Foi uma semana infeliz para a Folha. Erros são da natureza extremamente dinâmica do jornalismo, mas o balanço de informações ou títulos incorretos dos últimos dias é preocupante e constrangedor.
Começo pelo mais antigo: no sábado (20), na edição de cobertura da prisão dos executivos das empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez, a editoria “Poder” informou em título: “Operação é severamente criticada pelo meio jurídico”. O texto, como bem definiu um leitor, era bisonho: das quatro pessoas ouvidas, três são advogados de réus da Lava Jato, e a quarta, o ex-ministro do STJ Gilson Dipp, escreveu um parecer –pago pela Galvão Engenharia– em que tachava de juridicamente “imprestável” a delação premiada de Alberto Youssef.
“É função dos advogados divulgar a melhor versão para seus clientes, mas eles não caracterizam ‘o meio jurídico’. Ninguém na editoria percebeu que o texto não menciona nenhum advogado que não seja parte interessada?”, escreveu um leitor.
Na terça (23), “Mercado” relatou que, segundo um estudo global, 23% dos brasileiros haviam pago para acessar notícias online em 2014. O número punha o Brasil na vanguarda mundial, deixando em segundo lugar, com 14%, a Finlândia, um daqueles países nórdicos que exibem em todas as áreas índices de humilhar o restante do mundo.
Observei na crítica interna que lá o dado poderia fazer sentido. A população finlandesa é de cerca de 5,5 milhões de habitantes, 97% com acesso à internet; os pagantes somariam 770 mil. No Brasil, onde só 54% têm acesso à rede, é difícil acre- ditar que 47 milhões teriam pago para consumir notícia digital.
A correção saiu na sexta (25): “O correto é afirmar que 23% dos inter- nautas brasileiros que leem notícias pagaram pelo menos uma vez por esse tipo de conteúdo durante o ano passado.” Alguém sabe quantos são os internautas que leem notícias?
Na quinta (25), a Folha estampou no site por cinco minutos uma manchete bombástica, publicada também no Twitter: “Lula pede à Justiça para não ser preso por juiz da Operação Lava Jato”. O petista não tinha nada a ver com o angu. Problema: a notícia foi ao ar antes que a reportagem ouvisse o Instituto Lula.
“O jornal corrigiu o erro após obter a íntegra do habeas corpus. A correção saiu no site e no Twitter”, informa a direção de Redação.
O problema é que o sistema de correção no digital é bem pior do que no papel. O registro de erro vem em letras pequenas no pé do texto. A reportagem de Lula é longuíssima; é preciso lê-la até o fim (coisa rara) ou rolar a tela pelo menos quatro vezes para chegar até o aviso –só um link que remete para outro lugar.
Se você nunca viu a seção Erramos no site, não é por distração, leitor. A impressão é a de que ela foi pensada para não aparecer. Não está integrada nos temas da barra superior e, por razão que me escapa, não é elencada em ordem alfabética da lista de “Seções” (botão azul à esquerda, no alto). Vem no fim: a lista tem 41 itens, o Erramos está no 39° lugar.
O problema do Twitter é de outra ordem. “A política do jornal é nunca apagar um tuíte ou texto errado, mas corrigir os erros o mais rapidamente possível e com visibilidade. Na nossa avaliação, é um procedimento mais transparente do que simplesmente apagar o conteúdo original. Nesse caso, o leitor que seguir o tuíte antigo será levado ao texto correto e informado de que uma versão anterior estava errada”, declara a direção de Redação.
Nos dois meios, acho que o jornal precisa rediscutir seus procedimentos. Se a intenção é dar transparência e visibilidade a correções no site, seria mais eficiente explicar no mesmo arquivo que uma versão anterior do texto havia informado algo incorretamente. Mais claro e visível, impossível.
Também não vejo lógica em manter a chamada errada no Twitter, onde pode continuar sendo reproduzida. Ao corrigir o texto de Lula, o jornal substituiu a informação incorreta do site; por que não apagar o tuíte errado e deixar um que informa do erro removido?
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Vera Guimarães Martins é ombudsman da Folha de S. Paulo