Uma enxurrada de emails, telefonemas e comentários chegou a esta ouvidoria após a publicação da charge do dia 2 deste mês. Eram leitores incomodados com o teor da ilustração humorística. Nela, o chargista apresentava o conflito entre policiais militares e professores no Paraná, onde aparecia uma caricatura do governador Beto Richa (PSDB), com trajes de policial segurando um escudo onde se lia “Governo Federal – Brasil Pátria Educadora” e um professor abatido no chão. O nome do governador estava na lapela do fardamento.
A indignação resultou do fato de o chargista ter usado o slogan do governo Dilma como mote para um episódio eminentemente ligado ao Estado de origem do conflito. “Absurdo dos absurdos”. “Manipulação, falta de ética”. “Odienta a charge, repugnante mesmo, de baixíssimo nível”. ”Infeliz charge”. “Descompromisso, ato de desinformação”. Estas foram algumas opiniões colhidas sobre o desenho publicado na Editoria Opinião.
Os leitores enxergaram intenção do chargista em jogar a culpa das agressões aos professores no governo Dilma, apesar de o governador do Paraná se fazer presente na ilustração. A charge tem como elemento fundamental o humor. Sei que é natureza do cômico ultrapassar fronteiras, avivar tensões, provocar reações fortes, seja para o bem ou para o mal. Mas, esse tipo de conteúdo jornalístico não deve ser criado a partir contextos inexistentes.
Opinião e pluralidade
Provoquei os núcleos Gestor e o de Imagem, a quem o chargista é agregado, para que me respondessem se existe alguma política editorial para as charges. Recebi a seguinte resposta da Diretoria de Redação: “A charge é um espaço de opinião e, como tal, o autor tem liberdade de expressão. Neste caso, uma opinião visual. E neste sentido a charge foi publicada: submetendo-se ao crivo dos que dela discordaram ou dos que entenderam no traço do Clayton uma denúncia. O POVO respeita as divergências de opinião e estimula a pluralidade.”
Por sua vez, o editor-executivo do Núcleo de Imagem, Gil Dicelli, ressalta que “a charge é um texto visual, que apresenta um ponto de vista através da imagem/ilustração. A charge em questão é uma opinião do chargista e tem espaço dentre as várias outras vozes da página de Opinião”.
Interpretação possível
A charge realmente é uma opinião como apontam os editores, mas ela dialoga com os acontecimentos. As notícias publicadas sobre o caso do Paraná informavam que foi uma ação da Polícia Militar, que é estadual, responsável por deixar quase 200 professores feridos. Quando o chargista do O POVO utilizou a frase “Pátria Educadora” com a logomarca específica, induziu à leitura fácil e rápida de associar a agressão ao Governo Federal. E, mesmo considerando que as críticas podem ser fruto do clima de animosidade política no Brasil atual, há de se entender que esta é uma leitura possível e clara. É lógico que aquele desenho pode ter outras interpretações, mas são mais trabalhosas e complexas. Por fim, considero que a liberdade criativa, a crítica contundente aos acontecimentos políticos e sociais são características essenciais numa charge. No entanto, num veículo como O POVO, que tem entre seus princípios o interesse de bem informar, estas particularidades não podem suplantar a obrigação de se orientar pela verdade.
Coluna do Zé Simão
O POVO deixou de publicar, no dia 30 de abril, a coluna do Zé Simão no Vida & Arte. Dois dias antes da veiculação do último texto, o caderno avisou aos leitores que o colunista deixaria de ser reproduzido. Achei transparente. O leitor não foi pego de surpresa.
Erramos e atendimento ao leitor
Em abril, foram publicadas 10 correções na seção “Erramos”. A partir de levantamento preparado pelo Banco de Dados do O POVO, divulgo os reparos por editoria. Também presto contas dos atendimentos ao leitor no mês passado.
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Tânia Alves é ombudsman do jornal O Povo