Questionado por um deputado republicano sobre uma suposta tendência da mídia de só noticiar o lado ruim da situação atual do Iraque, o vice-secretário de Defesa americano, Paul Wolfowitz, disse, em testemunho no congresso, na semana passada, que ‘uma grande parte da imprensa tem medo de viajar muito, por isso fica sentada em Bagdá publicando rumores’. ‘Nossa mídia tem alguma responsabilidade de tentar apresentar um quadro balanceado em vez de sempre tender para o sensacionalismo. E a violência é sempre sensacional’, continuou.
Desde o início da invasão do Iraque, mais de 30 jornalistas morreram cobrindo o conflito. Na noite do dia em que o vice-secretário deu aquelas declarações, o âncora da CNN Aaron Brown, do programa Newsnight, reagiu de forma contundente: ‘Em primeiro lugar, nós não publicamos rumores. Em segundo lugar, nossos repórteres e os de outros veículos viajam muito. Eles estiveram em Fallujah quando a coisa pegou fogo por lá. Estiveram em Najaf. Estão em Basra esta noite. Eles também foram a escolas e hospitais e muitos outros lugares para mostrar o retrato mais equilibrado que poderiam fazer do cotidiano. Mas o fato é que a vida no Iraque hoje é perigosa. Ouça o que os iraquianos dizem. Ouça sobre seu medo de sair de casa em Bagdá. Ouça sobre a anúncio do novo governo de que possivelmente será necessário impor lei marcial. O Iraque não é oito ou oitenta, mas alegar, como faz o senhor Wolfowitz implicitamente, que segurança e violência não são o assunto mais importante no país é quase tão correto quanto seu argumento frente ao congresso de que a reconstrução do Iraque se auto-financiaria e que os iraquianos nos receberiam com flores’.
O ombudsman do Washington Post [27/6/04], Michael Getler, escreve que recebe regularmente cartas de leitores reclamando que o jornal estaria propositadamente fazendo um retrato negativo da situação do Iraque, deixando de lado notícias otimistas. Getler cita algumas matérias positivas publicadas pelo Post para mostrar que isso não é de todo verdade e reforça que o quadro pintado por Wolfowitz antes da guerra não é o que se vê hoje no Iraque. A resistência à ocupação é grande e a falta de segurança ‘naturalmente e apropriadamente’ predomina nas notícias. ‘Com o passar do tempo, a história vai nos dar um julgamento mais definitivo sobre quem tem divulgado ‘rumores’, se é a imprensa ou os políticos’, conclui. Wolfovitz parece já ter pensado melhor a respeito do que disse: dois dias após fazer suas insinuações, escreveu uma carta de desculpas ‘aos jornalistas cobrindo o Iraque’.