‘A semana que antecedeu o período de Carnaval, (oficialmente começa hoje), foi cheia de acontecimentos policiais. O que mais chamou a atenção dos cearenses ocorreu em Quixadá, no Sertão Central, onde um grupo repetiu uma ação muito parecida com a que resultou no maior furto a uma agência bancária no País. Como ocorreu no Banco Central, em Fortaleza, no início de agosto de 2005, uma quadrilha cavou um túnel para levar o dinheiro do Banco do Brasil na cidade de Quixadá.
A manchete de O POVO, última terça-feira, 17, afirmava: ‘Bandidos cavam túnel e assaltam banco’. No texto era usada a palavra furto ‘Um grupo de pelo menos três homens furtou a agência do Banco do Brasil do município’. Na página em que foi publicada a notícia (Fortaleza, 5), lia-se:’quantia roubada’, ‘assaltantes’, mas também ‘furto’.
Os leitores reclamaram dizendo que não ocorrera assalto ou roubo porque não tinha sido mediante uma ação violenta ou ameaças , mas furto porque o grupo se apropriara da quantia sem a prática da violência. Em vez de ‘assaltantes’, os leitores disseram que o certo seria ter escrito ‘ladrões’. Citaram o que diz o Código Penal brasileiro.
Na quarta-feira, 18, O POVO optou por continuar usando a palavra ‘assalto’ na manchete: ‘Assalto ao Banco do Brasil – Investigação aponta consórcio de quadrilhas’. No texto se referia ao furto do Banco do Brasil. A mesma palavra, que segundo os leitores era a correta, foi usada em todo o texto da pág. 8 (Fortaleza) assim como o vocábulo ‘ladrões’. Porém ‘assaltantes’ constavam no abre (resumo) da matéria.
A confusão das palavras continuou na edição de quinta-feira, 19, quando o grupo levou 200 quilos de dinamite que estava no interior da empresa Marsilop encarregada das obras de saneamento de Quixadá. Aí sim, O POVO acertou na manchete: ‘Roubados 200 kg de dinamite’. O vigia foi rendido e ameaçado com uma pistola caracterizando-se como ação violenta. Mas no texto, a palavra ‘assalto’ ao banco (se referindo ao ocorrido na terça-feira) continuou sendo usada.
‘Fiquei estressado e indignado porque o jornal persistiu no erro. Era como se a gente tivesse reclamando por nada’, disse o leitor José Mário da Silva, um dos que mais dispensa atenção às incorreções das matérias publicadas no O POVO.
RESPOSTAS
Para tirar as dúvidas, consultei o professor de Língua Portuguesa, Myrson Lima e o advogado Luiz Carlos de Queiroz Júnior, assessor jurídico da Ordem dos Advogados do Brasil, secção do Ceará (OAB-CE). Perguntei ao professor Myrson se ele achava que o jornal tinha errado por ter usado a palavra assalto.
Ele disse que tinha visto inadequação na manchete do jornal e explicou: ‘Diz-se FURTO no sentido mais genérico de subtrair algo alheio sem qualquer violência. Furtar é usado em muitos dicionários como sinônimo de roubar. No ROUBO existe rigorosamente, na linguagem técnica, mais do que um furto, pois está presente a violência ou a ameaça de violência. O ASSALTO é ato repentino, algo impetuoso e surpreendente para a vítima, que se dá em determinado momento com uso de força física ou moral’.
O assessor jurídico da OAB-CE descreveu o que define o Código penal Brasileiro:
‘Furto (art. 155) é subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel. A pena de reclusão é de um a quatro anos e multa. A pena aumenta um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.
Roubo (art. 157) é subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência. A pena de reclusão é de quatro a dez anos, e multa. Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.
Segundo Luiz Carlos, ‘assalto’ é uma expressão popular que não tem definição no direito brasileiro. Tanto é utilizada para furto quanto para roubo.
LEMBRANDO
Em agosto de 2005, o então ombudsman do O POVO, jornalista Plínio Bortolotti, recebeu as mesmas reclamações dos leitores com relação ao furto no Banco Central, em Fortaleza. Na época, ele consultou o professor Myrson Lima. E também a o filólogo José Alves Fernandes que é autor do Dicionário de Formas e Construções Opcionais da Língua Portuguesa (edições UFC).
José Alves disse que haveria ‘mais precisão’ com o uso da palavra ‘roubo’ ou ‘furto’. ‘Os cuidados (dos ladrões) evitaram o assalto e a violência contra pessoas’, portanto, a ação estaria mais próxima de ser classificada como roubo. Porém, não condenou o uso de ‘assalto’ para se referir ao roubo. Para ele, houve algum tipo de violência, pois a quadrilha arrombara o piso do banco para chegar ao cofre.’