, formada por três editores em tempo integral e um que trabalha meio período, seleciona a cada semana, de uma lista de centenas de livros, as obras a serem resenhadas. Por ano, são cerca de 900 críticas. O Post conta com o trabalho de freelancers para tal. Após o episódio com Krakauer, Rachel afirmou ter tomado medidas extras para deixar mais claro os possíveis conflitos de interesse nos contratos.