‘Internautas têm escrito para reclamar de uma escalada do sensacionalismo na edição da principal foto do portal, a que primeiro que se vê quando se entra na home do UOL. Segunda-feira, foi publicada foto de morto na Fonte Nova sendo velado na Bahia. Mesmo vestido, chamava atenção a exposição do corpo e o olhar desolado do parente para o fotógrafo. Na terça-feira de manhã, a principal imagem era a do corpo incendiado de um morador de rua em São Paulo. À noite, foi a vez da foto da adolescente acusada de furto que dividiu uma cela com dezenas de homens em Abaetetuba, no interior do Pará, e lá foi humilhada, machucada, abusada sexualmente e estuprada seguidamente. O caso chocou o país. A edição das fotos chocou internautas ao mesmo tempo em que deu boa audiência (cujos números, por regra estabelecida, não posso divulgar).
Até levar o caso à foto principal, o UOL vinha noticiando-o sem muito empenho, dependendo do esforço jornalístico da Folha (com reportagem das enviadas especiais ao Pará, Laura Capriglione e Marlene Bergamo). Para quem vinha cobrindo o caso com discrição como fazia o UOL até então, foi um salto escolher a foto da adolescente para a principal da home do portal. A imagem entrou no sistema de fotografia da Folha às 23h01, com um crédito pouco usual: ´Divulgação/Folha Imagem` e com a recomendação de que não poderia ser vendida. Apesar de a legenda não dizer, a foto parecia ter sido tirada de dentro da cela, enquanto a adolescente esteve presa. E era. Foi para a home do UOL às 23h15, como a principal imagem do portal, e ficou no ar até as 11h05 de hoje. Quase doze horas ininterruptas. Ainda pode ser vista no arquivo de home pages e no álbum de imagens do dia de 27 de novembro.
Internautas reagiram com indignação.
´É com grande estupefação que abro a primeira página do UOL em meu browser agora, por volta da uma da manhã de quarta-feira, dia 28 de novembro, e vejo uma foto da garota paraense de apenas 15 anos, que foi barbaramente estuprada e seviciada durante sua absurda estada na cadeia daquele Estado. O que me causou estupefação não foi ler mais uma reportagem sobre o caso, que merece sim ser investigado até a exaustão pela imprensa séria deste país, mas sim pelo fato de tê-la visto numa foto, parece que tirada da cadeia. Mas que absurdo passou pela cabeça dos editores deste portal? Depois de tudo que esta menina passou, ainda há de ser identificada na rua, graças a esta foto? Que sanha insana de agradar o grande (e normalmente ignorante) público, que quer ´ver` a menina a qualquer preço? O que acrescenta, eu lhe pergunto, à reportagem colocar a foto desta menina na capa do UOL? Em nada, de certo, além de causar sensacionalismo barato, do pior tipo.´
A. Carlos
´Ao acessar o UOL hoje pela manhã, a primeira imagem que vi foi a da menina que foi ´desumanamente` presa com um bando de pilantras. Acessei a matéria para tentar entender o que o UOL pretendia mostrando aquela imagem. Nada… não tem nenhum vínculo com a matéria… aliás, foto ridícula, sensacionalista, que pessoas de bem e profissionais que se prezem não deveriam ajudar a divulgá-la. Quiseram mostrar o quê? O decote que ela usa? Que ela já está bem, passeando? Não entendi.´
Sérgio R. V. Peca
´Achei bastante antiético colocar na primeira página do UOL uma foto da adolescente que foi colocada em uma cela masculina no Pará. Ainda que com a modificação da foto, que impossibilitava reconhecer o rosto da menina, a publicação deste material é desnecessária. A adolescente encontra-se em situação de risco por ter denunciado os abusos que sofreu, logo é extremamente irresponsável a postura do site. A função do jornalismo é informar/revelar e isso já tem sido feito nos últimos dias pelo UOL, publicando matérias sobre o ocorrido. Interessa ao leitor ver a imagem desta menina? Acrescenta algo às informações publicadas pelo site? Ou trata-se de mera curiosidade mórbida?`
Erica Montanheiro
Mesmo modificada, a foto facilita a identificação da adolescente e traz detalhes que podem, dependendo da interpretação, colocá-la em situação vexatória e constrangedora porque:
1. permite visualizar o formato do rosto da menina;
2. permite visualizar sua boca;
3. permite ver o formato e tamanho de sua orelha direita;
4. como ela foi fotografada de frente, dá indícios de como são os olhos;
5. mostra em detalhes parte de sua roupa, o decote de sua camiseta levantada, o formato e tamanho de seus seios;
6. expõe parte de sua barriga desnuda;
7. expõe a cela que ela dividiu com dezenas de presos e onde foi abusada, atacada e estuprada.
Ou seja, da forma como foi alterada e divulgada, a foto pode trazer problemas à adolescente e sua família.
Não custa nada lembrar, aqui, incisos e artigos da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Constituição
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Estatuto da Criança e do Adolescente
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
Seguem as oito perguntas encaminhas à redação e as respectivas respostas.
1. Por que o UOL decidiu publicar a foto e dar a ela tanto destaque? Ficou no ar por quase doze horas e foi a foto principal na maior parte desse período.
UOL – O UOL considera o fato ocorrido no Pará de extrema gravidade.
2. Houve alguma reflexão interna antes da publicação da imagem?
UOL – Sim, houve reflexão. O UOL considerou que o efeito gráfico aplicado sobre a foto foi suficiente para não expor a identidade da adolescente.
3. Que fato jornalístico relevante o UOL viu na imagem para decidir colocá-la como principal foto do portal?
UOL – Há muitas formas de chamar a atenção para um assunto na primeira página do UOL. A foto é uma das principais. Como o UOL considera essa cobertura jornalística da maior importância, achou por bem usar o espaço da foto principal para isso.
4. Sob a luz do ECA, o UOL não considerou que poderia estar ferindo pelo menos dois dos artigos (17 e 18)?
UOL – Não, o UOL não considera ter ferido o ECA.
5. O tratamento em Photoshop feito na foto permite ter detalhes do rosto da garota, como formato, cabelo, olhos e boca. O UOL não considerou que a publicação da foto poderia expor a adolescente de forma vexatória e constrangedora?
UOL – Não. O UOL não considera ter exposto a adolescente de forma vexatória
6. Por que não consta a informação de que a imagem foi tirada de dentro da cela?
UOL – Quando o UOL publicou a imagem, o UOL ainda não tinha a informação de que a foto havia sido tirada de dentro da cela.
7. O UOL falou com a editoria de fotografia da Folha antes de publicar a foto, para ter mais detalhes que ajudassem a tomada de decisão? Não estranhou o crédito e a determinação de que a imagem não poderia ser vendida? Não achou estranho publicar como foto quente uma imagem com o crédito Arquivo/ Folha Imagem?
UOL – Não.
8. Há alguma regra que verse sobre publicação de fotos de crianças e adolescentes?
UOL – Sim. A regra que o UOL adota é não publicar foto que permita expor a situação de constrangimento criança ou adolescente.
A partir das respostas, pergunto: se o UOL julga ´essa cobertura jornalística da maior importância´, por que dependeu 100% da Folha para a cobertura? Por que não enviou alguém para o Pará? Por que só decidiu colocar como foto principal a que expõe a garota, se tinha fotos feitas com cuidado por Marlene Bergamo? Se já sabe que a foto foi tirada de dentro da cela, por que mantém a legenda inalterada até agora?
A redação fala novamente
´Diante das perguntas feitas no final do post ´Sensacionalismo em alta´, a redação do UOL gostaria de fazer as seguintes considerações.
A Folha é conteúdo exclusivo do UOL e é a principal fonte de informação jornalística do portal no Brasil hoje. O UOL considerou que a cobertura da Folha seria suficiente para atender da melhor maneira aos leitores do UOL.
A publicação de uma foto não elimina a possibilidade de publicação de outras fotos.
A legenda da foto que mostra a adolescente na cela foi atualizada com essa informação.´
***
Edição bonita, mas descuidada (27/11/07)
Por uma olhada rápida, o UOL poderia estar de parabéns pela página especial sobre o relatório do Pnud que a ONU divulgou hoje, assunto que foi manchete do portal por sete horas e quinze minutos nesta terça. Uma leitura mais atenta, porém, aponta para problemas que vão da escolha de texto disponível na concorrência para a manchete até descuidos na finalização e edição do material, passando pela repetição de desenho de página da (também usada para o Airbus A-380 e muito similar à usada para a eleição argentina) e por falta de análise profunda sobre os dados.
Dos grandes portais e jornais online brasileiros, somente UOL e iG valeram-se de parceiro (inclusive o mesmo, a BBC Brasil) para dar a notícia de que o país entrou no grupo de nações com alto IDH. Folha Online, Estadão, Terra (que já havia dado, em abril, a informação de que o Brasil chegaria ao clube dos países de alto IDH), O Globo e G1 produziram textos próprios.
Dos oitos destaques editados na home sobre o tema (além do infográfico), apenas três eram produção da redação: dois do UOL News (exclusivos para assinantes) e um de Ciência e Saúde. Todos os demais, incluindo o da manchete, eram da BBC Brasil, que pode ser encontrada em todos os sites concorrentes do UOL em conteúdo jornalístico. Por melhor que seja a qualidade editorial da equipe da BBC Brasil, fica a sensação, ao ler um material que foi divulgado em Brasília e produzido por um parceiro em Londres, que falta ao UOL equipe e/ou planejamento para ´agarrar` um assunto que merece a manchete do portal. Ainda mais quando a redação recebeu o relatório parcial na última sexta e teve um complemento ontem.
A busca por textos exclusivos e reportagens que não possam ser facilmente encontradas na concorrência deveria ser um objetivo constante no UOL. Fica estranho falar em ´melhor conteúdo` quando esse material é encontrado em qualquer concorrente (apesar de ´empacotado de forma diferente´, como costuma dizer a redação).
Logo após o ´desembargo` da pesquisa, o UOL colocou às 10h05 em sua home page o texto da BBC e um infográfico produzidos obviamente com antecedência. Depois, às 13h05, foi ao ar a ´página especial´.
Apesar do especial, não vi uma análise mais rigorosa sobre o que representa essa ascensão do Brasil ao clube dos países de alto IDH ou mesmo a relativização da pesquisa, como, por exemplo, o excelente texto de Daniel Bramatti no Terra Magazine. Faltou, ainda, para quem se interessasse mais, destacar a íntegra da pesquisa, dada pela Folha Online, ou o anexo estatístico (aqui, em inglês). Não havia, tampouco, de forma clara, num quadro ou arte, todos os indicadores que levaram o Brasil ao IDH de 0,800 e como tem sido a evolução do índice. O infográfico deu apenas dados de PIB per capita e expectativa de vida ao nascer dos relatórios de 2006 e 2007. Faltaram os números relativos à educação (índice de analfabetismo e taxa de matrícula em todos os níveis de ensino) e a evolução do IDH ao longo do tempo.
Do site do Pnud em português, seguem os dados:
Apesar de a redação ter oferecido ´tabelas´, faltaram dados essenciais, como os acima
Chama atenção, ainda, a falta de cuidado de revisão e padronização dos textos na ´página especial´. O Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) foi chamado pelo UOL de o PNUD, o Pnud, a PNUD e a Pnud. Países como Zimbábue tiveram, em uma mesma página, a grafia também sem acento (está assim no ar, mesmo depois de a redação ter sido alertada para o erro). Países como Níger foram grafados como Niger. O PIB virou pib. O gráfico trazia uma legenda com setas amarela e verde para ´países que subiram no índice´. Em 2007, havia setas correspondentes no mapa. Em 2006, nada, mas a legenda estava lá. Apenas esse item do infográfico havia sido revisto, depois das 16h. Os erros na grafia do nome dos países e a falta de cuidado inclusive com o título permaneciam.
Arte feita pelo UOL trazia problemas básicos
Falta rigor na padronização (´Índice de desenvolvimento Humano` e ´Zimbabue` são exemplos)
Outro problema, que é recorrente nesse tipo de página especial ou guarda-chuva para outros conteúdos, é a navegação. Quando o internauta clica em ´Mudança climática vai minar combate à pobreza, diz relatório da ONU´, por exemplo, é direcionado para uma página de Ciência e Saúde que não traz nenhum link para o especial. Ele voltará ou dando um ´retornar` no browser ou voltando para a home page do UOL e iniciando a navegação novamente. Nem se fosse para a home page da estação Últimas Notícias acharia a home guarda-chuva (até agora, os destaques lá são para morador de rua incendiado e notícia sobre o Irã). Em casos de ´especiais´, deveria haver um selo ou chapéu em todas as páginas do assunto que permitissem o retorno à página inicial, como há a barra de navegação em todo o conteúdo UOL, seja próprio seja de parceiros.
A redação informa que teve ´acesso parcial ao relatório na sexta-feira e ao material completo apenas ontem de tarde. Não havia uma lista consolidada da colocação de cada país no ranking. Fizemos isso internamente.` Ou seja, houve tempo de sobra para ter editado o material com mais cuidado e, inclusive, ter feito os textos de abertura.
UOL responde
O gerente geral de notícias do UOL, Rodrigo Flores, responde à crítica:
´Mais do que escrever textos originais, a missão do UOL é informar bem o seu internauta. A redação avaliou que a reportagem da BBC Brasil era de boa qualidade e não demandava a produção de um texto próprio.
A cobertura do UOL está longe de restringir-se a um texto. Temos gráfico, tabelas, mapa, análises e vídeos. Há espaço para a participação do internauta. Há conteúdo de parceiros (o How Stuff Works, por exemplo, explica como funciona o IDH).
Gostaria de aproveitar o espaço e fazer duas ponderações:
1- Fomos os primeiros entre os grandes portais a destacar em manchete o resultado do IDH.
2- Fomos os primeiros entre os grandes portais a apresentar a lista completa dos 177 países e comparar o desempenho atual com o relatório do ano passado.
Obrigado,
Rodrigo
Meu comentário: não basta ser o primeiro nem ter volume, é preciso ter excelência.
***
Sem o outro lado (26/11/07)
Desde o início da função, em julho, a ombudsman recebe freqüentemente queixas de internautas que acusam o UOL de ser petista e favorecer Lula & cia. no noticiário e de internautas que vêem o UOL como um ninho tucano, a levantar a bola de FHC & cia. Normalmente, a resposta da redação é que o ´UOL faz um jornalismo apartidário e independente´.
Quando o portal, porém, não toma o cuidado de ouvir o outro lado em questões políticas, fere uma das regras mestras do bom jornalismo (válida para qualquer tipo de cobertura) e fica vulnerável à pecha de partidário.
Hoje, por exemplo, por mais de seis horas, o UOL manteve em sua home page (foi inclusive submanchete) chamada, sob o chapéu ´eleições´, que dizia: ´MP recomenda rejeição de contas de Geraldo Alckmin em 2006´. Pois bem. A notícia é das 11h28. Foi para a home do portal às 12h10. A reportagem foi uma das mais lidas da Folha Online, a autora do texto. O texto não demonstra que houve a procura do governador, para ouvi-lo. Em mais de seis horas, haveria tempo suficiente para, ao menos, procurar a assessoria de imprensa do tucano e escrever, em caso de falta de resposta, que ´até tal hora, a assessoria não respondeu aos telefonemas da redação para explicar o caso´. Básico. O correto, segundo o próprio manual da Folha, seria publicar a notícia após Alckmin ter sido procurado. Nunca antes.
Se a Folha Online errou, caberia ao UOL evitar que a falha fosse parar em sua home page, como submanchete e por tanto tempo. Bastaria um telefonema para a redação do parceiro para pedir que se ouvisse o outro lado. A omissão evidencia falta de cuidado, o que não deveria ocorrer num jornalismo de qualidade.
UOL responde
O editor Haroldo Sereza respondeu à crítica sobre a permanência, por vários dias, de conteúdo na home page do portal. Segue, abaixo, a resposta.
´Tereza,
O módulo em que a ombudsman aponta falta de atualização é um espaço relativamente novo na home page e que, desde o seu ´nascimento´, tratamos de modo distinto dos demais blocos. É, portanto, uma experiência que estamos ainda aprendendo a explorar.
Até o post ´Falta conteúdo ou atualização?´, não havíamos recebido reclamações sobre a edição desta área, possivelmente porque o internauta, de alguma forma, entendeu essa diferença.
Achamos que, ao navegar pelas setas, o internauta encontra o equivalente a uma lista de conteúdos interessantes, mas não necessariamente ´quentes´. É como se dois tempos convivessem na home, um mais ágil, sempre exposto na home, outro mais lento, com conteúdos que, de alguma forma, continuam interessando a ele, internauta.
Não consideramos, no entanto, o resultado perfeito e estamos, inclusive, pensando em mudanças visuais e de conteúdo no módulo. Por isso, a sua pergunta: ´Falta conteúdo ou atualização?´, responderia que conteúdo não falta. E que estamos, para essa área, aprendendo o ritmo adequado de atualização. Seu comentário nos ajuda nesse sentido.
Obrigado,
Haroldo Ceravolo Sereza
Editor da home page do UOL´’