Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Suzana Singer

“Falta pimenta ao novo caderno Comida. Lançado em maio passado, o suplemento nasceu para fazer concorrência ao ‘Paladar’, do ‘Estado de S. Paulo’, que também circula às quintas-feiras.

Não é uma missão fácil: já estabilizado, o ‘Paladar’ soube explorar esse frenesi gastronômico que tomou São Paulo nos últimos anos. Parece que todo o mundo que tem dinheiro e tempo de sobra quer aprender a cozinhar, entender de vinhos e conhecer os lugares ‘imperdíveis’ aqui e no exterior.

A Folha já se havia aventurado nessa seara com o pioneiro ‘Comida’, homônimo do atual, editado por Josimar Melo entre 1988 e 1991. Era muito cedo, São Paulo não tinha tamanha variedade de restaurantes nem uma burguesia tão interessada em ceviches, emulsões ou em redução de vinho do Porto.

Só que a Folha esperou demais. Deixou o concorrente correr sozinho por seis anos até decidir enfrentá-lo. Com tanto tempo para gestar um produto de impacto, acabou saindo com um arroz com feijão correto, bem apresentado, mas sem sal.

A fórmula é bem conhecida: belas fotos de pratos, abertas em tamanho de pôster, seções manjadas (‘o desafio ao chef’ é igualzinha a uma que morreu no ‘Paladar’), umas tantas receitas e os mesmos cozinheiros de sempre.

Em tempos de azeitonas esferificadas por Ferran Adrià, dá para exigir mais criatividade do jornal. As capas: carne de porco, Festa Junina, Dia dos Namorados, o centenário do Catupiry -os bons pauteiros têm horror a efemérides- , comida de candomblé, louças para chefs e, a última, ‘o limão’.

Falta pegada jornalística, é tudo pasteurizado, com um tom excessivamente laudatório. Não se trata de pedir um ‘caderno do contra’, porque a Folha já tem uma sanha denunciatória que domina da política ao esporte. Mas poderia dar-se mais ênfase ao que vai contra o senso comum, como fez Josimar Melo certa vez ao demolir mitos culinários de São Paulo -sua crítica ao sanduíche do Mercado Municipal (‘quase meio quilo de mortadela para quase nada de pão’) provocou torrentes de reações.

Útil

Outra vertente a ser explorada nessa cobertura é a de testar entregas, atendimento, preços e produtos. Ir a vários lugares e comparar, como fez a revista sãopaulo recentemente, quanto se cobra pelo mesmo vinho em diferentes restaurantes. São reportagens que poupam tempo e trabalho para quem lê.

É preciso buscar novos nomes, ampliar a turma de 20 chefs que ocupam 95% dos textos sobre comida em todos os veículos, inclusive nos blogs, e dar voz a outros talentos.

O caderno é novo, começou em banho-maria, mas dá tempo de colocar mais tempero nesse caldo servido toda semana aos leitores.

Os mesmos de sempre

No domingo passado, uma revista especial trouxe ‘O Melhor de São Paulo’, com dois rankings de restaurantes: um escolhido pelo público e, outro, por um júri.

O resultado não surpreendeu: Fasano, D.O.M, Ritz, Fogo de Chão, Tordesilhas, Bráz… São os que ganham sempre na Folha, na ‘Vejinha’ e no ‘Estado’.

A pesquisa com os clientes em geral, mais democrática, dá um resultado estranho: o melhor da cidade é o Fasano (prato de massa mais barato a R$ 89) e o italiano favorito é o Famiglia Mancini (espaguete ao sugo por R$ 32).

É evidente que boa parte dos que escolheram o Fasano nunca pisou lá. Trata-se de uma vitória da imagem, não um teste da sua qualidade. A edição da revista precisava ter deixado isso claro.

O júri de 50 ‘‘descolados’ cai na mesmice. De 16 categorias, só quatro não tiveram nomes repetidos em relação a 2010. Escolher o Spot, 17 anos, como lugar para ‘‘ver e ser visto’ é sinal de que essa gente, apresentada como ‘‘quem se aventura pelos quatro cantos da cidade atrás de um bom prato’, não anda circulando muito.

Seria melhor se concentrar na opinião de quem vive disso -blogueiros, professores de culinária, críticos, banqueteiros- e montar um time grande de especialistas, no molde do júri que escolhe os 50 melhores restaurantes do mundo na revista inglesa ‘Restaurant’.”