O ombudsman do New York Times, Daniel Okrent, aborda três assuntos diferentes em sua coluna quinzenal publicada em 27/6. O texto alerta para a mania de simplificação de manchetes jornalísticas, questiona a publicação de uma dura resenha do livro de Bill Clinton na primeira página do Times e faz uma remissão à coluna anterior do ombudsman, dando continuidade à polêmica sobre o uso de fontes anônimas nas matérias.
Ultraje ou distorção?
Okrent conta que a manchete ‘Panel Finds No Qaeda-Iraq Tie; Describes a Wider Plot for 9/11’ (Quadro não encontra laço entre Qaeda e Iraque; descreve uma trama maior para 11/9), publicada em 17/6, revoltou alguns leitores – entre eles o vice-presidente americano, Dick Cheney – , que acusaram o Times de fazer uma ‘ultrajante’ distorção do relatório da comissão independente que analisa os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. O ombudsman diz que não concorda com o termo ‘ultrajante’, mas considera que o jornal cometeu o ‘crime da distorção pela abreviação’, comum nas redações.
Segundo ele, manchetes de jornal possuem dois enigmas. Quanto mais complexa é a história, mas facilmente ela irá receber uma manchete que a simplifique exageradamente. E quanto mais fiel a manchete for à história, mais dificilmente o leitor entenderá seu ponto principal.
No caso específico citado por Okrent, a manchete peca por não especificar que o relatório preliminar se referia, em grande parte, aos ataques em solo americano, e por fazer uso de duas palavrinhas queridas pelas redações: o resoluto ‘não’ e o impreciso ‘laço’. O ombudsman questionou o editor assistente Craig Whitney, responsável por revisar a primeira página do Times. Whitney alega que os termos usados são uma maneira correta de se resumir que ‘o relatório chegou à conclusão de que, aparentemente, não existe uma relação colaborativa entre a Al Qaeda e o Iraque’.
Okrent diz que não considera que, neste caso, tenha havido uma distorção intencional; prefere falar em erro de conduta. Alguns críticos do jornal sugerem que seja feito um pedido de desculpas aos leitores. O ombudsman discorda. ‘Se tivesse que se desculpar por todas as manchetes fora de tom, a indústria jornalística se transformaria em uma cacofonia de confissões’, diz ele. ‘O que precisamos são boas reportagens e apresentações cuidadosas’, conclui.
Clinton na primeira página
A resenha feita por Michiko Kakutani sobre o livro de memórias de Bill Clinton, My Life, foi brutal, diz o ombudsman. Do tipo que arrasaria a carreira de qualquer autor (não a de alguém com a estampa de Clinton, que fique claro), a crítica não se atém ao livro; entra na política. Os fãs do ex-presidente se indignaram. Muitos escreveram a Okrent para dizer que a resenha se tratava de uma ‘emboscada anti-Clinton’; outros questionaram o fato de Kakutani não mencionar as críticas que o livro faz ao Times.
Okrent não concorda com a acusação de emboscada, ou vingança. Diz também que as ‘críticas existem para conter opiniões’. Não são matérias jornalísticas estritamente compromissadas aos fatos. Desde que não os distorçam, não caluniem ou difamem alguém, elas são – e devem ser – livres para dizerem o que querem.
O problema encontrado pelo ombudsman neste caso foi o posicionamento da resenha, colocada na primeira página. Seria correto, pergunta ele, utilizar a inviolabilidade da primeira página para a exposição de opiniões? Segundo o editor-executivo do Times, Bill Keller, ‘a voz de uma crítica brilhante era algo que nós poderíamos adicionar a nossa cobertura sobre o assunto’.
Okrent não se dá por satisfeito. ‘A primeira página é lugar de notícias e, discutivelmente, de análises; mas se é também lugar de opiniões sobre pessoas públicas, então podemos argumentar que os editoriais pertencem a ela’.
Contra as fontes anônimas
Por fim, o ombudsman faz uma remissão a sua última coluna, publicada em 13/6. Na ocasião, ele afirmou que o assunto abordado – o uso de fontes anônimas – era complexo, e que esperava poder explorá-lo mais a fundo em textos futuros.
Porém, diz Okrent, o adjetivo ‘complexo’ não é suficiente para descrever o assunto. Ele recebeu diversas mensagens de leitores, jornalistas e fontes com as mais abrangentes opiniões sobre a questão. O ombudsman diz que planeja voltar ao tema e tentar abordar suas complexidades, mas, pelo menos por enquanto, prefere se ater a um único ponto: as ‘coletivas secretas’ organizadas por figuras políticas, que, segundo ele, são uma afronta à integridade jornalística e um insulto aos cidadãos.
Okrent sugere um grande desafio aos cinco maiores jornais dos EUA e à agência de notícias Associated Press. Mesmo tendo consciência de que os jornais competem entre si, ele propõe aos editores-chefes do USA Today, Wall Street Journal, New York Times, Los Angeles Times, Washington Post e da AP que eles concordem em se unir para não cobrir as coletivas secretas conduzidas por oficiais do governo e outros personagens políticos que se recusam a permitir que seus nomes sejam publicados nos jornais.
Se sua sugestão der resultado, ele promete avisar os leitores.